segunda-feira, 20 de maio de 2019

DA REUTILIZAÇÃO DOS MANUAIS ESCOLARES


Neste final de ano lectivo o Tribunal de Contas alerta para a insustentabilidade da medida de gratuitidade dos manuais escolares caso não se eleve substancialmente a taxa de reutilização que terá ficado pelos 4% dos livros distribuídos neste ano lectivo. Nada de novo, estamos habituados a que as contas da educação nunca dêem certas.
Para além de decisões de muitos pais e de algumas escolas no sentido de não reutilizarem manuais, uma questão significativa é a dificuldade de produzir manuais com características que sejam amigáveis da reutilização apesar das orientações, agora mais explícitas para o próximo ano, no sentido de que a potencialidade de reutilização seja real.
Como disse há algum tempo, a operacionalização deste caminho, a reutilização dos manuais escolares, não seria fácil.
A elaboração dos manuais escolares, um importante nicho de mercado, sempre considerou a sua não utilização. De facto, a quantidade e o tipo de trabalho que os alunos realizam no manual impede a sua reutilização. Acresce que as mudanças frequentes quer nos conteúdos curriculares, quer nos manuais aprovados nos diferentes agrupamentos e escolas serão também um obstáculo à sua reutilização.
Neste sentido, a gratuitidade dos manuais escolares e a sua reutilização exigem um outro olhar sobre os manuais, considerando quer os conteúdos e apresentação, quer a utilização. As práticas já desenvolvidas em muitas salas de aula e a experiência de outros sistemas educativos mostra que é possível apesar da evidente resistência dos donos do mercado do livro escolar.
Assim, e com tantas vezes tenho afirmado creio que o caminho a percorrer em matéria de manuais escolares deveria incluir estratégias que tentassem contrariar o que costumo designar por uma excessiva “manualização” do ensino que emerge de práticas pedagógicas pouco diferenciadas muito decorrentes de conteúdos curriculares que apesar do “mantra” da flexibilidade curricular ainda são “passados” de forma prescritiva e normalizadora. Seria desejável atenuar a fórmula predominante, o professor ensina com base no manual o que o aluno aprende através do manual que o pai acha muito importante porque tem tudo o que professor ensina.
Em algumas circunstâncias, o número de alunos por turma é também um factor contributivo para este cenário. A adequação do número de alunos por turma ao abrigo de uma verdadeira autonomia das escolas e dos docentes, permitiria a alunos e professores um trabalho de pesquisa e construção de conhecimentos com base noutras fontes incrementando, por exemplo, a acessibilidade a conteúdos e informação diversificada que as novas tecnologias oferecem.
A construção dos próprios manuais, tendo um outro papel no trabalho de alunos e professores, pode evitar a sua utilização como suporte do trabalho dos alunos e, assim, não impedir a sua reutilização. Aliás, o mercado também é fértil em materiais como “cadernos de actividades”, “fichas”, “Cds”, etc. que são suportes para o trabalho dos alunos
A questão é que os manuais escolares constituem um importantíssimo nicho de mercado potenciado por esta enorme quantidade de materiais que os acompanham. Como também é previsível, numa sociedade de consumo e desperdício a cultura de reutilização é pouco sólida e alimenta a resistência à reutilização é grande e dificulta o surgimento de outro tipo de manuais ou mesmo o seu abandono.
É também sabido que a reutilização de manuais é prática já verificada em muitos países.
Os manuais escolares são disponibilizados pelas escolas e devolvidos pelos alunos no final do ano lectivo ou da sua utilização. As famílias são responsabilizadas pelo seu eventual dano ou extravio e ficando, assim, com "folga" para aquisição de outros materiais, livros por exemplo, um bem com pouca presença em muitos agregados familiares.

Sem comentários: