segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A REVISÃO CURRICULAR. Umas no cravo outras na ferradura

Foi hoje conhecida a proposta de revisão curricular que de tão anunciada e sempre adiada, estava mesmo condenada a aparecer tarde. Mas, como diz o povo, vale mais tarde que nunca.
Algumas notas sobre o que nos foi dado conhecer.
De forma positiva, é sempre preferível começar pelo mais interessante, creio que a extensão do ensino obrigatório do inglês, nos tempos que correm e independentemente de apreciações subjectivas, parece-me de registar, assim como a manutenção do acréscimo de tempo já atribuído à Língua Portuguesa e Matemática e o acréscimo de tempo trabalho em Ciências Naturais, Físico-Química, História e Geografia ainda que, como adiante refiro, entendo que a organização curricular pudesse ser diferente.
Creio que a disponibilização diária de apoio ao estudo no 1º e 2º ciclos, se não for utilizada na fórmula "mais do mesmo", pode ser uma ferramenta interessante e uma boa ajuda ao trabalho de alguns alunos.
Também me parece positiva a antecipação para o 2º ciclo de uma abordagem curricular às novas tecnologias de comunicação e informação.
Como aspectos francamente negativos entendo a manutenção do 2º ciclo quando a experiência aconselharia a definição de um ciclo de ensino inicial de seis anos assente em áreas científicas e não tão "disciplinarizado".
Por outro lado, considerando a carga horária do 3º ciclo, entendo que continua com demasiadas disciplinas levando em que algumas o pouco tempo de contacto entre alunos e professores não seja facilitador do estabelecimento de conhecimento recíproco e da definição de metodologias eficazes.
Não tenho opinião definida sobre as alterações introduzidas em torno das áreas de Educação Visual e Tecnológica.
Uma nota relativamente aos professores. Os discursos produzidos em vários quadrantes sobre a reforma curricular fazem habitualmente referência a uma tentativa de, sob a capa de uma revisão curricular, o MEC pretender reduzir o número de professores. Não me surpreende esta afirmação e creio que a dúvida é razoável se olharmos às decisões de natureza orçamental que vão sendo conhecidas.
Se as mudanças curriculares ou as imprescindíveis alterações nos modelos de organização e funcionamento das escolas "libertassem" professores, defendo que se recorra ao trabalho de parceria pedagógica, que se permitisse a existência em escolas mais problemáticas de menos alunos por turma ou ainda que se utilizassem os professores em dispositivos de apoio a alunos em dificuldades. Os estudos e as boas práticas mostram que a presença de dois professores na sala de aula são um excelente contributo para o sucesso na aprendizagem e para a minimização de problemas de comportamento bem como se conhece o efeito do apoio precoce às dificuldades dos alunos.
Sendo exactamente estes os dois problemas que afectam os nossos alunos, creio que talvez o investimento resultante da presença de dois docentes ou de mais apoios aos alunos e a outros professores, compense os custos posteriores com o insucesso, as medidas remediativas ou, no fim da linha, a exclusão, com todas as consequências conhecidas.

7 comentários:

Luis disse...

No geral a reforma curricular até não está má, e fiquei surpreendido pela positiva precisamente nos pontos que o texto enumera. Além disso, acrescento, separar educação visual, artística e tecnológica é uma óptima ideia já que para começar nunca fez qualquer sentido sequer estarem juntas: que tem informática a ver com desenho? Passar a educação tecnológica para o segundo ciclo também é também muito bem vindo, vem em linha com o que tem sido feito noutros países com excelentes resultados até.

Porém no melhor pano cai a nódoa e o ministro não resistiu a dar azo à mente estreita e tacanha com que nos tem infelizmente presenteado nos últimos meses: reduzir as TIC a apenas 2 horas no 2º ciclo é ridículo e típico de quem achas que o computador serve para escrever cartas no “Worde” e mandar bocas no facebook. Esta fixação a roçar o fetiche, plenamente demonstrada em vários discursos nos últimos meses, é de tal forma grande que ele nem se importa de cair no ridículo já que em momento algum, sempre que discutiu este tema, o ministro foi capaz de articular uma ideia coerente, por mais bizarra que ela fosse, limitando-se simplesmente a apregoar um regresso ao “glorioso” passado. E no passado… não havia computadores.

O problema é que sem informática devidamente ensinada lá vamos nós condenar mais uma geração a estar completamente impreparada para competir no espaço Europeu onde a imagem conta muito e há cada vez menos tolerância para o amadorismo: aquilo que uns não fazem outros farão de bom grado, aquilo que uma companhia Portuguesa não fizer ou não fizer bem, farão uma dúzia doutras noutros países.

Nesta matéria não estou a exagerar nem isto é um maniqueísmo profissional, infelizmente sei bem do que falo, sei bem aquilo que vejo hoje e sei ainda melhor o que verei amanhã. Atente-se ao estado absolutamente miserável da internet em Portugal, aos poucos e maus serviços oferecidos, muitas vezes repletos de erros técnicos onde até os sites das grandes cadeias não funcionam bem, e onde as pessoas na maioria das vezes não os sabe usar. E ainda acham que estou a empolar a questão? Se por um lado a forma como as TIC estavam a ser ensinadas era mau e merecia ser revisto, por outro esta asneira de as reduzir à expressão mínima vai ter tamanha influência na sociedade que este palerma (porque não obstante a minha educação não encontro mesmo outra palavra para o descrever) vai cometer um crime tal que merecia ser julgado. A informática é de tal forma importante nos dias de hoje, está de tal maneira presente nas nossas vidas que a impreparação para a mesma penso ser passível de quantificar na produção duma empresa e por consequência também na produtividade dum país.

Esta volta ao passado, porque vai ser isso sem tirar nem por, não é uma simples mudança ou incompetência pontual, vai sair cara ao país. Juro que não entendo porque é que pessoas notoriamente incompetentes aceitam ir para ministro, se a vaidade o explica, só mesmo a total falta de miolos poderá justificar aceitarem ser lembrados desta maneira.

Zé Morgado disse...

Olá Luís, no que diz respeito ao universo da informárica concordo consigo. Actualmente, não podemos correr o risco da iliteracia informática a acrescer às outras iliteracias. Não é um adereço, é uma ferramenta de acesso e construção do conhecimento.

Luis disse...

Precisamente, informática não é uma questão de conhecimento, não se pretende que todos sejam programadores, mas sim que saibam usar ferramentas que são essênciais para adquirirem os conhecimentos que pretenderem. Para ilustrar o problema vou por as coisas da seguinte maneira: o meu filho de 9 anos em Inglaterra tem praticamente os mesmos conhecimentos de informática que o meu sobrinho que entrou agora para um curso de engenharia. E não o meu filho não é programador, aliás nem sei se sabe o que isso é. Mas, quando precisa de saber qualquer coisa, e eu não estou disponível, simplesmente vai à internet... e procura. Recentemente teve como trabalho de casa fazerem uma exposição sobre um tema de estudo e ele fê-lo em powerpoint, e não foi o único na turma (confesso aqui que não gosto mt de powerpoint embora reconheça a utilidade). O que sobressai disto nem é ele saber usar o powerpoint mas sim sistematizar as ideias, expo-las, e faze-lo de forma a ser facilmente entendível pelos colegas. Há muito mais em informática do que programar só que infelizmente o nosso ministro não sabe nem quer saber, é daqueles que acham que uma máquina de escrever já chega perfeitamente.

António Procópio disse...

Exmº Senhor Luís disse:.."Além disso, acrescento, separar educação visual, artística e tecnológica é uma óptima ideia já que para começar nunca fez qualquer sentido sequer estarem juntas: que tem informática a ver com desenho?...". Quando se fala em Tecnológica na disciplina de EVT não estamos a falar de informática.A disciplina de Educação Visual e Tecnológica (EVT) resultou da fusão entre duas disciplinas, Educação Visual (EV) e Trabalhos Manuais (TM). A disciplina de EV, tinha uma abrangência mais estética. A disciplina de TM tinha objectivos essencialmente tecnológicos (aqui o significado da palavra tecnológico é: “saber fazer” ou “forma como se faz” determinada coisa). Não comente o que não sabe.

Luis disse...

Caro António, agradeço o seu reparo. Efectivamente, como disse na mensagem atrás, estou em Inglaterra. Quando saí de Portugal, há 10 anos atrás, existia no então ensino secundário uma disciplina de informática, salvo erro no nono ano, tanto que um amigo meu a leccionava. De igual modo, na proposta de revisão corricular onde são mostradas tabelas das disciplinas actuais e das propostas, aparecer claramente "Educação Tecnológica / TIC" associada a educação visual no segundo e terceiros ciclos, englobada neste último em "educação artística". Se isto não corresponde à realidade isso já não tenho culpa, até porque, para além do sentido estrito não reconheço qualquer ambito tecnológico a Trabalhos Manuais, e assim sendo o caso ainda é pior do que eu expus. Deduzo portanto que tudo isto seja literalmente para Inglês ver? Nada do que disse invalida o que aqui expus, antes pelo contrário, só o reforça.

Mas, mesmo neste contexto limitado, que tem ed. visual a ver com trabalhos manuais? Bem, se calhar além de não saber também vou para burro...

António Procópio disse...

Caro Luís: A questão de fundo neste processo é que era necessário poupar dinheiro. A disciplina de EVT terminou porque este governo votou contra o fim do par pedagógico. Teria de resolver o problema de eliminar um dos professores sem dar (muito) nas vistas. A solução encontrada foi dividir a disciplina em duas tal como acontece no 3º Ciclo. Nessa separação aproveitou-se para reduzir a carga horária de ambas as disciplinas tornando a disciplina de Educação Tecnológica Semestral. Mas era necessário outra disciplina semestral para fazer par com esta. Mais uma vez poupar dinheiro. Eu sou a favor do ensino de informática no 2º ciclo. E acrescento que se a disciplina fosse anual seria mais correto (mas aí gastávamos mais dinheiro). Não vou tecer muito mais comentários sobre a palavra tecnológica. Não podemos confundir manualidades (pois é este o sentido que deu aos trabalhos manuais) com o design, com a arquitectura, com a engenharia pois é nestas áreas que a abrangência tecnológica é maior. Há muito que a disciplina de EVT deixou de ser uma disciplina de fazer desenhos. Se for bem leccionada é uma disciplina abrangente que desenvolve a criatividade, o sentido estético, a capacidade de se poder vir a ser um cidadão culto, informado a acima de tudo um ser pensante.

Sérgio O. Sá disse...

Sr. Luis disse, li os seus comentários e o do Sr. Penetra que tentou ajudá-lo quando lhe falou da "fusão" das disciplinas de Trabalhos Manuais (TM) e de Educação Visual (EV). No seu retruque, e a propósito da relação entre T.M. e tecnologia, o Sr. Luis escsreve algo que me merece a seguinte interrogação: Sabe o Sr. Luis o significado dos vocábulos "tecnologia","tecnológica" e "técnica"?
Só isto.