Por coincidência, no dia em que passam 15 anos do
desaparecimento de uma criança, o Rui Pedro, será conhecida a decisão do
Tribunal da Relação do Porto sobre o recurso interposto pela família e pelo
Ministério Público da sentença de absolvição do indivíduo que foi considerado
suspeito de ligação ao desaparecimento. Ao que se soube agora, a decisão foi uma condenação a três e meio de prisão efectiva.
Esta tragédia, o desaparecimento de crianças e
adolescentes é hoje tema de primeira página do JN. Em média são reportados
cerca de 2000 casos de desaparecimento de crianças e adolescentes por ano, um a
cada cinco horas. Felizmente a larga maioria é resolvida e os menores são
encontrados.
Sobre esta questão que afecta muitas crianças e
famílias, algumas notas.
De há uns anos para cá tem sido feito um esforço
nacional e internacional no sentido de aumentar a eficácia na abordagem a
situações desta natureza bem como, a maior atenção aos factores de risco de que
a título de exemplo se cita a net e as redes sociais que não podendo, obviamente,
ser diabolizadas, apresentam alguns riscos que não devem ser negligenciados.
Embora se saiba, como já referi, que muitos dos
casos reportados de desaparecimento de crianças e adolescentes acabem por ter,
por assim dizer, um final feliz, o desaparecimento é temporário, reactivo a
incidentes ou a resultados escolares alguns transformam-se em tragédias sem fim
como o caso do Rui Pedro desaparecido há 15 anos.
Uma situação desta natureza é uma tragédia
absolutamente devastadora numa família. Nós pais, não estamos "programados"
para sobreviver aos nossos filhos, é quase "contra-natura". Se a este
cenário acresce a ausência física de um corpo que, por um lado, testemunhe a
tragédia da morte mas, simultaneamente, permita o desenvolvimento de um
processo de luto, a elaboração da perda como referem os especialistas, que,
tanto quanto possível, sustente alguma reparação e equilíbrio psicológico e
afectivo na vida familiar a situação é de uma violência inimaginável.
No entanto e neste contexto, creio que vale a
pena não esquecer a existência de muitas crianças que estão desaparecidas mas à
vista, situações que por desatenção e menos carga dramática passam mais
despercebidas.
Na verdade, existem muitíssimas crianças e jovens
que vivem à beira de pais e professores para os quais passam completamente
despercebidas, são as que eu chamo de crianças transparentes, olhamos para
elas, através delas, como se não existissem. Não estando desaparecidas, estão
abandonadas. Algumas delas não possuem ferramentas interiores para lidar com
tal abandono e desaparecem, mantendo-se à nossa vista, no primeiro buraco que a
vida lhes proporcionar, um ecrã, outros companheiros tão abandonados quanto
eles, o consumo de algo que lhes faça companhia ou adrenalina de quem nada tem
para perder.
Em boa parte das situações, por estes ninguém
procura.
E estes, por vezes, também se perdem de vez.
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