terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

INCLUSÃO E ENSINO SUPERIOR

 Há uns dias li no Observador que, no âmbito das alterações à conclusão do ensino secundário e acesso ao ensino superior, o Governo se compromete a aprovar durante 2023 legislação que enquadre o acesso e a frequência de estudantes com deficiência ao ensino superior.

A Secretária de Estado da Inclusão divulgou no Parlamento em Maio de 2022 a intenção de aprovar legislação “que determine um conjunto de obrigações que um estabelecimento de ensino superior tenha de cumprir ao receber alunos com necessidades educativas especiais”.

No que agora foi decidido passam a ter acesso ao contingente prioritário para candidatos com deficiência apenas “os titulares de atestado médico de incapacidade multiuso que avalie incapacidade igual ou superior a 60% ou os titulares de parecer positivo de comissão de peritos”. Será ainda obrigatória a comprovação “das medidas adicionais de suporte à aprendizagem durante o percurso do ensino secundário justificadas pela deficiência em causa”.

Como já aqui tenho escrito, é habitual ouvir-se que, recorrer a quotas ou contingentes especiais para minimizar exclusão ou desigualdade, não sendo o ideal, pode ajudar a minimizar os problemas.

No que respeita aos alunos com necessidades especiais e considerando dados de 2017/2018, frequentaram o ensino superior 1644 alunos com necessidades especiais, 0,5% do total dos matriculados no ensino superior, sendo que apenas 14% das vagas do contingente especial para estes estudantes foram ocupadas. Donde, o caminho só por aqui é demasiado estreito.

Para além da definição de quotas no acesso ao superior e dos seus critérios de aplicação, a promoção da qualificação de cidadãos com necessidades especiais e, portanto, da sua inclusão começa na educação pré-escolar e durante todo o trajecto do ensino básico e secundário. Neste percurso é crítica a necessidade de dispositivos de apoio competentes e suficientes.

A realidade, no âmbito da chamada educação inclusiva, apesar das boas experiências não é a que muitas vezes se vê referida. Há poucos dias abordei aqui esta questão e referi aspectos como o não cumprimento limite de alunos com necessidades educativas especiais, sendo que em turmas de 1º ciclo com diferentes com alunos de diferentes anos de escolaridade as dificuldades agravam-se.

É claramente insuficiente os recursos técnicos e humanos, psicólogos, terapeutas e auxiliares e verifica-se a incapacidade de muitas escolas na operacionalização das medidas de apoio definidas nos relatórios técnico-pedagógicos. As direcções escolares referem a insuficiência de recursos humanos adequados.

Acresce que, como referi a propósito do contingente prioritário para alunos carenciados, a decisão de continuar para o ensino superior é construída durante todo o trajecto do básico e secundário. Trajectos educativos bem apoiados promovem expectativas mais elevadas de alunos e famílias, valorizam o conhecimento e a qualificação e, portanto, são mais potenciadores da intenção de continuar a estudar. Donde, é imprescindível um forte investimento em recursos e dispositivos de apoio que que sustentem mais sucesso para todos os alunos de todas as escolas.

Também sabemos que, sem estranheza, as famílias em situação mais vulnerável expressam mais frequentemente expectativas mais baixas ou nulas sobre o sucesso escolar dos seus filhos e sobre a importância de estudar. Por outro lado, também sabemos que a entrada no mercado de trabalho de pessoas com deficiência é ainda tem obstáculos. Torna-se, assim, necessário um trabalho que envolva as famílias no sentido de construir ou reajustar expectativas sentirem a existência de uma imagem criadora de

Embora já seja feito em muitas escolas, sobretudo no final e durante o pós-básico, seria desejável que os dispositivos de orientação vocacional tivessem os recursos necessários para de forma alargada providenciarem informação clara sobre a natureza da oferta formativa, das suas características e solicitações, a que áreas de desempenho permitem aceder no mundo profissional, etc. Por outro lado, esse apoio também envolve o trabalho com os alunos no sentido de ajudar a um processo de tomada de decisão que seja base para procurar qualificação, de natureza diversa, no ensino superior.

Já no ensino superior e para todos os alunos é importante que existam dispositivos de apoio institucionais e também formas de mentoria desenvolvidas já por alunos a frequentar os estabelecimentos que contribuam para melhores e mais rápidos processos de adaptação a novas rotinas, métodos de trabalho, dificuldades de adaptação, etc. O nível de desistência da frequência é mais alto nas populações mais vulneráveis

Uma nota final para o óbvio, as mudanças mais estruturais requerem investimentos e os recursos são finitos, nenhuma dúvida. No entanto, as políticas públicas exigem opções e, também por isso, são avaliadas.

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