sábado, 21 de outubro de 2017

DOS MIÚDOS COM O MUNDO ÀS COSTAS

Num dos raros exemplos de unanimidade a Assembleia da República aprovou uma recomendação ao Governo no sentido de desenvolver um conjunto de medidas que promovam o aligeirar do peso das mochilas transportadas pelos alunos portugueses.
A recomendação surge na sequência de uma petição pública e com o apoio de diferentes especialistas face à preocupação com os riscos desse peso excessivo. Diferentes estudos sugerem que sete em cada dez crianças transportam às costas um peso superior ao aconselhado pela OMS, 10% do seu peso corporal.
Como escrevi na altura acho que existem muitas matérias que não deveriam ser objecto de legislação, o bom senso deveria bastar mas assim não é, esperemos que algo surja no sentido de minimizar a situação que para algumas crianças é mesmo pesada. Daí a insistência no que na altura referi.
Como é óbvio esta preocupação, pelas suas implicações e riscos, imediatos e a prazo, para a saúde dos miúdos, deve merecer a atenção de pais e educadores no sentido de a minimizar, embora, por outro lado, o seu transporte configure um exercício físico que disfarça a ausência de espaços e equipamentos adequados em muitas das nossas escolas e combata uma infância sedentarizada, a troco, é certo, de uma coluna castigada.
No entanto, aproveitando o espaço e o tempo de reflexão criados talvez também fosse útil olhar de uma forma mais alargada para o peso excessivo que muitas crianças carregam nas suas costas.
As mochilas escolares serão apenas um dos carregos, por assim dizer, mas existem outros que temo ficarem fora deste conjunto de recomendações.
Estou a pensar no peso da pressão para que sejam excelentes.
Estou a pensar no peso da pressão para que sejam o que não são e da pressão para que não sejam o que são.
Estou a pensar no peso da pressão de viver demasiado só.
Estou a pensar no peso da pressão que leva a que, por vezes, só gritando e agitando-se se façam ouvir.
Estou a pensar no peso da pressão de não conhecer o caminho e sentir-se perdido.
Estou a pensar no peso da exclusão que muitos sofrem.
Estou a pensar no peso da pressão de actividades sem fim e, às vezes, sem sentido. Estou a pensar no peso da pressão do depressa e bem.
Estou a pensar no peso da pressão para sejam diferentes e na pressão para que sejam iguais.
Estou a pensar no peso da pressão causada por famílias demasiado distantes ou por famílias demasiado próximas ou ainda por famílias ausentes.
Na verdade, há miúdos que carregam o mundo às costas. Entende-se as preocupações dos professores, pediatras, psicólogos, ortopedistas, outros especialistas e de muitos de nós com a coluna dos miúdos.

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