AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

QUE 2009 NOS TRAGA (II)

Nesta circunscrita tentativa de perceber os anseios do Portugal que cabe no meu bairro, aqui ficam mais alguns registos.
O Sr. Silva, empregado bancário. “Com estas coisas que estão a acontecer com o banco o meu desejo é que não sobre para mim. Os grandes é que se orientam e os pequenos, como eu, é que ouvem as pessoas e ainda podemos ficar sem emprego, eles ficam sempre bem. Vamos a ver se isto se compõe.”
O Joca, aluno da C+S, que até nem é dos piores (não faz filmes com o telemóvel dentro da sala de aula para pôr no You Tube). “Meu, havia de se resolver aquela cena dos setores com a ministra. Pá, preciso de me safar no 9º, pá queria continuar a estudar mas dizem que o people com curso não arranja empregos. Pá, agora tá-se bem, mas depois, não sei, tás a ver.”
D. Manuela, professora em guerra com a ministra. “Olhe, nunca pensei, depois de uma vida dedicada às crianças só quero que me dêem a reforma que já solicitei. Tenho pena de quem ficar, mas para mim acabou-se. Saio com muita pena e revoltada com a ministra, tratou-nos muito mal”.
A Lina, como diz o Cajó, gaja boa todos os dias. “O meu grande sonho para 2009 é que me chamem para um casting em que me inscrevi para uma novela, da TVI. Já fui uma vez ao programa do Sr. Goucha e disseram-me que tenho muito jeito para a televisão”.
A D. Júlia, velhota só e residente na sala de espera do Centro de Saúde. “Olhe, na minha idade já queremos pouca coisa. Precisava de um aumentozinho na pensão que mal chega para os medicamentos que são muitos, e que pudesse mexer-me sozinha para poder vir à consulta, é que eu sou uma pessoa muito doente”.
O Sr. Lopes, pessoa que acredita. “Os meus votos para 2009 é que haja muita saúde para todos, que os partidos se entendam para que os nossos governantes façam um bom trabalho. Eu acho que se todos dermos as mãos o país vai para a frente”.
O Sr. Óscar, protestante compulsivo. “Para 2009 eu queria é que estes gajos todos fossem dar uma curva. Não há nada de jeito, ninguém faz nada, é cada um por si. Olhe aqui para o bairro, vê alguma coisa boa? Nada. O pessoal quer é encher-se, só a mim não me toca nada, eu bem jogo no euromilhões, mas nem aí ganho nada, ganda cambada”.
A D. Teresa, pessoa deprimida. “Os meus desejos para 2009? Olhe, para lhe dizer a verdade, nem ligo nada à passagem de ano. Às 10 horas meto-me na cama, eu não tenho cabeça para estas coisas. A vida é muito difícil, não paro de pensar nela mas não melhora nada, é o destino, cada um é para o que nasce”.
Já agora o meu desejo.
Que o ano vos seja leve.

AFINAL NÃO É PERFEITO, FUMA

Estou bastante mais descansado. Fiquei a saber hoje pelo DN que Obama não é perfeito. Provavelmente já o deveria saber, mas a maior figura emergente neste princípio de século fuma. Não é perfeito, além disso é americano, o que nestas coisas de tacaco não é despiciendo. No entanto, parece, o Enorme Obama já foi tratando de dizer que poderia deixar o vício (um vício? Em Obama?) para agradar a Hillary Clinton, que raio de motivo. Gostei mais de saber que admite a possibilidade de, de vez em quando, fumar um cigarrito nos jardins da Casa Branca. Ainda bem.
Gosto de pessoas normais.

AGORA A OBESIDADE

Os resultados agora apresentados pelo Ministério da Saúde relativamente ao tabagismo são encorajadores e positivos. O Governo deve encarar agora um outro grande problema de saúde pública, a obesidade que, como é sabido afecta milhões de portugueses, sendo já nas crianças e adolescentes um problema grave. Com um Primeiro-ministro tão elegante e saudável parece-me uma exigência.
Creio que a estratégia deverá ser outra. Contrariamente ao que se fez com o tabaco, não se pode proibir as pessoas de comer, embora com o suporte de alguma legislação já existente, a ASAE esteja a dar uma ajuda ao fiscalizar e proibir o acesso àqueles produtos tradicionais, caseiros, autênticas bombas calóricas. As chamadas campanhas de sensibilização parecem genericamente ineficazes. Assim, e porque importa de facto tornar os portugueses mais elegantes e saudáveis, aproveitando também os tempos difíceis que atenuariam o impacto de algumas medidas, poderia considerar-se a título de sugestão.
Aumento do ISP. Com combustíveis mais caros teríamos de baixar o uso do automóvel. A maior utilização de transportes públicos também seria vantajosa pois proporcionaria sessões de sauna sempre proveitosas.
Aumento do IVA sobre os produtos alimentares. Parece-me óbvio o impacto que esta medida teria no acesso a estes bens.
Uma outra medida importante poderia ser a limitação significativa na atribuição de carro a funcionários e colaboradores, quer no sector público, quer no sector privado.
Na avaliação dos trabalhadores, também dos sectores públicos e privados, estaria contemplada a atribuição de prémios de emagrecimento. A legislação laboral poderia ainda prever a obrigatoriedade de uma paragem diária de 30 minutos para exercício físico a controlar pelas chefias.
Devido às dificuldades financeiras do SNS, poderia pedir-se à Catarina Furtado e à Bárbara Guimarães a realização de uma campanha apelando à responsabilidade social das empresas, motivando-as para a oferta de bandas gástricas aos gordos mais pobres.
Embora este tipo de medidas não sejam propriamente populares, o ímpeto reformista do Governo seria capaz de as levar por diante, com o aliciante bónus do aumento de receitas fiscais.

NÃO SOU ASSIM TÃO VELHO, NEM DO RESTELO, MAS ...

Num país cuja cultura se regesse por padrões razoáveis, sublinho razoáveis, de ética e transparência, a simplificação e desburocratização de procedimentos poderia ser uma boa notícia. No entanto, em Portugal, o ajuste directo, portanto sem concurso, de obras ou aquisição de serviços ou bens por parte do Estado, mesmo com um tecto de 5,1 milhões de euros, assusta-me. É conhecida a promiscuidade entre poder autárquico e central, interesses empresariais, caciquismo e sindicalização de votos. O ajuste directo constitui uma bela ajuda a este quadro. É certo que a decisão se apresenta disfarçada de “apoio à economia” em tempos de crise. Tudo agora parece feito em nome desta miragem salvadora, “o apoio à economia”.
Porque não simplificar ao máximo os procedimentos processuais, mas não abdicar do concurso? Seria uma forma de regular a”gestão de interesses”.

OS VOTOS DA CLASSE POLÍTICA (PARTE SEGUNDA E ÚLTIMA)

Conforme tinha prometido deixo-vos os desejos para 2009 de mais algumas personalidades políticas que tiveram a amabilidade de nos confiar esses tão íntimos pensamentos.
A Sra. Ministra da Educação. “Vou confessar um sonho. Gostava de uma educação em que só existissem as crianças (sem aqueles horrorosos que atiram ovos), os Drs. Valter Lemos, Jorge Pedreira e Margarida Moreira, da Direcção Regional de Educação do Norte. Como os pais são muito importantes, também gostava que continuasse o Dr. Albino Almeida. Gostava ainda de receber mais cartas tocantes dos meninos que recebem os Magalhães e prometem inscrever-se no PS. No meu sonho, as crianças aprendiam sozinhas, não precisavam de professores e eu já não teria de ver a cara daquele Mário Nogueira. Mas é mesmo um sonho”.
O Dr. Luís Filipe Menezes. Quando o interpelámos, o Dr. Menezes com aquele seu jeito de Calimero e uma lágrima ao canto do olho confessou. “Desejava um congresso extraordinário do PSD para eu tentar, de novo, ser presidente do partido. Agora já saberia como resistir ao barbudo da Cavalgadura do Círculo, levava o Marco António”.
O Dr. Alberto João. “Olhe, eu queria para 2009 era ver-me livre desses f … da p … desses socialistas chefiados pelo Sr. Pinto de Sousa e dos colonialistas de Lisboa. E se calhar ainda tenho que ir a Lisboa meter na ordem os meninos copos de leite e os barões que estão a tomar conta do PSD”.
O génio, Dr. Pacheco Pereira. “Se bem se recordam, fui o primeiro a antecipar que depois de 2008 viria 2009 e por isso sinto-me à vontade para dizer o que vai acontecer. A Dra. Ferreira Leite ganha as eleições. Apesar desse mito inventado pela comunicação social de que Dra. Ferreira Leite não tem ideias, não é verdade, tem, são minhas, portanto, boas e suficientes para ganhar ao Primeiro-ministro. Não devia dizer, mas, como sabem, digo sempre tudo, desejava que o Dr. Santana Lopes não ganhasse a Câmara de Lisboa”.
Encontrámos juntos os Ministros Mário Lino e Manuel Pinho que nos confidenciaram o mesmo desejo, “Que o nosso querido líder, o Sr. Primeiro-ministro, nos deixe acabar a legislatura, gostamos tanto de ser ministros, até temos andado muito calados”.
O Professor, o Marcelo. “Antes dos livros, para 2009 gostava de manter a genialidade e infalibilidade das minhas análises, comentários e cenários políticos. Aquela de primeiro achar mal a candidatura de Santana Lopes a Lisboa e depois já achá-lo o melhor candidato? Mais uma prova da minha agilidade intelectual e capacidade de análise”.
Depois de aqui chegar, por aqui vou ficar, é demais.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

MAIS UMA FORÇA DE BLOQUEIO

Segundo o INE, a carga fiscal dos portugueses aumentou pelo terceiro ano consecutivo atingindo o nível mais alto dos últimos treze anos. Provavelmente distraído com os preparativos da passagem de ano, o Ministro Santos Silva ainda não veio desmentir os dados do INE que, como é sabido, quer dizer Instituto da Nova Esquerda, e será já o produto da “reconfiguração da esquerda” iniciado em “pas de deux” por Louçã e Alegre. Assim, a divulgação destes dados inscreve-se na oposição que nunca mais percebe que não devia ser oposição. Depois do desmentido de Santos Silva, virá o inevitável Vitalino Canas sublinhar que os dados trabalhados pelo INE não correspondem aos reais, ou seja, aos do Governo.
Como já aqui referi, aproximando-se eleições, o Governo precisa de cobrar para depois distribuir e contribuir de forma generosa para ajudar a formar as consciências eleitorais, por isso, esqueçam a questão dos impostos mais baixos.
Já me esquecia. Estamos a falar de “interesses partidários de ocasião”. Onde é que já ouvi isto?

O SUPREMO INTERESSE DOS "INTERESSES PARTIDÁRIOS DE OCASIÃO"

Já ontem aqui manifestei a minha perplexidade pelo facto do Presidente da República atribuir a interesses partidários de ocasião o problema em torno do Estatuto do Açores. Como se fosse possível no nosso modelo e cultura política, uma partidocracia, verificar-se outro critério a informar quase em exclusivo a acção política, ainda que estes interesses partidários se mascarem, nas mais das vezes de forma desajeitada e até desrespeitadora da inteligência do cidadão, sob o manto do “supremo interesse nacional”. Vejamos dois bons exemplos deste quadro. O primeiro, em declarações recolhidas pelo Público o Dr. Santana Lopes, um paradigma de consistência política, defende a dissolução da Assembleia da República. Ele não disse mas presumo que a sua posição é ditada pelo supremo interesse nacional e não tem nada, mas mesmo nada, a ver com “interesses partidários de ocasião”, tal como a posição do PSD nesta matéria e, também, relativamente à situação na Madeira. O segundo exemplo remete para as declarações de Carlos César, líder do PS nos Açores. Defende o Sr. Dr. que a promulgação do Estatuto defende, claro, o supremo interesse nacional. E nós ficámos mais descansados pois a sua posição não tem nada, mas mesmo nada, a ver com interesses partidários de ocasião.
É por isso, que se o povo acreditasse no Pai Natal, teria pedido uma classe política nova. A que temos, na sua esmagadora maioria, não merece credibilidade.
PS - Para acentuar esta ideia vejam as declarações do inenarrável Menezes, estão fresquinhas no Público

OS VOTOS DA CLASSE POLÍTICA (PARTE PRIMEIRA)

Numa prova de humildade, parte da nossa elite política acedeu a confessar-nos alguns dos desejos que gostariam de ver realizados em 2009. Com os devidos agradecimentos, aqui fica o registo.
O Primeiro-ministro. “Desejo que em 2009 os portugueses e as portuguesas reconheçam a excelência, a competência e o ímpeto reformista do governo e nos dessem maioria absoluta. São os meus votos, que os portugueses me dêem os seus. Como todos reconhecerão sou um homem de diálogo mas uma maioria parlamentar liderada por Alberto Martins é de um valor inestimável”.
O ministro Pedro Silva Pereira. “Desejo que em 2009 os portugueses e as portuguesas reconheçam a excelência, a competência e o ímpeto reformista do governo e nos dessem maioria absoluta. Como todos reconhecerão sou um homem de diálogo mas uma maioria parlamentar liderada por Alberto Martins é de um valor inestimável. Foi o que disse o Eng. Sócrates? Pois é também o meu desejo que o governo é coerente”.
Manuel Alegre. “Como é sabido nunca me calei, tenho comigo os portugueses e portuguesas que votaram nas presidenciais e já disse, quero reconfigurar a esquerda”.
O ministro Santos Silva. “Para 2009 desejo que a oposição, perceba de uma vez por todas que não deve opor-se ao governo, estão sempre contra”.
O Dr. Mário Soares. “Em 2009 enfrentaremos na o PCP na batalha pela democracia ... Foi em 1975? Bom, por vezes já confundo a história, de qualquer forma é preciso que a democracia não adormeça”.
A Dra. Manuela Ferreira Leite. “(loooooonguíssimo silêncio). Creio que fui clara, sem ironias“.
O Dr. Portas, o Paulo. “O meu maior desejo é que as eleições cheguem depressa, logo três. Quantas feiras e quantas vendedoras para os beijinhos. Já comprei um boné novo, assim daqueles da lavoura”.
O Dr. Francisco Louçã. “Desejo que o Governo deixe de apoiar os bancos e as bancas, os banqueiros e as banqueiras e apoie os famílios e as famílias. De resto, lutaremos pelas habituais causas fracturantes".
O Sr. Jerónimo Sousa. “Pois camaradas, que o PCP continue a ser o grande partido que é, dos homens e das mulheres deste país, a conduzir a luta dos trabalhadores e das trabalhadoras contra os interesses do grande capital e deste governo que se diz socialista mas é de direita”.
O menino guerreiro, Santana Lopes. “Com toda a franqueza gostava de ganhar a Câmara de Lisboa, o problema é para onde vou fugir depois, talvez para vereador em Gaia”.
O Presidente da República. “Os meus votos, perdão, o presidente não fala em votos, os meus desejos é que, pelo menos em alguma coisa que eu discorde, a maioria parlamentar me dê razão, afinal tratar-se-ia de cooperação estratégica”.
Ainda recolhi mais alguns depoimentos que, provavelmente, vos farei chegar.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

INTERESSES PARTIDÁRIOS DE OCASIÃO. WHAT ELSE?

Sobre interesses partidários de ocasião falou o Presidente da República na comunicação de hoje, para, na sua opinião, justificar o comportamento do Parlamento relativamente ao Estatuto Político-Administrativo dos Açores. As reacções dos partidos, designadamente do Dr. Canas, “His master’s voice” foi no sentido de contestar a existência e peso destes “interesses partidários” e o Dr. Rangel, líder parlamentar do PSD que votou a favor do Estatuto duas vezes e na terceira se absteve, vem falar da atitude de guerrilha partidária do PS para com Cavaco Silva.
Devo confessar que fico perplexo. Num sistema e numa cultura política assente na partidocracia que mais haverá para justificar posições políticas do que, obviamente, “interesses partidários de ocasião”. Estranho é que o Presidente, já com experiência de liderança partidária, venha agora, com discurso de virgem ofendida, queixar-se desses interesses.
Se como disse o Presidente, esta questão, compromete o regular funcionamento das instituições, então deveria assumir as consequências, dissolução do Parlamento. Mas isto levantaria, provavelmente, uma grande questão sobre “interesses partidários de ocasião”.

BORDA D'ÁGUA (II)

Conforme prometido e depois do descanso devido ao enorme esforço de prever aqui ficam as últimas notas sobre o que, na minha modesta opinião, nos espera em 2009.
. Creio que o preço dos combustíveis continuará indexado ao preço do barril de crude o que em português quer dizer, quando o barril sobe 1, o combustível sobe 3 no consumidor e quando o barril desce 3, o combustível desce 1 no consumidor.
. Parece-me também possível que aumente a produção cinematográfica portuguesa sobre o universo educativo com obras do tipo “A terrorista do telemóvel” ou, o mais recente, “Dá-me nota positiva senão levas um tiro”, produtos bem recebidos pela crítica.
. Creio que 2009 será finalmente o ano do Modelo, não sei bem qual, mas certamente haverá um Modelo. Estou a falar de avaliação de professores.
. O Eng. Sócrates, provavelmente acompanhado pelos ministros Pinho e Lino, apoiado na maioria absoluta no parlamento, decretará perto das eleições o fim da crise. Se Mugabe decretou o fim da cólera no Zimbabwe, porque não Sócrates decretar o fim da crise mesmo a tempo das eleições.
. O Alberto João continuará numa de Chavez, arruaceiro e mal-educado e ninguém no Portugal dos pequeninos tem coragem para dizer basta de insultos e chantagem e fechar a torneira.
. O Presidente da República continuará a sua linha de cooperação estratégica, ou seja, eu não estou de acordo mas promulgo.
. O deputado Manuel Alegre vai continuar a sua “reconfiguração da esquerda”, ideia agora muito em voga e que ninguém sabe exactamente o que quer dizer, nem o Poeta.
. O director do Público, José Manuel Fernandes, irá cumprir uma travessia no deserto pois com a saída de cena de Bush ficará órfão político. Restar-lhe-á a prosa ultra-liberal em editoriais intragáveis de pesporrência.
. Também não acredito que em 2009 fiquemos convencidos, como o ingénuo Procurador-Geral, de que a justiça portuguesa tem mesmo uma venda nos olhos, trata toda a gente com equidade.
. Também não acabarão em 2009 as escandalosas listas de espera no SNS.
Agora já não aguento mais, estou extenuado com o esforço de adivinhar o futuro, se querem saber o resto, procurem o Professor, o Marcelo, ou Pacheco Pereira.

QUE 2009 NOS TRAGA (I)

Com algum tempo livre e enquanto descanso do trabalho de prever 2009 fui fazer um périplo, adoro esta do périplo, ao país real, o meu bairro, e tentar perceber que espera o povo do próximo ano. Trago-vos a primeira recolha.
O meu amigo, Zé Barbeiro. “P’ra 2009, eu queria era o euromilhões e saúde. Como, se calhar, não me sai o euromilhões, o que eu queria é que os gajos pusessem a reforma aos 60, já tou farto de dar à tesoura”.
O meu amigo Cajó, que já conhecem, mecânico e adepto do chunning, o tunning para pobres. “Ó migo, o que eu queria mesmo era o euromilhões para ter guito pa comprar um Audi A3, senão quero é ter saúde para fazer uns biscates e comprar umas ponteiras e uma asa p’ró Punto”.
A D. Odete, reformada. “Olha meu lindo, eu precisava era do euromilhões, para ficar com algum e distribuir o resto pelos pobres. E também podia ir ao particular fazer a operação às varizes que tou à espera vai para 3 anos. De resto, alguma saúde e já fico contente”.
O Sr. Manel, vendedor na praça. “Eu só desejava o euromilhões e saúde. Como não me vai a sair, gostava que o governo olhasse um bocadinho pelos comerciantes pequenos, porque isto anda muito mal. Vende-se pouco e os impostos são muitos”.
A D. Ana, boa pessoa e muito religiosa. “Olhe Sr. José, se eu tiver saúde já vou ficar contente, graças a Deus. E gostava que Deus iluminasse a juventude para não se verem as sem-vergonhices que andam por aí, credo.”
O Sr. Rafael, comerciante e especialista em comer e bober. “Ó amigo Zé, para 2009 só queria o euromilhões, reformava-me e depois comia e bobia descansado”.
O Sr. António, do café. “Olhe amigo, eu só queria o euromilhões, trespassava o estabelecimento e já não tinha que apanhar com a ASAE, que ainda no outro dia aqui teve e apreendeu os croquetes e rissóis bem bons que a minha vizinha de cima, a D. Alzira, faz para eu vender e ela acrescentar alguns euros à reforma”.
Como amostra, dá para perceber como o euromilhões povoa os desejos do povo do meu bairro. Até ao fim do ano deixarei aqui mais alguns postais do país real, ou sociedade civil, como também lhe chamam.

BORDA D'ÁGUA (I)

Depois de anos e anos a observar e estudar o nível e a infalibilidade das análises e previsões dos grandes nomes da futurologia em Portugal, designadamente do entertainer político conhecido por Professor e do omnipresente Pacheco Pereira tenho o atrevimento de alinhar algumas notas à laia de previsão para o próximo 2009. Se por acaso não se confirmarem, o que em boa verdade duvido face ao rigor que utilizo, cá estarei para um mea culpa. Assim, depois de aturados estudos e da consulta a diferentes oráculos:
. O ano de 2009 não vai ser nada fácil em termo de economia. As empresas e as famílias vão sentir algumas dificuldades para gerirem as suas actividades.
. Durante o próximo ano não prevejo alternativa de liderança dentro do PS, Sócrates parece-me seguro e o aparelho do partido está sob controle embora a chamada ala esquerda vá, aqui e ali, dizendo qualquer coisa, o que garante a democracia e pluralismo interno, como lhe chamam.
. No PSD continuará a rodagem da tragicomédia “Chefe precisa-se”. Eventualmente poderá verificar-se algum acerto de casting, dependendo do resultado das eleições para a Câmara de Lisboa e das cambalhotas do menino guerreiro, Santana Lopes.
. O Dr. Louçã, através do Bloco, continuará a afirmar-se como a voz dos portugueses e das portuguesas, dos trabalhadores e das trabalhadores, dos emigrantes e das emigrantas, dos ofendidos e das ofendidas, dos professores e das professoras, dos operários e das operárias, dos minoritários e das minoritárias, dos verdadeiros esquerdos e das verdadeiras esquerdas, dos etc. e das etcas, enfim a voz.
. O PCP, com invejável unidade interna continuará a renovação do seu discurso contra os capitalistas e opressores do nosso povo.
. O Dr. Portas, o Paulo, na sua política de eucaliptização do CDS-PP, conseguirá manter o partido coeso em torno da sua figura e de Teresa Caeiro e Diogo Feyo, uns resistentes.
. Em termos de justiça, não vai acontecer nada de relevante aos gestores envolvidos nos casos BCP, BPP e BPN. O Dr. Oliveira e Costa sairá em breve para junto dos seus.
. Não acabará em 2009 o processo Casa Pia.
. Os portugueses continuarão mal colocados na generalidade dos estudos comparativos internacionais, exceptuando, o fosso entre ricos e pobres, onde continuaremos em lugares cimeiros.
. O PS ganhará as legislativas de 2009, eventualmente com maioria absoluta.
Por questões de cansaço, devido à profundidade e dificuldade intelectual deste trabalho de análise e previsão, alinhavarei posteriormente mais algumas notas.

O MEU AMIGO PROCURANTE

Um dos meus amigos é um tipo bem peculiar. Há muito que lhe chamamos o Procurante. Perguntarão o porquê de tão insólito chamamento. Deve-se ao facto do meu amigo fazer da sua vida uma procura. É o tipo mais inquieto que conheço e a sua permanente procura deve-se a esse desassossego. O Procurante anda atrás daquele livro que ainda não leu e que será o mais interessante, antes de procurar o próximo ainda mais interessante. O Procurante busca o filme que, de tão estimulante, o deixe à procura de outro que justifique ainda mais a sua atenção.
O meu amigo Procurante trabalha e creio que emprego é a única coisa que deixou de procurar, escreve, sobrevive da escrita e de algumas traduções mal pagas. Ainda assim, embora não procure outro emprego o Procurante continua a tentar escrever o livro que venha a ser O seu livro.
O Procurante ainda não encontrou numa só mulher tudo o que procura nas mulheres e, por isso, continua à procura.
Em múltiplas viagens e mudanças, o Procurante tem tentado encontrar o seu mundo em muitos cantos, mas ainda procura o seu canto no mundo. Quando nos encontramos para uns copos e umas discussões acesas, a palavra que o Procurante mais usa é “porquê”. Ri-se sempre que um de nós propõe uma qualquer resposta para um dos seus porquês e, sem percebermos se ri de nós ou para nós, pergunta porquê, sem fim.
Quando penso no Procurante fico na dúvida. Será o Procurante o mais infeliz de nós porque nunca encontra ou, pelo contrário, o mais feliz porque ainda procura, sempre.

domingo, 28 de dezembro de 2008

OS LIVROS, OS EDITORES E OS LEITORES

As considerações de António Lobo Antunes, transcritas no Público, sobre o indecente preço dos livros em Portugal suscitam-me dois comentários. Em primeiro lugar e em termos mais genéricos, a cultura em Portugal é um produto de luxo, veja-se também o preço dos CDs e dos espectáculos. O Ministério da Cultura vive, com melhorias esporádicas, numa apagada e vil tristeza orçamental. Sabe-se como os museus têm dificuldade em manter portas abertas, para não falar de investimento e manutenção nos respectivos espólios. Muito do que se realiza em Portugal em matéria de cultura está dependente de apoios privados, carolice e mecenato. A crise instalada vai complicar a situação.
Por outro lado, e no que respeita ao mercado livreiro, creio que uma das grandes razões para o preço dos livros será o reduzido volume de consumo desse bem por parte do cidadão comum. De facto, à excepção de alguns, poucos, nomes, entre os quais Lobo Antunes, as edições reduzidas dificultarão, por questões de escala, o abaixamento do preço. Algumas editores ou grupos editoriais têm experimentado o lançamento de colecções com obras a mais baixo custo, mas muitos dos potenciais compradores dessas obras, já as terão adquirido pelo que, mais uma vez será difícil que sejam bem sucedidas essas edições. Parece-me sobretudo que a grande aposta estará no leitor e não no livro, ou seja, criando mais leitores, talvez as edições, que poderiam em todo o caso ser menos exigentes em papel e grafismo, ficassem mais acessíveis como se verifica, por exemplo, nos países citados por Lobo Antunes. Esta batalha ganha-se na escola e na comunicação social. É certo que existe em actividade o Plano Nacional de Leitura que, parece, estará a dar alguns resultados, mas na comunicação social generalista o livro está praticamente ausente embora exista o sketch do conhecido entertainer político, conhecido por Professor, que ao Domingo à noite na RTP despeja livros em cima de uma secretária enquanto faz, dizem, comentário político. Insisto, é um problema de leitores não de livros, aliás, nunca se publicou tanto como agora.

O VÍRUS DA DESORGANIZAÇÃO E INEFICÁCIA

Esta época, entre Natal e Ano Novo, com o habitual adormecimento da actividade política, fica muito dependente dos resultados das rotineiras “Operação Natal” da GNR, das sugestões para inenarráveis “réveillons”, os gastos no Natal mais os saldos que começam e, lá mais para dia 30 e 31, os balanços e desejos para o ano seguinte. Mas este ano as águas agitaram-se, apareceu o surto, ou epidemia, ainda não percebi bem, da gripe.
Todos os anos, em Setembro/Outubro, aparecem campanhas a sugerir a vacinação contra o vírus da gripe, sobretudo nas populações mais vulneráveis, velhos e doentes crónicos por exemplo e todos os anos se sabe que haverá picos de actividade desses terroristas, os vírus da gripe. Pois a verdade é que ainda se verifica a enorme e escandalosa incapacidade de resposta de muitas estruturas hospitalares. Ontem, a espera média em alguns hospitais rondava as 12 horas e contam-se casos de mais de vinte horas de espera. As desculpas variam, é um dia mau logo a seguir ao Natal, os Centros de Saúde estão fechados, são administração pública que encerrou a 26, afluxo anormal de gente que se lembrou de achar que tem gripe, etc.
Naturalmente que isto decorre da minha ignorância, mas para que servem planos de contingência senão para acudir a situações atípicas? Para que servem os dispositivos de planeamento se as estruturas entram em colapso? Naturalmente que ninguém é ou será responsável por este quadro. Creio que nos resta esperar pela descoberta da vacina contra o vírus da desorganização e ineficácia.

sábado, 27 de dezembro de 2008

MAS AS PROMESSAS EM POLÍTICA SÃO PARA CUMPRIR? TODAS?

Acho sempre interessante o exercício que ciclicamente se faz de tentar inventariar quais as promessas que foram cumpridas por parte do poder político. Normalmente, realiza-se no fim do ano ou no fim dos ciclos eleitorais e o resultado é sempre, sempre surpreendente. Então não é que se chega à conclusão que existem promessas não cumpridas? Ficamos sempre perplexos porque não esperamos tal resultado. Este fim-de-semana tocou ao Expresso avaliar o grau de execução das promessas do governo e, claro, verificou que muitas não foram cumpridas. Este exercício parece-me dispensável mas sempre aparece. No modelo e cultura política em que vivemos ninguém minimamente atento acredita que as promessas enunciadas pelos políticos no poder ou pelos que estão na oposição e lutam pelo poder se destinam, na sua totalidade, a ser cumpridas. A promessa faz parte da retórica política e depois, temos discursos mais ou menos eficazes, discursos melhor ou pior vendidos e o resto é … retórica. Tal situação é, aliás, um excelente contributo para a imagem e credibilidade da classe política
Vejam o triste exemplo a propósito da homilia do Eng. Sócrates. O Sr. Primeiro-ministro disse que entre todos os milagres realizados pelo governo se contava o ter “criado condições para a baixa das taxas de juro”. A oposição clama, é propaganda. O ideólogo de serviço no governo, o ministro Santos Silva vem explicar, o homem é um didacta, que sendo estas matérias decididas em instâncias europeias que intervêm junto do Banco Central Europeu, se o governo faz parte destas instâncias, logo, claro como a água, o governo teve um papel na matéria. É uma análise à prova de bala. Tal como as promessas.

PASSADO E FUTURO

Olha o Mix, estás bom meu?
Fixe, e tu Big?
Na boa. Nunca mais te tinha visto desde a secundária Não se Aguenta. Que tens feito?
Pá, andei aí um bocado perdido, saí no 11º e andei nas pizzas uns tempos. Conheci lá uma miúda que me convenceu a ir para um Centro daquela cena do Novas Oportunidades. Como curtia, meti-me nos computadores, fiz lá uns trabalhos e depois deram-me um certificado. Nesse dia até foi lá um ministro, se calhar foi por causa de mim. Lá em casa começaram a chatear-me para continuar a estudar que já tinha 23 anos e até podia ir para a Universidade. Fui fazer uns testes bué da fáceis e entrei para a Universidade Treta do Sul e ando no primeiro ano da licenciatura em SMS. Mix, aquilo é fácil e tá-se bem. E tu, qual é a tua?
Quando tu bazaste da escola, ainda lá fiquei mais algum tempo, curtia com uma chavala que lá andava, a Tina, lembras-te era aquela que tinha bué da piercings. Mas a Tina deu de frosques e eu passei-me e saí da escola. Um bacano meu amigo arranjou-me uma ponta a distribuir jornais e publicidade mas aquilo era pesado. Havia lá um chefe que atinou comigo, era um gajo fixe e convenceu-me a ir para um Centro de Formação Profissional e vou-me orientando. Conforme há vagas, faço um curso, arranjam-me uns meses de estágio, depois faço outro curso e outro estágio e é assim, vou ganhando o meu, mas a cena tá má. Para ti não Big, vais ser doutor.
Se calhar até vou Mix, mas quem é que vai dar emprego a um gajo que é doutor de SMS?

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

AFINAL, A REALIDADE ESTÁ ENGANADA

Certamente contente com o facto do Pai Natal, em quem ainda acredita, ter respondido a quase todos os desejos expressos na carta que lhe escreveu para a Lapónia, o Sr. Procurador-Geral da República veio a terreiro informar “urbi et orbi” que a justiça em Portugal apenas distingue o lícito do ilícito, não sendo sensível à condição social, ao poder económico ou ao cargo de quem, eventualmente esteja ligado a um ilícito.
Eu creio que o Sr. Procurador-Geral se baralhou. Este era o último desejo que ele tinha colocado na carta ao Pai Natal, mas este achou que era uma tarefa para a qual, nem mesmo ele, não tinha recursos e que, por isso, não podia realizar. Então o Sr. Procurador-Geral, como é muito crente, pensou que se o Pai Natal não conseguia, talvez ele pudesse ir adiantando a formulação dos desejos para as passas do fim de ano. Só que, como é um bocadinho distraído, às vezes diz o que não quer, lembrem-se das suas considerações sobre o caso da menina Esmeralda e sobre o julgamento do processo Casa Pia, o Sr. Procurador-Geral começou a pensar os desejos em voz alta não reparando que um jornalista estava por perto e pronto, lá deu esta confusão.
Eu e mais alguns cidadãos que não escrevemos ao Pai Natal nem comemos passas no fim de ano para ver a nossa vida se altera, sem querer ofender o Dr. Pinto Monteiro é que nos rimos discretamente a pensar em histórias como perdões fiscais, ausência de condenados por corrupção, manobras processuais executadas por advogados bem pagos que protelam até à prescrição inúmeros processos, acordos informais sobre condições e circunstâncias de detenção, etc., sempre envolvendo figuras com algum peso social e não um qualquer pilha-galinhas. O Sr. Procurador-Geral bem pode escrever ao Pai Natal mas este, só não lhe diz que a justiça é forte com os fracos e fraca com os fortes, para ele, coitado, não ficar triste e deprimido.

CRISE, APOIOS E ELEIÇÕES

O ano de 2009, como toda a gente antecipa, será um ano extremamente complicado em termos mundiais e para nós em particular.
Depois de discursos de um optimismo excessivo, por vezes uma quase delirante negação da realidade, o discurso dos responsáveis políticos começa a passar com algum realismo a natureza das dificuldades esperadas. Como o problema começou por afectar sobretudo o sector financeiro, as primeiras medidas foram dirigidas a este sector o que, por falta de informação suficiente, gerou algumas perplexidades no cidadão comum. Entretanto, os problemas estendem-se à chamada economia real e desencadeiam-se dispositivos de apoio às empresas até que finalmente, como seria de esperar, os problemas começam a abater-se seriamente sobre as famílias.
Neste quadro, a homilia natalícia do Eng. Sócrates assume a generalidade dos problemas e, claro, assume a intenção de, naquela fórmula tão cara ao discurso político, garantir “fazer tudo o que estiver ao seu alcance” para apoiar toda a gente. Uma vez que, como diz, as contas públicas estão equilibradas, existe margem orçamental para apoios. Aqui começa a minha questão. Parece-me bastante mais eficaz que, estando as contas equilibradas e preparando-se o estado para distribuir apoios (euros) pelas famílias e empresas, porque não baixar as suas receitas, por exemplo mexendo, mesmo transitoriamente, no ISP, no IVA e no IRS, fazendo com que famílias e empresas mantivessem recursos “no bolso” em vez de lhes criar a dependência do apoio posterior.
O problema, é que 2009 será ano de eleições e o Eng. Sócrates precisa de ter dinheiro na mão para “ajudar a formar as consciências eleitorais”. Aquele menino que recebeu o Magalhães e escreveu à Ministra da Educação prometendo inscrever-se no PS quando crescer vai no bom caminho. Não é bonito, é discutível em termos de política económica, é mais duro para muitas famílias e empresas, mas é capaz de dar resultado.

SOMBRAS

(Foto de Adriane)

Já repararam como o sol de inverno faz com que as sombras que carregamos pareçam ainda maiores?

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

AS NOTAS OU A VIDA, MAS NOTAS POSITIVAS

Quando o famoso filme “A terrorista do telemóvel” tinha saído de cena e entrado no circuito dos filmes de culto, a produção cinematográfica independente apresenta em estreia absoluta um filme sobre a mesma temática, o universo das salas de aula, intitulado “As notas ou a vida, mas notas positivas”.
O filme utiliza a mesma linguagem cinematográfica presente em “A terrorista do telemóvel”, o “casting” é constituído por figuras reais, filmado em cenário real, ao primeiro “take” e com som sem produção.
Certamente inspirado pela atmosfera de faz-de-conta que caracteriza muito do quotidiano português há a introdução de um elemento dissonante que complexifica a leitura do filme, a arma utilizada pelos alunos para ameaçar a professora é de plástico, um elemento de certa forma “kitsch”.
É interessante a reacção de parte da crítica, com o pretexto da presença deste elemento em plástico cataloga o filme como de humor de mau gosto seguindo a estética “kitsch”. Discordo em absoluto desta interpretação da crítica, o filme é claramente uma tragédia neo-realista. Do meu ponto de vista, a questão a discutir remete para uma falha na construção do argumento que fragiliza bastante a credibilidade da obra.
Em primeiro lugar, parece desnecessário que os alunos pressionem a professora para que lhes atribua notas positivas porque o próprio ME o faz, para responder à imperiosa necessidade de subir o sucesso escolar. Por outro lado, os poucos alunos que conseguissem ter nota negativa entrariam durante umas semanas, poucas, para uma iniciativa do Programa Novas Oportunidades e rapidamente veriam certificadas as suas competências, alguma “competência” hão-de de ter que se possa certificar, nem que seja o domínio dos telemóveis. Passado algum tempo, estes alunos entrarão no Ensino Superior, pois em qualquer Universidade ou Politécnico, público ou privado, terão uma vaga à sua espera.
É esta a grande fragilidade do filme. De qualquer forma, parece-me que tem interesse e actualidade suficiente para se manter em exibição num ecrã perto de si durante as próximas semanas.

FELIZMENTE, AMANHÃ HÁ JORNAIS

Por mais que muitos de nós se queiram afirmar anti-rotinas, a verdade é que elas nos são imprescindíveis como organizadores dos nossos dias. A questão é que não devem ser os únicos organizadores. Umas das minhas rotinas é a compra do jornal e esta coisa de não haver jornal impresso a 25 de Dezembro deixa-me “pendurado”. Felizmente existe a imprensa on-line, mesmo a meio gás. De qualquer forma, invariavelmente nestas ocasiões, 25 de Dezembro e 1 de Janeiro, lembro-me do Mestre Almada na sua Cena do Ódio,
“Lês os jornais e admiras tudo do princípio ao fim
e se por desgraça vem um dia sem jornais,
tens de ficar em casa nos chinelos
porque nesse dia, felizmente,
não tens opinião para levares à rua".

Não é caso para ficarmos embaraçados, afinal Almada dirigia-se aos burgueses de Portugal, mas é curiosa esta ideia do mundo sem notícias. As dúvidas e inquietações sem resposta. Que simplificação no Modelo de avaliação anunciará hoje o ME? Que resposta dará o incontornável Mário Nogueira? Qual a descoberta de hoje sobre as falcatruas do BPN e do BPP? Quantos milhões de euros serão hoje anunciados pelo Eng. Sócrates para apoiar o quê? Qual a resposta da Dra. Ferreira Leite? Será que é hoje que a cigarra, o menino guerreiro, responde à formiga, o António Costa? E fico sem saber o pensamento do Paulo Bento para hoje? E se o Alberto João aproveita o 25 de Dezembro sem jornais para declarar a independência da Madeira? E os discursos de época sobre os mais necessitados e a solidariedade e blá, blá, blá? E a imperdível informação sobre os acidentes nas estradas portuguesas durante o chamado “período festivo”? E etc?
São inquietações a mais. Felizmente, amanhã há jornais.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

CONTAR O NATAL

Avô, ouvi na escola que o Natal antigamente não era como hoje, em que as pessoas da mesma família se encontram para falar sem usar qualquer dispositivo de som e imagem, estão juntos mesmo, os que podem. Não foi sempre assim?
Não, realmente, há muitos anos não era assim. As pessoas tinham o hábito de quando chegava o Natal comprar muitíssimos presentes para dar aos outros, família ou amigos, gastavam imenso dinheiro nisso, as lojas estavam a abarrotar de gente que andava a abarrotar de sacos de compras.
Então era bom, agora não se dão coisas no Natal.
Bem, para algumas pessoas era bom, os miúdos gostavam porque eram quem recebia mais prendas. Alguns recebiam tantas que nem sabiam o que fazer com elas, nem tinham tempo para brincar com outros miúdos.
Então porque acabou?
Houve uma época, no ano de 2008 e de 2009, em que a vida das pessoas começou a ficar muito complicada, muitas pessoas sem emprego, o dinheiro que tinham era pouco, e, por isso, começaram a ter dificuldades em comprar prendas. Na mesma altura começaram a aparecer pessoas a falar na televisão, na antiga net e a escrever em jornais, uma coisa que já não há, traziam notícias todos os dias escritas em papel e vendiam-se nas ruas, a falarem de que se gastavam muito dinheiro em coisas que depois não se usavam, que havia pessoas que tinham muitas dificuldades e não parecia justo que outras pessoas gastassem tanto dinheiro em coisas inúteis e a defenderem, portanto, que seria melhor olhar para o Natal de outra forma. Ao princípio, a maioria das pessoas não ligava muito a estas opiniões mas, devagarinho, começaram a pensar que, de facto, muito do dinheiro que as pessoas gastavam era mal gasto e era mais útil se fosse usado para outras coisas. Além disso, as pessoas começaram também a achar graça encontrarem-se no Natal só para conversarem “ao vivo”, hábito que se foi perdendo com a utilização das máquinas. De maneira que as coisas no Natal se alteraram muito.
Avô, quem ficou pior foram os miúdos, não eram os que tinham mais prendas?
Só alguns. Mas todos ficaram melhor porque as pessoas aprenderam a dar as prendas ao longo do ano, a não darem coisas a mais, a darem mais tempo de brincadeira com os miúdos em vez de brinquedos a mais, etc. Eu acho que o teu Natal é mais bonito do que o meu quando tinha a tua idade.
Avô, percebi, agora vamos conversar sobre o quê?

A SOLUÇÃO (A PRAZO)

No meio desta turbulência entre a deriva do ME, as posições da Plataforma Sindical e, sobretudo, o sentimento dos professores, eis que informações provenientes do ME podem representar a solução deste imbróglio a um prazo relativamente curto. Segundo o Gabinete de Estatística e Planeamento do ME, entre 1997 e 2006, o sistema educativo perdeu cerca de 200 000 estudantes, sendo que cerca de 100 000 no Secundário.
Certamente que alguns de vós se lembrarão de há uns anos largos atrás, numa intervenção televisiva que ficou para a história, um responsável do ME ter afirmado que o grave problema do analfabetismo em Portugal se resolveria quase naturalmente porque afectava sobretudo a população mais idosa e portanto … estão a ver.
Pois estamos na mesma situação mas ao contrário, daqui a uns anitos não teremos alunos, não teremos professores, não teremos o Modelo e, mais do que tudo, não teremos esta equipa do ME.
Bom Natal.

ASSIM UMA COISA DO TIPO COISA, ENTENDEM?

Hoje, como o meu café de estimação, o do Sr. António, estava em descanso semanal, fui a um outro bem maior e mais “produzido”. Estava de namoro com a bica e bati com os olhos em alguns cartazes que me deixaram a pensar. Um dizia, “temos pão do tipo Mafra”, um outro afirmava, “temos pão do tipo alentejano” e um outro ainda, “prove os nossos bolos com massa do tipo bolo-rei”. Não reparei se haveria outros cartazes do tipo, “estes que referi” mas achei curioso.
Estes discursos parecem muito elucidativos de algumas particularidades do nosso funcionamento. De facto, parecemos ter uma especial apetência para nos não preocuparmos se as coisas são ou não são, podem apenas parecer, aproximar-se, ser quase iguais, etc., ou seja, não são coisas mesmo coisas, são coisas do tipo coisas, o que é notável. Um outro exemplo desta forma de funcionar é a quantidade de anúncios que nos informam sobre a venda de carros semi-novos que também é uma ideia interessante. Este conceito do carro semi-novo poderia transformar-se em qualquer coisa como, “vende-se um carro tipo novo”. Mas esta capacidade de transformar algo, em qualquer coisa do tipo algo, faz mesmo escola. Vejam o caso da avaliação de professores. O Governo tanto tem andado, mudado e simplificado, que já poderá anunciar que tem para aplicar um “Modelo do tipo Modelo”.
Às vezes, quase chego a acreditar que temos um país do tipo país.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

FORÇA DE BLOQUEIO (II)

No processo de produção legislativa não é de estranhar incidentes que decorrem de interpretações diferentes das disposições constitucionais. Numa constituição com o modelo da nossa, na doutrina e na forma, este risco parece acrescido. Assim, mais esta divergência na interpretação do Código do Trabalho que o Governo considera caber na sua interpretação constitucional e o Tribunal Constitucional acaba por considerar ferida de inconstitucionalidade, não me parece por si só um caso muito significativo.
O que me parece interessante e elucidativo é o exercício, mais um, da atitude de infalibilidade arrogante com que este governo encara as suas iniciativas. De facto, relativamente a esta norma, o período experimental, toda a oposição a considerava errada e inconstitucional. Mais um caso em que, do ponto de vista político, o Eng. Sócrates virá queixar-se de que deixaram o governo sozinho a defender a norma, tal como fez com a avaliação de professores. O Sr. Eng. Sócrates, com alguma humildade, poderia tentar perceber que o Governo e o PS, ou vice-versa porque é o mesmo, não são os únicos iluminados, os infalíveis, os competentes e omniscientes.
A autoridade, mesmo em política, afirma-se pela competência e pelas ideias, não pela arrogância e autoritarismo, mesmo disfarçadas de liderança e assertividade.
PS – Também registo o discurso habitual nestas circunstâncias, hoje do Ministro Vieira da Silva, “o governo irá respeitar a decisão do Tribunal Constitucional”. Mas poderia ser de outra forma?

O MUNDIAL IBÉRICO DO DR. MADAIL, O ETERNO

Não entendo. Num momento em que atravessamos uma das situações mais complicadas da história recente do mundo, essa figura mítica da cena portuguesa, o Dr. Gilberto Madail, mais conhecido pelo Eterno, começou a acalentar a ideia de, em conjunto com a Espanha, candidatar Portugal à organização do Mundial de Futebol de 2018. A irresponsabilidade, aqui sim é irresponsabilidade, não é o aumento do salário mínimo, é que o Governo pondera “a disponibilidade” para tal efeito, disse o Dr. Sócrates II, Pedro Silva Pereira. Depois do faraónico Europeu de 2004 que deixou uma herança de estádios às moscas e exorbitantes custos de manutenção sem proveito, agora seria um Mundial, uma desgraça nunca vem só. Se ainda cá tivesse o Sr. Scolari e a Nossa senhora do Caravaggio mais o Murtosa, lá viria a conversa sobre a nossa auto-estima, a capacidade de realização dos portugueses e a mobilização nacional, as bandeiras na janela e o Rónaldo a querer dar alegrias aos portugueses. Tirem-me daqui.
Pensando bem, esta ideia do envolvimento de Portugal na organização deve tratar-se de um expediente saloio para o Dr. Madail se eternizar, com enorme sacrifício pessoal e profissional (estou a falar a sério, não se riam), à frente do futebol português que tão bem anda com a sua sábia e desinteressada liderança.

OS DESCARTÁVEIS MESTRES E DOUTORES

Com algum atraso, uma pequena nota sobre uma notícia que merece alguma reflexão. Segundo dados do INE e do seu congénere espanhol, Portugal, em 2006 tinha, proporcionalmente, mais detentores do grau de mestre e doutor que a Espanha, 61 por cada 100 000 habitantes em Portugal e 16 por 100 000 em Espanha. Devido ao chamado processo de Bolonha, estes números vão ter que ser repensados na medida em que a formação universitária de cinco anos passou, genericamente a conferir o grau de mestre e não o de licenciatura.
Mas mais do que nos números disponibilizados, simpáticos numa primeira leitura, importa pensar o que é que o país faz com estes mestres e doutores. O subaproveitamento desta franja altamente qualificada, muitos com o apoio de bolsas com fundos públicos, é quase escandaloso. Um número significativo vai passando de projecto em projecto sem perspectivas de carreira, sem vínculos profissionais minimamente estáveis e facilitadores de projectos de vida. Muitas empresas, sobretudo as de média e maior dimensão, provavelmente devido ao baixo nível de qualificação dos empresários (um dos mais baixos da UE), também não valorizam a contratação de recursos humanos tão qualificados. O quadro fica assim menos animador do que quando apenas se refere o número de mestres e doutores comparativamente a Espanha.
A grande questão é que, disso ninguém parece ter dúvidas, o futuro dos países em mercados hiper-competitivos e globalizados, depende em grande medida, do nível da excelência na qualificação das pessoas e no investimento em I&D. Nós, para não variar, como somos ricos, não aproveitamos.

UM CONTO DE NATAL

Estava o Burro tranquilamente a tomar uma bica numa esplanada ao solzinho da tarde, quando entrou a Vaca com quem já tinha trabalhado várias épocas. Depois dos cumprimentos da praxe, o Burro lamentou-se.
Nunca me tinha acontecido tal, no desemprego nesta altura. Como sabes, já trabalhámos juntos, a questão habitual era escolher bem entre as muitas ofertas. A tradição já não é o que era. Ninguém liga a presépios. As poucas famílias que os fazem optam por produtos contrafeitos vindos lá da China. Onde é que já se viu? Burros em plástico? Dão cabo das tradições e a ASAE a isso não liga, tantos Burros portugueses com capacidade para aguentarem três árduas semanas de companhia ao Menino Jesus e vamos para o desemprego. O que vale é que algumas Câmaras ainda fazem uns presépios, mas também não adianta muito, empregam os Burros ligados ao partido que manda na Câmara, sem critérios transparentes de selecção por mérito. É Vaca, isto está mesmo mal. E tu, não devias estar aqui nesta altura. Também te está a correr mal a vida?
Não me digas nada, Burro. Estou com os mesmos problemas que tu e, para piorar as coisas, desde que foi a crise das minhas primas loucas, nunca mais confiaram em nós como antigamente. Para os poucos empregos que ainda vão aparecendo exigem atestado veterinário de sanidade, que é caro e é uma burocracia para tratar e, na volta, não nos dão o emprego. E ainda vai ficar pior, ouvi dizer que iam proibir os presépios por causa do Menino Jesus. Dizem que obrigar o miúdo a ficar três semanas nas palhinhas, mal aquecido, é maus-tratos e exploração de mão-de-obra infantil. Então é que vai ficar mesmo mal para a gente, não sei mesmo o que fazer, só sei trabalhar em presépios. Na volta ainda vou ter que pedir a reforma antecipada ou um subsídio de desemprego de longa duração. E tu, Burro?
Se as coisas continuarem assim, vou inscrever-me no Programa Novas Oportunidades, peço para em duas semanas me certificarem qualquer coisa, recebo um computador, e assim, mais qualificado talvez consiga qualquer coisa. Quem sabe, com uma cunha do Menino Jesus até poderia entrar para um banco para brincar com os filhos dos administradores. Era um bom emprego. Vaca, achas que consigo?
Deixa-te de sonhos Burro, o Natal já não é o que era.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

E UM ABAIXO-ASSINADO EXPLICATIVO PARA OS PAIS?

Dentro da estratégia de contestação definida pela Plataforma Sindical e numa lógica guinessiana, temos agora o maior abaixo-assinado já produzido por professores. Não tenho nada contra, trata-se apenas da opinião de um cidadão interessado nestas matérias, e acho que pode representar perante o ME mais uma tomada de posição expressiva por parte da classe docente face aos problemas em discussão. Já aqui tenho dito, e basta estar atento aos comentários que se ouvem na rua ou em fóruns da imprensa on-line, o cidadão comum parece-me mal informado acerca das razões que assistem aos professores, para além, como já referi, da luta política presente num terreno tão apetecível como a educação. Também tenho para mim que havendo responsabilidades da comunicação social no tratamento à comunicação vinda dos professores, entendo ainda assim que os seus líderes não parecem ter a preocupação objectiva de que o cidadão comum entenda as verdadeiras questões em jogo, por exemplo, parte da opinião pública pensará, creio, que os professores não querem ser avaliados, e as intervenções dos lideres da Plataforma parecem-me pouco convincentes no sentido de alterar este entendimento.
Nesta perspectiva, tenho o atrevimento de uma sugestão. Para além do abaixo-assinado para o ME, talvez fosse interessante que cada professor do 1º ciclo ou director de turma dos 2º, 3º ciclos e do ensino secundário, bem como outros professores responsáveis por turmas, elaborassem um texto a enviar através dos alunos aos respectivos encarregados de educação explicando, de forma clara e sintética, como o estatuto em vigor e a consequente avaliação são um mau serviço prestado à educação, portanto, aos professores, aos alunos e às famílias. Penso que poderia ser uma boa forma de atenuar equívocos instalados, esclarecer posições e informar os cidadãos. Do meu ponto de vista, teria ainda a vantagem, de baixar o ruído criado pela politização óbvia desta questões e a que muitos pais e encarregados de educação são sensíveis, bem ou mal. Ainda irá a tempo.

PASSOS PESADOS

(Foto de Jorge Alfar)

Os passos pesam-me cada vez mais. Quando chegar, o conforto do descanso vai confundir-se com o desconforto da casa fria, só. E as noites de inverno são tão compridas.
Não podias ter partido. Sem mim.

domingo, 21 de dezembro de 2008

O POVO FAZ-SE

De há uns tempos a esta parte, não há discurso do governo sobre questões de economia e desenvolvimento, que não sublinhe a importância da capacidade empreendedora e de inovação da chamada sociedade civil, no sentido de promover desenvolvimento e bem-estar. Numa altura em a situação é particularmente complicada, é usual que, nos mesmos discursos, se acrescente a ideia de transformar dificuldades em janelas de oportunidade.
Certamente inspirados por aquela rapaziada que tem gerido o BPP, a SLN, o BCP, etc. cujo empreendedorismo e inovação ainda não acabou de nos surpreender, três indivíduos de Sta. Maria da Feira, dois donos de oficinas e um vendedor, montaram um esquema simulando acidentes e outros incidentes com automóveis com o objectivo de lesarem as seguradoras, O grupo terá simulado 138 acidentes e o “negócio” terá envolvido cerca de 750 000€. É uma questão de escala, não chegaram ao patamar dos milhões que o outro pessoal atingiu, mas é de notar que se trata de pessoas sem o nível de qualificação dos gestores bancários, eventualmente, até nem terão passado pelo Programa Novas Oportunidade, mas, apesar disso, estamos em presença de um nível de produtividade, de dinamização de um nicho de mercado em crise, peças e manutenção automóvel, bem como de um nível de inovação que me parecem de sublinhar.
Acho que podemos estar optimistas, com boas lideranças e exemplos, o povo faz-se.

O GÉNERO DOS GÉMEOS

Com a generosidade que deve caracterizar a época natalícia, desculpar-me-ão este não assunto que vos trago. Certamente não justificará o tempo que demorará a ler mas não resisto. Gosto de conduzir a ouvir rádio e, às tantas, uma voz informa-me que se quisesse saber o género dos gémeos de uma senhora chamada Sónia Araújo deveria comprar a Lux. Fiquei inquieto e impressionado. Inquieto porque se uma revista informa o povo sobre o género dos gémeos que a senhora carrega, a senhora deve ser alguém seguramente importante. Lamento mas não conheço e o problema é certamente da minha ignorância pois, imediatamente antes de começar este textinho, uma rápida pesquisa na net deu-me informação suficientemente relevante para ficar esclarecido sobre a irrelevância da senhora, enquanto figura pública, não como pessoa, naturalmente.
Fiquei impressionado pois, se uma revista, a Lux, coloca como notícia o género dos gémeos da Sra. D. Sónia, é porque certamente haverá gente que quererá saber tal informação. Acho notável, ainda há pessoas felizes. Com os tempos que correm, com os discursos e notícias sobre as dificuldades das pessoas, ter como preocupação o género dos gémeos da senhora, é uma prova de felicidade, lamentavelmente, ao alcance de muito poucos. Sorte a dessas pessoas.
Por mim, estou-me nas tintas para o género dos gémeos, apenas desejo, como se costuma dizer, que a Sra. D. Sónia tenha uma hora pequenina e que, logo que possa, mostre as fotografias dos rebentos, na Lux, claro. Vou tentar interessar-me.

sábado, 20 de dezembro de 2008

A HISTÓRIA DO ANTIGAMENTE

Era uma vez um homem chamado Antigamente. O seu discurso sobre qualquer questão acabava invariavelmente por concluir que noutros tempos era diferente, sempre para melhor. Se olhava para os miúdos, rapidamente aparecia algo como “dantes é que os jovens se comportavam como deve ser”. Falava-se de escola ou de educação e ele considerava que no passado é que as coisas funcionavam bem. Assistia aos noticiários televisivos e os comentários sucediam-se, sempre expressando a recorrente ideia de que dantes tudo se passava de forma bem mais positiva. O Antigamente afirmava que já não existem políticos como os de outrora e a música do passado é que, de facto, era música, o que não acontece com essas coisas sem jeito que agora se ouvem. A sua grande preocupação estava virada sobretudo para ideias, comportamentos e costumes. Nesta matéria é que o Antigamente se convencia, e queria convencer os outros, de que no passado é que as pessoas agiam como devem, falavam de forma correcta, vestiam de forma decente e com bom gosto e, enfim, não se viam, como ele dizia, as desgraças que agora não paramos de ver. O Antigamente tinha a maior das dificuldades em entender muito do que hoje acontecia, como tantas coisas são permitidas e concluía que o mundo não iria por bom caminho se não voltasse aos velhos tempos.
Na última vez que me falaram do Antigamente, disseram-me que andava extremamente preocupado com esta questão, que naturalmente não havia dantes, do aquecimento global. O Antigamente tem medo que o aumento da temperatura o possa descongelar. Não será capaz de viver no presente.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

SÓ UM EM CONTRAMÃO? AQUI VÃO TODOS!

Nem sei como dizer isto. Mas correndo o risco de contrariar quem nunca erra, quem domina o único ponto de vista ajustado sobre qualquer problema que afecte o país, quem se julga detentor da verdade, vou mesmo ter o despudorado atrevimento de corrigir o Querido Líder. Não é verdade que o governo tenha ficado sozinho a defender a avaliação de professores, perdoar-me-á o Senhor Engenheiro na sua infinita sabedoria, mas o governo ficou sozinho a defender UM MODELO DE AVALIAÇÃO, que de tantas simplificações, algumas estranhíssimas, (como a de deixar cair a obrigatoriedade da avaliação da componente lectiva), já não é coisa nenhuma, nem o modelo que o governo apresentou. Foi isto que o governo ficou a defender sozinho. Muitos dos discursos ouvidos, sobretudo os vindos dos professores, não confundir com o discurso de alguns dirigentes sindicais, afirmam claramente e defendem a imperiosa necessidade de avaliação dos professores, de forma competente, transparente e eficaz.
Esta afirmação, mais uma, do Primeiro-ministro inscreve-se na habitual miopia que ataca os políticos no poder, a realidade está enganada, eles é que estão certos. Sempre me lembra a história que se conta no meu Alentejo do sujeito que indo, sem dar por isso, em contramão na auto-estrada, ouve avisar pela rádio que se encontra um automobilista a circular em contramão naquela via, o nosso amigo interroga-se “Só um em contramão? Porra, aqui vão todos!”.
Não Senhor Engenheiro, é o governo que com este modelo, seja ele já o que for, vai em contramão.

NICHOS DE MERCADO

O Público de hoje volta a uma questão que não é nova, mas cujos dados têm evoluído. Portugal é o segundo país da UE, depois da Itália, com mais partos realizados por cesariana. De facto, 33.5% dos partos são cirúrgicos, enquanto na Holanda, o país com níveis mais baixos, é de 15,1, uma diferença espantosa. Algumas das explicações, como o aumento de risco em alguns casos de gravidez, opções das mulheres ou indicações da OMS, certamente importantes, parecem-me que escondem a questão central, também o parto é um negócio. Isto é tanto mais evidente, quando verificamos que, de acordo com os dados do Relatório do Projecto Euro-peristat, o número de partos por cesariana realizado em estruturas privadas de saúde é o dobro, apenas o dobro, do realizado em serviços públicos. Esta parece-me que constituirá o maior obstáculo ao cumprimento do objectivo de baixar para números razoáveis o recurso à cesariana.
Sendo claras as estratégias comerciais destinadas a crianças e adultos jovens, estava a lembrar-me de uma peça televisiva que há umas semanas vi sobre o incremento exponencial dos negócios em torno dos funerais, com oferta de serviços inimagináveis, e de um trabalho sobre a crescente importância económica de nichos de mercado especificamente dirigidos para os seniores, constatando que, cada vez mais e inexoravelmente, o cidadão, qualquer cidadão, é um alvo comercial do nascimento até à morte. Não há volta a dar, é a economia, estúpido.

A VIDINHA DO CINZENTO

Às vezes chego a invejar, coisa feia de se fazer, a vidinha do meu amigo Cinzento. Vejam só se não é caso para isso. O Cinzento tem um tranquilo e pouco exigente emprego, que não parece ameaçado, onde não ganha propriamente uma fortuna mas o Cinzento é um homem comedido e sem grandes ambições. Encontrou uma companheira, a Lisete, que o estima e acarinha e com quem tem duas adoráveis crianças que frequentam a escola sem problemas de maior. Os dias do Cinzento começam com uma curta viagem de autocarro para o emprego, onde funciona sem sobressaltos, a que se segue a sopa e o mini-prato do costume, no snack do costume e, à tarde, o regresso a casa onde a Lisete o espera com o jantar que os dotes de cozinheira tornam saboroso. Depois de uns dedos de conversa com os miúdos e de uma passagem de olhos pela televisão, de que o Cinzento rapidamente desliga pois só se vêem desgraças, o meu amigo deita-se a pensar que cumpriu mais uma jornada e, às vezes, sonha que lhe sai o Euromilhões.
O fim-de-semana é religiosamente organizado. O sábado começa pela ida ao supermercado para as compras da semana com a lista elaborada pela Lisete e que o Cinzento prefere realizar para evitar as tentações gastadoras da mulher, passa por uma tarde de futebol pela televisão e pela leitura da Bola que o Cinzento de há muito compra ao sábado e, por vezes, o dia acaba um bocadinho mais tarde do que o costume se contar com a disponibilidade e carinho da Lisete. O domingo de manhã está invariavelmente reservado para a lavagem completa do carrinho que fica toda a semana parado à porta. Lavar por fora, aspirar, colocar abrilhantador na chapa, jantes e pneus, está cumprida a manhã. Segue-se o almoço com um franguinho assado da churrasqueira Catita, com muito bom sabor e em conta, que a Lisete vai buscar. À tarde e consoante o tempo, assim o Cinzento pega na família toda, incluindo a sogra, a D. Adelaide, e orgulhosamente dá um passeio até à Costa, que inclui um café e um bolo para todos, que a vida não pode ser só privações. Em alternativa, se assim o mau tempo obrigar, o Cinzento encaminha a família para o Centro Comercial onde todos gostam de passar a tarde.
À noite, o Cinzento adormece a planear a próxima semana. Igual à anterior, naturalmente. É a vidinha do Cinzento.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

NÃO ACREDITO

Não duvido das respostas dos professores inquiridos no estudo realizado pelo Instituto Superior de Educação e Trabalho sugerindo que quase 75% mudaria de profissão se tivesse alternativa. No entanto, creio que a leitura destes resultados deve ser cuidadosa. Parecem-me mais uma resposta reactiva ao mal-estar instalado pelas erráticas e erradas decisões tomadas no âmbito da PEC – Política Educativa em Curso. Tal reacção, sublinha os efeitos nefastos do clima actual que se vive nas escolas e em que decorre a educação dos miúdos. É certo que a Ministra declarou em tempos numa das suas mais famosas afirmações que “perdi os professores mas ganhei a população” e a partir daí foi sempre a somar de crispação. O que de mais curioso tudo isto tem é que, a história prova-o, as equipas ministeriais mudam, e mudam, e mudam, e os professores na sua quase totalidade continuam, e continuam, e continuam, por uma razão fundamental, a ESMAGADORA MAIORIA DOS PROFESSORES ESCOLHEU SER PROFESSOR.
Por isso, não acredito. Os professores responderam com um desejo de mudança, mas de mudança em muitos aspectos das políticas educativas. Continuo convencido de que, no fundo e se a amostra do estudo for representativa do universo dos professores, que os inquiridos querem continuar a ser professores, mas não a ser professores assim.

OS MILHÕES E OS CÊNTIMOS

O Natal é a época do ano que, privilegiadamente, se destina a um pensamento de piedosa solidariedade para com os nossos concidadãos menos favorecidos. Com a situação que atravessamos e que, dizem, pode ainda piorar, esta preocupação solidária, mais ou menos genuína, tem ainda mais razão para se expressar, do que apenas cumprir o calendário das consciências.
Todos os dias ouvimos o Governo a apresentar medidas e a expressar preocupações. Parece mais ou menos claro que a unidade de preocupação é o milhão, ou seja, ouvimos o anúncio de milhões disponibilizados para os mais diversos fins, mas retemos os milhões injectados na banca para proteger sobretudo, dizem, as pequenas e médias empresas e as famílias, que, ao que parece, não se sentem apoiadas e protegidas.
Pois não vou também falar de milhões, vou falar de cêntimos. Sabem que cerca de 200 000 pessoas, os mais idosos, terão para 2009 um rendimento mensal de 413.33 €? Estas pessoas não recorrem à banca nem integram pequenas e médias empresas, dificilmente os milhões disponibilizados neste universo chegarão àquela franja. Nos tempos que correm, 413 € permitem exactamente o quê? Claro que com diferenças residuais, o fosso entre os mais ricos e os mais pobres mantém-se e os riscos de pobreza são reais. Não atentar nisto é desconhecer a realidade e falta de solidariedade. Também lhe podem chamar políticas sociais. Precisam-se.

O MEU AMIGO CRENTE

Vocês não conhecem o meu amigo Crente. É uma pessoa fantástica. Desde sempre acontece que, quando alguém se refere ao Crente, é provável ouvir, “é um tipo porreiro”. É uma pessoa franca e séria na relações que estabelece, partindo sempre do pressuposto de que todas as pessoas são como ele. Os equívocos que, por vezes, surgem entre as pessoas são entendidos pelo Crente como falhas de sua responsabilidade, pois não acredita que os outros podem errar, consciente ou inconscientemente. Está sempre disponível para confiar e acreditar em qualquer discurso não duvidando das razões ou intenções das outras pessoas.
Algumas vezes vi uma ponta de tristeza nos olhos do Crente, sobretudo quando alguns de nós nos rimos da sua forma de ser, sugerindo-lhe que fosse mais desconfiado e atento às pessoas, pois nem toda a gente é tão boa e bem intencionada como ele. Mas rapidamente o Crente recupera a sua indestrutível confiança nos outros e diz de forma tímida que é assim o seu jeito.
À tarde, quando nos encontrámos, ainda ficámos um pouco na conversa à volta de uma bica até que o Crente saiu apressado. Ainda queria escrever hoje ao Pai Natal para lhe dizer o presente que pretende para este Natal.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

MODELO? QUAL MODELO? A ESPERANÇA ADIADA QUE OS ALUNOS NÃO AGRADECEM

Já aqui escrevi em tempos, que a forma como o modelo de avaliação dos professores definido pelo ME ao ser objecto de sucessivas simplificações, foi estabelecendo gradualmente uma posição insustentável para a Ministra por duas ordens de razões. Em primeiro lugar, porque com sucessivas simplificações, o que fica tem pouco a ver com a posição inicial do ME que entendia a bondade indiscutível do modelo, ou seja, acaba por, cada vez que mexe, dar razão às críticas que se foram ouvindo. Por outro lado a intransigência de não aceitar pura e simplesmente mudar, não para o substituir por aquela incrível e desprestigiante proposta da auto-avaliação entretanto defendida pela Plataforma Sindical, em vez de configurar firmeza e rumo, mostra teimosia e incompetência pois o que está neste momento em cima da mesa é algo que me parece inaceitável. Só para exemplificar, atente-se no facto de, sendo a actividade de ensino o núcleo da acção docente, só se o professor se quiser candidatar à nota máxima é que terá a componente pedagógica avaliada. Isto faz sentido? Os bons professores, a maioria da classe, são bons professores pelo trabalho que fazem nas salas de aula com os nossos filhos. Como é que se pode ainda falar de avaliação de professores se este trabalho em sala de aula, razão que certamente levou a quase totalidade dos professores a quererem ser professores, deixa de estar contemplado obrigatoriamente na avaliação de desempenho?
Esta simplificação de hoje é apenas mais um passo num trajecto que, de tão enviesado e feio, apenas contribui para que a qualidade na educação de que todos falam seja, continue a ser, uma esperança adiada. Os alunos não agradecem.

PRIORIDADES

Em tempos de aperto, lembramo-nos da história da manta que é curta. Se a puxamos para cima destapamos os pés, se a puxamos para baixo apanhamos frio em cima. Assim é o orçamento da maioria das famílias portuguesas e, por isso, agora no inverno, ou andamos descalços (ou com as havaianas da moda) e de casaco, ou com sapatos mas de t-shirt.
Esta conversa vem a propósito de alguns indicadores já conhecidos sobre a utilização dos cartões multibanco neste Dezembro. De acordo com a SIBS, os portugueses aumentam o número de compras mas o volume de dinheiro gasto é o mesmo, ou seja, compram-se bens mais baratos.
Por outro lado, a Apifarma divulga a informação de que tem vindo a acentuar-se o abaixamento dos gastos com medicamentos. Esta situação pode até nem ser grave, se considerarmos que em Portugal se verificam altos níveis de consumo de medicamentos e de auto-medicação.
No entanto, parece curiosa e indicadora dos tempos a síntese que destes dados se pode extrair, com compras mas com dores.
Grave, grave, é não poder fazer aquele monte de compras desnecessárias que nos mascara de felizes umas horas por ano.

O QUE ME CONSOLA, É A MINHA CONSOLA

Há algum tempo atrás referi-me a um jogo para computador, o Call of Duty – World at War, cuja publicidade passa na televisão, que me impressionou pela violência e pelo facto da publicidade aparecer tranquilamente no chamado horário nobre. A minha ignorância nesta matéria leva-me a ficar ainda mais surpreendido com um jogo que vi há uns dias ser apresentado numa peça de um Telejornal. O jogo, GTA IV – Grand Theft Auto, pareceu-me assentar na gestão dos comportamentos de natureza criminosa de um personagem e que incluíam roubo de automóveis, espancamentos, homicídios, atropelamentos, etc., tudo comportamentos do mais fino recorte ético, moral e formativo.
É certo que o jogo é apresentado como destinado a adultos, o que não o torna mais interessante, mas como um dos intervenientes na peça informou, em qualquer local venderão o jogo sem grandes preocupações sobre a idade do destinatário.
Sabendo, como já aqui referi, a quantidade de tempo que muitos miúdos passam sós em frente a um ecrã, é fácil perceber os efeitos potenciais de tal experiência, sobretudo, nos mais novos. Como sempre digo, este discurso não pretende diabolizar os jogos de vídeo ou para computador, tem apenas a ver com a qualidade das experiências que, por negligência, omissão ou desconhecimento, proporcionamos aos gaiatos.

O DESPUDOR

Poderia dizer que estou surpreendido, mas não. Lamentavelmente, a política no Portugal dos Pequeninos já não nos consegue surpreender. Depois do que foi a trapalhada com o governo do menino guerreiro, do estado em que as finanças da Figueira da Foz ficaram, do que foi a gestão lisboeta, incluindo a generosa contribuição para os bolsos do arquitecto Frank Gehry e, sobretudo, do indecoroso espectáculo que as lutas internas do PSD nos últimos tempos tem constituído, a indigitação "pacífica e entusiasmante" do Dr. Santana Lopes para candidato à Câmara Municipal de Lisboa é representativa do que mais negativo existe na luta pelo poder, sem princípios, sem memória, sem pudor ético, enfim, sem vergonha. Será que é mesmo esta a classe política que merecemos?

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

NÃO SE GOVERNA PELA RUA, MAS É PRECISO OUVIR A RUA

Se considerarmos a posição de Mário Soares hoje expressa no DN, que me parece conter algum realismo, ainda menos se percebe a sua intervenção na semana passada, quando afirmou que, por estarmos em tempo de crise, não é oportuno fazer guerra política. Parece-me justamente o contrário, quanto mais difíceis e complexos são os tempos, mais é exigido que as lideranças políticas sejam consistentes, sólidas e capazes de congregarem as comunidades em projectos de ultrapassagem das dificuldades e restauradores da esperança e essas lideranças emergem da luta política. Os grandes lideres políticos as últimas décadas emergiram sempre em tempos de dificuldade, nunca em tempos de bonança. Assim sendo, a luta política é imprescindível no sentido de clarificar ideias, definir alternativas, identificar projectos, mas ao serviço das comunidades e não ao serviço de projectos pessoais que, estes sim, representam a política com “p” pequeno referida na espantosa intervenção da deputada do PS, Marta Rebelo, a propósito do triste episódio das faltas dos deputados.
A grande questão será perceber se o actual cenário político contém esse potencial de liderança e federação de projectos que contribuam para, em tempos difíceis, definir propostas de desenvolvimento e melhoria do bem-estar comum. De facto, temos um PS acantonado e acomodado à sombra de um líder, Sócrates, sem capacidade para dialogar e federar, mas com um projecto de poder. Existe a excepção do habitual Manuel Alegre, que agora agita agora a hipótese de ir a votos não se sabe muito bem com quê, nem com quem. Temos o PSD em implosão e nas habituais lutas pelo poder interno, um CDS-PP, espécie de sociedade política unipessoal e o Bloco e PC em disputas inócuas sobre quem é a verdadeira esquerda, seja lá isso o que for nos tempos que correm.
Neste caldo, ou aparece um D. Sebastião tão ao nosso gosto, ou o risco de convulsão social é sério por ausência de projectos reguladores ou esperamos que a comunidade tenha a capacidade de produzir, até para além da vida partidária, um projecto que lhe devolva confiança e esperança no futuro.

UM HOMEM CHAMADO FELIZ

Era uma vez um homem chamado Feliz. Desde pequeno que, quase sempre, aparentava um ar satisfeito. Vivia numa família de quem gostava e que gostava dele. A escola correu sem sobressaltos, tinha amigos com quem brincava tranquilamente e, por isso, o Feliz se sentia bem.
Cresceu, acabou o curso que escolheu e encontrou um trabalho no qual se sentia bem. Apaixonou-se e a família que formou também o deixou satisfeito. Não era insensível, antes pelo contrário, aos problemas que afligiam as pessoas mas não escondia o bem-estar que sentia.
A partir de certa altura, o Feliz começou a sentir que o tratavam se forma diferente. As pessoas mostravam-se amargas e irritadas na relação consigo. De mansinho, sentiu que se instalou antipatia à sua volta. Sem perceber muito bem porquê, o Feliz esforçava-se por recuperar as relações procurando mostrar-se ainda mais simpático, disponível e com o ar que um feliz deve ter. Sem resultado, quanto mais se esforçava por se mostrar bem, mais amargas as pessoas pareciam.
Um dia, estava sentado num banco de jardim a pensar na sua vida, quando ao lado se sentou um Velho. Como sempre, o Feliz meteu conversa e, como frequentemente fazemos com desconhecidos, contou a sua perplexidade. Depois de ouvir a longa história, o Velho, de olhos serenos e voz calma, falou.
Sabe amigo, de uma forma geral as pessoas não gostam de Felizes, sobretudo as que não se sentem bem consigo próprias. Como não se sentem bem, cada vez que encontram um Feliz é como se tivessem um espelho em frente que lhes devolve a imagem da sua infelicidade. Então, por vezes, mostram-se amargas e irritadas como se cobrassem ao Feliz a sua própria infelicidade.
Eu até entendo isso, mas que hei-de fazer?
Nada, amigo. Boa tarde, seja Feliz.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

DE PEQUENINO SE TORCE O DESTINO

Num relatório agora divulgado pela UNICEF a que o Público faz referência, chama-se a atenção para as condições de educação das crianças entre os zero e os seis anos. Portugal apenas cumpre quatro dos dez indicadores de referência relativamente aos cuidados a prestar a esta franja etária. Os indicadores não cumpridos comprometem a qualidade nas condições de educação. Em Portugal, 25% das crianças até aos três anos passam o dia longe dos pais, entre os três e os seis anos a percentagem é de 82%. Como se verifica noutros países estes números tendem a elevar-se devido às condições socioeconómicas e culturais, como, por exemplo, a falta de protecção à carreira profissional das mães que implica a necessidade de retorno prematuro à vida profissional pós-parto com o consequente afastamento da criança. Torna-se assim imperioso assegurar a qualidade dos serviços educativos prestados aos mais pequenos no sentido de assegurar melhores níveis de sucesso e realização.
Considerando uma outra face do mesmo problema, a educação e cultura relativa à protecção dos mais vulneráveis, não posso deixar de referir que o Tribunal da Relação de Coimbra deu provimento ao recurso de um homem que tinha sido condenado a pena suspensa e ao afastamento da casa por um período de 16 meses, pois deram-se como provadas as agressões à mulher, por vezes na presença dos filhos. O Tribunal da Relação decidiu levantar a pena de afastamento da casa, ou seja, a vítima é obrigada a coabitar com o agressor. Será que estes amanuenses da justiça percebem o que estão a fazer?
Por isso, repito, é imprescindível promover, tanto quanto possível, a qualidade da educação, talvez tenhamos menos agressores e juízes mais competentes.

NAMORO

(Foto de António J. S.)

Maria, queres vir passear à chuva? Seria bonito. Lembras-te de Serenata à Chuva? Eu faria de Gene Kelly e tu de Debbie Reynolds. É certo que não dançaria tão bem como ele, mas tenho a certeza que nos divertíamos ainda mais, porque eles eram actores a vestir uma personagem e eu, eu gosto muito de ti, Maria.

domingo, 14 de dezembro de 2008

PARTE O ALEGRE, CHEGA O PORTAS

O discurso de Manuel Alegre deve ter feito soar as campainhas do núcleo duro do PS, perdão, do Governo, o “think-thank” socialista terá de analisar e prever as potenciais consequências da ideia deixada em aberto por Manuel Alegre de “ir a votos”. Em primeira análise poderá fazer perigar a hipótese, não segura, de uma nova maioria absoluta e o reforço de uma maioria social à esquerda que dificulte as políticas mais liberais que têm sido desenvolvidas por Sócrates. No entanto, creio que não deve esquecer-se que o posicionamento actual do CDS-PP parece ir no sentido viabilizar um governo sem maioria absoluta. Por aí Sócrates poderá descansar um pouco, sobretudo se o CDS-PP conseguir entrar no eleitorado do PSD o que, no estado que o partido atravessa, não parece tarefa muito complicada.
No entanto, a disponibilidade para os votos resultante do discurso de Alegre e do Encontro das Esquerdas, continua a não contemplar algo que me parece verdadeiramente necessário, uma mudança que permita combater a partidocracia instalada. Não o fazendo, trata-se apenas de mais um que obrigará a refazer as contas e a restabelecer equilíbrios, para que tudo fique na mesma como diria Lampedusa.

TARDE PIASTE

Como aqui já tenho referido, na minha terra, quando alguém decide fazer ou dizer algo que já vem atrasado, utiliza-se a expressão, “tarde piaste”. É o caso do Banco de Portugal. O Governador, é ele o responsável, deixou-se enrolar, ou não foi suficientemente competente na acção de supervisão para prevenir as trapalhadas que os gestores executivos do BCP foram montando ao longo dos anos. A maior parte desta gente conseguiu entretanto excelentes “Planos de Reforma” e enormes “apoios” à sua retirada. Estão na sua grande maioria em pleno gozo de uma douradíssima reforma. Agora, de acordo com o Público, o Banco de Portugal vem acusá-los de práticas de gestão ilícitas. Os acusados, certamente, sem fundamento, poderão, como é natural, apresentar a sua defesa e o processo entra, assim, na suave modorra que inspira o Dr. Vítor Constâncio, a última pessoa a correr o risco de se considerar hiperactiva. Antecipo que as consequências irão ser mínimas, eventualmente alguns dos envolvidos poderão ver-se inibidos de exercer cargos de gestão no sistema bancário durante algum tempo. É verdade que estando já reformados, a “pena” é irrelevante. Até imagino o Eng. Jardim Gonçalves e o delfim Teixeira Pinto a tremerem de medo e a “ver a vida a andar para trás”.
No entanto, para dar uma ideia de justiça, também se poderá dizer, “vale mais tarde, que nunca”.

A NÁUSEA

Por mais quanto tempo? Como bom português tenho a tentação da promessa e quase começava este texto com uma, não volto a falar do Dr. Jardim, o Alberto João. Mas não a faço, e não sabendo, portanto, se será última vez, cá estamos. Depois daquele espectáculo deprimente e insultuoso que foi a aprovação do orçamento pelo Parlamento regional, com a troca de insultos e atropelos às regras democráticas, assistimos ao discurso de ontem com insultos, chantagens e ameaças saloias. Não vale a pena, como muitas vezes acontece, desvalorizar com as afirmações habituais do tipo é estilo, é inimputável, tem graça, ou um mais simples, já não há pachorra. Não, é perigoso e é um insulto que não temos de suportar. Até quando o PSD e o Presidente da Republica tolerarão o discurso e as práticas jardinistas? Quem conheça minimamente a realidade da Madeira, não pode desconhecer a teia de interesses, monopólios, circuitos de benesses políticas, asfixiamento da liberdade de opinião, etc., que a elite política do PSD-Madeira instalou na ilha, um verdadeiro polvo nas palavras de Alberto João quando se dirige ao polvo instalado pelo PS.
Não percebo que medo possa meter o Alberto João, a não ser a quem na Madeira não esteja nas suas graças. Mas medo não é respeito e quem não respeita não pode ser respeitado, nem faz falta. É uma nódoa, como diria o Eça.

ENERGIA POSITIVA

Sobre a situação que atravessamos, torna-se obviamente impossível encontrar opiniões consensuais, quer entre políticos, entre técnicos ou entre o cidadão comum, para além da que toda a gente exprime, “isto está mau”. Nesta perspectiva, creio que não fica fácil para a generalidade das pessoas, considerar-se esclarecido sobre a natureza das medidas a tomar face à crise e, naturalmente, estabelecer um juízo definitivo sobre o pacote de medidas agora enunciado pelo governo pois como diz o povo, cada cabeça cada sentença, e para muitos de nós a boa medida era … colocarem-nos dinheiro no bolso. Isto é tanto mais complicado quando se verifica que os especialistas não terão avaliado de forma adequada os sinais que indiciavam o risco e que os dispositivos do mercado, também montados por especialistas, se revelaram insuficientes para evitar os sérios problemas que estão aí e que, provavelmente, ainda não conhecemos todos.
Perante este quadro promotor de desconfiança, creio que é mais interessante procurar algo de positivo e a um nível que para qualquer de nós seja acessível. Assim, parece-me de sublinhar a iniciativa de um cidadão de Tondela, não especialista em energia, que resolveu montar no seu quintal um conjunto de painéis solares para produzir energia que injecta directamente na rede, vendendo-a à EDP a um preço seis vezes superior ao que nós compramos. Espera ter o retorno do investimento no prazo máximo de 8 anos, para além de alguns benefícios fiscais.
Não vos sei dizer porquê, mas achei mais interessante contar este exemplo que falar da crise, das várias crises que por aí andam. Talvez seja da necessidade de vermos alguma coisa de animador e positivo à nossa beira.

sábado, 13 de dezembro de 2008

LER A TERRA E TER A ESTRADA NA PALMA DA MÃO

Em mais um dia cabaneiro no meu Alentejo, ficámos nas lérias ao pé do lume. Estávamos de conversa sobre o atraso na “semeação” e o Mestre Marrafa aproveitou para contar uma história. Trabalhava no Monte da Pedreira que foi comprado por um “engenhero” novo. Quando se chegou à altura da “semeação” apareceu lá um “engenhero” velho que perguntou que quantidade de semente iam espalhar por hectare. O “engenhero” novo respondeu-lhe que nos livros dizia a quantidade. O “engenhero” velho disse-lhe para ele perguntar ao feitor velho que estava no monte há muitos anos e que deveria saber a quantidade acertada para a “semeação”. O velho explicou que embora se tenha estudar nos livros também é preciso perguntar a quem estuda a terra, que não são todas iguais. O Mestre Marrafa ria-se a dizer que o patrão novo nunca mais convidou o “engenhero” velho para voltar ao monte, não gostou da lição.
Esta história sobre o conhecimento que advém da prática, fez-me lembrar um episódio que se passou comigo numa das primeiras viagens a Moçambique. Vinha de Chimoio para a Beira num jipe conduzido pelo Sr. Doba, de quem vos hei-de contar outras histórias. Como reparou que eu gostava de tirar fotografias, postais chamava-lhe o Sr. Doba, começou a avisar-me com antecedência, “daqui a 5 km tem um sítio bom para um postal”, e assim era, mais um aviso, “a 6 km há um monte bonito para tirar um postal” e a viagem ia decorrendo. Passados alguns alertas, não resisti e comentei como ele conhecia bem a estrada. Olhou para mim com aquele sorriso enorme que o caracterizava e disse-me, mostrando as palmas das mãos, “A estrada está toda aqui”.
Claro, por vezes esquecemo-nos de como se pode estudar a terra e ter a estrada na palma das mãos.

UM HOMEM CHAMADO OPTIMISTA

Era uma vez um homem chamado Optimista. Ao longo de toda a sua vida sempre encontrou forma de fazer um discurso positivo e de confiança, mesmo quando as circunstâncias não eram muito favoráveis. A sua capacidade era tão eficaz, que as pessoas que ouviam o Optimista quase se sentiam contagiadas, ficando a ver a realidade com outros olhos, como se costuma dizer.
O Optimista tinha uma maneira de falar muito curiosa e na qual assentava a sua forma de ver a vida. Para vos dar alguns exemplos, o Optimista não falava de pobres, antes de menos favorecidos. Em vez de dificuldades, referia-se a oportunidades. Os problemas transformavam-se em estímulos. O Optimista transformava uma derrota em qualquer coisa como, os objectivos não foram totalmente alcançados. Nunca ficava sem resposta, quando hesitava era porque estava a pensar e a teimosia passava a persistência. O Optimista era assim uma espécie de Rei Midas que transformava qualquer coisa negativa em algo de positivo.
Disseram-me que estava em vias de ser nomeado porta-voz do governo.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

A POLÍTICA COM "p" PEQUENO E A DEPUTADA COM "d" PEQUENO

Não resisto. Depois da embrulhada da última sexta com as faltas dos deputados, hoje verificou-se a ausência de quórum para reunir a Comissão de Orçamento e Finanças da Assembleia da República. Será que os deputados entraram numa espiral de suicídio de imagem? É só incompetência? Trata-se de desrespeito e desprezo face a quem os elege e financia? É fruto da impunidade dos partidos face à recorrente situação? Veja-se que como consequência do escândalo da semana passada, o PSD resolveu “punir” os deputados com um trabalho, apresentar uma proposta legislativa. Extraordinário. Então não é para isso que lá estão? Então só trabalham quando se portam mal?
É certo que hoje poderíamos admitir a existência de várias circunstâncias atenuantes para as faltas e que foram referidas por alguns deputados. A reunião da Comissão começava às 9:30, praticamente de madrugada, e, como sabem, o trabalho político à noite acaba tarde. Verificaram-se problemas com o trânsito, situação que raramente acontece e que, por isso, surpreendeu alguns deputados. A ordem de trabalhos não era particularmente importante e, naturalmente, os génios não podem desperdiçar tempo com minudências. Estava algum frio e chuva e, como sabeis, com a Assembleia em obras, estar lá dentro é, praticamente, estar na rua. Considerando todos estes aspectos acho que a deputada Marta Rebelo, uma das faltosas (com justificação, claro) tem razão quando afirma, que falar das faltas dos deputados é política com “p” pequeno, quando é preciso atentar na política com “P” grande.
É verdade, por isso escrevi deputada com “d” pequeno.

NÃO SEI LER

O Professor Velho, aquele que está na biblioteca e fala com os livros, estava sentado num banco do recreio da escola a apanhar um bocadinho de sol quente ao intervalo, quando a Joana se sentou ao seu lado. A Joana tem quase sete anos e entrou este ano para a escola. Ficou calada a olhar para longe e, de repente, disse para o Professor Velho, “Não sei ler e, se calhar, não aprendo”. O Velho perguntou-lhe porque dizia aquilo. A Joana pensou um bocadinho e explica, “Não sei o que dizem as coisas que estão escritas”. O Velho olhou à volta, levantou-se e convidou a Joana a dar um passeio pela parte do recreio que dava para a rua, cheia de lojas e movimento, em frente à escola. E foi fazendo algumas perguntas.
Olha para aquela coisa vermelha e amarela por cima daquelas portas largas, que está lá escrito?
McDonald’s, disse a Joana a rir-se.
E naquela tabuleta por cima daquele café?
Coca Cola, disse de pronto a Joana.
E naquela casa que tem uma cruz branca em cima do verde está escrito o quê?
Eu acho que é farmácia.
Tens razão, e neste papel que algum colega teu deixou cair?
Corneto, disse a Joana já à gargalhada.
E na tua mochila está escrito o quê?
Noddy.
Estavas a enganar-me Joana, afinal sabes ler e até lês palavras estrangeiras.
Velho, mas não sei bem o nome das letras e entender todas as palavras.
Bom. Então sabes ler mas precisas de saber melhor o nome das letras para conhecer mais palavras. Acho que vais ser capaz de aprender, já conheces muitas palavras que, como viste, sabes ler e os teus colegas e a tua professora vão dar uma ajuda. Depois vais ter comigo à biblioteca que eu tenho lá uns livros muito giros para leres.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

DIOXINAS E ACTIVOS TÓXICOS

Definitivamente, o mundo anda estranho. Quando parecia que “só” tínhamos a crise para nos preocupar, eis que esse paradigma do desenvolvimento europeu, a Irlanda, nos manda salsichas e entremeada temperadas com dioxinas, que, ao que parece, fazem mal mas que as autoridades europeias da qualidade alimentar dizem que … não fazem mal. O pobre cidadão já desesperado e desconfiado das vacas descompensadas, dos frangos, patos e perus com gripe, vai voltar-se para quê? Para o peixe de piscicultura, ou seja, de “peixário”? Sabe-se lá com que rações são alimentados os peixes de “peixário”? Na volta, o meu amigo Cajó é que tem razão, “Cá p’ra mim, esta cena da carne de porco, é mas é p’ró pessoal deixar de comer, não há é guito, os porcos andam bons”.
Mas o problema dos químicos nocivos não é só com os porcos, parece que os bancos estão cheios de activos tóxicos, dizem agora. É por isso que o pessoal está com grandes dificuldades com os bancos, entra-se lá com a ideia de pedir uma massinha para comprar o T2 lá no bairro e sai-se intoxicado e doente com a pipa de juros que se vai pagar durante a vida inteira, quando se consegue.
Mas há mais activos tóxicos. Reparem como muitos dos políticos que temos são autênticos activos tóxicos na nossa democracia, vejam a confusão que se instalou na Assembleia da Republica com a mais do que habitual falta dos deputados. Será que no Protocolo de Quioto consta alguma disposição ou meta relativa às questões ambientais na política?

É A FASE DA MÃE

Hoje, estava no meu habitual programa do fim de tarde de quarta feira, à espera do meu sobrinho, na companhia do jornal e do chá, quando entrou, no café pequenino e simpático onde me acolho do frio, uma senhora com um bebé ao colo. A senhora do café cumprimentou efusivamente com um “Olá Marta” dirigido, percebi, ao bebé. A mãe respondeu com um imprevisível “agora é fase da mãe” que me surpreendeu e me deixou atento. Felizmente para a minha curiosidade, a senhora foi explicando de forma detalhada que a Marta só quer a mãe, não quer outra coisa.
Achei engraçada e ingénua a conversa, pois que há-de uma pessoa com oito ou dez meses querer que não a mãe? A mãe é tudo e dá tudo. Que esperaria a mãe da Marta que ela quisesse?
O problema é que no nosso país continuamos com demasiadas crianças pequeninas sem mãe, umas porque estão escondidas em algumas instituições, outras, porque mesmo tendo por perto a mulher que as pariu, estão sem mãe.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

DESGASTE OU SEGUIDISMO SOCRÁTICO

Há pouco, no carro, durante um serviço noticioso, ouvi o Dr. Mário Soares, naquele seu jeito de dar lições, “explicar” a propósito do próximo 2º Encontro das Esquerdas, que “atirar contra o governo” não faz sentido porque, considerando a crise difícil que o país atravessa, será prejudicial para o país, não para o governo. Primeiro, pensei que não tinha ouvido bem, mas depois já em casa e pela imprensa on-line, percebi que foi exactamente isto que foi dito e que me parece extraordinário. De acordo então com o Senador Soares, só faz sentido fazer oposição quando a situação é tranquila, calma e atravessamos um período positivo, caso contrário, atentamos contra o interesse nacional, notável. Se pensarmos que o Dr. Mário Soares começou a sua luta pela democracia no mais “estável” período da história recente do país, o Estado Novo, ainda menos se percebe. Se repararmos na luta de Mário Soares nos agitados tempos do PREC em que a crise também não era pequena, ainda menos percebemos. Será apenas o desgaste da idade ou uma conversão de última hora do laico Soares ao “Seguidismo Socrático”?

COM UMA PONTINHA DE DEMAGOGIA E POPULISMO

Eu sei que haverá por aqui uma ponta de demagogia e populismo. No entanto, não posso deixar de reparar que numa época marcada por muitíssimas dificuldades atravessadas por milhares de portugueses, pela subida significativa de pedidos de ajuda às instituições de apoio social, por situações crescentes de desemprego e incumprimento de créditos com consequências devastadoras para as famílias, etc., ficamos a saber que o Governador do Banco de Portugal tem o terceiro salário mais alto dos governadores de bancos centrais, atrás do Banco de Hong Kong e do Banco de Itália, assistimos à escandalosa trapalhada sobre faltas e assinaturas não correspondentes às presenças por parte daqueles que representam, por natureza, a nata da acção política, os deputados, para não referir o que recentemente tem vindo a lume no âmbito dos casos BPN e do BPP.
Não consigo entender porque razão, quem de direito, os próprios envolvidos, não avaliam o impacto devastador e lesivo da sua própria imagem que situações destas implicam. Por onde pára o pudor e o bom senso e algum sentido ético de solidariedade e cumprimento do dever de que as elites não podem, nem devem, alhear-se.
Estas questões serão certamente questões menores quando comparadas com os atropelos que ainda se verificam aos Direitos Humanos no dia em que se assinalam 60 anos sobre a Declaração Universal, mas contribuem, seguramente, para um caldo de cultura pouco positivo e promotor de confiança.