AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

segunda-feira, 30 de junho de 2014

A NEGRURA CRÁTICA SOBRE A INVESTIGAÇÃO E CIÊNCIA

"Carlos Fiolhais acusa Governo de liquidar a ciência em Portugal"

Na sequência de mais um controverso processo, a avaliação dos centros e laboratórios de investigação, o Professor Carlos Fiolhais vem afirmar que a Fundação para a Ciência e a Tecnologia e o Ministério da Educação e Ciência “estão a liquidar” a ciência em Portugal, criticando fortemente o modelo de avaliação e classificação utilizados e os cortes de financiamento resultantes dessas classificações. O Governo “está a matar a árvore do desenvolvimento”, referiu Carlos Fiolhais.
Na verdade, está estudada e reconhecida de há muito a associação fortíssima entre o investimento em educação e investigação e o desenvolvimento das comunidades, seja por via directa, qualificação e produção de conhecimento, seja por via indirecta, condições económicas, qualidade de vida e condições de saúde, por exemplo.
Com o desinvestimento fortíssimo no ensino superior e investigação que tem vindo a verificar-se e vai continuar, corremos o sério risco de ver ameaçados e destruídos os excelentes resultados que os centros, laboratórios e unidades de investigação e as instituições de ensino superior têm vindo a alcançar e que atestam o esforço e a competência da comunidade científica portuguesa e o trabalho realizado no âmbito do ensino superior e investigação, traduzidos no reconhecimento internacional das nossas instituições.
Como em quase tudo é uma questão de escolhas e prioridades de quem lidera. O problema como referia também o Professor Sobrinho Simões num entrevista de há algum tempo sobre estas questões é que "os nossos políticos têm um problema ... alguns não se apercebem do valor do ensino superior e da investigação".
A negrura crática que cai sobre a investigação vai ter consequências brutais em termos de desenvolvimento científico e económico para além, evidentemente, do impacto nas carreiras pessoais assim ameaçadas de milhares de pessoas que investigam, criam conhecimento, promovem desenvolvimento e que, provavelmente, desistem ou emigram.
E assim se destrói uma política científica que vinha a produzir  resultados positivos.

UM RAPAZ CHAMADO INSEGURO

Era uma vez um rapaz, tinha oito anos e chamava-se Inseguro. Era esperto mas tinha sempre algum receio de fazer o que lhe pediam, tinha medo de não fazer bem as coisas. O Inseguro era quase sempre assim, em casa, na escola ou a brincar com os amigos. Tinha tanto receio de não fazer bem feito que, quando a professora lhe pedia para inventar uma história, o Inseguro preferia contar uma história já inventada dizendo que era mais bonita do que a que ele tinha começado a inventar.
Nunca se oferecia para dar uma resposta quando a professora fazia alguma pergunta para o grupo. Quando era interpelado em alguma circunstância, o Inseguro respondia muito baixinho, tinha medo de não responder bem.
A pouco e pouco, foi ficando mais calado, discreto, enfiado no canto mais cantinho que a sala tinha. A professora, quase sem dar por isso, foi deixando de falar com ele, até se esquecia, dizia ela, e os colegas achavam que o Inseguro não era grande companhia para trabalhar ou brincar pelo que também deixaram de lhe dar atenção.
Um dia, o Inseguro não apareceu em casa à hora do costume, os pais, preocupados, foram até à escola que estava quase a fechar, já sem ninguém.
Procuraram e no canto mais cantinho da sala de aula, estava um vulto que mal se via. O Inseguro, sem ninguém se dar conta, estava a ficar transparente. Já era muito difícil reparar nele, quase não se percebia que existia.
Se conhecerem algum miúdo que também esteja a ficar transparente, assim como o Inseguro, ofereçam uma caixa de tintas para ele se pintar às cores e ver-se ao espelho. Ele vai rir-se e não se esquecerá de que existe. Nem nós. 

E A SAÚDE? CÁ VAMOS, NADA BEM

"Há “iniquidades” no sistema de saúde e dois mundos: o real e o oficial"

"Observatório acusa Governo de “síndroma de negação” do efeito da crise na saúde"

"“Há uma preocupante conjugação de factores desfavoráveis à saúde mental”"

O Relatório Anual do Observatório Português dos Sistemas de Saúde hoje divulgado chama a atenção para o que considera ser o impacto negativo das medidas resultantes políticas de austeridade aplicadas no sector da saúde. O Observatório sublinha o “síndroma de negação” de que sofrerá o Governo negando a realidade, as consequências na saúde das pessoas com obstáculos ao acesso aos serviços de saúde a que se acrescentam as dificuldades criadas aos próprios serviços no sentido garantirem o cumprimento da sua missão.
O Relatório mostra uma especial preocupação com as questões relativas à saúde mental. Os tempos que atravessamos e conforme vários especialistas e estudos demonstram potenciam impactos negativos na saúde mental, situação que, de acordo com o Relatório, "é  agravada por uma resposta organizacional insuficiente e sustentada por um sistema de informação aparentemente medíocre”. Existe suporte na investigação para se poder correlacionar a taxa de prevalência de doenças mentais com os níveis de desigualdades sociais e de saúde, aliás, regista-se um aumento da procura de consultas por pessoas em situações fragilizadas no quadro de desemprego e dificuldades económicas. Portugal está a apresentar em várias situações clínicas níveis de incidência extremamente elevados sendo que a resposta é claramente insuficiente.
Também aqui nada de novo, a experiência tem mostrado que a doença mental é, nas mais das vezes, um parente pobre no universo das políticas de saúde. Quando a pobreza das pessoas aumenta e a pobreza dos meios e recursos também aumenta, o quadro é ainda mais grave.
Como afirma Michael Marmot, reconhecidíssimo especialista em saúde pública, que há algum tempo esteve em Portugal, todas as políticas podem, ou devem, ser avaliadas pelos seus impactos na área da saúde.
Talvez a ideia do "custe o que custar" fosse de repensar, pela nossa saúde.

NOTÍCIAS DE UM PAÍS MELHOR

"Mais de 38 mil idosos perderam o complemento solidário no espaço de um ano"

"Mais de 45 mil pessoas perderam o direito ao RSI num ano"

Como repetidamente, os feitores-mor Passos Coelho e Paulo Portas e respectivos ajudantes têm afirmado, estamos no bom caminho, estamos, de facto, a ficar mais pobres, as estatísticas europeias e os dados do INE e da Segurança Social vão mostrando isso mesmo, pelo que, graças a eles e à ajuda dos nossos desinteressados amigos, estamos mais perto da salvação, já estamos a viver abaixo das necessidades e cada vez mais perto da solução final, todos pobres.
Bem, quase todos, é claro. Alguns, muito poucos, para contrariar o Governo e as estatísticas, estão mesmo mais ricos, são uns conservadores desmancha-prazeres.
A verdade é que, apesar dos indicadores de natureza macro mostrarem alguns sinais mais positivos, as pessoas, muitas pessoas, demasiadas pessoas, vivem, não acima das suas possibilidades como alguns abutres entendem, mas abaixo das suas necessidades, como quem conhece a vida da gente muito bem sabe.
No entanto, apesar desta negra situação, ainda entendem que a maioria das famílias está com rendimentos excessivos pelo que insistentemente ameaçam com a sua redução.
A solução final estará próxima.
As pessoas (sobre)vivem de quê?

domingo, 29 de junho de 2014

O PAÍS PODE SER DESRESPEITADO, OS SÍMBOLOS NÃO

"A bandeira e as liberdades têm de caber no mesmo mastro"

"Tratar ou destratar a bandeira nacional"

"Outras polémicas com a bandeira e o hino como pano de fundo"

A ver se percebo.
Um jovem artista decide recorrer a uma forca e a uma bandeira para simbolizar o que, do seu ponto de vista está a acontecer ao País.
Tal iniciativa é considerada um desrespeito a um dos símbolos pelo que vai a julgamento e aguarda sentença.
Entretanto discute-se o respeito devido aos símbolos nacionais, bandeira e hino, por exemplo e os limites do tratamento que lhes é devido e imposto por lei. Está tudo muito certo, o respeito é muito bonito, desde miúdo que assim oiço.
No entanto, tenho umas pequeninas dúvidas.
O país é destruído por políticas de urbanização verdadeiramente criminosas que sacrificaram boa parte do nosso litoral.
Foram destruídas quase na totalidade a pesca, a agricultura ou a indústria naval.
As nossas empresas vão fechando, as pessoas ficam desempregadas, partem e a desesperança instala-se.
Uma parte significativa do património cultural e arquitectónico de Portugal está em estado de abandono e degradação.
Os recursos naturais são desordenadamente utilizados.
No fundo, desrespeita-se um país, as pessoas, a cultura, os recursos e o património e quase nunca se responsabiliza alguém.

O crime está no desrespeito à bandeira ou ao hino. 

AS TERRAS TRISTES DAS ESCOLAS FECHADAS

“As crianças dão ânimo. Sem elas a freguesia fica mais sozinha”

Decadência

Porque o encerramento de escolas continua na agenda e me parece justificar-se, aqui se retomam algumas notas.
Muitas das questões que se colocam em educação, como noutras áreas, independentemente da reflexão actual, solicitam algum enquadramento histórico que nos ajudem a melhor entender o quadro temos no momento. Durante décadas de Estado Novo, tivemos um país ruralizado e subdesenvolvido. Em termos educativos e com a escolaridade obrigatória a ideia foi “levar uma escola onde houvesse uma criança”. Tal entendimento minimizava a mobilidade e a abertura sempre evitadas. No entanto, como é sabido, os movimentos migratórios e emigratórios explodiram e o interior entrou em processo de desertificação o que, em conjunto com a decisão de política educativa referida acima, criou um universo de milhares de escolas, sobretudo no 1º ciclo, com pouquíssimos alunos. Como se torna evidente e nem discutindo os custos de funcionamento e manutenção de um sistema que admite escolas com 2, 3 ou 5 alunos, deve colocar-se a questão se tal sistema favorece a função e papel social e formativo da escola. Creio que não e a experiência e os estudos revelam isso mesmo. Parece pois ajustada a decisão de em muitas comunidades proceder a uma reorganização da rede.
É também verdade que muitas vezes se afirma que a “morte da escola é a morte da aldeia”. No entanto, creio que será, pelo menos de considerar, que os modelos de desenvolvimento económico e social promovem a litoralização e desertificação do interior. Apostas políticas erradas não contrariam este processo, antes pelo contrário, promovem-no fechando os equipamentos sociais, incluindo as escolas, uma das formas evidentes de fixação das pessoas. Cria-se assim um ciclo sem fim, as pessoas partem, fecham-se equipamentos, as pessoas não voltam ou continuam a partir.
Seria fundamental a coragem e a visão para outros caminhos.
Por outro lado, afirmo-o com frequência, a concentração excessiva de alunos não ocorre sem riscos. Para além de aspectos como distância a percorrer, tipo de percurso e apoio logístico, importa não esquecer que escolas demasiado grandes são mais permeáveis a insucesso escolar, absentismo, problemas de indisciplina e outros problemas de natureza comportamental.
Neste cenário, a decisão de encerrar escolas não deve ser vista exclusivamente do ponto de vista administrativo e económico, não pode assentar em critérios cegos e generalizados esquecendo particularidades contextuais e, sobretudo, não servir como tudo parece servir em educação, para o jogo político.

OS FILHOS ESTÃO MUITO CAROS

"Mais de 75% das pessoas em idade fértil não pensam ter filhos nos próximos três anos"

"Portugal é o país com mais mães com filhos menores de seis anos a trabalhar a tempo inteiro"

Sem surpresa, pois vai no mesmo sentido de dados já conhecidos, um estudo, “A prestação de cuidados pelos avós na Europa”, em que se analisam as políticas familiares e a sua influência no papel dos avós na prestação de cuidados às crianças envolvendo a Áustria, Bélgica, Dinamarca, França, Alemanha, Grécia, Itália, Holanda, Espanha, Suécia, Suíça, Portugal, Espanha Itália e Roménia, conclui que as mães portuguesas com filhos até aos seis anos são as quem mais trabalham a tempo inteiro, sendo também Portugal um dos países estudados em que os avós mais cuidam dos netos.
Uma pequena nota sobre a questão dos avós recordando que a crise económica e a falência de muitas famílias devido ao brutal desemprego, sobretudo jovem, têm levado a que em muitos agregados familiares se juntem várias gerações contribuindo assim para este dado relativo aos avós portugueses mais cuidadores.
Acresce que Portugal também integra o grupo com menores apoios sociais para que os pais fiquem mais tempo em casa com filhos pequenos e ainda que “há pouca oferta de estruturas formais de acolhimento de crianças e poucas oportunidades das mães trabalharem a tempo parcial". Por outro lado, Portugal tem um dos mais elevados custos de equipamentos e serviços para crianças o que, naturalmente, é mais um obstáculo para projectos de vida que envolvam filhos.
Este cenário ajuda também a perceber o inverno demográfico que atravessamos com uma diminuição brutal dos nascimentos. Dados de 2012 mostram que Portugal, dentro da UE tem o nível mais baixo de fecundidade e dados agora divulgados mostram que mais de 75% das pessoas em idade fértil não pensam ter filhos nos próximos três anos. O Índice de fecundidade em Portugal  é de 1,28 filhos por mulher sendo que a renovação das gerações solicita, 2,1 filhos por mulher. A austeridade sumbergiu os nascimentos.
Quando abordo estas questões recordo sempre alguns trabalhos evidenciam que as mulheres portuguesas são de entre as europeias as que mais valorizam a carreira profissional e a família.
Não pode ainda esquecer-se a discriminação salarial de que muitas mulheres, sobretudo em áreas de menor qualificação, são ainda alvo e a forma como a legislação laboral e a sua “flexibilização” as deixam mais desprotegidas. São conhecidas muitas histórias sobre casos de entrevistas de selecção em que se inquirirem as mulheres sobre a intenção de ter filhos, sobre casos de implicações laborais negativas por gravidez e maternidade, sobre situações em que as mulheres são pressionadas para não usarem a licença de maternidade até ao limite, etc. Foi recentemente noticiado que algumas empresas exigem às mulheres um compromisso de que não irão engravidar nos próximos 5 anos.
Toda esta situação torna urgente a definição de políticas de apoio à família com impactos a curto e médio prazo como, por exemplo, a acessibilidade aos equipamentos e serviços para a infância com o alargamento da resposta pública de creche e educação pré-escolar, cuja oferta está abaixo da meta estabelecida bem como combater a discriminação salarial e de condições de trabalho através de qualificação e fiscalização adequadas.
Seria ainda importante, à semelhança do que se passa noutros países, a introdução de ajustamentos na organização social do trabalho, no tempo parcial e nos horários, por exemplo, que tornassem mais amigáveis e compatíveis para famílias com filhos os desempenhos profissionais. Os custos destas medidas seriam certamente compensados em várias dimensões. 
É uma questão de futuro.

sábado, 28 de junho de 2014

DO DESPUDOR


Milhões de pobres e desempregados depois, os abutres descobrem que a receita poderia ser outra. Afinal, os infalíveis modelos econométricos paridos pelos geniais empregados dos mercados estavam errados, a realidade é mais forte. 
Como sempre.
O drama é que a realidade é a vida da maioria das pessoas por cima da qual pairam os abutres.

A QUALIFICAÇÃO É UM BEM DE PRIMEIRA NECESSIDADE

"Uma campanha de crowdfunding para poder voltar a estudar"

Todos os estudos e indicadores demonstram que mesmo em conjunturas económicas adversas, estudar compensa, a qualificação é um bem de primeira necessidade.

O nível preocupante de desistência na formação é uma ameaça ao futuro, individual e colectivo.

O QUE É UM BOM EXAME?

"Professores divididos sobre o que deve ser um exame de Matemática"

Como tenho referido, os exames constituem-se, do meu ponto de vista, como uma arma privilegiada da gestão política do universo da educação.
Neste contexto, através da "modulação", por assim dizer, da sua dificuldade, poder-se-á influenciar os resultados no sentido esperado e mais favorável a interesses de circunstância. Este entendimento minimiza o impacto das análises comparativas e está também patente na discussão recorrente e nem sempre consensual sobre o grau de dificuldade e adequação dos exames como se está a verificar com o de Matemática.
Por outro lado e não sendo um especialista na matéria, creio que a construção de um exame no que respeita aos conteúdos, forma e natureza, extensão ou grau de dificuldade, decorre do objectivo ou objectivos desse exame e relativiza-se à perspectiva a partir da qual se olha para esse exame. Daqui decorre, provavelmente  diferente entendimendo da Associação dos Professores de Matemática e da Sociedade Portuguesa de Matemática. De facto, um exame destinado a identificar os alunos excelentes numa determinada disciplina ou um exame que avalia as competências esperadas nessa disciplina no universo total dos alunos com o objectivo de os ordenar, não serão, evidentemente, iguais.
Neste cenário complexo julgo que a discussão do que será um “bom exame” dificilmente será conclusiva, de ângulos diferentes vêm-se coisas diferentes.

ATRÁS DE MIM VIRÁ, QUEM BOM DE MIM FARÁ. Nem sempre, nem sempre ...

Numa entrevista ao Expresso a propósito do lançamento próximo da obra “40 anos de Políticas de Educação em Portugal” por si coordenada, a ex-ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, tece um conjunto de considerações sobre o caminho percorrido nas últimas décadas e os tempos que se vivem no universo da educação, produzindo algumas críticas tal como já o tinha feito numa entrevista ao Publico em Dezembro de 2013.
Relativamente à entrevista, esperemos pelo livro, umas notas breves. Como já tenho referido, em Portugal verifica-se uma estranha e curiosa situação, muitos ocupantes de funções políticas relevantes após terminarem essas funções apresentam sempre uma visão muito clara do que deve ser a política na área de que foram responsáveis mas que, por incompetência, falta de poder, visão diferente ou qualquer outra justificação, não realizaram. É o que eu chamo a Síndrome Pós-ministério, ou seja, é assim que se deve fazer mas na altura, não me lembrei, não soube, não fui capaz ou ...
É verdade que as políticas educativas actuais são, em muitos aspectos, absolutamente deploráveis, com consequências devastadoras, gostava de estar enganado, que muito rapidamente irão ficando evidentes, aliás algumas já à vista, mas, embora exista a ideia de que "atrás de mim virá quem bom de mim fará" importa não esquecer que Maria de Lurdes Rodrigues ocupou a 5 de Outubro e subscreveu medidas de política educativa que mereceram, merecem, profundas críticas e não podem, não devem, ser esquecidas ou branqueadas pela justeza das críticas que agora produz.
Alguns exemplos. Uma primeira referência para a existência da figura insustentável de "professores titulares" e professores "outros" comum que teve um efeito arrasador no clima das escolas e no universo profissional dos docentes.
Uma segunda nota relativa à aceitação do estabelecimento de quotas na avaliação de professores para além da tentativa de instalar um bizarro modelo de avaliação que determinava a estranha situação de um professor que apesar de cumprir todos os critérios para que fosse considerado "excelente", não pudesse sê-lo porque as "senhas" para excelente já estavam esgotadas, já não cabia.
Finalmente, uma chamada de atenção para a definição do DL 3/2008, relativo à educação especial que reintroduzindo no universo da educação um insustentável critério de "elegibilidade" para apoio educativo, produziu e produz milhares de situações de alunos com dificuldades que ficaram sem os apoios necessários. Em educação, do meu ponto de vista, não é aceitável que a decisão sobre o que se realiza com um aluno que experimenta algum tipo de dificuldade assente no entendimento sobre se "é elegível, ou não é elegível", deve assentar na definição de que tipo de apoio o aluno ou os seus professores precisam. Deve, no entanto, sublinhar-se que neste âmbito, a resposta aos alunos com dificuldades a actual equipa do MEC tem sido de uma enorme incompetência e insensibilidade que ameaçam os direitos dos miúdos.
A história é algo de importante e o tempo não faz esquecer tudo.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

O MINISTRO E O ASSESSOR. Outro diálogo improvável

"Universidades terão os 30 milhões de euros cortados em excesso “já na semana que vem”"

"Nuno Crato garante verbas para transporte dos alunos cujas escolas vão fechar"

Dá-me licença Sr. Ministro?
Sim, entre e sente-se meu caro Dr. Aparelhista. Qual é o problema?
Sr. Ministro, na verdade são dois problemas. O primeiro, que me parece mais grave, se me permite a avaliação, é ainda a questão das Universidades. Os Reitores não se calam com aquela história dos 30 milhões que foram cortados e ameaçam criar um problema sério, afirmam até que não poderão pagar salários. A imprensa está a dar-lhes uma cobertura injustificada
Isso não é um problema, Dr. Aparelhista, com o tempo e experiência vai aprender a lidar com essas matérias. Qual é o outro problema?
Sr. Ministro, muitas autarquias estão a queixar-se na imprensa de que não têm dinheiro para transportar os alunos das localidades onde residem e cujas escolas fecharam para os Centros Escolares. Sabe como é a imprensa e alguns autarcas, muitos não são compreensivos com a excelência das suas decisões.
Meu caro Dr. Aparelhista, ao fim deste tempo como meu assessor, ainda me surpreende.
Como assim, Sr. Ministro, não estou a entender.
Veja se consegue acompanhar-me. Conforme o programa do Governo e as nossas decisões, impomos um ajustamento no orçamento para o ensino superior. Já sabemos que os Reitores vão protestar, como sabe, alguns não nos são muito próximos. Esticamos mais a corda, eles protestam um pouco mais e, finalmente, anunciamos que afinal o corte não é tão significativo e deixamos mais uns milhões nas mãos deles. Ficam sem possibilidade continuar a protestar, ficam com o dinheiro que reclamam mas, entretanto, já reduzimos substancialmente o orçamento. Compreendeu?
Perfeitamente Sr. Ministro, absolutamente genial. E com as autarquias e o transporte dos alunos?
Afinal não compreendeu Dr. Aparelhista. Adoptamos justamente o mesmo procedimento. Decidimos o encerramento das escolas que entendemos por bem, como verificou pois acompanhou o processo. Já sabíamos que algumas autarquias iriam protestar e encontrar motivos para discordar da bondade das nossas decisões. Como sabe, muitos autarcas não nos são afectos.
Deixamos que eles protestem um pouco porque isso até se torna favorável à decisão que vamos tomar a seguir.
E qual é Sr. Ministro?
Dr. Aparelhista, confesso que por vezes me arrependo de ter aceitado a recomendação para o colocar no meu Gabinete. Você vai mandar um comunicado para a imprensa anunciando que o Ministério fará chegar às autarquias os montantes necessários para o transporte dos alunos. Esta despesa teria sempre que ser realizada mas o mais importante está feito, as escolas estão encerradas.
O Sr. Ministro deixa-me embaraçado, vai desculpar-me, que genialidade!
É por isso que aqui estou.

A SÉRIO?! Meio milhão para mostrar que não é gastador!

"Madeira gasta mais de meio milhão em ajuste de contas com o Estado"

Estudo encomendado por Jardim com o objectivo de demonstrar que a região “não é despesista” teve co-financiamento comunitário.
Como se sabe, o Dr. Alberto João é danado para brincadeira, sobretudo para a brincadeira com dinheiros públicos. Esta também está bem caçada. Encomenda um estudo destinado a provar que as contas regionais por si dirigidas desde 1974 são um paradigma de rigor e sobriedade.
Para o efeito gasta mais de meio milhão de euros. Digam lá se não tem mesmo graça.

As gracinhas do Dr. Alberto João são sempre um mimo.

800 ANOS DE PORTUGUÊS. Porquê maltratá-lo?

"A língua portuguesa faz 800 anos"

Assinala-se hoje a data instituída para comemoração do Português como língua. A data foi fixada assente no mais antigo documento aceite como escrito em português, o testamento de D. Afonso II, de 27 de junho de 1214. Cumpre, portanto, 800 anos de Português. Esta idade deveria merecer respeito e prevenir maus tratos.
Talvez a efeméride pudesse constituir um pretexto para repensar o ataque à Língua Portuguesa constituído pelo sinistro Acordo Ortográfico que nos estará a ser imposto por interesses mesquinhos e razões pouco sustentáveis.
Como várias vezes tenho referido, do que tenho lido e ouvido, nada me tem convencido da sua bondade ou necessidade, antes pelo contrário, as intenções são muito pouco transparentes para ser simpático.
 Entendo que as línguas são estruturas vivas, em mutação e isso é importante. Neste cenário, é clara a necessidade de ajustamentos, por exemplo, a introdução de palavras novas ou mudanças na grafia de outras o que não me parece sustentação suficiente para o que o Acordo Ortográfico estabelece como norma. Já estou cansado do argumento da “pharmácia” quando se pode verificar que em todos os países, e são muitos, em que o termo tem a mesma raiz, a grafia é com “ph” e nada de muito grave acontece. A introdução ou mudança na grafia tem acontecido em todas as latitudes e não tem sido necessário um Acordo com os conteúdos bizarros, alguns, que este contém.
Por outro lado, a grande razão, a afirmação da língua portuguesa no mundo, também não me convence pois não me parece que o inglês e o castelhano que têm algumas diferenças ortográficas nos diferentes países em que são língua oficial, experimentem particulares dificuldades na sua afirmação, seja lá isso o que for. De facto, não tenho conhecimento de perturbações ou de dramas com origem nas diferenças entre o inglês escrito e falado na Inglaterra e nos Estados Unidos, mas isto dever-se-á, certamente, a ignorância minha e à pequenez irrelevante daquelas comunidades anglófonas. O mesmo se passa entre a comunidade dos países com o castelhano como língua oficial.
Por outro lado, a opinião dos especialistas não é consensual, longe disso, temos regularmente exemplos disso mesmo, e eu sou dos que entendem que em todas as matérias é importante conhecer a opinião de quem sabe. Aliás, é interessante analisar a natureza da argumentação dos especialistas favoráveis ao Acordo. Algumas vezes assenta, sobretudo, no porque sim, porque é novo. É pobre.
Neste quadro e como sou teimoso vou continuar a escrever em desacordo com o Acordo até que o teclado me corrija. Nessa altura desinstalo o corrector que venha com o Acordo e vou correr o risco de regressar à primária, ou seja, ver os meus textos com riscos vermelhos por baixo de algumas palavras, os erros.
Não é grave, errar é humano.

No entanto, como toda gente, não gosto de errar, pelo que preferia continuar a escrever assim, desacordadamente.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

DE REGRESSO

"Portugal vence o Gana no adeus ao Mundial"

Não vale a pena uma crónica muito rebuscada e extensa.
Fizemos tudo bem. O melhor e mais flexível treinador comprovado pelas escolhas sempre adequadas para a formação da equipa, os melhores jogadores disponíveis, incluindo o melhor jogador do mundo, a melhor estrutura de jogo e escolha táctica, a melhor organização e planeamento da campanha, um inexcedível empenho, atitude, como se chama em futebolês, de todos os jogadores (até com alguns excessos louváveis, de Pepe, por exemplo), a melhor estutura de apoio e condições já montada, adeptos confiantes ainda que com menos bandeirinhas nas janelas e nos carros, etc., etc.. Nada poderia comprometer a anunciada candidatura a um lugar cimeiro no Mundial.
Apenas falhou um pequeno e imponderável pormenor, Alemanha, Estados Unidos e Gana não colaboraram, de forma absolutamente condenável não se disponibilizaram a uma cooperação com os nossos interesses e evidentes merecimentos.
O resultado é a antecipação da viagem de regresso ainda que tal situação tenha afectado algumas outras selecções, Itália, Espanha ou Inglaterra, também vítimas injustiçadas da falta de solidariedade de países que já não respeitam tradições, nem camisolas.

A HISTÓRIA DO PORQUÊ

Era uma vez um rapaz chamado Porquê. Não sei se o nome lhe foi posto por castigo, por acaso, ou porque lhe ficava bem.
Desde pequeno que a tudo o que lhe diziam, pediam, mandavam, etc., começava sempre por questionar a razão, queria saber.
Muitos adultos que o foram conhecendo, primeiro achavam-no curioso, “vivo” e interessado, depois, achavam-no chato e perturbador. Finalmente, ficavam exasperados pela sua arrogância e má educação, diziam.
Para alguns dos professores, o Porquê tornava-se insuportável. A pouco e pouco tornou-se o centro da inquietação da escola, de todos os professores, e o motivo de todas as conversas. A situação complicou-se porque vários outros alunos, mesmo sem se chamarem Porquê, começaram a comportar-se como ele, sempre a questionar tudo. Devido à proporção dos problemas, os professores decidiram que o Porquê não poderia continuar naquela escola.
Quando lhe comunicaram a decisão, estranhamente e contra todas as expectativas, não ouviram o porquê do Porquê. Foi uma das poucas coisas que disseram ao Porquê que não lhe criou sombra de dúvida, já tinha percebido muito bem e há muito tempo que não cabia naquele mundo.
Os professores ficaram mais descansados e foram assistir a uma interessante acção de formação sobre “Despertar a curiosidade nos alunos”.

NECESSIDADES DE FORMAÇÃO NA ÁREA DAS NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS

"OCDE Um quarto dos professores quer mais formação em educação especial"

Voltando ao Relatório TALIS (Teaching and Learning International Survey) de 2013, produzido pela OCDE, agora conhecido, retomo um aspecto que me parece interessante. Sem surpresa, a área em que os professores expressam maior necessidade de formação remete para o trabalho com alunos com necessidades educativas especiais, a média é de 22. 3% de professores que a identificam como a mais importante, sendo que entre os docentes português é de 26.%, veja-se a pg 347 do Relatório.
Também aqui nada de novo, é reconhecida a necessidade de formação adequada e de qualidade nesta área, como o Conselho Nacional de Educação e o Grupo de Trabalho do MEC para revisão da legislação na educação especial sublinharam em Relatórios recentes.
Sobre estas questões, coloca-se-me uma dúvida face ao que tem sido e parece ser a política educativa em curso.
No sentido de promover a capacidade de professores e escolas acomodarem adequadamente as diferenças entre os alunos e responderem às suas necessidades, numa perspectiva de educação inclusiva, as necessidades de formação dos docentes neste âmbito são óbvias.
Acontece que, do meu ponto de vista, vários aspectos da política educativa em curso e anunciada podem tornar dispensável esta necessidade.
Se atentarmos no facto de que através de sucessivos exames promovermos uma selecção rigorosa dos alunos sendo que os menos bem sucedidos serão encaminhados para o ensino vocacional e os alunos com necessidades educativas especiais poderão retomar um caminho de aproximação às instituições acontecerá que as necessidades de formação para lidar com estes alunos que colocam mais dificuldades se atenuarão significativamente, eles não estarão nas salas de aula, junto dos seus colegas, como seria legítimo e de direito acontecer, tanto quanto possível.

No entanto, para não ser demasiado pessimista e como diz o Velho Marrafa lá no Alentejo, deixe lá ver. 

ENCERRAMENTO DE ESCOLAS. Um processo, claro, planeado, consensual, racional, etc.

"Autarcas desconhecem futuro dos jardins-de-infância acoplados às escolas que vão encerrar"

Mais um exemplo da forma clara, objectiva, planeada, dialogada, consensual, racional, etc. como está a decorrer a processo, necessário diga-se, de redefinição da rede escolar.
Ao que parece, as autarquias não têm informação sobre o futuro dos Jardins de Infância que funcionam nos espaços das escolas do 1º ciclo que vão ser encerradas. O MEC diz que o processo está em estudo e os pais não sabem com que podem contar.
Estamos a falar de crianças até aos seis anos cuja “deslocalização” levanta problemas de natureza diferente face aos alunos do 1º ciclo que também não é isenta de riscos e desvantagens.
As questões logísticas das deslocações, as questões de proximidade familiar são variáveis a considerar.
Um dos vários factores contributivos para a baixa da natalidade, sabe-se, é a acessibilidade, proximidade e custos envolvidos, a serviços para a infância. Portugal é um dos países europeus em que as famílias mais sentem dificuldades nesta matéria.
O encerramento dos Jardins de Infância, a par das escolas do 1º ciclo, não é seguramente, em muitas situações, uma política amigável da qualidade da educação, das crianças, das famílias e do desenvolvimento das comunidades.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

MEGA ESCOLAS = MEGA PROBLEMAS

Voltando ao Relatório TALIS (Teaching and Learning International Survey) de 2013, produzido pela OCDE, agora conhecido, retomo um aspecto que me parece de enorme relevância, o número de alunos por escola.
Portugal apresenta um número médio de alunos por escola, 1152, que é mais do dobro da média dos países da OCDE, 546.4. Notável.
De há muito que me refiro aos riscos da política de construção de mega-agrupamentos e mega-escolas que se subordinam a lógicas de contabilidade e gestão política do sistema diminuindo o número de direcções escolares.
É conhecido e reconhecido que um dos factores mais contributivos para o insucesso, absentismo e problemas de disciplina escolar é o efectivo de escola. Não é certamente por acaso, ou por desperdício de recursos, que os melhores sistemas educativos, lá vem a Finlândia, só para citar outra vez um exemplo recorrentemente apresentado como referência de qualidade, mas também outros países, veja-se o quadro da pg. 285 do Relatório, que optam por escolas com dimensões médias da ordem dos 500 alunos.
Sabe-se, insisto, de há muito, que o efectivo de escola está mais associado aos problemas que o efectivo de turma, ou seja, simplificando, é pior ter escolas muito grandes que turmas muito grandes, dentro, obviamente dos limites razoáveis. 
É certo que o MEC faz o pleno, aumenta o número de alunos por escola e o número de alunos por turma, como é hábito o Ministro Nuno Crato cita ou ignora estudos, experiências e especialistas, nacionais ou internacionais, conforme a agenda que lhe é favorável.
As escolas muito grandes, com a presença de alunos com idades muito díspares, são autênticos barris de pólvora e contextos educativos que dificilmente promoverão sucesso e qualidade apesar do esforço de professores, alunos, pais e funcionários. Recorrentes episódios e relatos de professores sustentam esta afirmação.

OS PROFESSORES, ESSA MALANDRAGEM A QUEM ENTREGAMOS OS NOSSOS FILHOS

"Nove em cada dez professores do 3.º ciclo sente que profissão é desvalorizada pela sociedade"

De acordo com o Relatório TALIS (Teaching and Learning International Survey) de 2013, produzido pela OCDE, a grande maioria dos professores do 3.º ciclo em Portugal considera que a profissão é desvalorizada pela sociedade. Apenas 10.5% entende que a sua profissão é valorizada.
No entanto, 94.1%. considera-se satisfeito com a profissão, 71.6% voltaria a escolher ser professor e 70.5 % julgam que as vantagens são superiores às desvantagens. Neste aspecto nada de novo, as esmagadora maioria dos professores gosta, mesmo, de ser professor.
O Relatório, que merece leitura atenta tem um conjunto de dados susceptíveis de reflexão mas neste momento apenas quero deixar umas notas breves sobre a profissão professor em Portugal.
Nos últimos anos tem sido muito evidente um discurso social e político, com acolhimento numa imprensa que embora se reclame de "referência" é "preguiçosa", que através de uma informação avulsa e por vezes cirurgicamente trabalhada ou divulgada procura desvalorizar e questionar a imagem social e profissional  dos professores.
Estes discursos de ataque e desvalorização que incluem boa parte dos discursos e também das decisões políticas do MEC algum do discurso produzido pelos próprios representantes dos professores, o discurso que muitos opinadores profissionais, mais ou menos ignorantes, produzem sobre os professores e a escola, e uma imprensa mal preparada na abordagem a muitas matérias e com agendas que nem sempre são claras, tem efeitos muito significativos, fragilizando seriamente a imagem dos docentes aos olhos da comunidade educativa, designadamente de alunos e pais.
Esta desvalorização é um sério contributo para muitos dos problemas, designadamente ao nível da autoridade percebida nos professores, que afectam o nosso sistema educativo.
Devo, no entanto, reconhecer que "bater" nos professores, essa "malandragem" a quem entregamos os nossos filhos, resulta sempre, vende bem. 
Mas faz mal.

terça-feira, 24 de junho de 2014

PAIS EM REDE

A lida profissional levou-me desta vez para o Meu Alentejo. Poisei em Aljustrel para participar numa iniciativa da Associação Pais em Rede, um movimento cívico que congrega fundamentalmente, mas não só, pais de pessoas, maiores ou menores, com necessidades especiais.
Umas notas breves.
Em primeiro lugar, a afirmação recorrente e significativa de que a educação de qualidade deve ser para TODOS e TODOS devem, tanto quanto possível, aprender, crescer e participar juntos nas comunidades educativas.
Não é moda, não é privilégio, é uma questão de direitos que não são de geometria variável.
Não é uma utopia, é algo de uma simplicidade e realismo absolutos e simples de enunciar, os miúdos devem estar juntos e participar nas actividades da comunidade da forma que conseguem, acomodando as diferenças entre si, entre todos.
É também e de facto uma questão ideológica como todas as dimensões da vivência humana, pois envolve valores, não é uma questão "meramente"  técnica, científica ou pedagógica.
Uma outra ideia prende-se com o envolvimento dos pais nestas questões e muito para além da acção, muitas vezes difícil, com os seus próprios filhos. Neste sentido, a construção de redes que funcionam como suporte, apoio, partilha e voz é um contributo verdadeiramente importante.
Na verdade, precisamos urgentemente de construir ou reconstruir comunidades, não só de pais, que funcionem em rede.
Também não é uma utopia, é "só" entendermos que assim deve ser.

O INCONSEGUIMENTO DO CONSENSO

"Só houve acordo para o encerramento de 67,5 por cento das 311 escolas"

Nesta altura e após tantas vezes o ter feito, já não vou escrever sobre as potenciais riscos e desvantagens das escolas e centros escolares com grande número de alunos, apesar de concordar que em alguns casos o encerramento pode ser justificado, mas não com critérios exclusivamente administrativos e sem ponderação de variáveis de contexto.
Apenas uma nota para sublinhar a manha política de se afirmar que o processo de encerramento de escolas em curso há alguns anos é estabelecido em consenso com as autarquias e imune a critérios de natureza política, local ou nacional, bem como sustentar que não decorre de critérios economicistas.
Na verdade, é óbvia a contaminação deste processo de encerramento de escolas pelos interesses políticos e da contabilidade que informa boa parte da PEC - Política Educativa em Curso.

CARGA HORÁRIA E PRODUTIVIDADE

"Portugal é o quinto país da UE onde se trabalha mais horas por semana"

"Justiça vai investigar médicos que trabalharam em vários locais à mesma hora"

Portugal é o quinto país da União Europeia com maior carga horária média de trabalho semanal, de acordo com o Eurofund, uma agência europeia de investigação em políticas de trabalho.
Recordo que em 2013 o Governo aumentou a carga horária semanal dos funcionários da administração para as 40 horas semanais. Na altura, vários especialistas salientaram que a medida não teria impacto significativo na produtividade e competitividade, sendo que também é pouco amigável na promoção de emprego ou, se preferirem, no combate ao desemprego como também alguns técnicos já alertaram.
Na verdade, parece claro que a produtividade não decorre fundamentalmente do tempo de trabalho. Existem factores menos referidos que, do meu ponto de vista, desempenham um papel fundamental como a qualificação profissional, a organização do trabalho, a qualidade dos modelos de organização e funcionamento, no fundo, a qualidade das lideranças nos contextos profissionais, entre outros. O nível de desperdício no esforço, nos meios e nos processos em alguns contextos laborais é extraordinariamente elevado. Na administração central, autárquica e no universo das empresas públicas, por diferentes ordens de razões, este tipo de circunstâncias é razoavelmente frequente, sendo que em muitas situações as lideranças estão entregues por razões de aparelhismo partidário e troca de favores e não por competência ou currículo o que, naturalmente se traduz na qualidade do desempenho na gestão.
Neste cenário, o aumento do horário de trabalho não parece ser, só por si, a solução milagrosa de incremento da produtividade e de combate ao desemprego, antes pelo contrário.
Parece-me bem mais potente um esforço concertado e consistente de reorganização e estruturação de serviços e de modernização e formação de chefias, funcionários e procedimentos do que o recurso simplista e “fácil” ao aumento da carga horária.
Ter aumentado o horário de trabalho não parece a forma mais eficaz de combater as famosas "gorduras" do estado, antes pelo contrário, boa parte das políticas em curso promovem, isso sim, o emagrecimento dos cidadãos, ou, pelos menos, dos seus rendimentos.  

No entanto e a propósito de horário de trabalho e produtividade, não deixo de ficar impressionado com uma rapaziada, médicos, que, aparentemente, tem a enorme capacidade de realizar actos médicos em locais diferentes em simultâneo. É notável e um exemplo de entrega, criatividade e espírito de missão.

segunda-feira, 23 de junho de 2014

A SURPRESA DOS EXAMES MAIS FÁCEIS. Agora o de Biologia

"Exame de Biologia e Geologia foi mais fácil do que se esperava"

"Tal como Português, exame de História do 12.º ano surpreende pela facilidade"

"Afinal, o exame de Português do 9.º ano foi “facílimo”"

"Exame de Filosofia não assustou"

"Média de Português do secundário "vai subir significativamente""

"A única surpresa no exame de Português do 12.º ano foi a facilidade"

"Exame de Física e Química surpreendeu pela positiva"

Como já afirmei logo no início da época de exames, umas médias um bocadinho mais altas vinham mesmo a calhar. Permitiriam aquele discurso em pose de estado com ar de missão cumprida vindo da 5 de Outubro afirmando que os alunos, os professores, as escolas e as famílias "corresponderam" com o seu trabalho ratificando a bondade das medidas de política educativa em curso. Está certo.
A coisa parece mesmo, mesmo, no bom caminho, vamos ver como se segue a época de exames.

E O VENCIMENTO? RESPEITARÁ A DIGNIDADE?

"Passos desafia empresas a criar ofertas de estágio para jovens"

Para além do brutal desemprego jovem, a precariedade nas relações laborais quase duplicou na última década. Portugal é o segundo país da Europa, a seguir à Polónia, com maior nível de contratos a prazo. Por outro lado, as políticas de emprego em curso incluem maior flexibilização das relações laborais.
Neste cenário, os desequilíbrios fortíssimos entre oferta e procura em diferentes sectores, a natureza da legislação laboral favorável à precariedade e insensibilidade social e ética de quem decide, promovem a proletarização do mercado de trabalho mesmo em áreas especializadas ou mesmo o recurso a uma forma de exploração selvagem com uma maquilhagem de "estágio" sem qualquer remuneração a não ser a esperança de vir a merecer um emprego pelo qual se luta abdicando até da dignidade.
Acontece ainda que alguns dos vencimentos que se conhecem, atingindo também camadas altamente qualificadas, não são um vencimento, são um subsídio de sobrevivência. É justamente a luta pela sobrevivência que deixa muita gente, sobretudo jovens sem subsídio de desemprego e à entrada no mundo do trabalho sem margem negocial, altamente fragilizadas e vulneráveis, que entre o nada e a migalha "escolhem amigavelmente" a "migalha", ou mesmo uma remota hipótese de um emprego no fim de período de um indigno trabalho gratuito. Como é evidente esta dramática situação vai de mansinho alargando e numa espécie de tsunami vai esmagando novos grupos sociais e famílias.
É um desastre. Grave e dramático é que as pessoas são "obrigadas" a aceitar. Os mercados sabem disso, as pessoas são activos descartáveis.

A GENEROSIDADE DO IAVE

"Instituto de Avaliação aceita resposta alternativa no exame de Português"

"Como é evidente e tantas vezes afirmamos, errar é humano. Nesta perspectiva, o erro da responsabilidade do Instituto de Avaliação Educativa na correcção do exame de Português do secundário poderia ser encarado com alguma serenidade. 
Acontece que a arrogância e postura do IAVE, na pessoa do seu Presidente, designadamente nos discursos dirigidos ao profissionalismo dos professores, retiram qualquer tolerância face a erros desta natureza (...).
Como o povo costuma dizer com grande sabedoria, "no melhor IAVE cai a nódoa"".

Atenta Inqietude, 19/6

EDUCAÇÃO ESPECIAL EM MUDANÇA. EM QUE SENTIDO?

"FNE critica grupo para a Educação Especial e teme que se pretenda “reduzir ainda mais os apoios”"

Algumas das questões levantadas pela FNE sobre os resultados e recomendações elaboradas pelo Grupo de Trabalho criado envolvendo o MEC e o Ministério da Solidariedade e da Segurança Social sobre a designada Educação Especial, vão ao encontro do que aqui e no Público já escrevi e afirmei. Dado que o processo de revisão de legislação e orientações políticas neste universo está em aberto será sempre oportuno chamar a atenção para alguns aspectos.
Uma primeira importante nota para a perspectiva defendida pelo Grupo de que a avaliação compete “sempre” ao Serviço Nacional de Saúde. Se o que está em causa é a avaliação de necessidades educativas que competências terão os serviços de saúde para tal avaliação. Existem, evidentemente, situações que requerem abordagens e avaliação multidisciplinares mas estamos no universo de competências da educação, não da saúde.
O Coordenador do Grupo de Trabalho referiu na apresentação pública do Relatório que em 2007 se realizou um estudo de prevalência de Necessidades Educativas Especiais e encontrou-se 1,8%. Como? Um estudo de prevalência? Não, apenas o tratamento descritivo de dados fornecidos pelas escolas e Direcções Regionais sem controlo sobre as avaliações, os processos e os instrumentos. Qualquer pessoa minimamente conhecedora deste universo sabe que os valores de prevalência aceites internacionalmente e que servem de base, por exemplo, à gestão de recursos humanos necessários à resposta educativa estão muito longe destes valores. Claro que o Grupo assume o discurso  oficial que vai fazendo escola entre nós, "a realidade está enganada, nós é que estamos certos".
Aliás, o Grupo conclui o que toda gente que conhece as escolas sabe que se passa. As crianças e jovens têm dificuldades e como não existem apoios disponíveis a não ser que passem o crivo da "elegibilidade", em muitas situações os alunos são "administrativamente" "avaliados" como apresentando NEE permanentes (que não deveria servir de critério), a única forma de lhes garantir algum apoio. Esta situação, não tem a ver com a prevalência e muito menos com uma taxa de 1,8%, tem a ver com ausência de respostas. Esta situação não pode ser esquecida.
O Secretário de Estado João Granjo informou ainda que não se tem verificado desinvestimento nesta área. Talvez fosse de sugerir ao Grupo e ao Secretário de Estado que lessem os últimos Relatórios da Inspecção-geral de Educação e Ciência, que lesse o parecer recente do Conselho Nacional de Educação, que oiça professores e pais, que atente na catástrofe que têm sido os dois últimos anos lectivos, com falta de técnicos, professores e funcionários, sendo ainda que muitos são colocados já tarde nas escolas e agrupamentos.
O Grupo insiste na definição de necessidades permanentes, como critério para educação especial, algo pouco sustentável, persistindo, assim, na manutenção de uma norma, a elegibilidade, para situações que obviamente não cabem numa norma "educativa" e prometeu ainda criar equipas para apoio a alunos com dificuldades de aprendizagem. Com que professores, com que recursos técnicos quando já se anunciou a intenção de baixar o orçamento para o Ensino Básico no Documento de Estratégia Orçamental. 
Na verdade, o que é conhecido é preocupante embora não seja surpreendente. Como há dias afirmava, a propósito da sessão referente aos 20 anos da assinatura da Declaração de Salamanca que estabeleceu os princípios da educação inclusiva, julgo que estes tempos são pouco amigáveis para as crianças e jovens com necessidades educativas especiais (permanentes ou temporárias, seja lá isso o que for), para as suas famílias e para todos os que entendem que a sua educação de qualidade, tanto quanto possível junto dos seus colegas, é um direito e não um privilégio.

NOTÍCIAS DO PAÍS FELIZ

"Jovem responde em tribunal por “ultrajar” a bandeira nacional em instalação artística"

O julgamento de um jovem que utilizou a bandeira portuguesa para simbolizar numa instalação artística os destratos que estão a ser dados a Portugal é o que costumo chamar uma notícia do país feliz. 
Na verdade este país tem sido maltratado e destruído, veja-se os crimes ambientais e o estado de boa parte do património.
Os portugueses estão empobrecidos e passar por enormes dificuldades.
Em negócios que nada têm de transparente queimam-se milhões de euros que são disponibilizados por nós através de uma carga brutal de impostos.
Não acontece nada a quem por estes crimes gigantescos é responsável e julga-se um indivíduo que pendura a bandeira portuguesas numa forca para simbolizar de forma artística o estado em que vivemos.
Talvez um pedaço de bom senso não fosse má ideia.

FAZER CONTAS

"Portugal empata no último suspiro e precisa de uma calculadora"

Creio que o resultado do jogo com os Estados Unidos e o muito provável afastamento de Portugal ,já não surpreende mesmo os que achavam que seríamos candidatos ao pódio do Mundial do Brasil se contássemos, evidentemente, com aquela "pontinha de sorte" em que sempre depositamos esperanças.
Lamentavelmente, ter um jogador com um talento excepcional mas fisicamente limitado, três ou quatro jogadores de bom nível e um conjunto de jogadores de valor médio a que se juntam alguns manifestos erros de "casting" que a teimosia de Paulo Bento mantém, não chega, evidentemente, para montar uma equipa que faça sombra a outras equipas bem mais fortes.
Embora estejamos habituados a fazer contas, não é de esperar que os resultados necessários se concretizem.

Também aqui não iremos estranhar. De há muito que as nossas contas raramente dão certo.

domingo, 22 de junho de 2014

AS COISAS DO MUNDO

"São coisas do mundo, só se podem ver ao longe", diziam os Heróis do Mar num velho tema, Fado, que estou a ouvir numa onda de revivalismo. Agora, tempo em que as coisas do mundo, todas as coisas, estão perto, demasiado perto, a ideia faz ainda mais sentido.
As coisas demasiado perto invadem-nos, ocupam-nos, esmagam-nos, empurrando-nos umas vezes para cima, empurrando-nos outras vezes para baixo, mas sempre roubando a lucidez do olhar e do pensar.
Deixamos, então, de entender as coisas do mundo.


FECHAMENTO

Fecham-se hospitais e maternidades pois existem demasiadas salas de parto sem qualidade e há que ser bem acolhido quando se chega ao mundo.
Fecham-se escolas pois parece que temos alunos a menos, professores a mais e há que racionalizar uma vez que, como bem sabemos, tudo o que nos rodeia é racionalmente organizado.
Fecham-se os miúdos numa “escola a tempo inteiro”, irão intoxicar-se até ficarem “agarrados”.
Fecham-se os adolescentes dentro de um ecrã pois assim não andam com “más companhias”.
Fecham-se cursos pois parecem não ter saídas profissionais e só se “deve estudar o que faz falta”.
Fecham-se empresas pois falta a produtividade e qualificação que, como se sabe, abundam nos explorados dos “mercados emergentes”.
Fecham-se urgências e serviços de saúde pois, se andarmos um bocadinho mais, ficaremos um bocadinho melhores.
Fecham-se aldeias pois há que promover desenvolvimento sustentado e com economia de custos.
Fecham-se tribunais em nome de uma justiça que de tão injusta envergonha.
Fecham-se os espaços habitacionais urbanos abertos pois os condomínios fechados promovem qualidade de vida.
Fecham-se as pequenas queijarias e outras actividades do mesmo tipo pois temos que proteger a saúde do consumidor e, por isso, só comemos uma comida que é tão boa que nem o bicho lhe pega, como dizemos no Alentejo.
Fecha-se o pequeno comércio pois o que nós precisamos é de comprar tudo no mesmo local e encostado ao carro, e não de ouvir “Bom dia, tá bom Sr. Zé e a família? Então o nosso Benfica lá ganhou!”
Fecham-se os Correios, a ligação física com o mundo e o Banco para gente velha e isolada.
Fecham-se os velhos nos lares pois sempre ficam ajuntadamente sós.
Fecham-se os olhos ao sofrimento dos outros. O outro ganhou uma estranha transparência, não o vemos e também… “já me chega a minha vida”.
Fecha-se a boca em vez de dizer pois… “adianta alguma coisa?
Fecha-se a cabeça ao pensamento pois “Deus por escárnio deu-me a inteligência” algo que só serve para nos incomodar.
Fecha a porta para um futuro por cá a muitos milhares de jovens que se sentem obrigados a partir para outras paragens numa viagem, provavelmente, sem retorno.
Finalmente, alguém nos fecha numa memória. Esperamos.

PAIS, POSSO SAIR À NOITE?

"O que fazer quando os filhos pedem para sair à noite?"


Uma colaboração minha num trabalho do DN sobre uma das inquietaçoes dos pais de adolescentes e jovens, as saídas à noite.

sábado, 21 de junho de 2014

O FECHAMENTO DAS ESCOLAS, MAIS 311

"Ministério da Educação fecha 311 escolas do 1.º ciclo no próximo ano lectivo"

É preciso insistir. Considerando os impactos que o encerramento dos equipamentos sociais têm na desertificação do país e nas assimetrias de desenvolvimento, a decisão de encerrar escolas não deve ser vista exclusivamente do ponto de vista administrativo e económico, não pode assentar em critérios cegos e generalizados, esquecendo particularidades contextuais e, sobretudo, não servir como tudo parece servir em educação, para o jogo político, local ou nacional.
Por outro lado, em termos de qualidade dos processos educativo, este movimento de reorganização da rede, de construção dos centros escolares e da constituição de mega agrupamentos, em algumas circunstâncias com números completamente comprometedores da qualidade não ocorre sem riscos sérios.
De há muito que se sabe que um dos factores mais contributivos para o insucesso, absentismo e problemas de disciplina escolar é o efectivo de escola. Não é certamente por acaso, ou por desperdício de recursos, que os melhores sistemas educativos, lá vem a Finlândia outra vez, e agora os Estados Unidos ou o Reino Unido na luta pela requalificação da sua educação, optam por estabelecimentos educativos que não ultrapassam a dimensão média de 500 alunos. Sabe-se, insisto, de há muito, que o efectivo de escola está mais associado aos problemas que o efectivo de turma, ou seja, simplificando, é pior ter escolas muito grandes que turmas muito grandes, dentro, obviamente dos limites razoáveis. É certo que o MEC faz o pleno, aumenta o número de alunos por escola e o número de alunos por turma. Como é hábito o Ministro Nuno Crato cita ou ignora estudos, experiências e especialistas, nacionais ou internacionais, conforme a agenda que lhe é favorável.
As escolas muito grandes, com a presença de alunos com idades muito díspares, são autênticos barris de pólvora e contextos educativos que dificilmente promoverão sucesso e qualidade apesar do esforço de professores, alunos, pais e funcionários. Recorrentes episódios e relatos de professores sustentam esta afirmação.
Por outro lado, a experiência já conhecida mostra casos de distâncias grandes entre a residência dos miúdos e os centros escolares, levando que devido à difícil  gestão dos transportes escolares, os miúdos passem tempos sem fim nos centros escolares, experiência que não é fácil, sobretudo para os miúdos mais pequenos.
Em síntese, aprece-me razoável que algumas escolas do 1º ciclo sejam encerradas mas com critérios não exclusivamente burocratizados e administrativos, como a análise simples do número de alunos.

DE TANTO CHUMBAR, UM DIA APRENDES

O estudo do Banco de Portugal sobre o impacto negativo da retenção escolar, sobretudo nos primeiros anos vem, de novo, contrariar a errada convicção de que a repetição só por si conduz ao sucesso e alimenta o que a OCDE já classificou de "cultura da retenção".
Na verdade, muitos estudos, nacionais e internacionais, mostram que os alunos que começam a chumbar, tendem a continuar a chumbar, ou seja, a simples repetição do ano, não é para muitos alunos, suficiente para os devolver ao sucesso. Os franceses utilizam a fórmula “qui redouble, redoublera” quando referem esta questão.
Nesta conformidade e do meu ponto de vista, a questão central não é o chumba, não chumba e quais os critérios ou o número de exames, mas sim que tipo de apoio, que medidas e recursos devem estar disponíveis para alunos, professores e famílias, desde o início da percepção de dificuldades, de forma a evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo. É necessário diversificar percursos de formação com diferentes cargas académicas e finalizando sempre com formação profissional. Importa ainda que as políticas educativas sejam promotoras de condições de sucesso para alunos e professores. O aumento do número de alunos por turma no Ensino Básico e no Secundário é, apenas, um exemplo do que não deve ser feito se, efectivamente, se quiser promover qualidade e sucesso.
Como é evidente este tipo de discurso não tem rigorosamente a ver com "facilitismo" e, muito menos, com melhoria "administrativa" das estatísticas da educação, uma tentação a que nem sempre se resiste.
O estudo do Banco de Portugal evidencia uma outra realidade também conhecida, a associação entre o nível de escolaridade dos pais e os resultados escolares dos filhos, ou seja, quanto mais alta a escolaridade dos pais, menor o risco de insucesso escolar dos filhos. Também aqui nada de novo mas mais um dado que importa sempre considerar.
Recordo que uma análise da OCDE, cruzando os resultados escolares dos alunos de diferentes países no Estudo comparativo PISA relativos a 2012 com as profissões dos pais, mostra que em Portugal, mais do que noutros países, os filhos de pais mais qualificados têm melhores resultados. Esta constatação não surpreende, estando em linha com estudos anteriores.
De facto, desde sempre os estudos, designadamente no âmbito da sociologia da educação, associam a carreira escolar e o estatuto profissional dos filhos ao nível de escolaridade e estatuto económico dos pais. Também sabemos que isto é tanto mais evidente quanto maiores são os níveis de desigualdade. Em Portugal verifica-se um dos maiores fossos entre ricos e pobres da União Europeia pelo que a relação entre os níveis escolar e salarial dos pais e os dos filhos é ainda mais forte. O Relatório da OCDE, tal como este estudo do Banco de Portugal vêm confirmar a realidade que conhecemos, a dificuldade da escola de promover mobilidade social, ou seja, o nível de escolaridade dos pais marca de forma excessiva o nível atingido pelos filhos. A situação sempre assim foi, ainda me lembro de quando era pequeno, haver quem se admirasse do meu pai, um serralheiro, ter decidido que eu continuaria a estudar.
Acresce que as circunstâncias conjunturais, uma política educativa que parece ter como desígnio a promoção de uma espécie de darwinismo socioeducativo, em que por sucessivos processos de selecção que não garantem equidade nas oportunidades, a educação e a qualificação não promoverão mobilidade social ascendente.
Deste quadro, resulta uma complexa situação que poderemos de forma simplista colocar nestes termos, a escola ao acabar por reproduzir a desigualdade social à entrada, compromete o papel fundamental que lhe cabe na promoção da mobilidade social, ou seja, a escola que deveria ser parte da solução, na prática, corre o risco de continuar a ser parte do problema. No entanto e apesar disto, creio que muito poderá e deverá ser feito no sentido da promoção efectiva da chamada e distante igualdade de oportunidades.
Do meu ponto de vista, muitas vezes aqui afirmado, a questão central é a qualidade na escola pública. Esta qualidade deverá assentar em três eixos fundamentais, a qualidade considerando resultados, processos, apoios a alunos e professores e gestão optimizada de recursos, segundo eixo, qualidade para todos, a melhor forma de combater os mecanismos de exclusão e a desigualdade de entrada e, terceiro eixo, diversificação dos percursos de educação e formação.
No actual cenário, quando se entende e espera que a educação e qualificação possam ter um papel decisivo na minimização de assimetrias, as políticas, os custos e a dificuldade de acesso podem, pelo contrário, alimentar essas assimetrias e manter a narrativa, "tal pai, tal filho", pai letrado, filho letrado e pai pouco letrado, filho pouco letrado.
Assim sendo, urge a definição de uma política educativa para o médio prazo, estabelecida com base no interesse de todos, com definição clara de metas, recursos, processos e avaliação. A continuar na deriva a que nos entregamos, daqui a algum tempo a OCDE ou o Banco de Portugal virão dizer exactamente o mesmo.

ALUNOS À BOLEIA

Alunos não têm transporte para ir às aulas de apoio



Mais um exemplo, só mais um da forma competente como o MEC planeia e operacionaliza medidas de política educativa.
Estabelece uma calendário escolar sem sentido com exames a meio do terceiro período já excessivamente curto. Os miúdos que chumbam no exame terão aulas suplementares para se apresentarem a novo exame, medida de pouca eficácia mas que este ano vai correr melhor que o ano passado pois os exames serão, evidentemente, um bocadinho mais fáceis e é oportuno subir as médias. Os transportes dos alunos para as escolas é da responsabilidade das autarquias e as necessidades são significativas em consequência do fechamento das escolas e da deslocalização de alunos e professores.
As autarquias afirma que só lhes compete transportar os alunos para as aulas que, entretanto acabaram, não para aulas suplementares. Estranho?
Não,  a educação em modo crático.

sexta-feira, 20 de junho de 2014

A SÉRIO?!

"Jardim justifica encerramento de urgências nocturnas na Madeira com excesso de bebedeiras"

O Dr. Alberto João é um pândego, sempre a dizer coisas engraçadas, é danado para a brincadeira. Esta última gracinha, é uma pérola e um elogio extraordinário aos madeirenses.
Até quando?

A INDOMESTICÁVEL VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. Enésimos episódios

"Detido segurança que sequestrou e agrediu companheira na maternidade"

"Homem mata a mulher e é depois perseguido e atropelado pelo filho em Soure"

Para além da gravidade e frequência com que continuam a acontecer episódios gravíssimos de violência doméstica, é ainda inquietante o facto de que alguns realizados em Portugal evidenciam um elevado índice de violência presente nas relações amorosas entre gente mais nova mesmo quando mais qualificada. Muitos dos intervenientes remetem para um perturbador entendimento de normalidade o recurso a comportamentos que claramente configuram agressividade e abuso ou mesmo violência.
Importa ainda combater de forma mais eficaz o sentimento de impunidade instalado, as condenações são bastante menos que os casos reportados e comprovados, bem como alguma “resignação” ou “tolerância” das vítimas face à percepção de eventual vazio de alternativas à separação ou a uma falsa ideia de protecção dos filhos que as mantém num espaço de tortura e sofrimento.

Nesta perspectiva, torna-se fundamental a existência de dispositivos de avaliação de risco e de apoio como instituições de acolhimento acessíveis para casos mais graves e, naturalmente, um sistema de justiça eficaz e célere.

ERROS MÉDICOS. E DEPOIS?

"Portugueses entre os europeus com mais medo de erros nos cuidados de saúde"

A este propósito, recordo que nos últimos 13 anos quintuplicou o número de queixas por alegada negligência ou erro grave apresentadas contra médicos ou outros profissionais de saúde.
É também relevante que em 2013, em 107 auditorias realizadas aos centros de saúde e hospitais pela Ordem dos Médicos em parceria com a Direcção-Geral da Saúde, para perceber a qualidade da aplicação das normas clínicas definidas estavam a ser bem aplicadas, concluíram que as taxas de incumprimento atingem 70%.
Estes dados não devem significar apenas, creio, tanto um aumento dos erros mas também um aumento da decisão de apresentar queixa face ao erro ou à suspeita de erro.
No que se refere ainda à prática clínica imposta considerar que as actuais circunstâncias de funcionamento em muitos centros de saúde e hospitais podem aumentar o risco de erros ou negligência.
Por outro lado, importa sublinhar que os tribunais portugueses levam cerca de oito anos, em média, a decidir casos de "erros médicos", sendo que estes podem assumir diferentes contornos.
Esta morosidade, que não se estranha, é fruto da teia infindável de esquemas e manhas processuais que dilatam no tempo até ao inaceitável, quando não à prescrição, muitos dos processos, desta natureza e de outras, colocados à justiça. Chamar-lhe justiça é, evidentemente, uma questão de hábito.
Se pensarmos que os casos de "erros médicos" colocados aos tribunais podem conter alguma forma de dano ou consequência para o queixoso(a), percebe-se como este atraso fará parte das consequências e não uma forma de conseguir a reparação de eventual erro de um clínico.
Assim, espera-se que a constatação deste fenómeno sustente a intenção e os meios para responder em tempo útil e da forma adequada às questões levantadas quer por utentes, quer por profissionais.
Numa altura em que estão em curso e planeados ajustamentos e restrições no SNS, importa estar atento às consequências desses constrangimentos na qualidade dos serviços prestados.
Este cenário recorda-me uma história de humor negro que não resisto a partilhar. Com a vossa licença.
Um calceteiro, especialista na lindíssima calçada portuguesa, trabalhava numa avenida quando reparou em alguém que junto a si seguia há algum tempo o seu trabalho com toda a atenção. Não resistiu e meteu conversa.
O senhor está a ver o meu trabalho há muito tempo, também é desta arte?
Não senhor. Acho interessante o seu trabalho mas a minha profissão é médico.
Engraçado, a sua profissão é muito parecida com a minha.
Está a brincar, como assim, como é que são parecidas?
É verdade. Nas duas profissões quando há enganos, disfarçam-se com a terra.