Estou pasmado. D. Januário
Torgal, bispo das forças armadas produziu uma das mais violentas intervenções
contra o Governo. Afirmou, cito através do Público, "Eu não acredito
nestes tipos, em alguns destes tipos, porque são equívocos, porque lutam pelos
seus interesses, porque têm o seu gangue, porque têm o seu clube, porque
pressionam a comunicação social, o que significa que os anteriores, que foram
tão atacados, eram uns anjos ao pé destes diabinhos negros que acabam de
aparecer".
Na verdade, a mensagem de D.
Januário Torgal surpreende pela linguagem pesadíssima que utiliza e, sobretudo,
pelo próprio mensageiro, um alto representante da hierarquia da Igreja. No
entanto, deve recordar-se que, apesar de utilizarem uma forma e conteúdos menos
incisivos, outros elementos da Igreja, sobretudo ligados a instituições de
solidariedade social que estão na primeira linha de percepção dos problemas
graves que milhões de portugueses conhecem, têm expressado sérias preocupações
com os efeitos que a opção insistente e inflexível pela austeridade têm vindo a provocar. Este quadro é ilustrado com referências à 1ª página da imprensa de hoje, no CM regista-se que as pessoas com rendimentos superiores a 250 000 € estão a pagar menos impostos enquanto no JN lemos que aumentam as famílias com o fornecimento de água cortado por incapacidade de o pagar. No DN titula-se que mais 5 000 pais deixaram de pagar a pensão de alimentos a qe estão obrigados e, por outro lado, menos de um terço das empresas em Portual pagam IRC. Este cenário ajuda a perceber a assimetria crescente que o relatório do INE sobre as condições de vida há dias mostrava. Pode acrescentar-se ainda o que é referido por Paulo Morais, vice-presidente da Transparência e Integridade - Associação Cívica, sobre o nebuloso e promíscuo processo de privatização da EDP e da REN.
Apesar da referência pesada à
questão da corrução por parte de D. JanuárioTorgal, parece-me mais relevante a afirmação, "O problema é civilizacional, porque é
ético”.
Com muita frequência abordo no Atenta Inquietude
a preocupação com o que tenho referido por pegada ética, isso mesmo, pegada
ética. Os comportamentos e valores que genericamente mobilizamos têm,
obviamente, uma consequência na qualidade ética da nossa vida que não é
despicienda. Os maus-tratos e negligência que dedicamos aos princípios éticos
mais substantivos provocam um empobrecimento e degradação do ambiente e da
qualidade de vida das quais cada vez parece mais difícil recuperar. É com
excessiva frequência que tomamos conhecimento de episódios verdadeiramente
escandalosos e que decorrem na maior das impunidades, sem um sobressalto. O
caso da licenciatura do Ministro Miguel Relvas, ainda na agenda, é apenas mais
um destes exemplos. Curiosamente, o Primeiro Ministro considera-o um "não
assunto". Notável.
As lideranças, hipotecando a sua condição de
promotores de mudanças positivas são fortemente responsáveis pelo peso e
impacto que esta pegada ética está a assumir.
Vai sendo tempo de incluir a pegada ética no
universo da luta pelo ambiente, pela qualidade de vida e pelo futuro.
Sem comentários:
Enviar um comentário