Apesar das alterações, pouco relevantes sublinhe-se, da legislação face ao veto do PR ao diploma relativo à carreira docente, para Setembro não se antecipam alterações significativas no clima das escolas alimentando uma insustentável situação em nome com base em argumentos insustentáveis igualizando o que é diferente e um estranho entendimento de justiça.
Entretanto, foram divulgados alguns dados de um inquérito realizado pela FNE no início de Julho envolvendo
3482 docentes, 80% dos quais com entre 50-59 anos.
Não conhecendo a ficha metodológica
do trabalho e admitindo alguma fragilidade, ainda assim os indicadores
recolhidos mostram informação relevante ainda que não inesperada.
Recuperemos alguns indicadores.
O volume de trabalho administrativo
(burocracia) 30%, a avaliação de desempenho (25,24%), o número de alunos por
turma (11,8%), indisciplina (10,8%).
Considerando o que serão as 3
principais razões de preocupação com actividade profissional temos, excesso de
trabalho administrativo (burocracia) (60,3%), saúde mental e bem-estar (52,9%),
comportamento dos alunos (34,4%) e salário (16,5%).
Sobre a intenção de continuar a
actividade lectiva nos próximos cinco anos, sim (45,5%), aposentação (12,7%), antecipar
a aposentação (14,5%), continuar porque não tem alternativa (10%).
Inquiridos sobre mudanças
desejadas, 32,4% referem menos burocracia, 24% desejam respeito pelo horário de
trabalho e 18,4% menos alunos.
Parece-me relevante a resposta
relativamente ao modelo de gestão de escolas e agrupamentos, 66,35 dos
inquiridos prefere o modelo colegial.
Também me parece de recuperar que
num estudo promovido pelo ME, “Saúde Psicológica e Bem-estar” realizado pelo
Observatório de Saúde Psiocológica e Bem-estar Social com uma amostra de 1457
professores durante 2022 e 2023 encontrou níveis elevados de tristeza,
nervosismo, perturbações do sono, alterações do humor, depressão, ansiedade e
stresse. Na altura divulguei alguns dos dados deste trabalho.
A realidade que aqui se evidencia
não surpreenderá quem minimamente conhece a realidade das escolas. Nem mesmo tudólogos
como Miguel Sousa Tavares a desconhecerão, apenas a negam ou omitem por
desonestidade intelectual. Não são ignorantes reais, embora demasiadas vezes saibam
pouco do tudo de que falam, caso do mundo da escola e dos professores.
Esta realidade não emergiu agora,
é a consequência de muitos anos de políticas públicas inadequadas, designadamente
de educação, e são muitos os responsáveis incluindo os mais recentes titulares.
Em qualquer circunstância sempre
enjeitarão responsabilidades ou afirmarão estar de “consciência tranquila” o
que evidentemente mostra que para este pessoal consciência não terá o significado habitual.
Também não é raro, ultimamente
tem sido muito utilizado ou um comportamento mais observável em crianças
pequenas, a realidade é o que eu digo que é a realidade. Dito de outra forma,
recorrem a um modelo de pensamento mágico transformando a realidade na
projecção dos seus desejos.
Como é óbvio o resultado é que a
realidade continua o que conhecemos e assusta pensar que o próximo ano lectivo
se inicie neste clima, com estes protagonistas neste mal-estar.
Sei que a complexidade das
situações não permite que tudo se altere num instante, mas urge um caminho de
mudança em diferentes aspectos.
Sem esgotar, dimensões como uma real
autonomia, com mais recursos e com modelos organizativos mais adequados e
processos menos burocratizados, as escolas poderiam fazer certamente mais e
melhor e de forma mais tranquila.
Escolas com mais auxiliares,
auxiliares informados e formados podem ter um papel importante em diferentes
domínios do funcionamento e clima da escola.
Directores de turma com mais
tempo para os alunos e menos burocracia poderiam desenvolver trabalho útil em
múltiplos aspectos do comportamento e da aprendizagem.
Psicólogos e outros técnicos em
número mais adequado, o que se verifica poderiam acompanhar, promover e
desenvolver múltiplas acções de apoio a alunos, professores, técnicos e pais.
Mediadores que promovessem
iniciativas no âmbito da relação entre escola, pais e comunidade seriam, a
experiência mostra-o, um investimento com retorno.
Finalmente, no que respeita aos
professores e como já tenho escrito, sendo claro e conhecido de há muito o
problema da falta de docentes e da baixa atractividade pela carreira, só
mudanças integradas e não quase que exclusivamente na formação podem sustentar
a atractividade, a estabilidade e, naturalmente, a qualidade da profissão
docente.
É urgente adequar aspectos como o
modelo de carreira, modelo de avaliação e progressão, a valorização do estatuto
salarial dos docentes, a promoção da sua valorização profissional e social ou a
desburocratização do trabalho dos professores, fonte importante do seu
mal-estar são algumas dimensões a exigir alterações sérias.
Este conjunto de matérias será, por assim dizer, boa parte do caderno de encargos que os responsáveis pelas políticas públicas de educação não podem esquecer.
A história e as gerações que estão e entrarão na escola, o país, não lhes perdoarão.
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