No Observador encontra-se uma
extensa peça sobre as dificuldades sentidas por pais de crianças com
necessidades especiais de alunos de uma escola do 1.º ciclo em Lisboa para
encontrar respostas adequadas às necessidades identificadas.
A escola não tem meios ou
recursos humanos suficientes e os pais vão acompanhando as aulas dentro das
suas possibilidades tendo também contratado uma terapeuta.
Sim, estamos a falar de escola
pública e do direito à educação.
Recordo que em Novembro se
realizaram em Évora, Lisboa, Faro, Coimbra e Porto manifestações convocadas
pelo Movimento por uma Inclusão Efectiva para expressão e chamada de atenção
sobre os problemas sentidos nas escolas para o cumprimento do direito à
educação de crianças com necessidades especiais, pedindo desculpa pela expressão
que, parece, já não se deve usar.
Lamentavelmente são recorrentes
as vozes de pais, professores, técnicos ou directores escolares e algumas
referências na imprensa relativamente a essas dificuldades e, como se dizia há
uns anos, … a luta continua.
Algumas notas retomadas, não vale
a pena inventar.
Segundo dados da DGEEC, no ano
lectivo passado, estavam cerca de 90000 alunos ao abrigo de medidas selectivas
e/ou adicionais de acordo com o DL 54/2018.
Recordo que em 2018 o ME decidiu
que já não podíamos referir alunos com “necessidades educativas especiais”
porque a designação não era conforme a “educação inclusiva”, categorizava
alguns alunos o que não é uma boa prática. Assim, determinou que os alunos que
revelavam algum tipo de dificuldade eram objecto de medidas educativa arrumadas
em três categorias, as medidas “universais”, as medidas “selectivas” e as
medidas “adicionais”. Isto parece que é uma outra forma de categorizar, mas não
é. Na educação inclusiva é assim que se faz.
Também acontece que temos alguma
dificuldade em interpretar os dados que vão sendo divulgados, aumenta o número
de alunos com dificuldades de alguma natureza ou aumenta o número de alunos com
medidas aplicadas. E quais as dificuldades dos alunos que se inscrevem nas
medidas “universais” e assim ficam incluídos.
São habituais, tal como na peça,
as preocupações com a insuficiência preocupante dos recursos humanos,
professores e técnicos, designadamente psicólogos e terapeutas, auxiliares
educativos bem como o crescimento significativo do número de alunos sinalizados
com algum tipo de dificuldade. Aliás, também se conhecem situações em que
professores com funções de apoio assumem outro trabalho minimizando a falta de
professores.
Deste quadro resulta a impossibilidade de
assegurar a muitos alunos aquilo que é “apenas” um direito e não um privilégio,
uma resposta educativa de acordo com as suas necessidades. Sim, eu sei que não
é fácil, mas também sei que existem responsáveis pelas políticas públicas de
diversos sectores envolvidas nestas questões.
A verdade é que torturar a
realidade não a obriga a confessar. Muitos alunos não, não estão incluídos nem
sequer integrados, estão “entregados” com as consequências que professores e
pais bem conhecem. E não estou a considerar apenas os “Selectivos”, os
“Adicionais” ou os “Universais”.
Este cenário de insuficiência de
recursos tem sido referenciado em trabalhos diversos incluindo da
Inspecção-Geral de Educação e Ciência.
Como tenho afirmados e escrito
inúmeras vezes, acompanhei com esperança e expectativa a mais do que
necessária, reafirmo, mudança legislativa desencadeada no âmbito da Educação
Inclusiva que se traduziu no DL 54/2018 ele próprio associado a todo um quadro
de mudança envolvendo, designadamente a definição do Perfil dos Alunos à Saída
da Escolaridade Obrigatória, das Aprendizagens Essenciais ou o Decreto-Lei n.º
55/2018 relativamente ao currículo. Todo este edifício potenciaria a inovação,
a mudança de paradigma, de vários paradigmas aliás, e alguns falavam mesmo da
revolução que estava em marcha e anunciavam os amanhãs que cantam.
Com confiança em algumas virtudes
do novo quadro aguardei expectante pela revelação da anunciada escola inclusiva
de 2ª geração. No entanto, para meu desconforto e cansaço, o que fui conhecendo
e vai sendo divulgado não me ajudou a perceber o que seria.
Continuo a verificar que, tal
como aconteceu com o velho 319/91, (nesta altura eu já trabalhava neste
universo há 15 anos), quer com o 3/2008 e depois com o actual 54/2018 existiam
e existem professores, técnicos e escolas a realizar trabalhos notáveis que
devem ser conhecidos e reconhecidos.
A avaliação dos alunos, a
definição dos apoios nas diferentes tipologias (já usadas como categorização
uma vez que a outra categorização já não existe), o funcionamento das Equipas,
os recursos disponíveis, a organização da intervenção, os papéis ou a articulação
dos intervenientes continuam com inúmeros sobressaltos. Recebo muitos
testemunhos e, como referi, os dados conhecidos também não são particularmente
animadores.
Apesar de agora estar já
desligado em termos profissionais, o interesse e a paixão por este universo não
se reforma, mantêm-se e apesar do cansaço, sempre me animo quando conheço
situações muito positivas que, felizmente, acontecem todos os dias em tantas
escolas.
No entanto, nem tudo vai bem,
muito longe disso. Insisto, não torturem a realidade que ela não vai confessar,
alterem-na, e o que espera de políticas públicas e de promoção de direitos
inalienáveis.
Há muito que fazer, muito para
caminhar. Afinal o Ano Novo já está a ficar velho.
PS – Já agora e mais uma vez,
talvez já vá sendo tempo de não insistir no uso da designação "educação
inclusiva" para referir a educação dos alunos que têm algum tipo de
dificuldade e que se encaixam nas novas "categorias", os "universais",
os "selectivos" e os "adicionais" criadas pelo DL 54, a
educação inclusiva é de todos e, portanto, deveria ser “apenas” educação.