domingo, 18 de dezembro de 2011

UM REI FRACO FAZ FRACA A FORTE GENTE

Lê-se e não se acredita. Depois de um Secretário de Estado ter convidado os jovens portugueses com qualificação de nível superior a emigrar, é o Primeiro-ministro que convida os professores no desemprego a “abandonarem a sua zona de conforto” e a “procurarem emprego noutro sítio”. Num nobre esforço de agenciar emprego até sugere os países de língua portuguesas como destinatários privilegiados dessa emigração.
Depois de ter dito que o caminho dos portugueses passa pelo empobrecimento agora a sua perspectiva de combate ao desemprego passa pelo convite à emigração.
Os indicadores sobre a educação em Portugal deixam-nos ainda muito mal colocados em termos internacionais, a oferta excedentária de professores (em algumas áreas) passa pela desresponsabilização da tutela e o Primeiro-ministro entende que o melhor para alguns portugueses é mesmo emigrar, aqui não vão ter possibilidades de construir um projecto de vida, não cabem cá, em suma.
Sabemos todos das inúmeras dificuldades que o país enfrenta, sabemos que existem enviesamentos severos no mercado de trabalho, sabemos das alterações demográficas e das suas implicações em algumas áreas profissionais.
Admito até que os governantes não tenham soluções nem rumo face ao futuro, por incompetência e ou por impotência.
O que eu sei também é que um líder não pode fazer discursos deste tipo. Provavelmente, alguns virão dizer que é realista. Nada de mais errado. A liderança que transforma e é propulsora de energia e não desiste, nem “manda” desistir.
Camões, no século XVI, dizia que um rei forte faz forte a fraca gente tanto quanto um rei fraco faz fraca a forte gente. Ele tinha razão.

18 comentários:

Luis disse...

Eu também li e só não fiquei chocado porque em boa medida já nada me espanta. A este propósito hoje, ainda antes de ter lido a notícia, estava a pensar nestes assuntos e cheguei à nada original conclusão que o sistema político em Portugal é tal que é inevitável que cada geração de políticos seja pior que a anterior. Por isso, se acham o Passos Coelho, António José Seguro e afins maus, talvez se sintam reconfortados por saber que aqueles que se lhes seguirem serão ainda piores, quanto a isto o céu é o limite.

Em Portugal existe o monopólio dos partidos, criado logo a seguir ao 25 de Abril. Na altura isto pareceu uma boa ideia como forma de evitar uma revolução marxista que instalasse em Portugal uma ditadura soviética. Hoje em dia porém aquilo que se concluí é que, apesar das boas intenções, este foi provavelmente um dos maiores erros da história de Portugal, e este monopólio dos partidos acabou por ser um cancro que afunda inevitavelmente a sociedade portuguesa nivelando-a pelo mínimo denominador comum.

Eu passo a explicar: imagine-se que uma das pessoas que leiam isto no fim decide de forma altruística que é altura de ajudar o país. O que acontece então? Inevitavelmente tem de se inscrever num partido, seja ele qual for, porque fora dos partidos nada é permitido, supostamente a bem da nação. Até aqui ainda não se está muito mal, o problema vem depois: imagine-se que nos inscrevemos num partido o que acontece depois? Nada! Nos partidos vigora a lei do "chefe tem sempre razão" porque doutra forma isso é entendido como sendo mau para a imagem e um chefe que fique com má imagem é um chefe que perde votos, e ao perderem-se votos perdem-se cargos, mordomias, status social, e pretensas importâncias que fazem de alguém absolutamente insignificante poder dar-se a ares para com o seu vizinho.

Não se pense nisto também que por chefe se entende o líder do partido, existem vários níveis de chefes começando nas distritais, cada um mais insignificante que o outro e todos ciosos do seu pretenso poder. Neste contexto imagine-se que chega alguém a um partido cheio de ideias novas, a dizer que não concorda com isto ou com aquilo, que é possível fazer isto ou o outro muito melhor? Obviamente essa pessoa é logo considerada uma ameaça para o chefe do partido local que não tem as mesmas capacidades e fica assim com medo de ser ultrapassado, é uma ameaça para o chefe distrital pelos mesmos motivos, e depois de subirmos mais alguns degraus, é uma ameaça para o lider do partido porque assim se corre o risco de ser quebrada a solidariedade, acabando-se o mito de infalibilidade, e assim surgirem mais pessoas a contestá-lo.

Uma pessoa assim é desta forma automaticamente posta de lado e não tem qualquer hipótese, por mais que se esforce, por mais capacidade que tenha, por melhores que sejam as suas ideias, de progredir num partido. Imagine-se que um deputado qualquer, enchendo-se de coragem vota contra o seu partido, o que é que lhe acontece? Nunca mais voltará sequer a por os pés numa assembleia sequer da junta de freguesia. O chefe manda e não há vida para lá do chefe, e ainda chamam a isto democracia.

É fácil assim vermos portanto que a única forma de se progredir dentro dum partido é na base da obediência canina e total ausência de ideias próprias de forma a não se ser tomado como ameaça por ninguém.

Não é possível assim esperar que após 20 ou 30 anos a demonstrarem repetidamente que não têm nada na cabeça, que não têm qualquer espinha, que de um momento para o outro os políticos uma vez chegados ao topo tenham qualquer arremedo de ideia daquilo que pretendem para o país, e saibam liderar de acordo quando a ascensão deles se deve precisamente à falta de ideias e de capacidade de liderança.

Luis disse...

(continuando)

O facto é que Portugal não tem líderes, nem os pode ter, e neste círculo vicioso dos partidos é inevitável que cada safra de políticos seja pior que a anterior. E as coisas só não são piores porque volta e meia lá chamam uns "independentes" para o governo o que sempre serve para disfarçar. Agora perguntem lá a estes "independentes" o que acharam da sua experiência no governo? Pois... por isso é que há tanta gente de bem (e Portugal tem muita gente de bem) a recusar-se a ir para qualquer que seja o governo.

Por tudo isto é que eu digo que enquanto o sistema político não mudar nada irá mudar e o declínio continuado do país é inevitável. Se as pessoas querem mudar alguma coisa comecem por mudar o sistema político que tudo corrói na sociedade Portuguesa.

maria disse...

Senti vergonha deste PM, ao mesmo tempo, uma enorme desesperança no meu país.
Abraço

anónimo paz disse...

Optima análise do nosso sistema político, dr. Luis!

Continuamos com o receio da injecção atrás da orelha e daqueles senhores que comem criancinhas ao pequeno almoço, sejam eles de algum bloco ou não.

Não somos povo de ir para a rua com armas na mão, valha-nos isso!

Por isso...

Resta-nos o voto em branco para tirar legitimidade a este sistema político.


saudações

Luis disse...

Portugal é um país de extremos, basta olhar para a nossa história para vermos que os tais brandos costumes são uma invenção recente. Os Espanhóis também são assim com a diferença que a força da inércia em Portugal sempre foi tão grande que só ao fim de realmente muito tempo é que as pessoas se decidem a mexer. Mas quando isso acontece...

Por isso é que este governo, consciente do que ia fazer, a primeira medida que tomou foi aumentar os ordenados da PSP e da GNR.

Eu não acredito que a esmagadora maioria das pessoas no governo sejam más pessoas e que não tentem fazer o melhor para o país. É certo que alguns estão lá despudoradamente com uma agenda pessoal e nem o escondem, mas muitos dão genuinamente o seu melhor. O problema é que isso não chega porque nunca tiveram capacidade para os cargos que ocupam. Aceitaram-nos uns por um misto de vaidade, outros porque acham que "do outro lado" são ainda piores, o que até é capaz de ser verdade porque como expliquei o círculo é vicioso e sempre a descer.

Mete-me imensa impressão, com tanta coisa boa que podiam fazer, ver tanta incompetência generalizada, ver tanta asneira crassa, coisas que um mínimo de senso comum teria evitado, coisas que até o meu filho de nove anos seria capaz de dizer que estão mal e como fazer bem. O desnorte é tanto que a partir de certa altura é o pânico que comanda, e isso temos visto nós nos sucessivos governos, este apenas se está a estrear mais cedo.

Eu não acredito, e o governo também não, que o tempo das revoluções tenha passado. Os tiros no algarve deviam servir de sério aviso de que há limites para a prepotência até porque em muitas das medidas que o governo tem tomada ela é totalmente desnecessária e podiam-se obter muito melhores resultados por outros meios.

Agora como nunca gostei de violência, penso que a melhor forma disto mudar é mesmo deixar de se votar. Cada vez que votamos legitimamos o actual sistema, o que aliás nem sequer diz muito bem de nós já que é um sistema que toma os eleitores por imbecis: se é mau um deputado votar de cruz, o que é que se diz das pessoas que o elegeram? Talvez quando a abstenção chegar aos 60-70% os nossos não muito dignos partidos decidam duma vez por todas mudar o sistema eleitoral.

Até lá é cerrar os dentes e aguentar, afinal Portugal ainda é uma democracia e foi a democracia que há 6 meses atrás perpetuou mais uma vez este estado de coisas.

Zé Morgado disse...

Luís, como já deve ter verificado em diferentes textos que aqui deixo, também entendo que nossa democracia política se transformou numa partidocracia sustentada nos aparelhos partidários que administram interesses e proveitos de natureza variada. A intervenção cívica e política está asssente nestes aparelhos e qualquer movimento que possa emergira fora do seu controlo sofre uma tentativa de "captura" ou mesmo o risco de boicote e desvalorização.
Quanto ao voto em branco, ideia recorrente do Anónimo Paz, o quadro normativo existente, evidentemente produzido pela partidocracia, torna-o irrelevante

Luis disse...

Eu lembro-me de quando fui para a Universidade ter ficado imensamente entusiasmado com as eleições para a associação académica. Esse entusiasmo demorou precisamente 12 horas, o tempo que levei a saber que nas ditas eleições nem 10% dos estudantes participavam. Ainda assim, em todos os anos que lá andei nunca ninguém pôs em causa a legitimidade dos dirigentes da AAC cuja importância a comunicação social regular e diligentemente empolava.

Visto assim, eu seria forçado a concordar que mesmo com uma abstenção de para aí 70% ainda assim os nossos arremedos de políticos não teriam pejo em aceitar na mesma a formação de um governo onde após se lamentarem do estado de coisas não alterariam uma vírgula.

Eu no entanto a este respeito sou mais optimista, acredito, ou espero, que uma abstenção massiva levasse à recusa de formação de um governo e à reforma do sistema político. Até porque doutra forma o passo seguinte seria a revolução que pela própria essência nunca poderia ser pacifica.

A alternativa a isto só vejo mesmo a formação de um partido basica e declaradamente para destruir os outros partidos e o sistema político actual. Isto é possível, mas também imensamente perigoso porque é este também precisamente o caminho que leva a ditaduras, se a iniciativa for conduzida pelas pessoas erradas em vez de uma democracia teremos precisamente o inverso.

anónimo paz disse...

Fundamento a minha convicção de que o voto em branco é o voto útil do seguinte modo:

ABSTENÇÃO nas legislativas 2011 foi 41,1%. ou seja 3.875002 de cidadãos.

VOTOS EM BRANCO, 2,66% = 148.378 eleitores.

O partido governante ganhou as eleições com 38,65% = 2.159.742 eleitores.

O PS obteve 28,06 = 1.568.168 eleitores.

Ou seja os dois partidos juntos têm menos votos do que a abstenção.

A abstenção é considerada pela partidocracia (interessa-lhe, claro) como falta de cívismo ou pessoas que preferem utilizar seus fins de semana nas tarefas lúdicas em vez de cumprir seus deveres de cidadão responsável.

Os voto em branco é na realidade uma acção de descontentamento, porque o cidadão está presente nos seus deveres cívicos. E isto o sistema partidário não pode escamotear.

Para mim o voto em branco é uma das soluções, pelo menos a mais pacífica, para pôr em causa a democracia tal como é interpretada pelos actuais políticos.


saudações

Luis disse...

Devo dizer que gostei daquilo que li acima, e deu-me uma ideia que talvez fosse capaz de ser posta em prática: primeiro uma iniciativa legislativa dos cidadãos propondo que qualquer eleição seja considerada nula se a abstenção for acima dos 50% por falta de legitimidade democrática. Eu bem sei que a falta de vergonha da classe política não tem limites, mas ainda assim isto é de tal forma óbvio que será muito difícil para os partidos negarem a evidência. Afinal nas assembleias não há o quórum sem o qual não se podem reunir, os referendos não são inválidos se não tiverem um minímo de 50% de votos? Porque é que com a AR não há de ser o mesmo?

E então, uma vez isto aprovado, pregar sim a abstenção, para que os partidos sejam forçados a mudar o sistema eleitoral. Senão... bem a Bélgica não ficou quase 2 anos sem governo? Consta que mal não fez...

Zé Morgado disse...

Continuo a entender que não se trata apenas de contabilidade eleitoral, trata-se do modelo de organização política e regulação da transparência do financiamento das estruturas partidárias.

Luis disse...

Nós não podemos mudar os partidos em si nem o seu funcionamento interno. Isso faz parte da escolha de cada um, faz parte da democracia. E se houver um partido que funcione internamente como uma ditadura é com ele e com quem lá se inscrever, já que em teoria (e ressalvo o "em teoria" ninguém é obrigado a lá se inscrever).

A transparência de financiamentos é boa ideia mas ainda estou para ver após 200 anos de democracia moderna quem é o primeiro país a consegui-lo.

Resta pois a meu ver criar quer a nível nacional quer a nível local que facilitem a criação de alternativas aos partidos tradicionais obrigadno estes a reformarem-se e a prestarem mais atenção às pessoas que supostamente devem servir. Em Portugal, com o monopólio dos partidos isto não é possível, como expliquei logo de início não é permitido que uma pessoa qualquer se candidate à AR sem estar inserida num partido qualquer.

A criação de círculos uninominais fazendo cada deputado ser verdadeiramente responsável por uma área geográfica reconhecida, tendo assim de prestar contas aos seus eleitores em vez de ao chefe do partido, a par da permissão para qualquer cidadão se candidatar à AR, nem que se tivesse de proceder a primárias para apurar a lista eleitoral definitiva, mudariam e tornariam o país numa verdadeira democracia.

Esta é para mim a verdadeira solução, aproxima e responsabiliza os deputados perante os eleitores e não perante o chefe, ao mesmo tempo que retira o poder deste de "punir" eventuais desvios, aumenta a participação cívica das pessoas quer pela possibilidade de pedirem contas ao deputado que elegeram quer pela possibilidade delas próprias se poderem candidatar.

Esta é uma solução que por motivos obvios nenhum dos partidos quer, especialmente os mais pequenos que não querem correr o risco de perderem a maior parte dos deputados que teem eleitos graças aos grandes círculos eleitorais.

Por isso, e porque não espero que os partidos alguma vez venham a aprovar algo sequer remotamente semelhante a isto (das duas vezes que se falou em Portugal em círculos uninominais na última década foi incrível a falta de vergonha e a desonestidade intelectual das desculpas q arranjaram contra esse sistema eleitoral), é que sugeri que primeiro se bloqueasse a legislatura através da abstenção massiva, para depois forçá-los a aceitar aquilo que nunca na vida aceitariam de boa vontade.

A única alternativa a isto que eu veja só mesmo se pegarmos em armas e se fizer uma nova revolução. Mas como sou um democrata e acredito na democracia preferia que isto se fizesse por meio de votos.

Zé Morgado disse...

Caro Luís, por isso é que falei da alteração do modelo de organização política.

anónimo paz disse...

Penso que é uma verdadeira UTOPIA esperar que sejam os partidos a mudarem VOLUNTARIAMENTE as suas estruturas e organização política.As minhas esperanças diluíram-se em 2/3 gerações de políticos pós-revolução dos cravos.

Compreendo perfeitamente a ideia de José Morgado de serem os partidos a incutirem noutra direcção os seus comportamentos. Eu também desejava! Mas é uma forma romântica de encarar o assunto. Opinião minha,claro!...Vale o que vale...

O povo é que tem a dinamite (voto branco) para fazer implodir as máquinas partidárias tal como elas existem. Pensamento meu. Também... Vale o que Vale...


saudações

Cláudia Anjos Lopes disse...

"Cada vez que votamos legitimamos o actual sistema."
Concordo. Abstenção massiva resolveria mais do que ir votar. Se 90% dos eleitores não votassem, teria de haver alguma mudança.

anónimo paz disse...

Atenta Cláudia

Não foi isso que eu queria dizer.

Na boca dos políticos com a abstenção massiva seriamos 90% de portugueses cívícamente irresponsáveis e a nenhuma vergonha deles governava com os restantes 10%.


saudações

Cláudia Anjos Lopes disse...

Acredito que sim. Precisaríamos então de um boicote eleitoral, que impedisse os restantes 10% de ir votar.

anónimo paz disse...

Assim acredito, Cláudia!

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saudações

Cláudia Anjos Lopes disse...

Muito obrigada, anónimo paz!