quinta-feira, 2 de maio de 2024

SÍNDROME PÓS-MINISTERIAL

 Não acompanho suficientemente de perto a situação noutros países para ter uma perspectiva comparativa, mas existe uma espécie de síndrome em Portugal que afecta a classe política com experiência de poder. Esta síndrome, a que poderemos chamar "pós-ministério" ou, dito de outra maneira, “sei muito bem o que deveria ser feito, mas quando fui ministro não foi possível”, é patente em muitíssimos ex-governantes oriundos dos partidos que já assumiram responsabilidades de governo em diferentes áreas.

Vem esta introdução a propósito de uma entrevista no Público a David Justino a propósito da publicação “O Ensino em Portugal, Antes e Depois do 25 de Abril – Um Século em Análise; uma colecção lançada pelo jornal e coordenada Por David Justino. Na entrevista identificam -se problemas e prioridades e recomendam-se estratégias e orientações políticas que promovam sucesso e qualidade, o grande desafio que enfrentamos.

O que me parece curioso nestas circunstâncias é a apresentação de uma visão clara sobre os males e constrangimentos da área sectorial em que exerceram funções políticas, no caso a educação, bem como, propostas de desenvolvimento e correcção visando a desejável qualidade e o progresso, depois de terem passado por funções ministeriais nesse mesmo sector.

A pergunta, certamente estúpida e demasiado óbvia, que me ocorre face a este tipo de discursos é “então porque não fez, porque não defendeu assertivamente as ideias agora expressas, muitas a merecer concordância, quando teve poder para tal?” Podemos, com alguma habilidade, tentar encontrar respostas e acabaremos, creio, por colocar duas hipóteses básicas, não puderam ou não souberam, qual delas a mais animadora.

Na primeira, não puderam, implica questionar qual o poder que efectivamente o ministro detém relativamente às políticas do sector que tutela, ou seja, qual o verdadeiro nível de responsabilidade de quem assume o poder e as dificuldades para ultrapassar e gerir as corporações de interesses ameaçadas por eventuais mudanças. Na segunda, não souberam, sugere que a competência não abundará o que não me parece menos inquietante.

Em todo o caso, algum pudor e a humildade de nos explicarem porque não executaram as políticas que posteriormente defendem, seriam esclarecedoras e um bom serviço prestado à causa pública.

A questão é que muitos destes discursos que se apresentam como parte da solução, na verdade, são, foram, parte do problema.

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