AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 30 de abril de 2009

O PARTIDÃO

Hoje, que tanto se fala do “centrão” e das implicações, positivas ou negativas, para a saúde da democracia portuguesa, parece que iremos a assistir a algo mais estimulante, o “partidão”. As alterações legais que possibilitarão o aumento exponencial da quantidade de dinheiro “vivo” que pode entrar nos partidos serão, provavelmente, apoiadas pala generalidade dos partidos, já o foram em sede restrita. Os partidos, os donos da democracia, em tempos de crise, precisam de actualizar os seus rendimentos, certo, altera-se a lei e o dinheiro sem rasto já pode entrar em quantidades substancialmente maiores. Nestas matérias, o consenso é fácil, mais dinheiro vivo para os partidos, claro, concordam. No entanto, a existência de projectos consensuais para lidar com os grandes problemas que afligem a sociedade portuguesa, saúde, educação, justiça, emprego, segurança, etc., não é possível, fere a diferenciação política.
Anda bem o deputado Seguro em demarcar-se destas iniciativas. Por outro lado, ele que se acautele com o ministro Santos Silva, ele está danado para malhar.

DESCULPA, FOI SEM QUERER

Existe uma altura na vida dos miúdos em que quando olham para os seus comportamentos os avaliam fundamentalmente pela intenção. Trata-se daquela cena em que depois de uma asneira das grossas, olham para nós, com aqueles olhos, vocês sabem quais, e dizem “foi sem querer”. Os pais, os adultos generosos, às vezes fingem que acreditam, mas noutras, é preciso dizer seriamente que, mesmo sem querer, foi asneira que não deve repetir-se.
Este episódio triste das imagens dos meninos utilizadas no tempo de antena do PS é quase do mesmo tipo. A ingenuidade e nível de desenvolvimento dos meninos do PS, levaram a que “sem querer” fizessem asneira grande. É, foi mesmo uma grande asneira, não adianta dizer que foi sem querer, dizer que os tipos da produção e tal, e com uns olhinhos marotos pedir desculpa.
Não tem desculpa.

A REFORMA

Os discursos dos miúdos possuem uma infinita capacidade de nos surpreender e de nos mostrar uma representação da realidade através, muitas vezes, de enunciados muito ingénuos. Vejam esta história deliciosa.
Uma professora do 1º ciclo que conheço e considero daquelas que nos fazem lembrar com saudade os professores que tivemos, reformou-se há dois anos e deixou, coisa que o sistema não deveria permitir, um grupo de gente pequena do 1º ano. De vez em quando passa pela escola, como nesta terça-feira voltou a acontecer, o que deixa os garotos contentes, a gente sempre gosta de ver quem gosta da gente. Um dos garotos que quando entrou para escola já tinha surpreendido a professora com a fantástica questão, “Então és tu que me vais ensinar a ler?”, estabelece este diálogo.
Então professora, vais vir cá sempre ver-nos, estás reformada, não é? Podes vir sempre às terças-feiras?
Vou vindo algumas vezes, sabes, tenho outras coisas que vou fazendo.
Ah pois, tens que fazer crochet não é?
Notável.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

DEPENDÊNCIA

Hoje passei por uma experiência curiosa. Tal como, creio, a maioria das pessoas, gosto de acreditar que sou uma pessoa autónoma e, quase, sublinho quase, imune a dependências de natureza instrumental. Acontece que hoje me confrontei com um problema informático que me impediu de utilizar o computador até agora. Estava eu convencido, embora sem pensar muito nisso, que o computador é apenas uma boa ferramenta para, com mais eficácia, desempenhar algumas tarefas. Estava enganado e assustei-me. Basicamente o que me ocorria fazer, no local e circunstâncias em que estava, passava sempre pelo computador, designadamente pelo acesso a mail e a net.
Devo confessar que não fiquei particularmente entusiasmado com a dependência que senti face à máquina, que, felizmente já recomposta, me permite estar a escrever este texto. E fiquei a pensar no Magalhães nas mãos dos gaiatos sem enquadramento da sua utilização. Oxalá não fiquem dependentes.

O RAPAZ CHAMADO ESQUISITO

Um dia destes, estava o Professor Velho na sala de professores às voltas com o chá, quando entrou a professora Sara. Vocês conhecem o Professor Velho, é aquele que já não dá aulas, está na biblioteca e fala com os livros, a professora Sara é uma que trabalha com os pequenos.
Olá Velho, posso?
Claro, tudo bem Sara.
Bem Velho, quando a gente trabalha com os miúdos, nunca se pode dizer que está tudo bem. Conheces o Esquisito?
Não estou a ver quem é. Que se passa?
É mesmo Esquisito, ele tem oito anos, é um miúdo esperto e aprende com facilidade mas tem coisas estranhas, não quer que ninguém lhe toque, se lhe vou fazer uma festa, desvia-se, não quer tocar em material nenhum que venha dos colegas, por exemplo, não pega em borrachas ou lápis que não sejam os dele, sempre preocupado com a limpeza das coisas, diz que podem fazer mal se não estiverem limpas, não tem amigos, brinca sozinho quase sempre. Os outros miúdos acham que ele é vaidoso, que não quer nada com eles, nem que seja deles. E como sabe muitas coisas está sempre a afirmar o que sabe e os outros miúdos ainda menos gostam do Esquisito, dizem que é Esquisito, tem a mania. Que achas Velho?
Olha Sara, se eu pensar nos miúdos que moram nos livros e nos miúdos que moram na vida, eu acho que o Esquisito é um miúdo com medo do mundo, não quer que o mundo lhe toque. Não sabemos porquê, mas, fala com ele, tenta dar-lhe a mão, ajuda-o a atravessar a ponte entre o mundo dele e o mundo dos outros, sozinho ele vai continuar com medo e não atravessa a ponte nem deixa que ninguém a atravesse para vir ter com ele.

terça-feira, 28 de abril de 2009

NÃO PODE VALER TUDO

As sociedades actuais, chamadas da informação e do conhecimento, não dispensam a utilização de estratégias de comunicação eficazes nos diferentes domínios da actividade humana. Na acção política, sobretudo quando se aproximam eleições, quer em situação de poder, quer em situação de oposição, o recurso a estratégias eficazes de comunicação é algo de que ninguém, sublinho ninguém, prescinde. Nesta conformidade, ficará em aberto não a utilização do chamado marketing político, mas os limites e a natureza desse marketing, Sendo, obviamente de leitura subjectiva, dependendo, por exemplo, do posicionamento político de quem emite, analisa ou recebe a mensagem alguns aspectos podem, e devem, ser discutidos. É neste quadro que situo os episódios hoje relatados, a distribuição pelo Primeiro-ministro, Ministra da Saúde e Ministra da Educação de cheques-dentista a meninos das escolas e a utilização em tempo de antena do PS de imagens de meninos a trabalhar com o Magalhães registadas em escolas públicas a solicitação das estruturas regionais do ME. O primeiro caso, sendo uma medida necessária e integrada no Plano Nacional de Saúde Oral, parece um caso óbvio de publicidade terceiro-mundista e de aproveitamento mediático e abusivo de algo que é a operacionalização de um direito, o direito à saúde, tendencialmente gratuito, através do Serviço Nacional de Saúde. Imaginar o Primeiro-ministro e duas ministras a distribuírem cheques às criancinhas com a comunicação social atrás incomoda-me.
Na utilização da imagem dos meninos a trabalharem com o Magalhães no tempo de antena do PS, depois da recolha das imagens ter sido solicitada pelo Ministério da Educação parece-me um atropelo óbvio à ética, a confusão entre o estado e o partido e a indevida exposição pública de imagens que, embora autorizadas, não foram recolhidas para esse fim.
Não pode valer tudo.

MEMÓRIA

(Foto de Vitor Tripologos)

Joaquim, há aí muita gente a barafustar com a maneira como levam a vida, uns têm razão, passam mal, mas muitos nunca vão perceber o que foi a nossa vida quando éramos novos.
Às vezes ponho-me a falar do que passámos aos meus netos e eu acho que eles pensam que é uma história como as outras que lhes conto. O Miguel ainda se ri quando se lembra de eu lhe ter dito que quando me mandaram para a escola ia envergonhado porque não tinha sapatos e que só andei até à terceira classe. Comecei a trabalhar, como quase todos nós, tinha 11 anos. Lembro-me como se fosse hoje, o meu pai a falar com o encarregado da fábrica dos tijolos e eu, até estava mais alto, ia trabalhar como os homens. Foi difícil, o forno era muito quente e custava estar lá ao pé. E depois fui aprender a serralheiro, tive sorte, fui aprendiz na oficina do Zé Serralheiro, lembras-te dele, bom homem e bom trabalhador como poucos, já morreu há uns anos. O problema foi quando comecei a chegar-me à filha dele, a Laura, era bonita, mas ele lá percebeu que eu estava com boas intenções. Por ela me fiquei, casados quase cinquenta anos e agora sozinho outra vez, os filhos estão cada um para seu lado.
E lembras-te daquele problema da política, quando fomos fazer barulho por causa de terem prendido o Zé da Quinta e o Xico Passarinho por terem protestado por causa das horas que tínhamos de trabalhar ao sábado. Acabámos também presos. Eram tempos difíceis, nem sabíamos com quem se podia falar.
Mas também nos divertíamos. Lembras-te dos bailes no Clube Recreativo, gostava tanto do Baile da Pinha, a minha Laura ainda foi uma vez a rainha do baile, fiquei mesmo inchado.
É Joaquim, a vida hoje é muito diferente. Muitos nem imaginam como foi a nossa. Ainda bem.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

E SE OS PERITOS NÃO CONCORDAREM?

Qualquer medida política em qualquer área deve, espera-se, ser objecto de estudo e preparação no sentido de que a medida a desenvolver seja adequada e eficaz. Neste processo de estudo e preparação, o decisor político pode ouvir ou consultar quem por bem entender, designadamente, peritos na matéria a decidir. Assim enunciado parece-me normal e desejável. Menos normal, será decidir e, posteriormente, ouvir os peritos. A bondade da extensão da escolaridade obrigatória não parece genericamente discutível e acredito que, desde que, como já aqui referi, não se hipoteque a qualidade, a medida obterá o consenso dos peritos. Nestes termos, a audição posterior de especialistas, parece-me uma manobra de demagogia e falsa atenção ao que pensa a comunidade científica. Como se espera o apoio dos especialistas, dá-se a oportunidade para que eles digam alguma coisa, mas, à cautela, decide-se primeiro. É que eles podem não concordar.

A CULPA É DO JOELHO

É óbvio que qualquer instituição ou entidade deve definir objectivos para a sua intervenção ou funcionamento, seja qual for a área de desempenho. A inexistência de objectivos conduz ao laxismo, à ineficácia e ao desperdício. Na nossa sociedade e em todas as épocas os exemplos são mais que muitos a que acresce uma cultura de impunidade na medida em que nunca se responsabilizam os responsáveis por tais situações. Dito isto, parece razoável que as forças de segurança face aos indicadores de problemas, que se esperam credíveis, definam objectivos que passarão, necessariamente, pelo controlo e abaixamento dos números nas diferentes tipologias de problemas, a resolução breve de incidentes da sua área de competência, bem como na sua prevenção, podendo ainda ser considerados outros objectivos. O que parece estranho, é que se estabeleça como objectivos o número de detenções a realizar por mês, calculado por área de delinquência e para diferentes esquadras. Pode imaginar-se os operacionais da PSP no final do mês, aflitos com o cumprimento do plano de detenções, a procurarem desesperadamente um qualquer delinquente, até pode ser um daqueles já conhecidos que se não fez alguma, deve estar a prepará-la pelo que prende-se, cumpre-se o objectivo e depois logo se vê.
Para não variar a culpa é do joelho. Com a pressa das estatísticas pensa-se nas coisas em cima do joelho. Se o joelho não ajuda, sai disto.

O RECADO

A semana passada numa animada conversa com gente que procura que os seus filhos cresçam de bem consigo e com o mundo, uma das mães presentes contou uma história pessoal engraçada. Por isso, aqui fica.
Um dia, durante a adolescência, quando a família se juntou para jantar, o pai diz para a mãe, “Se eu tivesse a certeza do que vi, a tua filha levava uma tareia” e mais não disse. A mãe não entendeu, mas a moça sabia que à tarde estava num café perto da escola com um daqueles cigarros, os primeiros, pelos quais a maioria de nós passámos, e muitos continuámos. Sabia também que, apesar de todas as improbabilidades, o pai entrou naquele café, tinha que ser naquele café, e viu-a a fumar e sem tempo para as habilidades de que todos nos socorremos em tais circunstâncias. Olhou, olhou, para que se percebesse bem que tinha visto e sem uma palavra saiu depois de uma bica e de deixar pago o lanche do grupo da filha.
Numa época em que tanto se fala de recados, parece que se substituiu o diálogo pelo recado, este é um exemplo notável de um recado.
Toda a gente que estava no grupo entendeu por bem não perguntar se resultou. A história fica mais bonita assim.

domingo, 26 de abril de 2009

UM DOMINGO DE SANTIDADE

Reconfortante. Findo o ritual do balanço do que tem sido o resultado das “Portas que Abril abriu”, e quando nos espera mais uma semana dedicada, seguramente, à crise e aos seus devastadores efeitos, é bom um Domingo com o conforto da Santidade. Primeiro, pela canonização de D. Nuno de Santa Maria, circunstância exaltante e de profundo significado para as actuais e vindouras gerações. O seu exemplo de entrega, probidade, patriotismo e capacidade de decisão para nos tirar da crise em que vivíamos, Sócrates que se cuide, será certamente uma inspiração para a actual classe política. Apenas lamento que a canonização seja atingida através de um milagre assim para o fraquinho, curar o olho da D. Guilhermina que tinha levado com o pingo do óleo quente. O Santo Condestável merecia algo de maior substância e impacto, mas até no milagre foi humilde. Em segundo lugar, achei também reconfortante e santificadora a entrevista inserta no Público com a Virgem do Barreiro, uma menina de 26 anos que fundou o Clube das Virgens e guarda a sua virgindade para um príncipe encantado que um dia a envolverá num amor puro e imaculado capaz de lhe assanhar as carnes, como dizia Miguel Torga e digo eu. A Virgem do Barreiro já teve por perto uma rapaziada, a um até deu um beijo e outro queria, disse ela, “pôr a mão aqui e ali” (não percebi exactamente onde), mas aguarda o verdadeiro amor. Além disso, que não é de pouca monta, vive com o pai, um reformado que, ou está no café ou no sofá, fala de tudo à mãe com quem sai e, a Ministra da Educação vai achar tocante, acabou o 12º no Programa Novas Oportunidades. Acho este testemunho absolutamente esmagador e um grande exemplo para as moças das novas gerações que, como diz a Virgem do Barreiro, “ora gostam de um rapaz, ora gostam de outro”, umas devassas. Será certamente convidada para as tertúlias do Casino da Figueira, onde aparecerá com D. Saraiva Martins e será aconselhada por D. José Policarpo a não se deixar tentar por um príncipe árabe pois, apesar do petróleo, arranja um monte de sarilhos.
Bonito e reconfortante este Domingo, o problema é que amanhã está aí a vida e eu não acredito em milagres.

sábado, 25 de abril de 2009

OS TRÊS Ds, DE NOVO

Os grandes objectivos do processo desencadeado a 25 de Abril de 1974 eram muitas vezes referidos como os três Ds, Desenvolvimento, Descolonização e Democracia, a ordem não me recordo. Apesar de estarmos a viver esta história e, portanto, da falta de distância que sustente avaliação mais lúcida, creio que podemos afirmar que, basicamente, se cumpriram.
No que respeita ao Desenvolvimento, o País actual, em termos sociais, saúde, por exemplo, culturais, estilo e qualidade de vida, etc., tem pouco a ver com o Portugal de antes de 74. Este desenvolvimento foi global, para o melhor e para o pior. Em algumas áreas atingimos mesmo níveis impressionantes, temos uma densidade de rotundas, telemóveis, auto-estradas e betão à beira-mar que nos colocam na vanguarda. Também cresceram e se desenvolveram, por exemplo, a ineficácia da nossa administração pública, um sistema de justiça moroso e injusto, o nível de corrupção, etc. No entanto e apesar de tudo, o saldo pode considerar-se positivo.
Quanto à Descolonização a história parece afirmar que, nos termos em que a situação estava, dificilmente, poderia ter sido de outra forma. Apenas permanece por definir, de acordo com o inimputável Alberto João, a situação da colónia da Madeira.
Finalmente a Democracia. Começámos por aprender a viver numa Democracia, poder votar em eleições livres e gozar da liberdade expressão, foi demais. No entanto, a democracia política e a participação cívica foram-se confinando a uma partidocracia, a participação política dos cidadãos fora da esfera dos partidos é, quase, inexistente e também vamos assistindo a alguns “enviesamentos” do que podemos chamar de vivência democrática.
Apesar destes aspectos menos interessantes, podemos, creio, afirmar, como referi em cima, que, basicamente, aqueles três Ds de 74 se cumpriram. Temos agora como enormes desafios os três Ds de 2009, Divergência, Depressão e Desconfiança. A Divergência do nosso trajecto face aos nossos parceiros europeus que nos mantém, apesar da nosso progresso, ainda longe dos patamares atingidos pela maioria dos países. A Depressão económica que influencia o maior problema que actualmente enfrentamos, o desemprego e a Desconfiança que sentimos pela generalidade da classe política e pelas capacidades e recursos que temos, o que compromete seriamente a confiança no futuro, continuamos tristonhos e meio resignados.
Veremos o balanço daqui a uns anos.

UMA VISÃO DA HISTÓRIA

Durante algum tempo, mesmo anos, podia-se falar das comemorações do 25 de Abril de 1974, de facto, comemorava-se. Apesar do que de menos bom também se pode falar nos anos que se seguiram, havia muito que comemorar. Hoje, creio que cumprimos os rituais que assinalam mais um aniversário da “revolução”, dos cravos, assim chamada. O desfile na Av. da Liberdade, a sessão solene do Parlamento em que o Presidente da República, seja qual for, aproveita para, como agora se diz, mandar recados, umas referências e umas peças na comunicação social a factos ou figuras, José Afonso ou Otelo, esquecidas o resto do ano, uns cravos, cada vez menos, e pouco mais. Na Região da Madeira o Parlamento já nem a liturgia e até há quem aproveite a data para inaugurar a Praça Salazar. Sinais dos tempos.
Bom, mas voltando ao tempo da comemoração e a propósito da referência a Salazar, uma pequena história. Uma amiga, educadora de infância aqui no meu Alentejo, perguntava à sua miudagem se alguém tinha ideia do que era o 25 de Abril. Um dos gaiatos, cinco anos de experiência de vida, explicou, “foi quando a tropa matou o Salazar, um velho dum cabrão q’avia aí e era ruim como as cobras”.
É uma visão da história. Há tantas.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

CIDADANIA OU PARTIDOCRACIA

Na viagem para o meu Alentejo, ouvi, de forma meio distraída, que, de acordo com uma sondagem de que não fixei os dados, a grande maioria dos inquiridos rejeitava a necessidade de criação de um novo partido. Provavelmente, os cidadãos começam a assumir que mais um partido, será, mais do mesmo.
Na véspera do 25 de Abril faz sentido sublinhar que os partidos políticos são instituições inerentes, imprescindíveis e suportes das sociedades democráticas. No entanto, a prática política dos partidos não pode, não deve, esgotar o envolvimento cívico dos cidadãos. Acontece que é exactamente o que se verifica, o nosso sistema e o modelo de funcionamento da generalidade dos partidos que, fechando o círculo, alimenta a organização e funcionamento do sistema político, transformou os partidos em donos da democracia em vez de essenciais à democracia. Na prática, temos instituída uma “partidocracia”. Fica, portanto, curiosa, a possibilidade admitida por Manuel Alegre da criação de novo partido para dar uma lição aos partidos. Como?
Para além da questão folclórica do dono da esquerda ser homem para dar lições, vejam esta de humildade, a grande questão não é a reforma dos partidos, não acredito que se reformem, alimentam-se assim, é a construção de um movimento que permita o envolvimento cívico e político do cidadão fora da “tutela” de um partido. Como certamente repararam, nos últimos dias ouviu-se o Dr. Canas, o porta-voz do PS (reparem que o homem porta a voz do PS), veio a terreiro contra a possibilidade de cidadãos concorrerem à Assembleia da República sem o enquadramento de um partido.
Novos partidos não são parte da solução, são parte do problema.

HISTÓRIA DO HOMEM SÓ

Era uma vez um Homem, chamavam-lhe Só. A sua vida era, naturalmente, a vida de um Homem Só, raramente falava com alguém a não ser quando era mesmo imprescindível. Conseguiu até arranjar um trabalho que podia realizar em casa, era tradutor, um bom tradutor, quase sempre de ficção. Saía uma vez por dia para as compras da casa, entrava na loja do bairro onde conseguia tudo o que precisava e onde, como sabiam que era um Homem Só, nem lhe faziam muitas perguntas. Não sabiam, assim, que o Homem Só tinha tido um tempo em que era só um Homem e não um Homem Só. Claro que ele nunca iria falar com alguém sobre isso, doía-lhe demais, por isso, era um Homem Só.
Com o tempo, o Só começou a pesar no coração do Homem. Como já não conseguia falar com ninguém e tinha a experiência dos livros, começou, com medo, a escrever um livro seu. Já não traduzia o que alguém escrevera, traduzia o que ele carregava. De início, não foi uma tarefa fácil, mas, de mansinho, começou a gostar da ideia de criar um mundo dele no livro que escrevia, um mundo que todos os dias crescia.
De tal forma se apaixonou, de novo, que criou um personagem para ele e desapareceu no livro, no mundo que criara.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

CADA PROVEDOR, SUA JUSTIÇA. SERÁ?

Primeiro, há que sublinhar o injustificável atraso na substituição do Provedor de Justiça, Nascimento Rodrigues, que há muitos meses acabou o seu mandato. Agora, temos vindo a assistir ao indecoroso espectáculo que os partidos, designadamente PS e PSD, continuam a proporcionar em torno do nome a eleger. Não vou, naturalmente, discutir a competência científica e a solidez ética dos vários nomes que estão indicados, o que parece verdadeiramente assombroso é o facto de, devido à incapacidade e/ou indisponibilidade para consenso, cada partido acabar por indicar o seu candidato. Quando, no nosso ordenamento jurídico e constitucional se exige no Parlamento maioria de dois terços dos deputados para determinadas matérias, tal significa, que a relevância dessas matérias determina a necessidade de apoio mais alargado o que é também um sinal para sociedade civil, tal decisão é tomada com o apoio mínimo de dois terços do hemiciclo.
Quando numa situação tão importante como a eleição do Provedor de Justiça, garante último dos direitos, os partidos optam por apresentar o SEU candidato a Provedor, correm o sério risco de se entender que estão a indicar um Provedor da SUA Justiça. Tal entendimento reforça algo absolutamente devastador cujas consequências são gravíssimas e imprevisíveis o que, aliás, já se verifica em mediáticos processos em curso, isto é, à partidarização da Justiça.
Será que não entendem? Ou, irresponsavelmente, não se preocupam.

O RAPAZ QUE VOAVA

Uma vez na escola dos miúdos mais pequenos, no início da semana, a professora, como fazia quase sempre, pediu que a miudagem falasse do fim-de-semana, muitas vezes dava origem a trabalhos muito interessantes que os miúdos adoravam.
Quando chegou a sua vez o Manel, com um ar muito sério disse que tinha andado a voar, até estava cansado ainda. A professora e os colegas ficaram um bocado surpreendidos.
Manel, as pessoas não voam.
Voam sim senhor, eu acho que as pessoas podem voar, eu voei.
Então como é que tu voaste.
Fui ver terras muito longe que nunca tinha visto, vi casas esquisitas e gente também esquisita que morava nessa terras. Vi monstros bons e monstros maus, foi muito giro, mas também tive medo.
Manel, isso não pode ser, conta lá a verdade.
A sério, estive a voar. Fui visitar o meu avô e ele contou-me uma mão cheia de histórias.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

NÃO SE ESQUEÇAM DA QUALIDADE

Em sociedades cada vez mais desenvolvidas e, portanto, mais exigentes no domínio da qualificação das pessoas, a extensão da escolaridade obrigatória é uma medida indispensável. No entanto, tão importante como a extensão da escolaridade é a qualidade dos processos educativos. Continuamos com taxas altíssimas de insucesso e abandono na escolaridade obrigatória em vigor, até aos quinze anos. Criam-se sucessivas “novas oportunidades” sem cuidar de promover e exigir o eficaz aproveitamento das “velhas oportunidades”. Envereda-se por um despudorado processo de certificação que não se traduz em qualificação mas que compõe as estatísticas e sustenta o “enorme sucesso” da PEC – Política Educativa em Curso.
Esperemos pois que a extensão da escolaridade obrigatória para 12 anos não são seja apenas uma forma de amarrar os adolescentes ao sistema, exigindo umas recicladas “novas oportunidades”, agora depois dos 18 anos.
Sejamos optimistas.

NA MINHA TERRA

A propósito do Dia da Terra estava a pensar que uma das expressões que mais gosto de utilizar e ouvir é “na minha terra”. Não sei bem explicar porquê mas acho que remete para a ideia de origem, vim dali, foi lá que começou, é lá que pertenço e de, como dizem os brasileiros, de aconchego, de ninho. Creio que já uma vez aqui falei disso mas, sendo um suburbano de nascença, muitos colegas de escola nas férias iam à terra, eu não tinha terra para ir, e gostava de poder dizer “na minha terra”. Passados muitos anos consegui arranjar uma terra, a minha terra. É, como sabem, o meu Alentejo. Finalmente, embora já não possa dizer aos meus colegas de escola que também vou à terra, sempre que posso.
Mas andam a estragar a minha terra, retalham-na, secam-na, vendem-na a quem dela não gosta, que a espreme e a abandona. Enchem-na de rotundas e outras modernices. Quando na minha terra, o mar está perto, até se sente a terra a tremer como medo do que lhe vão fazer. Na minha terra, cada vez mais só ficam os velhos, tão abandonados como a terra. Quando a gente cuida da terra, a terra cuida da gente, mas a terra anda descuidada.
Cada vez haverá menos gente a poder dizer “na minha terra” e um dia a terra poderá dizer, “quando cá havia gente”.

SÓCRATES NO TRIATLO

Não tive oportunidade de assistir à entrevista do Primeiro-ministro à RTP1. As apreciações de hoje na imprensa seguem o padrão habitual, os simpatizantes gostaram e os opositores ou menos simpatizantes criticam. De novo, um feroz ataque a um órgão de comunicação social, a TVI e a referência ao ciclismo. De facto, muitos dos títulos remetem para a repetida afirmação de que cada um “pedala a sua bicicleta”. É certo e entende-se. A questão decorrente é que a partidocracia instalada determina que, por vezes, “os interesses partidários de ocasião”, também não é nova esta, se sobreponham aos interesses do país.
A grande consequência é que enquanto se entretêm a discutir, auto-estradas e alta velocidade, o TGV, posições que os partidos vão alterando consoante estão no poder ou na oposição, o país, esse sim, continua de bicicleta. A crise condiciona, mas não explica tudo.
De resto, é curiosa a ideia de um Primeiro-ministro que corre, pedala e nada, isto é, a oposição afirma que nada faz de positivo. A Vanessa Fernandes que se cuide.

UMA HISTÓRIA DA CRISE

Era uma vez um Homem. Sujeito para além dos cinquenta anos tinha a vida que quis construir, dentro do que podia construir, tinha uma mulher com quem, costumava dizer, ainda namorava, tinha os filhos já orientados, algo que deixa qualquer pai tranquilo, tinha um trabalho de que gostava, tinha-o aprendido com o pai, tinha um pequeno mas sólido grupo de amigos, enfim, o Homem estava feliz com a estrada que tinha andado e confiante na estrada que tinha para andar. A certa altura, começou a ouvir que a empresa não estava muito bem e que poderiam surgir alguns problemas. Como todos os companheiros ficou preocupado mas também acreditava que a sua história o ajudaria a ficar protegido desses problemas. Um dia, foi chamado e um jovem desconhecido, apresentou-se como elemento de uma consultora que estava proceder à reestruturação da empresa, com a mesma frieza com que o cumprimentou, disse-lhe que a empresa iria prescindir dos seus serviços com base, sobretudo, na idade. De facto, o Homem ficou a saber que a sua idade o impediria de se “reciclar”, de se “readaptar funcionalmente”, de se envolver em “processos de modernização”, ou seja, tinha terminado o seu prazo de validade.
O Homem saiu e, contrariamente ao que era habitual, não foi logo para casa. Passeou um pouco ao acaso e com uma frase a martelar constantemente na sua cabeça “não me podiam roubá-la, não me podiam roubá-la, não me podiam roubá-la.
Quando entrou em casa, sentou-se no seu canto do sofá e nunca mais se levantou. Era a dignidade que mantinha o Homem de pé, roubaram-lha.

terça-feira, 21 de abril de 2009

OS GAJOS NÃO SÃO NENHUNS TÓTÓS

Entrei no café do Sr. António para uma “italiana” estava o meu amigo Cajó, o mecânico que tem o Punto kitado, em frente a uma “mine”.
Olá amigo Zé, tava aqui a meter combustível na máquina antes de ir buscar a Odete ao Centro Comercial.
Você está a falar em combustível e estive a ler uma notícia que diz que os tipos das gasolineiras quando o petróleo sobe, sobem logo preço para a gente, mas quando petróleo desce, demoram mais tempo a descer os preços que a gente paga, não são parvos.
Os gajos não são totós, isso já sabe a gente. Os gajos sabem que o pessoal não larga o carrinho, carregam e a malta que somos uns meninos também não fazemos nada. Os gajos do governo é que deviam ter mão nisto, mas os gajos também só querem é o deles, não pagam gasolina, estão-se nas tintas pá gente. Depois querem que um gajo vá votar, vão mas é trabalhar. Depois ainda carregam à brava nos impostos da gasolina, ouvi dizer que a maior parte do dinheiro da gasolina vai pós gajos, pago um balúrdio de imposto, o que me safa são os biscates, senão tava feito e na volta pago tudo mais caro e não temos nada. Ainda ontem a minha Odete foi marcar uma consulta na Caixa pró médico de família e marcaram para o fim de Junho. Atão p´ra onde é que vai o guito dos impostos? É p´ra s´encherem, claro. Ponham mas é mais médicos …

Desisti, paguei a “italiana” e a “mine” do Cajó e fui meter gasolina, estava quase na reserva.

NÃO SE PROVA, NÃO EXISTE

Como é evidente a conclusão por parte da Autoridade da Concorrência de que não haverá cartel na formação dos preços no sector dos combustíveis não surpreende ninguém, nenhum cidadão que viva em Portugal ou que conheça o país esperaria que se afirmasse a intencionalidade e concertação de preços por parte das empresas do sector.
Em bom rigor, o que o Presidente da Autoridade da Concorrência pode afirmar é que não se provou a existência de cartel, ou seja, como os dirigentes das empresas são pessoas inteligentes o processo de cartelização de preços pode acontecer de forma a que não se possa provar.
Este tipo de conclusões vai na mesma linha do que se verifica em muitos processos de corrupção, nepotismo, tráfico de influências, etc. em que a defesa assenta, não na inocência dos arguidos, mas na impossibilidade de os acusar. Para este efeito servem todos os expedientes desde a “descoberta” do erro processual na acusação ou na investigação até a dilação de forma habilidosa que leva à prescrição.
No fundo estamos a falar da mesma coisa, ética, justiça e transparência.

HISTÓRIA DO ESPELHO EMBACIADO

Um dia destes estava a Joana sentada, só, a uma mesa da sala de professores quando o Professor Velho apareceu para o chá da manhã. Conhecem o Professor Velho, é aquele que já não dá aulas, está na biblioteca e fala com os livros. O velho pegou no chá e sentou-se com a Joana.
Ainda bem que apareces Velho, como sabes dou-me bem com os meus alunos, acho que os entendo e que eles me entendem a mim.
Sei Joana, alguns dos teus alunos, passam lá pela biblioteca e dizem isso, Até dizem que gostam dos livros, como tu.
Pois é Velho, mas ando preocupada com o Mauro, não consigo entendê-lo. Não consigo perceber de que é que ele gosta, que estrada é que gostaria de andar, que pensa ele das coisas, da vida dele, da escola, sei lá. Também acho que ele não me entende muito bem, estou um bocado perdida.
Sim Joana, eu conheço o Mauro, ele está cá há três anos e acho que ele está mais perdido do que tu. Imagina um espelho embaciado e como é difícil a gente olhar-se por um.
Não entendo Velho.
Quando olhamos para nós através de um espelho embaciado sabemos que estamos ali, sabemos que somos nós mas não nos conseguimos perceber de forma suficientemente nítida. O Mauro quando começa a olhar para ele, ou seja, quando pensa em si, sabe que está ali, como no espelho, mas a imagem não é clara, nítida, daí a sua dificuldade em entender-se. Experimenta chamá-lo para o pé de ti, mostra-lhe o teu espelho pequenino e pede-lhe para que ele fale do que vê. Talvez o teu espelho não embacie a imagem do Mauro.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

MAIS UMA CAMPANHA NEGRA

A notícia veiculada pela Lusa, segundo a qual o Tribunal de Contas terá conhecimento de que existem gestores públicos que pagam multas pessoais com dinheiros dos organismos que dirigem inscreve-se, obviamente, na campanha negra, mais uma, em curso visando associar os gestores à crise, diabolizando a sua imagem junto da opinião pública.
Como é evidente, ninguém minimamente conhecedor da realidade acreditará em tal atoarda caluniosa. Os nossos gestores públicos são pessoas de bem, parcimoniosas, preocupadas com o dinheiro de todos que lhes está confiado para bem gerirem as empresas e organismos pelos quais são responsáveis. São pessoas que prestam contas pelos seus actos de gestão, são pessoas desprendidas e competentes. Não, definitivamente não são pessoas para tal comportamento. Até porque sabem que temos leis e dispositivos eficazes que previnem e punem qualquer acto ilícito.
Aliás, a posição sobre esta matéria já expressa pelo Ministério das Finanças é muito clara, podemos estar descansados. Se existir, coisa que eu duvido, algum prevaricador, será punido, sem apelo nem agravo.

CHAME-SE ESTE HOMEM, JÁ

Astrólogo Mestre Dabo Vidente

Um grande vidente espiritualista e conselheiro, conhecido por grandes personalidades no mundo inteiro pelos bons resultados obtidos nos problemas mais complicados nos últimos anos. Mestra Dabo é um dos mais apreciados em África e na Europa com poderes eficazes. Ajuda a resolver de imediato qualquer problema difícil ou grave com eficácia: amor, o seu casamento está em crise? Quer recuperar o seu marido/mulher, namorado/namorada ou amante, amarra a você quem desejar: marido/mulher, namorado/namorada ou amante e acabam-se os problemas, afastamento total de pessoas indesejadas e trata com sucesso problemas de saúde, familiares, negócios, impotência sexual, dificuldade de engravidar, heranças, sorte, futuro, vícios, infertilidade, emprego, casas assombradas, destrói bruxarias e mal de inveja, magia negra, etc.

Resultado positivo em 48 horas – Trabalho garantido na presença ou à distância com total eficácia e honestidade – consulta pessoalmente por marcação ou por telefone. Pagamento após resultado.

Chame-se este homem, já, estamos à espera de quê?

QUESTÕES DE GÉNERO

Pois é, estamos perante mais uma das muitas questões de género. Desta vez temos um renovado exemplo do género de política que se faz no Portugal dos Pequeninos. A saber, a lei da paridade obriga a colocar três mulheres por cada homem na lista do PSD para eurodeputados, metem-se. Mas cria-se um problema, uma rapaziada que por causa dos equilíbrios políticos é preciso meter não cabem na lista em lugar elegível. Solução, as mulheres, depois de eleitas renunciam ao mandato, a rapaziada que estava de fora sobe e, como nós dizemos, pronto já está, manha e “jogo de cintura” é connosco, somos alguns tótós ou quê?
Fim da história, um “dois em um”, cumpre-se a lei e satisfaz-se a clientela.
Mas que género de política de verdade, clama a Dra. Manuela Ferreira Leite, é esta?
Que género de políticos, as mulheres, são estes para aceitar estes compromissos.
Estão a ver o género de atitude que este género de política estimula? Uma atitude do género falta de confiança e de credibilidade.
Claro que não faltarão as virgens ofendidas, outra vez o género, reclamarem contra aquilo que todos fazem.

PORTA-AVIÕES AO FUNDO

No meu tempo de aluno do ensino básico tínhamos formas bastante mais tranquilas de andar aos tiros na escola, quando a escola não nos interessava do que por vezes, felizmente poucas, se verifica hoje, jogávamos à batalha naval. Provavelmente se perguntarmos aos miúdos de hoje se jogam à batalha naval perguntarão para que consola é o jogo. É um sinal da mudança, nos também não sabíamos o que era uma Play Station.
Uma vez na aula de Matemática, creio que do 5º ano, (actual 9º), eu o meu amigo Sequeira tínhamos trocado a realização de exercícios por uma animada batalha naval. Como era nossa característica, realizávamos as tarefas escolares com o maior dos empenhos, de tal maneira que nem demos pela aproximação da professora. Chegou de mansinho e, de repente, uma mão tira-me o papel do jogo e uma voz zangada, muito zangada, disse “porta-aviões ao fundo” e sem mais dirige-se para o cesto dos papéis onde afundou toda a armada, com mar e tudo.
Não sei se naquela altura já tinham inventado a ideia de assertividade mas a de autoridade era já bem conhecida, pelos professores que a tinham, naturalmente, como hoje, aliás. Com aquela voz e aquele olhar na memória, nunca mais me apeteceu jogar batalha naval nas aulas, de Matemática, pelo menos.

domingo, 19 de abril de 2009

OS RECADOS

Quando eu era miúdo, nos inícios de sessenta, a minha mãe, numa espécie de exploração do trabalho infantil a que ninguém, a não ser eu próprio, se mostrava sensível, mandava-me fazer recados, muitos recados, era ao lugar da D. Maria, à capelista, à mercearia do Sr. Eugénio, meu tio, à drogaria do Sr. Raul, etc. Desde essa altura que os “recados” tinham praticamente desaparecido do meu ambiente. Eis senão quando, a política do Portugal dos Pequeninos recuperou o recado, o termo, que não o significado exacto. A imprensa anda cheia de recados. È o Engenheiro a afirmar que está contra a política do recado. É toda a gente a opinar sobre os recados que o Presidente Cavaco Silva mandou ao governo e aos empresários. É o Action Man Menezes a mandar recados à Dra. Ferreira Leite e aos seus apoiantes. É Mário Soares a mandar recados a Sócrates sobre Durão Barroso. É Paulo Rangel a mandar recados a Vital Moreira. É o Primeiro-ministro a mandar recados à imprensa. É D. José Policarpo a mandar recados sobre como interpretar o discurso do Papa sobre os preservativos. É o Procurador-geral a mandar recados ao Engenheiro. Enfim, para além da crise, agora temos os recados.
Esta gente não entende que uma das diferenças entre os líderes e os aspirantes, é que os líderes não mandam recados, falam.

sábado, 18 de abril de 2009

TENHO 11 ANOS, NÃO ME QUERO CASAR

Há umas semanas atrás a generalidade da comunicação social abordou a situação criada numa escola do norte em que um grupo de alunos de etnia cigana tinha aulas num contentor com atabalhoadas explicações da Comissária Moreira, Directora Regional de Educação do Norte. Muitas vozes se levantaram contra a situação. Eu próprio, neste espaço e em intervenções públicas tive oportunidade de afirmar a minha completa rejeição da situação que me parece, obviamente, discriminatória. Na altura, aproveitei para chamar atenção para práticas de discriminação que a própria comunidade cigana assume, referindo o exemplo do direito à educação muitas vezes negado às meninas.
Agora tomámos conhecimento da situação da menina cigana de 11 anos que terá sido raptada pelo tio com o objectivo de a casar com o filho de 18 anos, soube-se ainda que a menina foi submetida a um humilhante ritual para verificação de virgindade.
Esta situação, de grave atentado aos direitos individuais, não está a ter a mesma repercussão mediática que o contentor. Ou eu estou distraído ou ouvem-se e lêem-se muito menos juízos e apreciações sobre esta situação que, aliás, é dramaticamente frequente, estando as indignadas vozes do episódio do contentor bastante mais tranquilas.
Estranho este quase silêncio, no fundo estamos a falar do mesmo assunto, direitos das crianças.

TEM QUE SER

Na linha de alguns textinhos que por aqui passam, retorno hoje a expressões que utilizamos com frequência no nosso quotidiano. Em minha opinião uma das expressões mas elucidativas da “alma portuguesa” é “tem que ser”, mas o “tem que ser” da resignação, não o “tem que ser” igual ao “quero que seja”. Quem nos ouvir e entenda vai ficar convencido de que estamos vivos e nos movemos porque, isso mesmo, tem que ser.
Se repararem, muitos de nós conseguimos responder com um “tem que ser” até a propósito de tarefas de que, em princípio, gostamos, “Vais almoçar? Tem que ser”. No entanto, na maior parte das vezes o tem que ser acompanha a referência a algo que faz parte da vida da maioria de nós, trabalhar ou estudar, ”Vais para a escola? Tem que ser”, “Vou para o trabalho, tem que ser”.
Somos, com é sabido, um dos países mais consumidores de medicamentos e com um nível elevado de auto-medicação. Esta tendência, será, por ventura, resultante de uma espécie de hipocondria colectiva. Provavelmente, por estas razões, o “tem que ser”, para os mais chegados às questões da saúde, é substituído pela variante “que remédio” sempre na versão resignação. Viver porque “tem de ser”, viver porque “que remédio”, é demasiado curto para se viver bem

sexta-feira, 17 de abril de 2009

O EMBARAÇO E A ÉTICA

O presidente da Câmara de Cascais, António Capucho, defende que o Dr. Dias Loureiro deveria demitir-se do Conselho de Estado devido ao caso BPN, independentemente de ser, ou não, culpado. Muita gente tem defendido a mesma opinião, portanto, nada de novo apesar de ser proferida por um militante destacado do mesmo partido, o PSD. O que acho inédito e interessante, é argumentação. Acha António Capucho que a manutenção de Dias Loureiro no Conselho de Estado é um embaraço para as instituições políticas em geral. Verdadeiramente notável e promissor.
Estão a imaginar a situação que aconteceria se os elementos das várias instituições políticas que estão envolvidos em processos menos claros se apressassem a sair das respectivas instituições para lhes poupar embaraços?
Para além de a boa parte da nossa classe política faltar solidez ética que motivasse tal decisão, como é que as instituições políticas sobreviveriam a tamanha deserção de quadros?
Provavelmente, tal como a igreja está a fazer, trazer padres da Índia para suprir a falta de sacerdotes, teríamos de importar políticos, o problema é de onde, os bons não quererão vir e os maus, já basta assim.

PAÍS SEGURO, OU NEM POR ISSO

Hoje, na apresentação do Relatório de Segurança Interna de 2008 na Assembleia da República, tivemos uma discussão sobre a segurança do país, O Ministro, naquele jeito de quem vive num condomínio e anda de helicóptero pinta o quadro com cores simpáticas, a oposição, com base na opção estratégica de quanto pior melhor, fala do inferno. Tentando perceber em que país vivemos, fomos para a rua saber o que respondem as pessoas à questão “sente-se seguro(a)?”.
O Cajó, mecânico e adepto do shunning (o tunning dos pobres), “Seguro, quem é que se sente seguro? O patrão já me disse que não há guito, pode ter que me mandar embora”.
O Sr. Silva, reformado depois de uma carreira de 58 anos como empregado de balcão, “Olhe, na minha idade, a única coisa segura é a morte”.
O Zeca, adolescente que passa o tempo entre o portão da escola e o centro comercial enquanto aguarda pelas Novas Oportunidades”, “Ya, tou seguro man, o people da street é fixe, tá-se bem”.
O Sr. Francisco, bancário, “Seguro? Eu? nem o dinheiro que está no banco está seguro, não vê o que essa malta anda a fazer, e não acontece nada”.
Encontrámos o Dr. Isaltino a sair do tribunal, “Claro que estou seguro, se não me sentisse seguro não tinha aceite tudo o que os meus amigos me deram”.
A Marlene, uma rapariga daquelas que o Ribau Esteves quer namorar, boa como o milho, “Normalmente sinto-me segura, e quando ando nos transportes públicos muitos cavalheiros também tentam segurar-me”.
Entre duas afirmações brilhantes encontrámos o Génio Pacheco Pereira, “Com toda a franqueza, espero que estas declarações não sejam censuradas, tudo o que está a acontecer eu já tinha previsto e também já tive oportunidade de dizer o que vai acontecer, o resto é propaganda”.
Finalmente, nesta pequena incursão deparámos com o ministro Santos Silva que se preparava para começar a malhar. “Claro que me sinto seguro, seguro de que vamos ter maioria absoluta, seguro de que o Eng. Sócrates é o melhor primeiro-ministro que Portugal já teve, seguro de que, embora raramente, alguém roube uma carteira no metro, não há delinquência no país, alguém que se atreva, malho logo”.
Como podem verificar continuamos sem saber se, de facto, Portugal é um país seguro ou não. Será melhor ouvir de novo o ministro Rui Pereira e o Dr. Portas, o Paulo.

A HISTÓRIA DA VACA AZUL

Uma vez uma professora, no fim de uma conversa sobre animais pediu aos miúdos para cada um escolher um animal e que fizesse um desenho que, colocados juntos, mostrariam muitos animais. O Manel, como sempre, ficou a olhar pela janela algum tempo mas lá se resolveu a realizar a tarefa. Quando toda a gente finalizou a professora espreitou os trabalhos e encontrou o Manel, orgulhoso, a admirar a sua vaca, tinha uma linda cor azul e três cornos.
É bonita, não é Professora?
Manel, as vacas não são azuis e não têm três cornos.
Professora, quando a gente desenha, as vacas podem ter as cores todas.
Manel, assim não parecem vacas a sério.
Professora, esta não é uma vaca a sério, é a minha vaca pintada, de azul e com três cornos.
Manel, não podemos juntar um desenho com uma vaca azul aos outros desenhos que têm os animais parecidos com o que eles são.
Professora, mas isso não são desenhos, são retratos.
Manel, tens sempre que fazer diferente e, ainda por cima, não te calas, queres ter sempre razão.
Professora, posso fazer outra vaca, preta e branca, com dois cornos?
Manel, afinal sempre achas que estou certa.
Não professora, quanto mais igual eu for, mais tranquila é a minha vida.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

CHEIRA BEM, CHEIRA A ELEIÇÕES

Estava a olhar para a notícia sobre a eventual aceitação do ME do fim das quotas para professor titular e senti qualquer coisa no ar que me intrigou, de repente fez-se luz, lembrei-me do refrão da conhecida marcha lisboeta, “Cheira bem, Cheira a eleições”. Como muitas vezes referi, as quotas para titular não têm nenhuma espécie de justificação. O problema surgiu por se misturar da pior forma a avaliação, imprescindível diga-se, com a progressão na carreira, ou seja, se alguém merece excelente, deve ter excelente e progredirá para a etapa acima quando houver vaga e em concurso com outros candidatos e não estar sujeito a quotas com o argumento de que se promove o mérito. O que não tem sentido é alguém merecer excelente, isto é reconhecer o mérito, mas não poder ter porque “os excelentes” estão esgotados, um disparate. Isto era óbvio desde o princípio, desde a divisão entre “titulares” e “outros”, deveria ter sido alterado por estar errado.
Agora o ME admite deixar cair a quota a troco do bom comportamento dos professores, é a pior maneira de alterar. É reconhecer implicitamente que estava mal, é negócio manhoso (tomem lá e vejam se se calam), é a má maneira de fazer política. Teria sido mais fácil e ajustado ter, no tempo certo, tomado a decisão certa.

CRISE DE VOCAÇÕES

Ao que parece devido a uma crise de vocações e, na minha opinião, ao imobilismo conservador da Igreja a carreira de sacerdote já não atrai. A universalização do acesso à educação levou, sobretudo em meios menos privilegiados e rurais, a que a ida para o Seminário deixasse de funcionar como uma forma de formação acessível. Também com as mudanças sociais e culturais se alterou significativamente, por um lado, o estatuto social do padre e, por outro, o número de católicos praticantes. Naturalmente, este fenómeno é mais evidente em países mais desenvolvidos.
No entanto, tenho para mim, que esta dificuldade de encontrar padre e o afastamento das práticas religiosas também se deve ao conservadorismo da Igreja, por exemplo em aspectos como o acesso das mulheres ao sacerdócio ou o celibato dos padres, situação que dificilmente se entende nas sociedades actuais.
Tudo isto a propósito da notícia curiosa referida no DN sobre a importação de padres indianos da diocese de Palai para trabalharem na diocese de Lisboa, gente naturalmente próxima da cultura e da sociedade portuguesa. Já vínhamos à assistir à importação de seitas e igrejas alternativas, agora passámos à importação de padres católicos. Como qualquer emigrante, que sejam bem-vindos.

UMA DO CRAVINHO, OUTRA NA FERRADURA

Embora de forma tímida e comprometida parece que o PS está disponível para apoiar o fim do sigilo bancário proposto pelo BE. Qualquer medida que possa ter efeito no combate à corrupção e ao enriquecimento ilícito é de saudar, por isso, dada a maioria detida pelo PS na Assembleia da República, torna-se imprescindível a sua adesão sem a qual, como tem vergonhosamente acontecido, as medidas não passam, veja-se o destino do pacote Cravinho. É certo que a medida, sendo importante, perde impacto se não se conseguir entendimentos que promovam, por exemplo, o controlo ou a extinção dos offshores (esta medida está, naturalmente fora da competência da AR), se não se proceder à criminalização do enriquecimento ilícito, que aliás o PS ainda não aceita, se não se promover a eficácia dos dispositivos de regulação e, sobretudo, uma justiça célere, equitativa e eficaz, que não permita as habilidades e manhas jurídicas que suportam a instalada ideia da impunidade. A este propósito pode conferir-se as sucessivas e insultuosas declarações de Isaltino durante o seu julgamento, “toda a gente fazia assim”, “é a prática habitual”, etc., estando a falar de práticas fraudulentas.
Ver para crer, no entanto, vamos ter alguma esperança.

CANTA COM AQUILO QUE ÉS, SÓ PODES DAR O QUE É TEU

Um dia destes a Maria entrou na biblioteca da escola e sentou-se. A Maria é uma professora ainda novinha que está pela primeira vez naquela escola. O ar cansado e, parecia, ausente da Maria chamou a atenção do Professor Velho, aquele que já não dá aulas, está na biblioteca e fala com os livros.
Olá Maria, passa-se alguma coisa?
Olá Velho, estou cansada e sem saber muito bem o que fazer. Tenho um grupo de alunos que é um pedaço agitado, nada de particularmente grave mas torna-se difícil controlá-los. Tinham-me avisado que eles eram assim. De início procurei apresentar o ar mais sério que conseguia, mas o Zé, tu conheces, diz umas coisas, que eu não conseguia ficar sem me rir, lá se foi o ar sério. Depois, experimentei aproximar-me, informei-me sobre os gostos deles e comecei a querer parecer assim uma espécie de companheira. Não correu bem, quase que me tratavam como a um deles. Já não sei que experimentar.
Sabes Maria, quando a gente está a começar ainda não nos conhecemos muito bem, ainda não encontrámos o nosso jeito, o que nos dá um bocadinho de insegurança. Então somos tentados a construir uma personagem, uma “autoritária” ou “setora porreira” por exemplo, que não somos nós. A questão é que os alunos percebem lindamente que não somos nós. Existe um fado, o Fado Tristeza, do José Mário Branco, que diz “canta com aquilo que és, só podes dar o que é teu”. É isso que tens de tentar. Perceber o que é teu e falar, dar, isso. Vais ver que os miúdos percebem quando fores tu, a sério. Eles não gostam que os enganem.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

UMA HISTÓRIA BONITA

As dificuldades dos tempos actuais retiram-nos frequentemente, a lucidez e a disponibilidade para vermos o que de bonito ainda vai acontecendo. A história, hoje conhecida, de uma enfermeira, funcionária do Estabelecimento Prisional de Paços de Ferreira, que tentou introduzir no edifício dois telemóveis disfarçados em sandes é, eu acho, comovente ou, como diria a Senhora Ministra da Educação, tocante. Uma enfermeira é alguém que por imperativo ético e deontológico se preocupa com o bem-estar das pessoas. Assim, trabalhando com pessoas presas, afastadas do convívio com os seus semelhantes e entes amados e que, portanto, devem sentir-se muito mal, a senhora enfermeira achou por bem combater o isolamento e mal-estar dessas pessoas. Fez muito bem. Num requinte de humanidade e profissionalismo junta a ponte para o mundo, os telemóveis, com o alimento para o físico, as sandes, bonito mesmo. Não sabemos quem seriam os destinatários dos telemóveis, mas deixem-me acreditar que se trata de dois sujeitos condenados injustamente, um deles a morrer de amores pela namorada que, destroçada, aguardaria ansiosamente por cada sms recebido da prisão e o outro, o outro é o destinatário dos amores ainda não revelados da senhora enfermeira. Uma paixão proibida que faz toldar a razão e cometer erros.
Tocante, insisto.

FOLCLORE POLÍTICO E DOIS MILHÕES SEM EIRA NEM BEIRA

Lamento, mas não vou falar da canção dos Xutos “Sem eira nem beira” que alguma imprensa, o Público por exemplo, empurra para banda sonora da contestação ao engenheiro. È a parte folclórica da política à portuguesa, que vai na mesma linha de transformar o Pedro Abrunhosa em revolucionário responsável pela queda do cavaquismo porque se lembrou de cantar “não posso mais”. Aliás, como eles próprios dizem, de revolucionários e de militância política os Xutos têm muito pouco. Em termos mais pragmáticos poderão vir a agradecer o excelente efeito de marketing.
O problema sério é que, folclore à parte, um estudo, com dados de 2006, divulgado pelo Banco de Portugal evidencia a existência de 2 milhões de pobres em Portugal dos quais 300 000 são crianças. A valores da época viveriam com menos de 382 € de rendimento. Isto é que é verdadeiramente importante, dois milhões de pessoas a viver sem eira nem beira. Dois anos depois e com a crise instalada a situação deverá ser pior. Nem sequer tenho a certeza se os Xutos estavam a pensar nesta gente.
De positivo, o estudo refere algo que frequentemente aqui tenho defendido e que contraria alguns discursos que, sublinhando o desemprego entre licenciados, desvalorizam a formação de nível superior. De facto, o estudo refere-se ao “elevado retorno da educação no mercado de trabalho em Portugal, sobretudo nas pessoas com formação superior.”
O resto é folclore político.

A HISTÓRIA DO GOZADOR

Era uma vez um rapaz chamado Gozador. Andava na escola e tinha uns doze anos. O Gozador era um miúdo um bocado estranho, parecia que estava sempre a gozar. Tinha um sorriso permanentemente pendurado na cara e as pessoas ficavam um bocado incomodadas porque ele embora não falasse muito, antes pelo contrário, passava muito tempo calado, mas com aquele ar de gozador. Os professores então sentiam-se mesmo sem saber muito bem o que fazer, ele não perturbava as aulas, estava tranquilo mas aquele sorriso de quem estava a troçar incomodava. Os colegas não se davam muito com ele e o Gozador também não se aproximava muito, mantinha-se no seu canto e compunha o sorriso habitual. Um dia, um dos professores falava do Gozador com o Professor Velho aquele que já não dá aulas, está na biblioteca e fala com os livros. Depois de ouvir a descrição do Gozador o Velho disse para o professor.
Ainda bem que me falas no Gozador, também estou um bocado preocupado com ele, acho que ele ri de tristeza mas ainda não consegui perceber porque está sempre tão triste. Quando descobrir digo-te.
Velho, rir de tristeza?!
Sim, o Gozador tem medo que percebam a sua tristeza, então esconde-a com o sorriso.

terça-feira, 14 de abril de 2009

APENAS BOA EDUCAÇÃO

Hoje que tanto se fala de educação e das dificuldades e incapacidades de muitos pais na educação dos seus filhos, deve sublinhar-se o que de positivo verificamos à nossa volta, sinal de que nem toda a educação é má.
Esta introdução vem a propósito de uma orientação que os meus pais me deram, não é bonito recusar ofertas que nos fazem. Tal prática criou-me alguns embaraços pois obrigou-me a aceitar coisas que detestava, embora reparasse que as pessoas que ofereciam se sentiam melhor por aceitarmos.
É à luz desta ideia que deve ser entendido o comportamento do Dr. Isaltino e de outras figuras na mesma situação. São pessoas da minha geração e que devem ter passado pela mesma orientação, é feio recusar o que nos oferecem. Se algumas pessoas generosas lhe oferecem desinteressadamente uns donativos eleitorais que vão parar a umas continhas na Suíça, uma casinha no Algarve, uns descontos nas compras imobiliárias, etc. seria de uma grande falta de educação recusar. As pessoas que ofereceram até poderiam sentir-se ofendidas com a recusa e sem nenhuma necessidade, o Dr. Isaltino, e outros, limitam-se a ser bem-educados aceitando o que lhe oferecem.
A quem possa interessar, se me quiserem oferecer uma casinha na praia podem usar o contacto do blogue, eu não recuso.

SÓ FALTA JUSTIÇA A SÉRIO

A entrada de Portugal na Comunidade Económica Europeia, actual União europeia, trouxe um conjunto de implicações, umas francamente positivas, outras menos positivas. Nos aspectos em que estávamos mais longe dos níveis médios da União, nível de vida por exemplo, desencadeia-se um movimento de convergência que entendemos mas não sentimos. Um dos aspectos em que mais progredimos e nos temos aproximado dos níveis europeus é a delinquência. Sim, é verdade, já temos níveis e qualidade de delinquência que não nos envergonham. Já temos assaltos a bancos e a gasolineiras, temos crime organizado e com utilização de armas de fogo e violência, temos até um excelente nível de corrupção, temos tráfico de droga e de gente, temos pessoal aos tiros na rua, etc. não nos falta nada. Vejam o assalto de ontem em na A3 em Braga, 12 tipos bloqueiam um camião de tabaco e a escolta, reparem no pormenor da escolta, e levam 100 000 maços de tabaco apesar do camião ter dispositivo de GPS. Estes espectáculos só conhecíamos dos ecrãs.
Para continuar este caminho de convergência, só nos falta um sistema de justiça a sério.

O RAPAZ QUE SE PORTAVA MAL MUITO BEM

Era uma vez um rapaz que se portava mal muito bem, chamava-se Zé. Era até muito bom a portar-se mal. Havia colegas que eram muito bons em Português, Inglês ou Matemática, alguns eram mesmo bons a tudo, o Zé só era bom a portar-se mal. O Zé conseguia ter sempre a nota máxima a mau comportamento, não que ele fosse mau, só se portava mal muito bem. Os professores não gostavam assim muito do Zé mas os colegas, a maioria dos colegas gostava do Zé e pareciam gostar mais quando ele se portava pior. Achavam que o Zé fazia coisas mesmo difíceis, é que um tipo portar-se mal muito bem não é fácil e estavam sempre à espera que o Zé fizesse algo de novo que os divertisse, à custa dos professores é claro. Sempre que o Zé fazia das suas ou era castigado, os colegas chegavam-se mais perto e faziam-no sentir popular e cada vez mais convencido de que os colegas gostavam dele.
E como o Zé precisava que gostassem dele. Tanto, tanto, que até se portava mal que era coisa de que ele nem gostava assim muito.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

SÃO ROSAS SENHOR ENGENHEIRO

Foi a resposta que a Dra. Maria de Lurdes Rodrigues deu ao Eng. Sócrates quando quis disfarçar o pão que levava no regaço para as criancinhas que passam mal e estão na escola.
A sério. Naquele jeito aprendido com o chefe da omnipotência milagrosa que faz concorrência a Deus, a Senhora Ministra vem garantir que as escolas resolvem todos os problemas de carência alimentar que identificam. É certo que fala apenas dos problemas identificados pelas escolas, mas como pode a Senhora Ministra dar este tipo de garantias com um ar sério. Como a Senhora Ministra certamente saberá, as escolas, da maneira que a Senhora Ministra tem definido as políticas educativas, nem a educação de qualidade para todas as crianças conseguem garantir apesar de todas as habilidades estatísticas e da certificação acelerada, ainda hoje assumiu que não conseguiu fazer chegar os Magalhães a todas crianças e garante resolver todos os problemas de carência alimentar. Por muito menos, curar o efeito de um pingo de óleo quente no olho de uma senhora, o Condestável passou a Santo.
Temos candidata a milagreira.

A CULPA É DAS FÉRIAS, ACABE-SE COM AS FÉRIAS

Para que não seja acusado de sistematicamente evidenciar um discurso negativo sobre a PEC – Política Educativa em Curso e não encontrar aspectos positivos, quero sublinhar o esforço importante, necessário e útil de reorganização e requalificação do parque escolar. É certo que, em algumas circunstâncias, as decisões foram discutíveis mas o princípio geral parece-me correcto. No que respeita ao emblemático Magalhães, também concordo com a ideia de que as TIC apareçam cedo na vida das crianças, desde que sejam acautelados alguns aspectos, não devem ser percebidas “em vez de” mas como “para além de”, deve ser acautelada a formação e apoio à sua utilização por parte de professores e também dos pais, devem ser assegurados e eficazes os dispositivos que garantam a equidade e a oportunidade no acesso aos equipamentos por parte de TODAS as crianças. Acontece que neste processo, as questões que referi não foram devidamente acauteladas por se ter optado por uma estratégia apressada de propaganda e marketing em vez de planeamento e eficácia.
A desculpa agora encontrada pela Ministra para o facto de muitas crianças não terem ainda o computador, facto que também não é grave, estamos “só” no último período, é bem elucidativa da forma de funcionar do ME. Então a culpa é das férias pois “a interrupção das actividades lectivas não permitiu cumprir o programa”, disse a Ministra. Como sabem, a existência de férias da Páscoa é completamente inesperada e, portanto, apanhou toda a gente de surpresa a começar pelo pessoal da 5 de Outubro. De facto, as férias só atrapalham, tanto que, ao que parece, o Dr. Albino Almeida se prepara para pedir ao ME que acabe com os “períodos de interrupção das actividades lectivas”, à excepção de duas semaninhas no verão destinadas à ida dos meninos para as colónias de férias apanhar um solzinho que também faz muito bem.
Eu juro que hoje só queria dizer bem, mas esta gente não deixa.

ÉS O QUE TENS

Como seria de esperar, passada a acalmia pascal, regressámos à crise. Segundo o JN, os serviços de pediatria do Hospital Amadora-Sintra estão a registar cada vez mais casos de crianças que chegam às consultas mal alimentadas, quando não com fome, pouco cuidadas e, muitas delas, com roupa e ténis de marca. Este cenário retrata de forma elucidativa a crise em várias dimensões. Em primeiro lugar, naturalmente, as dificuldades económicas que muitas famílias atravessam, sobretudo, em situações de maior vulnerabilidade, como é caso de famílias monoparentais. Em segundo lugar, muitos destes casos configuram alguma negligência face às crianças que, não surpreendendo, é sempre preocupante, veja-se também o número revelado nos últimos dias de crianças abandonadas pelas famílias ou devolvidas depois de adoptadas. Em terceiro lugar, a inversão do sistema de valores, ou seja, a criança pode estar mal ou insuficientemente alimentada e cuidada mas não pode deixar de usar a roupa e os ténis da marca que está na moda. Esta pressão, assumida pelas próprias crianças e desenvolvida por nós adultos, assenta na ideia de “és o que tens”, isto é, sem ter a roupa de marca, não se é, porque todos têm. Os tempos vão difíceis mas também estranhos.
Por falar em crise, não me venham com a ideia de que se trata de discurso demagógico e populista, em 2008, os seis administradores da GALP ganharam 4 milhões de euros mais uma ajudinha de 90 000 € para cada um para os seus PPRs. Entre os administradores está o Dr. Fernando Gomes, ex-presidente da Câmara do Porto, ex-ministro da Administração Interna, actual boy e, desde sempre, um reputadíssimo especialista na área do petróleo.

ACABOU A PÁSCOA, SEGUE A CRISE

Pois é. Depois dos habituais congestionamentos na A2 e na A1 no que toca à entrada de Lisboa a região que conheço melhor, sinais “do regresso dos portugueses das mini-férias da Páscoa, época aproveitada para uns dias de descanso ao sol algarvio ou na visita aos familiares” na nunca ouvida expressão formulada nos jornais televisivos a crise está aí, de novo, à espera. Pelo meio ficam algumas notas deste período pascal. Deve registar-se o esforço de conciliação entre o criacionismo e o evolucionismo protagonizado por D. José Policarpo que deixaria Darwin perplexo e Bento XVI à beira de um ataque de nervos. De referir também o problema nacional, absolutamente inaceitável e perturbador criado pelo facto de ser definido um código de conduta e de apresentação para pessoas com funções de atendimento público em Faro e que o dono da esquerda, (pelo menos de uma, a dele), o deputado Alegre, já veio a terreiro classificar de fascizante num patético esforço de se manter audível. As mornas águas pascais, altura em que os “portugueses aproveitam as mini-férias para procurarem o sol algarvio ou matar saudades dos familiares à volta do tradicional borrego”, (já ouviram esta?), foram também agitadas pelo facto de a jornalista Fernanda Câncio, habitualmente considerada uma excelente profissional, ter desatado a opinar criticamente sobre as “maldades” que têm feito a Sócrates. Parece que ela não pode achar isso, com ou sem razão, porque, ao que se diz, é namorada do Eng. facto que deveria ser irrelevante pois cada um aplica o seu bom gosto no que melhor entende. Acho até muito bonito e uma prova de afecto defender o bem amado em público. Acho que quem critica o faz pela mesquinhez das invejazinhas. Além disso, sempre é uma ajuda ao Dr. Vitalino Canas e a Santos Silva.
Mas não se preocupem, está aí a crise, de novo.
PS – Também registo que o meu Benfica disse definitivamente adeus ao título. À boleia do espírito da época, alguns querem crucificar o treinador.

domingo, 12 de abril de 2009

É DA PÁSCOA, RESSUSCITAR OS FRENTISMOS

O pessoal está assustado. Percebe-se, a expectativa de voltar a ter a cidade de Lisboa governada pelo menino guerreiro, Santana Lopes, não é, de facto, muito animadora. Dito isto, não deixa de ser engraçado e curioso imaginar esta espécie de “esquerdão”, isto é, o PS, CDU e BE, para já, juntos, sobretudo, depois das simpáticas e elevadas trocas de mimos entre eles. Para justificar a petição do “Apelo à Convergência”, dir-se-á que as questões de política nacional são de natureza diferente das questões autárquicas o que, sendo verdade, não esbate diferenças nem torna “amiguinhos” quem regularmente troca “sopapos” políticos. Podem perceber-se entendimentos contextuais em situação pós-eleitoral em função dos resultados e no sentido de criar condições de governabilidade, mas uma coligação pré-eleitoral cheira a “frentismo” serôdio e que visa combater o “frentismo” também previsto do lado do “direitão”, juntando, pelo menos, PSD e CDS-PP. O cidadão mais envolvido nas questões político-partidárias pode fazer contabilidade eleitoral, o cidadão comum percebe menos como gente que passa o tempo a discordar e a confrontar-se de forma bem significativa, na Assembleia da República, apareça de braço dado em Lisboa, de um lado ou de outro. Como sempre trata-se dos interesses partidários de ocasião e da seriedade em política.

sábado, 11 de abril de 2009

A MARCHA DOS PENITENTES

Nesta quadra pascal aparecem sempre, faz parte do ritual, umas imagens impressionantes com origem, fundamentalmente, nas Filipinas, de gente que, literalmente, se crucifica e se auto-chicoteia numa perspectiva de sacrifício, penitência e purificação. Acho as imagens absolutamente chocantes, para além de me parecerem dolorosas. No entanto, sou sensível à ideia de penitência e purificação pelo que poderíamos aspirar a uma marcha dos penitentes que nos reconciliasse com parte substantiva daqueles que gerem os nossos destinos, quer políticos quer económicos.
À cabeça da marcha dos penitentes umas figuras de peso de que deixo alguns exemplos.
O Dr. Isaltino, a Dra. Fátima Felgueiras, o Avelino e o Major que se penitenciariam pelas “boas práticas autárquicas”.
A Dra. Maria de Lurdes Rodrigues e “sus muchachos” em penitência pela PEC – Política Educativa em Curso, que querendo alterar aspectos necessários, o tem feito da pior maneira e com custos ambientais muito severos, o clima das escolas não se aguenta.
O Dr. Alberto Costa e a Dra. Ferreira Leite em penitência por simplesmente não existirem. Na sua idade e com as suas responsabilidades é grave.
O Génio Pacheco Pereira, o Dr. José Manuel Fernandes e o Dr. Durão Barroso em penitência pela defesa fundamentalista do Sr. Bush um rapaz que mudou o mundo.
O Dr. Albino Almeida penitencia-se por “representar” os pais que desejam os meninos trancados nas escolas 12 horas por dia, pelo menos.
O Dr. Manuel Pinho em penitência pelos seus maus dotes de pintor. A realidade nunca é da cor que ele a pinta.
O Dr. Vítor Constâncio em penitência por passar o tempo a dormir enquanto parte da banca se orienta.
O Eng. Sócrates em penitência pela infalibilidade, genialidade e omnipotência deselegantemente usurpadas a Deus.
Por razões de espaço deixo ao vosso critério quem mais poderia integrar a marcha dos penitentes de forma a regenerar a ditosa pátria.

(Foto de Mico)
Para onde foram todos?
Sabem que não gosto de ficar só.

Mas quando estão todos,
também me sinto só.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

O ARROZINHO DO SACRIFÍCIO

Aqui no canto do meu Alentejo, estava a ver passar o mundo dentro da caixa mágica. Depois de notícias sobre o terramoto em Itália e a abordagem do importante e decisivo assunto das saias curtas e dos decotes não permitidos às funcionárias da Loja do Cidadão de Faro, as referências à época pascal foram muitas e variadas. Gostei especialmente de uma peça sobre o facto da comunidade católica não comer carne neste dia. Depois de uma visita a alguns restaurantes e às ementas que definiram para hoje, explicava o senhor pároco de Mafamude que tal tradição radica na ideia do sacrifício e do jejum. A seguir entrevistam uma senhora que diz fazer um excelente arroz de marisco por causa de não se comer carne e como é católica aproveita para fazer o arrozinho. Sacrifício e jejum? Um arrozinho de marisco?
Embora não seja católico, estava a ficar embaraçado por me ter dedicado a uma postinha de bacalhau com cebolada mas depois de ouvir a senhora já me senti melhor, afinal não não se trata de um arrozinho de marisco. Em todo caso, aprecio comovido o jejum e sacrifício da época pascal. O senhor pároco de Mafamude também não ficou muito convencido do jejum e do sacrifício do arrozinho de marisco.

NOTÍCIA DO PAÍS FELIZ

Para lá do país em crise também existe o país feliz, ainda bem. De facto, pelo menos um jornal de grande tiragem, o CM, e pelo menos um canal televisivo, a RTP1, dedicaram espaço, o CM a primeira página, ao facto de numa acção de formação para funcionários da recentemente inaugurada Loja do Cidadão de Faro ter sido “ensinado” que decotes excessivos (sem indicação de área visível), saias muito curtas (sem indicação de comprimento) e perfumes muito agressivos, entre outros aspectos devem ser evitados. O visual e o código de conduta prendem-se com a qualidade do atendimento.
Todos nós temos histórias de atendimento que consideramos desadequado em variadíssimas instituições privadas ou públicas. Assim sendo, formação em atendimento público parece, não só interessante, como necessário. Por outro lado, não existindo a obrigatoriedade da farda, uma referência a aspectos relativos à indumentária de homens e mulheres também não me choca no contexto referido, uma acção de formação para funcionários de um serviço novo e sempre no respeito pelas liberdades individuais, dentro do chamado bom senso. O que me choca é o tratamento noticioso dado a esta questão, fazer desta questão uma notícia de primeira página ou justificativa de um jornal televisivo nos tempos que correm, não tem justificação. Vai na mesma linha de muitos dos comentários já publicados on-line. Falam de controlo, referem-se a véus e a outras pérolas de melhor gosto ainda, sobre as saias e os decotes.
Não haverá coisas mesmo importantes?

A SÉRIO?

Embora pareça contraditório com o facto de sermos um povo assim a atirar para o triste, os estudos comparativos sugerem tal ideia, existe uma expressão que nos é muitíssimo familiar mas sugestiva de que muito do que está à nossa volta é a brincar. Trata-se da recorrente expressão “a sério?”, significativa de incredulidade e desconfiança. Entre tantas formulações alternativas, logo recorremos a algo que nos certifique de que o nosso interlocutor não está a brincar. A ver pela frequência de utilização, não dá para perceber como somos o tal povo tristonho. Alguns exemplos do quotidiano político recente.
O governo aceitou sugestões legislativas da oposição. A sério? A oposição aplaudiu uma iniciativa do governo. A sério? As autarquias estão bem geridas. A sério? O governo já tomou as medidas necessárias para resolver o problema. A sério? Na recente crise dos medicamentos, todos os envolvidos estão preocupados com o bem-estar dos utentes. A sério? Temos a maior central fotovoltaica do mundo e o maior parque eólico da Europa, isto corresponde a uma estratégia do governo, porque o governo tem uma estratégia. A sério?
Em termos mais pessoais, a situação é do mesmo tipo.
Adoro-te. A sério? Estou cansado de trabalhar. A sério? Estou um bocado preocupado. A sério? Essa roupa fica-te bonita. A sério? Pai, as notas subiram. A sério? João, podes continuar a brincar. A sério?
Com esta necessidade compulsiva de nos certificarmos de que o outro não brinca parece, de facto, estranho como nos consideram um povo triste.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

AS LISTAS

O aproximar das eleições implica um dos mais deprimentes espectáculos que a política à portuguesa nos proporciona, dá pelo nome de “as listas”. De facto a constituição das listas é, normalmente, um processo ilustrativo da nossa cultura política. Esta situação envolve todos os partidos, sobretudo, os que aspiram ao chamado arco do poder. Vejamos o caso da lista para as europeias. No PSD, numa manobra desconcertante da Dra. Manuela Ferreira Leite, sabe-se, ela afirmou-o, que o nome do cabeça de lista será divulgado ainda antes das eleições mas as referências aos elementos integrantes são mais que muitas enquanto as ideias e projectos são menos que poucos. No PS, depois de conhecido o nome de Vital Moreira outro homem “simpático e inteligente” que vai adaptando as suas ideias ao tempo, os outros elementos entre premiados e acomodados, são os suspeitos do costume. Gente disponível para se sacrificar é mais que muita enquanto ideias e projectos são menos que poucos, para além do apoio patriótico a esse homem “simpático e inteligente” chamado Durão Barroso. Ontem ficámos a saber que o Dr. Portas, numa perspectiva de renovação, avança os nomes de Nuno Melo, Diogo Feyo e Teresa Caeiro, ilustres desconhecidos no CDS-PP dispostos ao sacrifício em nome dos superiores interesses nacionais e do partido, ou seja, a capacidade de sacrifício é mais que muita enquanto ideias e projectos são menos que poucos.
Há umas semanas atrás foi divulgado um trabalho que tentava mostrar a actividade desenvolvida pelos eurodeputados portugueses no Parlamento Europeu. A grande excepção era Carlos Coelho do PSD, a esmagadora maioria dos outros não fez rigorosamente nada de significativo, intervenções, propostas ou relatórios. Depois estranha-se o nível de abstenção.

O RAPAZ QUE VIVIA NO FUTURO

A minha adolescência aconteceu na segunda metade dos sessenta. Alguns lembrar-se-ão, eram tempos social e culturalmente fechados, sombrios, para muitos de nós. O que acontecia fora, ideias, tendências, cultura, etc., dificilmente chegava à maioria das pessoas e o pouco que conhecíamos surgia, invariavelmente mais tarde. No entanto, este cenário, não se aplicava ao meu amigo Zé Manel. Nunca percebemos como, naqueles tempos não era fácil, mas o Zé Manel andava sempre mais à frente que nós. Falava-nos de ideias, factos ou modas que estavam a desenvolver-se no estrangeiro e que só algum tempo depois, e nem sempre, nós conhecíamos. Mostrava-nos música, nomes para nós desconhecidos, que só mais tarde se ouviam, nem todos, de forma mais alargada. Usava roupa diferente de nós, enfrentando a reprovação activa de muitos adultos. Quando lhe perguntávamos como tinha acesso a tudo aquilo, respondia entre o gozo e o mistério, “eu vivo no futuro”, quanto maior era a nossa curiosidade, mais o Zé Manel insistia, “vivo no futuro, as coisas lá são assim”. O final do liceu separou-nos, a alguns até geograficamente. Nunca mais vi o Zé Manel. De vez em quando, perguntava a antigos companheiros se sabiam dele. Estranhamente, ninguém soube mais nada, nunca.
Será que o Zé Manel foi, definitivamente, viver para o futuro? Ele parecia tão pouco interessado no presente.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

ATROPELAMENTO E FUGA

Passou de forma relativamente discreta a divulgação do Relatório sobre sinistralidade rodoviária em 2008 produzido pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária. Do conjunto de dados referidos, parece-me de registar alguns indicadores relativos a atropelamentos, acidente menos publicitado. Em 2008, verificaram-se menos atropelamentos e um ligeiríssimo (1 caso) abaixamento do número de vítimas mortais, Das vítimas mortais 13% foram atropeladas em passadeiras e também cerca de 13% em cima de passeios. Estes dados são, só por si, significativos de alguma das nossas “particularidades” em matéria de condução rodoviária.
No entanto, o dado que mais me impressionou foi a subida do número de atropelamentos com fuga do condutor envolvido e o aumento das vítimas mortais neste tipo de situações. De facto, em 2008 registaram-se em 426 atropelamentos com fuga que causaram 13 mortos. Que raio de sociedade nós criámos onde cabe o atropelamento e fuga. Dirão alguns que, em certos casos, esse comportamento decorrerá do pânico em que o condutor possa entrar. Não pode justificar-se assim, mas o condutor poderá sempre voltar, mesmo passado algum tempo, e assumir o acidente.
Não, atropelamento e fuga é, como outros comportamentos, o bater no fundo em matéria de irresponsabilidade individual e de ausência de valores respeitadores do outro.

O SUPREMO INTERESSE DO UTENTE. SERÁ?

Desencadeada a crise do remédio tentei ficar no meu canto a ver se percebia o quadro. A explicação que me parecia mais evidente e óbvia seria “isto trata-se de dinheiro e poder”. Depois pensei um pouco mais, ia vendo os desenvolvimentos e repensei, “não pode ser dinheiro e poder, estamos a falar do supremo interesse do utente”, deve ser outra a explicação. Neste momento continuo sem entender e por isso recorro à vossa ajuda. Vejamos alguns pontos.
O medicamento genérico é mais barato que o de marca. Certo ou errado? Certo, parece.
Quer os medicamentos de marca, quer os genéricos só chegam ao mercado depois de testada a sua qualidade terapêutica e controlados os riscos de efeitos secundários. Certo ou errado? Certo, parece.
Nos outros países a quota de mercado dos genéricos é maior que em Portugal e não se verifica perda de qualidade no apoio terapêutico aos cidadãos. Certo ou errado? Certo, parece.
O estado que comparticipa no preço dos medicamentos adquiridos pelo utente pouparia milhões de euros com a maior utilização dos genéricos. Certo ou errado? Certo, parece.
Os médicos podem optar pela prescrição de genéricos ou de marca. Se fosse uma questão de qualidade, por questões científicas, éticas e deontológicas a questão da opção não se colocava, seria sempre pela qualidade. Certo ou errado? Certo, parece.
Os utentes, sobretudo os de menores rendimentos e os mais idosos poupariam significativamente com a prescrição de genéricos. Certo ou errado? Certo, parece.
Existe uma relação entre a prescrição de medicamentos por parte dos médicos e os apoios à classe disponibilizados pelos laboratórios. Certo ou errado? Certo, parece.
Existem fortíssimos interesses comerciais na produção e distribuição de medicamentos a que a holding Associação Nacional de farmácias sob a liderança do Dr. João Cordeiro não é alheia. Certo ou errado? Certo, parece.
O estado não permite que na farmácia se substitua o genérico pelo de marca, gasta mais, o utente também gasta mais apenas porque o médico decide, relembremos que sem ser por exclusivo critério científico pois poder optar significa que a qualidade terapêutica estará assegurada.
Já chega. Estão a ver porque é que continuo a não entender a crise do remédio, alguém me ajuda.

VER AS NOTAS

Não sei o que se passava convosco, na minha vida escolar de miúdo, portanto há muitos anos, existia um momento que, ciclicamente, me criava uma sensação entre o receio e a esperança excitada. Esse momento desencadeava-se quando o meu pai inquiria, “já foste ver as notas?”. Como é óbvio, ainda não sabíamos que a net iria ser inventada uns anos mais tarde, pelo que se tratava de ir à escola, procurar a vitrina certa e …ver as notas. Para mim, aluno que me escondia num discreto e económico intervalo entre o 8 e o 12, passando, sempre que podia, “cortado” a alguma disciplina não era, de facto, um momento fácil como assistir às aulas, portar-me mal ou, até, fazer testes, o que sabia, fazia, o que não sabia, não chegava a ser uma preocupação. Ver as notas era, assim, algo que produzia alguma ansiedade, felizmente apenas se verificava três vezes por ano.
Por um lado, ia com receio de que se confirmassem as negativas que os meus resultados e os injustos e pouco generosos “setores” antecipavam. Muitas vezes confirmavam-se, o que me transportava para o passo seguinte, a “trepa” do meu pai. Esta parte da conversa acabava numa sempre renovada promessa de mais esforço e atenção nas aulas em que o meu pai, é para isso que servem os pais, acreditava, eu acho que ele acreditava mesmo. Era um homem bom e eu, passe a imodéstia, era convincente.
Por outro lado, ia com esperança de que as positivas correspondessem às minhas contas, sempre inflacionadas. Como sabem, a gente nova é optimista, é certo que há quem lhe chame irresponsabilidade e inconsciência. Mas sempre havia umas positivas que, no resto da conversa com o meu pai, depois de “ver as notas”, eu esticava no valor e na importância tentando mascarar as negativas. O meu pai, é para isso que servem os pais, lá mostrava um contentamento no qual, era a minha vez, eu acreditava.
Esta conversa vem do facto de ontem ao passar em frente de uma escola aqui da zona, ter visto pai e filho, pareciam, sair de um carro e ouvir o pai, enquanto puxava de um cigarro, “vai lá ver as notas”.
Apeteceu-me voltar a ir “ver as notas” e, a seguir, ter a conversa do costume com o meu pai.

terça-feira, 7 de abril de 2009

CHOCANTE? PORQUÊ?

O Dr. Mário Soares acha “chocante” o facto de um homem “inteligente e simpático”, Durão Barroso, depois de ter um discurso de admiração e apoio a Bush, por exemplo aquando da famosa cimeira das Lages, venha agora fazer o elogio de Obama, ou seja, o homem “inteligente e simpático” elogia e apoia uma coisa e o seu contrário. O Dr. Soares acha isto chocante. Devo dizer que fiquei chocado com o choque do Dr. Soares. Vejamos. O Dr. Barroso, formou-se, como muitos, na escola do MRPP, empregou-se na social-democracia, PSD, e pós-graduou-se em neo-liberalismo com a administração Bush. Temos vários exemplos deste tipo de deriva realizado por outros homens “inteligentes e simpáticos” como José Manuel Fernandes ou Génio Pacheco Pereira. Isto explica a capacidade de aprendizagem e flexibilidade do homem “inteligente e simpático”. Ora são exactamente estas qualidades que o convocam ao elogio a Obama, é o que está a dar. O homem “inteligente e simpático” quer continuar a presidir à União europeia e, portanto, a enorme, genuína e antiga admiração por Obama. Não percebo ainda o choque de Mário Soares quando é público que o Eng. Sócrates apoia, aliás, a continuidade do homem “inteligente e simpático”.
O Dr. Soares, um homem de larga experiência política e um dos paradimas de "flexibilidade", deveria saber que os tempos estão para os homens “inteligentes e simpáticos”, sobretudo os que não têm espinha.

O FUNCIONAMENTO EM REDE

O funcionamento em rede é uma das características das sociedades modernas. Nós os portugueses somos pioneiros neste modelo de funcionamento. Esta convicção e confiança nos modelos em rede começou por desenvolver-se no interior das famílias e desenvolveu-se no sentido de alargar o seu âmbito de funcionamento. Uma das áreas que mais me impressiona desta adesão aos modelos em rede, remete para a nossa relação com a administração fiscal. Vejamos alguns dos inúmeros exemplos. As facturas de gasolina que arranjamos uns para outros, os preços diferentes que os bens e serviços têm consoante impliquem, ou não, os respectivos recibos, os esquemas de tipo carrossel para fugir ao IVA, o biscate não declarado com a cumplicidade do cliente, os bens colocados em nome de familiares ou amigos (sobrinhos na Suíça, por exemplo), a venda (fictícia por vezes) de bens para evitar penhoras por dívidas fiscais que agora começaram a ser mais fiscalizadas (2270 em menos de um mês), etc. O limite é a criatividade que, como sabemos, não é pequena.
Acho de uma injustiça tremenda o não reconhecimento, por um lado, do pioneirismo do recurso à rede e, por outro lado, o desenvolvimento e contínuo aperfeiçoamento deste modelo com constantes e eficazes adaptações que nos transformam numa das mais eficazes sociedades europeias em matéria de cumplicidade e solidariedade na fuga ao fisco.

VAI-SE ANDANDO

O português, como língua riquíssima que é, tem um conjunto de expressões, do mais simples ao mais sofisticado, que são muito particulares. Algumas destas expressões são, creio, definidoras de nós portugueses enquanto povo. Uma das que mais gosto é a fórmula “vai-se andando”, com ligeiríssimas variações. Um português que se preze ao ser inquirido sobre o seu estado de alma, ou de qualquer outra dimensão, nunca responde com um assertivo e convicto “bem” ou “mal”. Com aquele jeito entre o fado, a resignação e a paciência, ouve-se “vai-se andando”.
Então a saúde? Vai-se andando e tu? Vou andando.
Tudo bem com o trabalho? Vai-se andando e tu? Vou andando.
E ela, está boa? Vai andando e a tua mulher? Vai andando.
Que achas da desta crise? Temos que ir andando.
Os miúdos? Vão andando e os teus? Vão andando.
Então que achas das cenas da política? Vai andando como de costume, não muda nada.
Ela partiu, acabou-se. E tu? Tenho que ir andando.
Com estes exemplos dá para perceber que nós não nos movemos, vamos andando, não andamos, vamos andando, não amamos nem odiamos, vamos andando, não sofremos nem vibramos, vamos andando.
E o País? Vai andando.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

O POVO ATRAPALHA, ARREDE-SE O POVO

Um dos tiques de autoritarismo e espírito anti-democrático mesmo em sociedades formalmente democratas é a confusão entre interesse público e interesses particulares e criação de dificuldades a que os cidadãos intervenham na defesa do que entendem ser o interesse público. O Dr. Jardim, em mais uma decisão reveladora do seu particular entendimento sobre democracia, vem encurtar até ao limite do exequível o prazo das acções populares que possam contestar junto do Ministério Público decisões sobre construções ou loteamento, passando de 10 para 3 anos, notável. O Dr. Jardim acha que estas coisas de contestar interesses particulares só atrasam o desenvolvimento, o povo não sabe, naturalmente, o que é, de facto, o interesse público e, portanto, arreda-se o povo.
O discurso do costume sobre o Dr. Jardim dirá que não se estranha, é o habitual, trata-se do seu peculiar estilo, etc. Isto é tudo verdade mas também é verdade que alguém dos órgãos de soberania da Republica deveria ser lesto a condenar. Só não percebo é de que têm medo.

GENEROSIDADE TOCANTE

Não há dúvida, somos um povo generoso. Sabendo como está difícil a vida para a banca, a administração fiscal entendeu por bem deixar prescrever cerca de 3,7 milhões de euros devidos pela correcção do IVA. Algumas vozes, com a demagogia do costume, virão a terreiro protestar contra esta medida de apoio a um sector tão cheio de problemas e que precisa de toda a nossa solidariedade. Não entendem certamente a necessidade destes apoios. Alguns virão até dizer que face aos contribuintes individuais a máquina fiscal não é tão generosa, veja-se o recente exemplo de fiscalização rigorosíssima das declarações fiscais dos pensionistas, que está muito certa, são pessoas já não trabalham, têm pensões altíssimas, é justo que paguem para que existam recursos. Ignorância e falta de valores correctos, uma sociedade solidária deve ser isso mesmo, solidária. Se nós cidadãos, que temos uma das maiores cargas fiscais da Europa, não ajudarmos a administração fiscal disponibilizando até ao último cêntimo que nos é exigido por leis fiscais justas e generosas, como é que pode haver recursos financeiros para ajudar sectores ou instituições em crise como a banca.

domingo, 5 de abril de 2009

ENRIQUECIMENTO ILÍCITO? NÃO, UMA TIA QUE VENDIA RISSÓIS

Como o Dr. Canas muito bem sabe, existem variadíssimos especialistas que sustentam a viabilidade constitucional da introdução do crime de “enriquecimento ilícito”. Muitos países contemplam essa figura e não consta que nesses países os direitos individuais dos cidadãos estejam mais desprotegidos do que em Portugal. Com uma ajustada redistribuição do ónus da prova e sem ferir, obviamente, a presunção de inocência é possível, se houver vontade política, combater situações bem conhecidas de gente que quando começou a desempenhar cargos públicos tinha um património conhecido na comunidade e que, passado alguns anos (alguns mandatos), são possuidores de um vastíssimo conjunto de bens que, como se sabe, foi herdado de uma tia velha que vendia croquetes e rissóis às vizinhas e ao café Estrela, lá na terra.
A questão central é a hipócrita inexistência de vontade política no PS, agora do PS pois já tocou a outros que foram governo, de alterar a situação. Veja, aliás, o tratamento dado às propostas de João Cravinho e, até, ao próprio João Cravinho. Enquanto isto, continuamos a aceitar um enorme grupo de “presumíveis inocentes” cheios de bens que não tinham e que os rendimentos não justificam, que estão a rir-se dos “pruridos” constitucionalistas de gente sem espinha e sem vontade real de combater a corrupção.

AS FALTAS DOS "GAJOS", DOS DEPUTADOS

Se existe em Portugal uma marca distintiva da nossa vida política é a confiança que o cidadão comum tem na classe política. Basta atentar em sucessivos e recentes trabalhos para perceber que a classe é, recorrentemente, a que merece menos confiança e credibilidade. É verdade que a classe, em Portugal mais conhecida pelos “gajos”, bem se esforça para não perder esse privilégio, a mais absoluta falta de confiança dos seus concidadãos, estranhamente, os seus eleitores. De entre os “gajos”, o povo tem especial apreço pelas virtudes dos deputados, trabalhadores, intervenientes, uma vida de sacrifícios, horários arrasadores, artroses de tanto levantar e sentar nas votações, problemas das cordas vocais pela frequentes intervenções que todos fazem, reformas miseráveis, insultos dos colegas de outras bancadas, etc., etc. Pois estes “gajos” resolveram alterar o seu regime de presença e faltas. Por iniciativa do chefe dos “gajos” o Dr. Jaime Gama, um grupo liderado por essa figura maior do mundo dos “gajos”, o Dr. José Lello, apresentou e fez aprovar pela maioria dos “gajos” um regulamento em que nos primeiros cinco dias de falta “A palavra do deputado faz fé, não carecendo por isso de comprovativos adicionais”. Embora o novo regulamento venha com um glossário a explicar o que se deve entender por “palavra do deputado”, o “gajo”, José Lello, inquirido sobre esta situação de privilégio respondeu que “os regimentos e as resoluções da AR ainda não são mobilizados pela imprensa”. A arrogância do “gajo” não tem fim e confia, como sempre, que a gente manda vir com os “gajos”, mas na volta, a troco de uns bifinhos com cogumelos e uns passeios de autocarro lá vai, de novo e sempre, votar nos “gajos”. Um dia, o pessoal cansa-se. Então os “gajos” vão ver.

sábado, 4 de abril de 2009

SOBRE O AZEITE

Não me lembro se vos disse na altura, creio que sim, este ano foi muito mau de azeitona aqui no meu Alentejo. Aproveitei um balde para conserva mas não entreguei um quilo para azeite. O que ainda tinha do ano anterior está a acabar pelo que hoje fui ao lagar. De acordo com o Mestre Luís, o ano foi muito fraco de quantidade mas o azeite é de boa qualidade. E é, a prova confirmou-o. Ficámos um bocado na conversa sobre o azeite que se come e os preços que se praticam. Como sabem, encontramos azeite muito barato e também extremamente caro. O Mestre Luís esteve então a explicar como se conseguem produzir matérias a que chamam azeite. Não vos vou reproduzir as receitas, até porque não tenho a certeza se entendi tudo, mas que fiquei assustado, fiquei. O tratamento, os produtos e as misturas feitas, de acordo com o meu interlocutor, levam a que, de facto, se esteja a consumir uma espécie de azeite, e não azeite.
Este azeite que fui buscar ao lagar e que já se usou para o almoço deixou-me reconfortado.

GRAN TORINO

Não é matéria que traga aqui com regularidade, a referência a figuras ou personagens não portuguesas. Mas hoje tem de ser. Estive a ver o imperdível Gran Torino, o último filme de Clint Eastwood, que, como tem acontecido, é também o actor principal para além de realizador e até de co-autor de uma das mais bonitos temas musicais do cinema dos últimos anos, também com o nome de Gran Torino.
Quando Camões enunciou a fórmula da eternidade, “aqueles que por obras valorosas se vão da lei da morte libertando” conhecia certamente Eastwood, os génios eternos devem-se encontrar-se algures para conversarem sobre as suas obras valorosas.
Quando se olha para este homem, Eastwood, fica-se, acho eu, com a sensação de que o conhecemos desde sempre, é verdade face à longevidade e de que o conheceremos para sempre, é verdade pela genialidade. Como actor, Eastwood faz parte daquele grupo restritíssimo que em cada personagem emana uma força que nos empurra para o fundo da cadeira do cinema e não nos deixa levantar no fim do genérico, precisamos de recuperar.
Figuras como Clint Eastwood têm ainda a notável capacidade de nos fazer sentir pequenos, podemos admirá-las mais à vontade.