sábado, 1 de dezembro de 2012

A PERVERSIDADE DA PROLETARIZAÇÃO DA ECONOMIA

Em Julho noticiava-se, se estão recordados, que existiriam cerca de 147 mil trabalhadores a receber menos de 310 €, relembro que o salário mínimo é 485 €, e na altura o Primeiro-ministro considerou "perverso" o recurso a trabalho temporário, reportando-se ao caso da contratação de diferentes técnicos, enfermeiros e médicos, para desempenho de funções no SNS.
Como é conhecido, esta é uma situação que não existe apenas no âmbito da Saúde. Existem, por exemplo, muitos professores a trabalhar nas chamadas Actividades de Enriquecimento Curricular pagos pelas Câmaras Municipais por valores semelhantes.
Há algumas semanas a imprensa divulgou a existência de docentes universitários, em estabelecimentos de ensino superior privado e também público, cujo pagamento por hora de aula é de cinco euros ou menos, sendo que alguns ainda terão que assegurar a preparação das aulas e avaliações sem remuneração acrescida. Os cincos euros por hora parecem ter-se transformado na unidade de conta dos salários neste processo de empobrecimento e proletarização da nossa economia empreendido pelos feitores da troika que nos governa e afunda.
Importa contextualizar as relações laborais num universo com mais de 16% de desemprego, 36,2% de desemprego jovem e a segunda mais alta taxa de precariedade da Europa. A Associação Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis refere hoje que, com base em dados do INE, mais de metade da população activa em Portugal tem trabalho precário ou está desempregada, situação que se agravou depois do estabelecimento do “memorando de entendimento”, estranha designação esta, entendimento.
A estabilidade no mundo laboral é espelhada num léxico que só de ouvir embaraça. São frequentes as referências a excedentários, as pessoas são excedentárias, não fazem falta, há que libertar o mercado desse peso, o das pessoas excedentárias. Um outro termo é o trabalho precário, flexível, dizem, que torna precária uma vida sem a confiança no amanhã.
Também me parece curiosa a ideia de rescisão amigável que, amigavelmente é claro, manda milhares para o desemprego. No fundo, as pessoas deixam de ser pessoas, são activos que como tal devem ser geridos em função do mercado, adquirem-se, dispensam-se, descartam-se, gerem-se e, finalmente, abandonam-se.
Neste cenário, os desequilíbrios fortíssimos entre oferta e procura em diferentes sectores, a natureza da legislação laboral favorável à precariedade e insensibilidade social e ética de quem decide, promovem a proletarização do mercado de trabalho mesmo em áreas especializadas.
Alguns dos vencimentos que se conhecem, atingindo também camadas altamente qualificadas, não são um vencimento, são um subsídio de sobrevivência. É exactamente a luta pela sobrevivência que deixa muita gente, sobretudo jovens sem subsídio de desemprego e à entrada no mundo do trabalho sem margem negocial, altamente fragilizadas e vulneráveis que entre o nada e a migalha "escolhem amigavelmente" a migalha". Como é evidente esta dramática situação vai de mansinho alargando e numa espécie de tsunami vai esmagando novos grupos sociais e famílias que se julgavam razoavelmente protegidas nos seus empregos e salários.
É um desastre. Grave e dramático é que as pessoas são "obrigadas" a aceitar. Os mercados sabem disso, as pessoas são activos descartáveis.

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