quinta-feira, 17 de outubro de 2024

ELE E ELA NÃO FALAM COMO A GENTE

 No Público encontram-se dois trabalhos sobre uma questão com um peso que tem vindo a aumentar significativamente no nosso sistema educativo, o trajecto escolar e o aumento do número de alunos filhos de pais estrangeiros.

De acordo com dados da DGEEC, “Perfil Escolar de Alunos Filhos de Pais com Nacionalidade Estrangeira 22/23", os alunos com pais estrangeiros têm uma taxa de retenção genericamente três vezes superior à dos alunos com pais de origem portuguesa. No ensino básico é de 10,3% e 3,2% respectivamente.

Considerando o 3.º ciclo, a diferença é maior, 16,4% dos alunos com pais estrangeiros que não terminam o ciclo no tempo previsto para 5,2% de alunos com origem portuguesa e no secundário 26,8% para 8,5%.

Há algum tempo o MECI anunciou algumas medidas no âmbito do Programa Aprender Mais Agora para minimizar este problema.

O objectivo será ter 75% dos alunos recém-chegados apoiados por mais 272 mediadores linguísticos e culturais.

A disciplina Português Língua Não Materna (PLNM) irá ser objecto de revisão instituindo um “nível zero” para os alunos que expressam maior dificuldade, promoção de diferenciação em matéria de avaliação e nas decisões de retenção no básico e avaliação no secundário.

É ainda previsto que as escolas tenham maior autonomia das escolas na colocação dos alunos nos anos curriculares considerando a sua origem e trajecto escolar.

Recordo ainda dados do estudo do CNE, “Estado da Educação 2022”, em 2021/2022 9,3% dos alunos matriculados no ensino e 7,9% no secundário básico eram de origem estrangeira. 

Este número tem aumentado, em 2021/2022 tivemos mais 17,5% de estudantes estrangeiros inscritos no ensino básico e 15,5% no ensino secundário, com alunos oriundos de 235 nacionalidades no básico e de 246, no secundário.

Considerando dados do Infoescola, em 2021/2022 e como exemplo, o Agrupamento de Escolas Eduardo Gageiro, com cerca de 2300 alunos de todos os níveis, tinha 30% de estudantes estrangeiros, de 42 nacionalidades diferentes. De forma mais diferenciada o pré-escolar e o 1.º ciclo têm 36% de crianças estrangeiras, e só no 1.º ciclo essa percentagem é de 44%.

Por outro lado e em termos genéricos, verifica-se uma baixa de frequência da Disciplina de Português Língua Não Materna, 2% de todos os alunos estrangeiros inscritos no 1.º ciclo, 12,5% dos que frequentam o 2.º ciclo, 15% no 3.º ciclo e apenas 5,1% dos que estão no ensino secundário.

Apesar dos indicadores não serem propriamente uma surpresa, pois tem vindo a aumentar a vinda para Portugal de cidadãos de outros países importa considerar que, contrariamente ao que as narrativas xenófobas que se vão escutando afirmam, é importante esta vinda de pessoas de outras paragens que se radiquem por cá através de projectos de vida bem-sucedidos e contributivos para o desenvolvimento das nossas comunidades. Minimiza-se o efeito do Inverno demográfico que vivemos levando envelhecimento significativo da população portuguesa rejuvenescendo-se as populações.

Como é evidente este movimento implica a existência de crianças e a necessidade da sua educação escolar, certamente, a mais potente ferramenta contributiva para a sua boa integração na comunidade.

Esta cenário como se demonstra na peça do Público não pode deixar de constituir o um enorme desafio para muitas escolas.

Há algum tempo foi criada a disciplina de Português Língua Não Materna, mas que só é constituída com um número mínimo de 10 alunos e os recursos disponíveis são manifestamente insuficientes como directores e professores tem regularmente referido.

Está, pois, criada, uma dificuldade acrescida para promover de forma eficiente o domínio da língua de aprendizagem, o português, e o impacto negativo que tal terá no seu trajecto escolar. Aliás, são bem conhecidas as enormes dificuldades que muitas comunidades portuguesas de emigrantes portugueses sentiram e sentem no processo de escolarização dos seus filhos em diferentes países da Europa.

Sabemos da enorme dificuldade de conseguir que em cada escola se consiga responder de forma eficaz às necessidades específicas da população que a frequenta, nenhuma dúvida sobre isto.

No entanto, também sabemos, o domínio proficiente da língua de aprendizagem, escrita e falada, é imprescindível a um trajecto escolar com sucesso.

Não existe normativo ou discurso em educação que não sublinhe as ideias de educação inclusiva, equidade, a diversidade, etc. A questão são as políticas públicas e os recursos de diferente natureza que este desafio exige, a retórica, não chega.

Estes alunos, tal como outros, enfrentam sérias dificuldades e um risco grande de insucesso como os dados evidenciam.

E é bom não esquecer que o seu sucesso será um forte contributo para as comunidades onde se integram, assim como poderemos ter que pagar um preço elevado pelo seu insucesso e exclusão.

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