terça-feira, 15 de janeiro de 2019

NÃO ERA NECESSÁRIO


Como é sabido, em qualquer país e em particular no nosso, o universo da educação é um rio de águas calmas em que tudo decorre tranquilamente apenas com a agitação própria da idade dos alunos e da sua irreverência, por assim dizer.
Assim sendo, torna-se necessário que de vez em quando surjam alguns episódios que criem alguma discussão que proporcione convívio e troca de impressões.
Desta vez temos a questão do poema Ode Triunfal, de Álvaro de Campos. Na elaboração do manual Encontros para o 12º ano da responsabilidade da Porto Editora, numa obra de Fernando Pessoa escolhida para o integrar, “Ode Triunfal”, foram substituídos dois versos por questões de linguagem (explícita chamam-lhe para minha surpresa) e valores. A chamada liberdade poética não mereceu acolhimento.
A Porto Editora diz que no manual dirigido aos professores o texto está completo cabendo a estes decidir se e como abordar a obra. A Associação Nacional de Professores de Português através da sua presidente critica fortemente a “truncagem”.
Das duas uma, a obra de Álvaro de Campos cumpre os critérios de relevância que sustentem o seu estudo pelos alunos do 12º e, portanto, deve ser disponibilizada na íntegra ou, não cumpre, e a escolha deveria ser outra.
A discussão sobre esta matéria que envolve em leitura do texto por gente acima dos 17 anos no ano da graça de 2019 é algo que do meu ponto de vista faz pouco sentido e sustentada por moralismo inconsistente. Este episódio remete para os meus tempos de liceu quando nas aulas de Português estudávamos os Lusíadas mas não abordagem o Canto Nono dos Lusíadas e a sua Ilha dos Amores, a parte mais estimulante da obra de Camões que, evidentemente, líamos pelo amor à literatura.
Com tantos problemas e dificuldades diárias porquê criar mais ruído? Como é que se decide solicitar a gente de jovem quase adulta para lerem um poema mas não aquelas duas linhas?
Não sei porquê lembrei-me da imortal “Cena do Ódio” do Mestre Almada, aliás, dedicada a Álvaro de Campos:
(…)
Tu, qu'inventaste a chatice e o balão,
e que farto de te chateares no chão
te foste chatear no ar,
e qu'inda foste inventar submarinos
p'ra te chateares também por debaixo d'água,
(…)

2 comentários:

inconfessável disse...

Completamente de acordo.
Depois fica-me a dúvida se foi a Porto Editora que resolveu banir versos e se sim, quem é a Porto Editora para tomar tal liberdade, ou se foi o ministéria da educação e se sim, ainda é mais grave.

Zé Morgado disse...

A responsabilidade será dos editores e autores.