AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

domingo, 31 de dezembro de 2023

DA EDUCAÇÃO. EM JEITO DE BALANÇO

 Faz parte das rotinas do final de ano proceder de diversas formas a um balanço do ano que acaba e se perspective o ano que vai chegar. Algumas notas relativas ao universo da educação, a área em que me movo há décadas, embora não esqueça a gravidade e preocupação com o rumo do mundo que constitui uma enorme ameaça, sendo que os sinais de esperança em melhoria são ténues.

Na educação, o ano que está a terminar o ano é marcado pela situação que envolve os professores e as suas consequências nas comunidades escolares Num caminho que começou em Maria de Lurdes Rodrigues e continuado pelos Ministros de Educação que se seguiram temos vindo a assistir a uma sucessão de medidas de políticas públicas de educação com impactos significativos e negativos na profissão docente e nas pessoas que a desempenham que se interligam ou associam.

Sem hierarquizar ou esgotar vejamos alguns aspectos. Regista-se a manutenção de um modelo de carreira, recrutamento e colocação de professores ineficiente e produtor de injustiça, um modelo de avaliação também injusto, incompetente e pouco transparente, a desvalorização salarial e social que se associam a uma baixa atractividade pela carreira de professor, o previsível e não acautelado envelhecimento dos professores e o consequente abandono, o cansaço e desânimo sentido pelos docentes e sublinhado em muitos estudos, o modelo de governança de agrupamento e escolas que se liga, embora não como única variável, ao clima que se vive em muitas comunidades escolares, um caminho de “descentralização”/municipalização” cheio de dúvidas e pouco claro, ou a burocracia excessiva que leva a uma “agitação improdutiva” e, pior, cansativa e ineficaz.

Este contexto acaba, naturalmente, por se tornar mais pesado e doloroso para os que gostam, escolheram e querem ser e continuar a ser professores, a maioria dos docentes apesar dos discursos de cansaço que regularmente se ouvem.

Todas estas questões sustentaram uma mobilização reactiva de forma muito significativa dos professores e tanto mais significativa, quanto também emerge fora, por assim dizer, da influência dos mais habituais “representantes” dos professores e se evidencia o apoio de pais e alunos, também preocupados com a situação de mal-estar e injustiça dos docentes.

Ainda relativamente aos professores e também decorrente das políticas públicas erradas de que, sem surpresa, ninguém assume responsabilidade, assistimos ao agudizar da falta de docentes que produz efeitos de diferente natureza e todos preocupantes, muitos alunos sem aulas a alguma disciplina no final do primeiro período, recurso profissionais sem formação adequada e o risco de promoção de uma “desprofissionalização” da classe docente com óbvios riscos.

Merece também registo o conhecimento de dados conhecidos de diversos dispositivos de avaliação externa do desempenho de alunos, de produção interna pelo IAVE, exames ou provas de aferição, ou externa de que é exemplo o PISA, que claramente mostram um abaixamento do desempenho escolar dos alunos portugueses nos diferentes ciclos e com a manutenção de desigualdades que a educação escolar não está a minimizar. Os dados dos dispositivos de avaliação externa contrastam com as avaliações internas, que através dos “percursos de sucesso” (alunos que terminam o ciclo no número de anos previsto) mostram uma discrepância altíssima que não deveria existir.

O ME continua, apesar da retórica em sentido contrário, a envolver as escolas e o seu quotidiano numa burocracia asfixiante e inútil que aumenta problemas e nada contribui para soluções.

Continua a ser imprescindível dotar as escolas de forma continua e estável dos recursos necessários para minimizar tanto e tão rápido quanto possível as dificuldades que identificam. Recursos suficientes para recorrer a apoios tutoriais ou ao trabalho com grupos de alunos de menor dimensão, apoios específicos a alunos mais vulneráveis, técnicos, psicólogos, por exemplo, num rácio que possibilite um trabalho multidimensionado como é exigido, etc., são essenciais e serão sempre essenciais. Torna-se também necessária a existência de dispositivos de regulação que sustentem o trabalho desenvolvido e de processos desburocratizados.

São apenas alguns exemplos de respostas com resultados potenciais com um custo que talvez não seja superior aos custos de tantos Projectos, Planos, Programas ou Iniciativas Inovadoras destinadas a múltiplas matérias e com custos associados de “produção” que já me têm embaraçado, mas a verdade é que as agendas e o marketing têm custos. Por outro lado, também acontece que todo este movimento acaba por mascarar a inadequação ou ausência em matéria de políticas públicas.

O ano também me parece marcado pelo deslumbramento do ME com a transição digital, quando são conhecidas com demasiada frequência queixas relativas ao acesso a equipamentos por parte dos alunos, à qualidade dos equipamentos, à insuficiência dos recursos necessários à adequada utilização dos equipamentos, nas escolas, mas em particular nas salas de aulas, infra-estruturas eléctricas e rede de net eficientes, por exemplo. Acontece ainda que existe uma enorme diversidade na literacia digital dos alunos. Deste cenário podem decorrer situações sérias de desigualdade entre escolas e entre alunos e todos conhecemos múltiplas situações que evidenciam a enorme disparidade de recursos e da sua utilização.

É conhecido também que muitas famílias recusam receber os computadores pois em caso de problemas serão responsáveis pelos equipamentos. Nesta situação estão sobretudo famílias com menores rendimentos o que, naturalmente, não será de estranhar. Os exames e provas de aferição serão realizados em formato digital em 2024.

O ME, não só nesta questão, mas de uma forma geral optou por um discurso de negação de dificuldades ou enreda-se em exercícios de “wishfull thinking” em que tudo vai (quase) bem.

Em Março teremos eleições e a equipa que se segue no ME herda um pesado caderno de encargos e seria desejável que se assumisse que as necessidades de mudança em matéria de políticas públicas, são demasiado importantes para que não sejam realizadas e se devolva, tanto quanto possível, a tranquilidade aos professores, às escolas, às comunidades educativas. De uma vez por todas, é necessário contenção e combate ao desperdício, mas em educação não há despesa há investimento.

A história não vos absolverá.

Bom Ano.

sábado, 30 de dezembro de 2023

QUANDO A IMPRENSA É NOTÍCIA

 De vez em quando a imprensa é ela própria o objecto da notícia. Desta vez noticia-se as dificuldades risco de encerramento de alguns títulos do Global Media Group que detém, entre outros o Jornal de Notícias (JN), o DN, a TSF, o Jogo ou o Dinheiro Vivo.

A confirmar-se, o encerramento, o desaparecimento de um órgão de imprensa é sempre um embaraço cívico, em particular com as características, sublinhando pela sua presença o DN, o JN e a TSF que muitos de nós se habituaram a ter como referência no universo da rádio.

É um lugar-comum, mas uma imprensa de qualidade é um dos alicerces da democracia e, nunca como hoje se tornou tão necessária.

É recorrente, não só em Portugal, a discussão da questão da sobrevivência da imprensa e, naturalmente, da sua independência face aos poderes, político e económico, designadamente. Sabemos das tentativas recorrentes de controlo político da imprensa, como também sabemos da eventual agenda implícita dos investimentos dos grupos e poderes económicos na imprensa. São vários os exemplos recentes. Sabemos que a sustentabilidade económica da imprensa é condição necessária, mas não suficiente para a sua independência e por isso os tempos são difíceis.

Por outro lado, a evolução do próprio mundo da imprensa, a evolução exponencial do universo do on-line, a conjuntura económica inibidora de gastos das famílias em bens “não essenciais” e, caso particular de Portugal, o baixo nível de hábitos de leitura e consumo da imprensa escrita, produzem dificuldades de sobrevivência de títulos de qualidade, chamados de referência, abrindo caminho à chamada imprensa tablóide que, apesar das oscilações, se mantém relativamente saudável, o que se entende. São também tablóides os tempos.

Como leitor de jornais desde muito novo, é sempre com inquietação e tristeza que penso nestas questões e vou assistindo ao abaixamento das tiragens e, finalmente, ao desaparecimento.

Numa entrevista ao Público há já algum tempo, um especialista, Tom Rosenstiel, afirmava que se o jornalismo deixar de ser rentável e, como tal, correr o risco de desaparecimento, as democracias poderão sofrer um "cataclismo cívico". Creio que a cidadania de qualidade exige uma imprensa não só voltada para o imediatismo da espuma dos dias e acredito que apesar das mudanças em tecnologia e das incidências do mercado a que os jornalistas, a imprensa saberá adaptar-se. Quero acreditar que a imprensa, jornais ou rádio com qualidade, são como os dias, nunca acabam. Se forem jornais, bons jornais, independentemente do suporte têm de resistir.

A imprescindível sobrevivência da imprensa, da boa imprensa, para além da qualidade e competência do seu próprio trabalho, também se garante na escola, nos hábitos de leitura, na educação, na cidadania.

Aguentem-se DN, JN e TSF, fazem falta.

quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

DOS PROFESSORES

 O Público de hoje aborda uma questão que durante todo o ano foi objecto de notícia, a situação de mal-estar dos professores face à desvalorização e injustiça que a classe sente. Vou retomar notas já aqui expressas.

Não me lembro de nos últimos anos a classe docente estar tão presente na agenda como nos dias que vivemos. Os seus problemas e as consequências a curto e médio prazo, sendo conhecidos de há muito, são agora claramente reconhecidos apesar de algumas tentativas de torcer a realidade. São recorrentes as referências à preocupante falta de professores, ao envelhecimento da classe, os níveis de cansaço e de exaustão emocional, a menor atracção dos mais jovens pela profissão associada a modelos de carreira, contratação e valorização pouco motivadores e justos. Os professores passam por dispositivos de avaliação pouco transparentes e competentes que desmotivam, causam mal-estar e climas institucionais pouco amigáveis, para ser simpático na adjectivação.

Antecipa-se e este último trimestre parece comprová-lo um caminho que transformará técnicos em professores, num processo questionável e preocupante de “desprofissionalização”.

Também é de registar que de uma forma geral continuam a merecer a confiança das comunidades.

Este quadro, de um mal-estar reconhecido, não pode deixar de ter impacto. Como muitas vezes afirmo, crianças, enquanto grupo social, e professores, enquanto grupo profissional, constituem dois grupos nucleares nas sociedades contemporâneas. Os mais novos porque são o futuro e os professores porque, naturalmente, o preparam, tudo (quase) passa pela escola e pela educação. Entre nós, este entendimento ainda me parece mais justificado porque, devido a ajustamentos na organização social e familiar e, é minha convicção, devido a políticas públicas sociais e educativas inadequadas, os miúdos passam tempo excessivo na escola, alterando a dinâmica educativa familiar o que sobrevaloriza o papel da escola através dos professores.

Raramente a profissão professor tem estado tanto em foco como nos últimos anos bem como a necessidade de defender a qualidade da escola pública. Os tempos que vivemos sublinham uma questão e outra de forma crítica.

Múltiplas acções e decisões políticas, bem como alguma imprensa e "opinion makers" têm contribuído para degradar a sua função, fragilizar a sua imagem social e comprometer o clima e a qualidade do trabalho desenvolvido nas escolas apesar dos professores continuarem a ser uma das classes profissionais em que os portugueses mais confiam.

A atenção que tem estado centrada nos professores advém de boas e más razões. Não cabe aqui um balanço, e entendo que, tal como os miúdos, os professores não têm sempre razão, os discursos dos seus representantes são, por vezes parte do problema e não parte da solução e também sei que existem alguns professores que o não deviam ser. No entanto, a verdade é que a esmagadora maioria dos docentes são ... Professores, muito bons Professores.

Ser professor no ensino básico e secundário por razões conhecidas e por vezes esquecidas, é hoje uma tarefa de extrema dificuldade e exigência que social e politicamente justifica um reconhecimento e valorização frequentemente negligenciados. Acresce que é uma tarefa desempenhada por uma classe extremamente envelhecida e cansada como tem sido amplamente estudado e divulgado.

Por um momento, pensemos no que é ser professor em algumas escolas que décadas de incompetência na gestão urbanística, nas políticas sociais e consequente guetização social produziram.

Pensemos ainda na forma como milhares de professores cumprem a sua carreira, muitos deles sem a possibilidade de desenharem projectos de vida para si quando são os principais responsáveis por lançar projectos de vida para os miúdos com quem trabalham. Aliás, nos últimos anos, milhares de professores, de bons professores e professores necessários, foram constrangidos à reforma e muitos ao desemprego por uma política de contabilidade inimiga da educação pública e da qualidade.

Pensemos em como os professores são injustiçados nas apreciações de muita gente que no minuto a seguir a dizer uma qualquer ignorante barbaridade, vai numa espécie de exercício sadomasoquista entregar os filhos nas mãos daqueles que destrata, depreendendo-se assim que, ou quer mal aos filhos ou desconhece os professores e os seus problemas.

Pensemos como é imprescindível que a educação e os problemas dos professores não sejam objecto de luta política baixa e desrespeitadora dos interesses dos miúdos, mesmo por parte dos que se assumem como seus representantes.

Pensemos que a forma como os miúdos, pequenos e maiores, vêem e se relacionam com os professores está directamente ligada à forma como os adultos os vêem e os discursos que fazem.

Pensemos finalmente nos professores que nos ajudaram a chegar ao que hoje cada um de nós é, aqueles que carregamos bem guardadinhos na memória, pelas coisas boas, mas também pelas más, tudo contribuiu para sermos o que somos.

A valorização social e profissional dos professores em diferentes dimensões é uma ferramenta imprescindível a um sistema educativo com mais qualidade. A valorização e reconhecimento passam também pela necessidade de modelos de avaliação justos e transparentes que sustentem, reconheçam e promovam competência, empenho e atracção pela profissão.

Gostava ainda de deixar uma ideia do enorme João dos Santos, “O Professor João, foi meu professor porque foi meu amigo” e uma convicção pessoal que a idade cada vez mais cimenta, qualquer professor ou educador, tanto ou mais do que aquilo que sabe, ensina aquilo que é. É da relação que tudo nasce numa sala de aula, qualquer que seja a configuração.

A verdade é que de todos os professores que connosco se cruzaram, os que mais nos marcaram positivamente foi sobretudo pelo que eram e menos pelo que nos ensinaram, por mais importante que seja.

Vamos entrar num novo ano e num processo eleitoral. Esperemos que traga mudanças nas políticas educativas, e não só. Este caminho está esgotado e o futuro está comprometido. Não vale a pena negar a realidade.

quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

ENTRE O NATAL E O ANO NOVO

 Como tantas vezes repetimos e ouvimos, meteu-se o Natal e agora mete-se o Ano Novo.

Os dias que medeiam entre o Natal e o Ano Novo têm, do meu ponto de vista, um conjunto de características muito particulares. Fico sempre com a sensação de que os percebemos como não dias. Pode parecer uma ideia estranha, mas vou tentar explicar.

Logo depois do Natal, ainda a recuperar do espírito natalício, entramos numa espécie de ressaca advinda da azáfama das prendas, dadas, recebidas ou sonhadas e da culpa resultante dos excessos. Acresce para muita gente o problema das trocas, ou porque já tinham o que receberam ou porque, por várias razões, não serve o que receberam.

Para que se não saia dos espaços comerciais o ânimo irá recuperar-se entrando de imediato na época de saldos, descontos, promoções ou outra qualquer designação apelativa a mais umas compras. Trata-se do efeito terapêutico do mercado e do consumo.

Deste estado, passamos para os dias de aproximação ao Ano Novo que, independentemente do que de menos bom possamos racionalmente esperar, vivemos com a esperança de que seja mesmo novo e, sobretudo, Bom. Este ano, mais do que nunca, queremos, precisamos, que o próximo seja melhor.

Iremos certamente trocar inúmeras mensagens e votos noutra azáfama que aparenta assentar numa ideia mágica dos tempos de miúdo que nos parece fazer acreditar em que se assim procedermos, o Ano Novo vai ser mesmo Novo e, repito, Bom. De tanto falarmos nisso pode ser que ele se convença de que terá de ser mesmo Bom.

É certo que de há uns tempos para cá, como devem ter dado por isso, foi desaparecendo o Próspero, basta que seja Bom, ou até mesmo que não seja pior do que o que acaba. Já era bem bom, por assim dizer, mas este ano não chega, o ano que acaba foi mau, muito mau, para muita gente.

É também muito provável que nos últimos dias do próximo Dezembro, o de 2024, e mesmo que como precisamos e desejamos ele tenha sido melhor que 2023, estaremos com o mesmo sentimento a enunciar os mesmos discursos apesar das promessas optimistas de que ... a coisa está a mudar.

A passagem deste ano como também não podia deixar de ser vai acontecer e múltiplas formas e cenários, com ou sem réveillons, mas, naturalmente com aquela alegria a que nos sentimos obrigados ou que genuinamente sentimos a cada noite de 31 de Dezembro para 1 de Janeiro.

O problema mais sério é que a 2 de Janeiro está aí o Ano Novo que, para muita gente, vai continuar velho e para muita outra gente não será Bom, longe disso.

Mas para um povo sereno e de brandos costumes como nós, esperemos que haja saúde que é o principal, como sabemos.

De resto, bom de resto … algum jeito se há-de dar.

Bom Ano. De forma mais modesta, o melhor ano possível.

terça-feira, 26 de dezembro de 2023

A ESCOLA EM ALERTA VERMELHO

 Lamentavelmente, sem nenhuma surpresa, mas com muita inquietação, foram divulgados os resultados das provas de aferição do 2.º, 5.º e8.º ano em realizadas em Maio e Junho deste ano lectivo, 22/23. Os resultados chegaram dia 15 às escolas que lamentam o atraso, dificultando eventuais medidas de resposta aos resultados.

Em síntese, no 2º ano foram avaliados os domínios de Português, Matemática, Estudo do Meio, Educação Artística e Educação Física. Só em Educação Física, se observou uma maioria de resposta com “Conseguiu”. O melhor resultado verificado em Português, foi 48.1% de respostas adequadas em “Oralidade” com nenhum parâmetro acima dos 20% de avaliação positiva. Em Matemática em nenhum domínio se verificaram resultados positivos.

No 5.º ano, em Português, 14,2% não revelaram dificuldades na “Oralidade”, em “Leitura”, 5,2%, em “Gramática” 8,7% e em “Escrita” 17, 4%.

Em História e Geografia de Portugal nos três domínios avaliados, a média foi negativa com percentagem de positivas inferior a 35 no contexto nacional. Só em Educação Física se verificaram resultados positivos.

No 8.º ano realizaram provas de Matemática, Ciência Naturais, Físico-Química e TIC.  O número de alunos com dificuldade é superior a 50% na maioria dos domínios avaliados em Ciências e Físico-Química. Em Matemática verificaram-se resultados semelhantes e em TIC a percentagem de alunos que não atingiu os objectivos é também elevado.

Aguardemos os dados divulgados pelo ME, mas o cenário é verdadeiramente preocupante. As escolas lamentam a chegada tardia dos resultados que dificulta dispositivos de recuperação.

Sendo certo, que a forma como os alunos olham para estas provas, não servem para nada, também terá o seu impacto no desempenho.

Em todo o caso, como tenho escrito estas provas de aferição creio que assentam numa perspectiva inadequada. Dado que ainda não foi alterada, a Lei de Bases do Sistema Educativo define que o ensino básico se organiza numa lógica de ciclos e não de disciplinas como o secundário. Assim, parece claro que uma avaliação externa de aferição deveria ser realizada no ano final de cada ciclo e não nos anos intermédios, 2º, 5º e 8º ano, quando os alunos estão a meio do seu caminho de um ciclo. Acresce que no 4º e no 6º não existem exames finais pelo que não temos a imprescindível avaliação externa.

A argumentação para a sua realização nestes anos, assenta na ideia de que a identificação de dificuldades e a devolução de resultados permitiriam a correcção de trajectórias futuras dos alunos. Certo, assim sendo e neste caso a avaliação não é de aferição, mas de diagnóstico. No entanto, espera-se que diariamente nas salas de aula os professores realizem, mais formal ou mais informalmente, avaliações desta natureza, mais formativa, pois é a mais sólida ferramenta que possuem de regulação do trabalho dos alunos e do seu próprio trabalho.

Acresce que estes resultados são incompatíveis comos designados “percursos de sucesso, resultantes das avaliações internas”. Em Maio de 2023, a Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, divulgou um relatório, “Resultados Escolares: Sucesso e Equidade” em que analisa os chamados percursos de sucesso, alunos que finalizam o ciclo de estudos nos anos previstos. De acordo com este indicador, em 2021 e considerando o número de anos de cada ciclo, 91% dos alunos do 1º ciclo, 95% do 2º ciclo, 90% do 3º ciclo, terminaram no tempo previsto.

Esta disparidade entre avaliação interna e externa é preocupante estabelece um pesado caderno de encargos num quadro de políticas públicas de qualidade.

Na análise do desempenho escolar dos alunos importa, evidentemente, considerar os resultados das avaliações internas, mas é imprescindível a existência de dispositivos de avaliação externa com uma função reguladora. E é aqui que radicam todas as dúvidas.

Nos últimos anos múltiplos estudos, nacionais e internacionais, revelaram a existência de impactos embora também se verificasse a necessidade de uma análise mais fina à natureza das dificuldades mais globalmente percebidas. Abordei aqui algumas dessas iniciativas.

Recordemos algumas referências.

Em Setembro, numa Conferência no Parlamento do Grupo de Trabalho de Acompanhamento do Plano de Recuperação as Aprendizagens foi apresentado um trabalho em que se revelava que dois terços dos alunos (66%) que em 21/22 no último ano lectivo frequentavam o 2.º ano de escolaridade evidenciaram um desempenho na leitura muito baixo ou abaixo da média.

Um trabalho do IAVE divulgado em 2021 afirmava que “menos de metade dos alunos atinge nível esperado em conhecimentos elementares". As dificuldades acentuavam-se no 6.º e 9.º ano.

Em Agosto, o Tribunal de Contas na auditoria ao Programa Escola 21/23+ considerou que “Existem insuficiências na definição do Plano 21/23, como prioridades pouco claras, insuficiente afectação de recursos, excessivo número de acções e inexistência de metas e de indicadores para efeitos de monitorização e avaliação”.

Também sabemos que foram reajustados pelo ME os recursos disponibilizados para o Plano de Recuperação que foi prolongado. As reduções reflectiram-se sobretudo nos créditos horários para o envolvimento dos professores. No entanto, importa considerar o impacto da falta de docentes em muitas escolas e em diferntes disciplinas.

Como sempre, o ME parece enredado num discurso que envolve realidades múltiplas. A habitual referência a uma espécie de realidade mágica em que tudo está quase bem, pois a perfeição não existe e uma realidade, esta sim, real, que expõe as enormes dificuldades que alunos, professores, técnicos e pais sentem na promoção de um efectivo direito a uma educação de qualidade e que possa responder à diversidade e necessidades dos alunos. É a esta realidade que as políticas públicas têm a responsabilidade de, primeiro, reconhecer e, depois, responder.

domingo, 24 de dezembro de 2023

BOM NATAL

 Bom Natal. Dos simples. Com Tempo, com Afecto.





sábado, 23 de dezembro de 2023

ACREDITAR NO PAI NATAL

 É Natal. Este ano não dei conta, mas tem sido habitual na época natalícia surgirem alguns trabalhos na imprensa sobre a relação das crianças com o Pai Natal. Colaborei por diversas vezes em iniciativas desta natureza em que, quase sempre, se abordava as suas crenças no Pai Natal. Nesses trabalhos é frequente ouvirmos as crianças afirmar convictamente que acreditam no Pai Natal, bem como pais que, conforme as suas convicções, alimentam ou desincentivam a crença no Pai Natal.

No entanto, deixem-me afirmar com toda a certeza. Os miúdos acreditam no Pai Natal e não numa mentira, como por vezes se ouve de gente menos atenta. Eu tenho a certeza, já fui Pai Natal e vi, senti, como eles acreditavam em mim, isto é, no Pai Natal. Recupero uma história pessoal que já aqui partilhei.

Nunca percebi muito bem porquê, mas ao longo da minha vida desempenhei várias vezes a função, sempre fora do contexto familiar. A escolha dever-se-ia, provavelmente, à proeminente mochila que carregava à frente, agora um pouco mais pequena, felizmente, e às barbas brancas que de há muito me acompanham.

Não pensem que é uma tarefa fácil, não é não senhor. Passar umas horas dentro de um fato quentíssimo com umas barbas ainda mais quentes que insistem em deixar a boca cheia de pêlos não é muito simpático. Mas os miúdos acreditam no Pai Natal e isso ajuda a aliviar o desconforto. Felizmente, naquela altura ainda não tinham inventado os Pais Natais que sobem às varandas, caso assim fosse desistiria mesmo, sou um rapaz demasiado pesado para o alpinismo, dado a vertigens sendo ainda que as noites são demasiado frias para que se possam passar pendurado na varanda de cada um.

Numa das vezes em que fui Pai Natal de serviço, há já muitos anos, cena de que ainda possuo uma memória perfeita, lembro-me do ar aflito e preocupado de um gaiato que insistiu o tempo todo junto de mim para que não me esquecesse do que queria como presente, Moto Ratos, creio que se tratava de umas personagens de banda desenhada em voga na altura.

E o miúdo, sempre que me lembrava os Moto Ratos e fazia-o sempre que comigo se cruzava, tal era o desejo, explicava-me com os olhos muito abertos e com muitos gestos como se ia para casa dele para eu não me enganar no caminho. E não me enganei, Pai Natal que é Pai Natal cumpre sempre. Confirmei depois que ele recebeu os desejados Moto Ratos, claro, o Pai Natal não falha.

Deve ser bom acreditar no Pai Natal. Aliás, deve ser bom acreditar. Por isso, nos vários trabalhos em que tenho colaborado vou afirmando, deixem as crianças acreditarem no Pai Natal até que queiram ou que precisem. Não lhes roubem o encanto em nome de um qualquer conjunto de pseudo-modernices educativas.

Vão ter o resto da sua vida para acreditar e desacreditar, para desacreditar e voltar a acreditar.

Provavelmente, numa busca incessante pelo encanto perdido quando descobrimos que o Pai Natal não existe.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

TERMINARAM AS AULAS, AGORA AS NOTAS

 Com excepção dos concelhos com anos lectivos semestralizados terminou o primeiro período no ensino básico e secundário terminaram.

Antes de se entrar mais a fundo no espírito natalício e assente na imensa burocracia da avaliação realizada pelos docentes, a generalidade das famílias vai dar atenção às notas. Não só às notas necessárias para a compra dos presentes de Natal, estes são mais resilientese hão-de aparecer, as boas notas são muitas vezes compensadas com presentes, mas, sobretudo, contribuem para comprar futuros.

A avaliação deste primeiro período, um processo sempre complexo, teve e terá ainda de considerar a situação de muitos alunos que não tiveram aulas ou tiveram menos aulas por falta de professores ou da sua colocação atempada. Claro que o ME desvaloriza, mas, obviamente, a situação tem impacto nas aprendizagens.

Ainda assim, felizmente, muitos miúdos e adolescentes esperarão com serenidade, apenas com a ponta de ansiedade criada pela expectativa de ver confirmado o bom andamento do primeiro período ou semestre. Destes, uns poucos, terão mesmo o seu nome e nota inscritos num quadro de honra ou mérito existente em algumas escolas. Receberão as felicitações da família pelo trabalho desenvolvido e, muito provavelmente, até terão essas felicitações e contentamento familiar sublinhadas com o reforço dos presentes, merecem, trabalharam bem, toda a gente dirá. Estamos num tempo de produtividade e incentivos.

Alguns outros miúdos esperam com a ansiedade da dúvida, será que o trabalho que realizaram e a generosidade dos “setôres” chegarão para a positiva, senão a tudo, pelo menos a quase tudo. É que os pais também tinham prometido “aquela” prenda se as notas fossem positivas, mesmo que não "boas", não esperam tanto.

Também existem alguns alunos que já nem a ansiedade pelas notas conseguem sentir, mesmo no primeiro período, sabem que vão ser más, o que não estranharão e as famílias, algumas, também não. É hábito. Destes, uns assumirão um discurso e pose de indiferença, precisam dessa pose e desse discurso para mascarar para fora o que o insucesso dói para dentro. Ninguém com saúde se satisfaz com o insucesso. As famílias não sabem que fazer e culpam a escola que as culpa a elas.

Alguns destes alunos receberão as más notas do primeiro período como uma espécie de “cheque pré-datado” passado pela escola, ou seja, estas serão também as notas do segundo e do terceiro período. Esta baixa expectativa é um forte contributo para que se cumpra o emitido no “cheque”, as más notas no futuro. Não tem que ser, não é o destino e não estão condenados ao insucesso. Era bom ter consciência do processo e recusar esse fatalismo.

Existe ainda um grupo mais pequeno de alunos que, por razões que eu não consigo compreender, não têm notas, são especiais, dizem, pelo que sendo alunos e trabalhando nas escolas não vêem, como todos os outros colegas, traduzida numa nota a sua participação na vida escolar. Será porque estando lá não participam, ou será que, apesar de participar e não tendo o mesmo "rendimento" ou sendo avaliados da mesma forma que os seus colegas, se entende, erradamente, que não se "justifica" uma nota, curiosamente, em contextos escolares que se afirmam "inclusivos". Talvez tenhamos ainda que caminhar no sentido de melhorar culturas, modelos e dispositivos de avaliação que acomodem todos os alunos.

Enfim, como em quase tudo na nossa vida, as notas são, muitas vezes, determinantes.

Boas férias e Bom Natal.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

AS PALAVRAS

 Estamos num tempo em que os discursos se atropelam, toda a gente tem algo a dizer e cansam tantas palavras.

E cansam não porque me pareçam palavras a mais, mas porque existe comunicação de menos, ou seja, o que a vida pública mais tem para nos mostrar é discursos sem interlocutor. Cada um dos actores ou protagonistas fala para algo ou alguém de indefinido e parece pouco disponível para o essencial, utilizar as palavras como suporte da comunicação e dos entendimentos, não estou a dizer concordâncias. As pessoas estão cansadas de retóricas palavrosas, inconsequentes e centradas nos interesses dos aparelhos partidários ou das elites económicas. Como dizia, parece-me que, de facto, temos palavras a mais e comunicação a menos.

Por outro lado, paradoxalmente, também creio que faltam palavras. Faltam palavras de solidariedade genuína para quem, vítima da crise que a especulação económica e modelos de desenvolvimento não centrados nas pessoas, vive momentos de enormes dificuldades num atentado diário à dignidade e com o quotidiano transformado na preocupação com a sobrevivência e a falta de uma palavra de esperança.

Como canta Paco Ibañez.

Las palabras entonces no sirven, son palabras...

Siento esta noche heridas de muerte las palabras

terça-feira, 19 de dezembro de 2023

O DESLUMBRAMENTO DIGITAL

A imprensa tem referido a preocupação de professores e directores escolares com a realização dos exames de 9.º ano em formato digital. A preocupação estende-se às provas de aferição do 2.º, 5.º e 8.º ano.

O deslumbramento do ME com o novo mantra, transição digital, sustentou a decisão apressada de que as provas serão realizadas de forma digital.

Tinha alguma esperança de que o bom senso e a reflexão sobre o que se passa noutros sistemas educativos que desencadearam uma reflexão e tomadas de decisão relativamente à introdução em termos excessivos dos recursos digitais pudesse contribuir para um maior equilíbrio e prudência na utilização destes recursos, designadamente nos primeiros anos de escolaridade.

Por outro lado, como o trabalho do DN mostra, são conhecidas com demasiada frequência queixas relativas ao acesso a equipamentos por parte dos alunos, à qualidade dos equipamentos, que, de acordo com os directores de escolas e agrupamentos, a insuficiência dos recursos necessários à adequada utilização dos equipamentos, nas escolas, mas em particular nas salas de aulas, infra-estruturas eléctricas e rede de net eficientes, por exemplo. Acontece ainda que existe uma enorme diversidade na literacia digital dos alunos. Deste cenário podem decorrer situações sérias de desigualdade entre escolas e entre alunos e todos conhecemos múltiplas situações que evidenciam a enorme disparidade de recursos e da sua utilização.

É conhecido também que muitas famílias recusam receber os computadores pois em caso de problemas serão responsáveis pelos equipamentos. Nesta situação estão sobretudo famílias com menores rendimentos o que, naturalmente, não será de estranhar. Uma hipótese seria que a sua utilização estivesse integrada no seguro escolar.

A Associação Nacional de Professores de Informática referiu há algum tempo as dificuldades existentes e também o Presidente do IAVE afirmou já em 2023 que não estavam reunidas as “condições ideais”.

A tutela, que parece entender que a realidade é a projecção dos seus desejos, insiste na digitalização, na base do “vai correr bem” habitual e, por deslumbramento ou por objectivo que não vislumbro, insiste nas provas digitais.

Como já aqui escrevi, este processo não podia correr assim, é mau, muito mau. 



domingo, 17 de dezembro de 2023

UMA FAMÍLIA É UM BEM DE PRIMEIRA NECESSIDADE. MAIS UMA VEZ

 No Expresso encontra-se uma peça sobre o universo da adopção familiar, das dificuldades, da natureza dos processos e dos constrangimentos existentes. Com alguma frequência tenho  abordado esta questão e retomo com alguns dados do Relatório do Conselho Nacional para a Adopção relativos a 2022 também considerado no trabalho do Expresso.

Em 2021 foram adoptadas 185 crianças e em 2022 foram 173. A situação de espera por adopção continua bastante elevada, entre seis e sete anos, nomeadamente para famílias que pretendem adoptar crianças até aos 7 anos, sem problemas de saúde ou com deficiência.

Até ao final de 2022 o número de candidaturas a adopção em espera era cerca de 6 vezes superior ao número de crianças em situação de adaptabilidade, 1322 candidaturas para 229 crianças e jovens em situação de adaptabilidade.

A maioria dos candidatos a adoptar (66%) expressa preferência por crianças dos 0 aos 3 anos, enquanto as crianças com indicação de adopção nesta faixa etária eram bem menos e totalizavam 26%. Por outro lado, as crianças com 7 ou mais anos, 62% do universo, são “preferidas” por menos de 8% das candidaturas e, praticamente, não existem candidaturas para adopção de jovens entre os 10 e os 15 anos.

Este cenário alimenta a manutenção em situação de acolhimento criando um universo de NAP (Necessidades Adoptivas Particulares) que, para além da idade, são também sustentadas por variáveis como existência de irmãos, problemas de saúde ou deficiência e etnia.

Trata-se, evidentemente de um universo muito complexo, mas, por outro lado, a solicitar a sua definição com questão central nas políticas de família.

Em termos internacionais, recordo que dados de 2018 mostravam que em Portugal apenas cerca de 3% das crianças retiradas às famílias estavam em famílias de acolhimento e 97% institucionalizadas. Em países como a Irlanda e a Noruega o acolhimento institucional não ultrapassa 10% das suas crianças retiradas aos pais pelo Estado.  Mesmo em países em que está mais presente a cultura de institucionalização, a Alemanha ou a Itália por exemplo, a percentagem é de 54% e 50% respectivamente, apesar de tudo bem mais baixa que o indicador português, 97%.

Precisamos de insistir nos processos de mudança relativa ao acolhimento, à adopção, ao funcionamento e calendário dos processos de decisão sobre as crianças que vivem em circunstâncias familiares adversas.

Retomando o Relatório do Conselho Nacional para a Adopção é de considerar um outro dado relevante. Contrariamente à diminuição que se fazia sentir desde 2018, em 2022 aumentou o número de crianças que estando em processo de adopção foram devolvidas, 14 crianças, 7,7% do total de crianças envolvidas.

Esta situação, crianças com diferentes idades serem devolvidas à estrutura de acolhimento depois de iniciado um processo de adopção, pela qual algumas passam mais do que uma vez é absolutamente devastadora.

Como relatei em algumas ocasiões em que aqui abordei esta questão, os motivos para esta “devolução” passam por situações que assim podem aconselhar, maus-tratos da família adoptante por exemplo, mas também por justificações como “não correspondem às expectativas”, “'venderam-me gato por lebre” ou que atrapalham as rotinas com os animais de estimação da família.

Relembro que há alguns anos o DN, num trabalho sobre o mesmo tema, citava o caso em que uma criança foi devolvida e trocada por outra porque não se adaptava ao cão da família. Outros casos de devolução envolvem dificuldades de adaptação a outros elementos da família ou a questões económicas.

Vejamos com mais atenção. Uma criança que por qualquer razão não tem uma família, está numa instituição, envolve-se num processo de adopção, entra numa família que entende passar a ser a SUA família, deve sentir-se num caminho bonito e prometedor. Passado algum tempo é devolvida, provavelmente, sem perceber porquê e vive uma, certamente mais uma, devastadora experiência de abandono e rejeição com efeitos que não podem deixar de ser significativos. É muito sofrimento.

Como é evidente, admito que em circunstâncias excepcionais o processo possa ser interrompido, mas, insisto, só mesmo numa situação limite depois de esgotados os dispositivos de apoio às famílias adoptantes.

Não sei se foi alterada, mas a lei permite o período de transição e um período de pré-adopção. Há uns anos em conversa sobre esta questão com o então presidente da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco, Juiz Armando Leandro, este reconhecia que a devolução não tem de ser baseada em "critérios necessariamente válidos".

Os serviços competentes têm-se esforçado para que estas situações se minimizem quer através da adequação das famílias candidatas, quer nas orientações e apoios para a optimização dos processos de adopção, mas, algumas situações continuarão certamente a acontecer.

Voltando ao tão apregoado "superior interesse a criança", é difícil imaginar o que se passará na cabeça de um miúdo que passa anos a construir uma ideia de família, a certa altura entra numa família a que chama sua e de repente dizem-lhe que volta a estar só, na instituição, porque ... não se dá bem com o cão ou não corresponde às expectativas. Que sentirá a criança?

Porquê? Não presta? Não a querem? ...

Mas as crianças, Senhores?

Deixem-me ainda recordar de novo uma expressão que ouvi em tempos a Laborinho Lúcio num dos encontros que tenho tido o privilégio de manter com ele. Dizia Laborinho Lúcio, "só as crianças adoptadas são felizes, felizmente a maioria das crianças são adoptadas pelos seus pais”. Na verdade, muitas crianças não chegam a ser adoptadas pelos seus pais, crescem sós e abandonadas. No entanto, é imperativo criar uma oportunidade para que as crianças "desabrigadas" possam ser adoptadas, possam ser felizes.

sábado, 16 de dezembro de 2023

DA IRRESPONSABILIDADE

 O final do primeiro período está a chegar e muitos milhares de alunos estão ainda sem aulas a uma mais disciplinas. A sobrecarga horária dos docentes que estão nas escolas não resolve o problema e contribui para desgaste e cansaço que aumentam as dificuldades.

O ME vive enredado em discursos de negação da realidade e alimenta um caminho de “desprofissionalização” com a contratação de "professores" sem formação para o ensino.

Há décadas que a falta de docentes estava escrita nas estrelas e sucessivas equipas ministeriais, para além de más políticas públicas que afastaram milhares de professores das escolas, ainda negavam a evidência e ouvimos o mantra dos “professores a mais”.

O resultado está à vista, o atropelo a um direito fundamental, o direito à educação, e o desempenho escolar de muitos alunos prejudicado pala falta de docentes.

As famílias com mais recursos recorrem a explicações externas, as outras … lamentam.

A questão é que cada vez se torna mais difícil falar de responsabilidade. Entrámos no mundo da irresponsabilidade.

Com que preço? Pago por quem?

E não acontece nada?

sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

OS BRINQUEDOS PODEM SER PERIGOSOS, A NEGLIGÊNCIA TAMBÉM

 No Público encontra-se uma peça sobre o perigo que alguns brinquedos podem representar para as crianças.

É frequente nesta época surgirem estes alertas a que importa dar atenção.

Não tenho dados recentes, mas em 2020 o Sistema Europeu de Alerta Rápido para os Produtos Não Alimentares identificou 916 brinquedos diferentes que são vendidos nos países da UE e com a indicação de conformidade que podem ser perigosos, seja pela toxicidade dos materiais seja pelo tipo de construção ou dimensão das peças.

Também em 2020, a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica apreendeu cerca de 1120 brinquedos por questões de rotulagem e segurança.

É verdade que existem riscos em alguns brinquedos tal como a Associação para a Promoção da Segurança Infantil e a DECO já têm referido alertando para o facto de que tal estar no brinquedo o símbolo CE não é suficiente como garantia de segurança. A DECO tem também alertado para o risco da compra de brinquedos através da net.

Neste cenário, tanto como o trabalho das instituições, importa sublinhar o papel dos pais como os "verdadeiros inspectores" da segurança dos brinquedos. No entanto, parece-me, como sempre, necessário usar de algum bom senso e evitar excessos de zelo que também não são positivos, ainda que em matéria de segurança infantil o excesso seja melhor que o defeito.

Esta referência à segurança nos brinquedos é importante e oportuna, estamos em pleno espírito natalício, o tempo dos brinquedos, mas gostava de reforçar o facto de continuarmos a ser um dos países da Europa com taxa elevada de acidentes domésticos envolvendo crianças, de que as quedas de janelas ou varandas, os afogamentos ou o contacto com materiais perigosos não devidamente acondicionados, são apenas exemplos tragicamente frequentes.

O que me parece importante registar é que num tempo em que os discursos e as práticas sobre a protecção da criança estão sempre presentes e muitas vezes e em múltiplos aspectos com comportamentos de excessiva protecção, em que é recorrente a referência aos perigos dos brinquedos, também se verifica um número altíssimo de acidentes o que parece paradoxal.

Por um lado, protegemos as crianças de forma que, do meu ponto de vista, me parece excessiva face às suas necessidades de autonomia e desenvolvimento e, por outro lado e em muitas circunstâncias, adoptamos atitudes e comportamentos altamente negligentes e facilitadores de acidentes que, frequentemente, têm consequências trágicas.

E não vale a pena pensar que só acontece aos outros.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

DEFICIÊNCIA, POBREZA E EXCLUSÃO

 Foi divulgado o relatório do Observatório da Deficiência e Direitos Humanos, "Pessoas com Deficiência em Portugal - Indicadores de Direitos Humanos 2023". Apesar de alguma evolução os indicadores são preocupantes.

Sem prestações sociais, em 2022 e com base em dados do INE, 62,3% das pessoas com deficiência com mais de 16 anos estariam em risco de pobreza face a 35,5% das pessoas sem deficiência. Considerando os apoios sociais a taxa de pobreza baixa 42,3% e apenas 21,5% na população sem deficiência o que sublinha o papel fundamental dos apoios sociais e a necessidade do seu aumento considerando a quase ausência de alternativas.

No que respeita ao emprego, no período entre 2015 e 2022 verificou-se um aumento de 4,6% no número de pessoas com deficiência inscritas como desempregadas.

Relativamente à educação e formação, em 2020, na população com deficiência nos alunos entre os 18 e os 24 anos, a taxa de abandono era de 22,1%, mais 13,6% do que nos alunos sem deficiência.

Apesar de alguma evolução a situação das pessoas com deficiência continua com grande vulnerabilidade face á pobreza e exclusão.

Não é novo, sucessivos relatórios de diferentes entidades vão mostrando o quanto está por fazer e as dificuldades decorrentes da corrida de obstáculos em que se transforma a vida das pessoas com deficiência ameaçando os seus direitos e bem-estar bem como das suas famílias. São por demais evidentes as dificuldades em áreas como, educação, saúde, trabalho e emprego, segurança social, acessibilidades, autonomia, independência ou autodeterminação.

A verdade é que a voz das minorias é sempre muito baixa, ouve-se mal, existem variadíssimas áreas em que são significativas as dificuldades colocadas às pessoas com deficiência, designadamente saúde, acessibilidades, educação, apoio social, qualificação profissional e emprego, em que a vulnerabilidade e o risco de exclusão continuam elevados como este relatório mostra.

Importa também sublinhar que os direitos fundamentais não podem ser de geometria variável em função de contextos ou hipotecados às oscilações de conjuntura ainda que tenhamos consciência da excepcionalidade destes tempos.

Parece necessário reafirmar mais uma vez que os níveis de desenvolvimento das comunidades também se aferem pela forma como lidam com os grupos mais vulneráveis e com as suas problemáticas. Este entendimento é tanto mais importante quanto mais difíceis são os contextos que se vivem.

terça-feira, 12 de dezembro de 2023

AINDA O PISA 2022. FUGIR PARA A ESCOLA

 Ainda os dados do PISA 2022. Um em cada dez alunos portugueses expressa que se sente só e outros 11% sentem-se “postos de lado”.

São indicadores que merecem toda a atenção apesar de se situarem bem abaixo da média da OCDE, 16% sentem-se sós e 17% afirma que são “postos de lado”.

Ao olhar para estes indicadores lembrei-me que há já uns anos me convidaram a participar numa iniciativa que tinha com título genérico "Fugir para a escola" que achei curioso e agora recordei.

Seria muito interessante, mas não passa, provavelmente, de um romantismo não compatível com a dureza crispada, agressiva e feia, dos tempos e da vida actual, imaginar que os miúdos quisessem fugir para a escola, não porque fugissem de algo mau, o contexto familiar, por exemplo, e que em bom rigor e lamentavelmente é por vezes tão mau que obriga a fugir, mas porque os miúdos quisessem correr para a escola por nela se sentirem bem e não apenas nos intervalos e com os amigos.

Por outro lado, nos tempos que correm também muitos professores, bons professores, mostram por cansaço ou desesperança que já não fogem para a escola, um lugar de realização, de trabalho duro, mas com uma das maiores compensações que se pode ter, ajudar gente pequena a ser gente grande.

O clima institucional, a burocracia, a deriva política foram, vão, levando a que a escola não apeteça. Felizmente, muitos outros professores ainda conseguem fugir para escola, os alunos desses professores são gente com sorte.

Será que ficou mesmo impossível acreditar que alunos e os professores, de uma forma geral, queiram fugir para escola?

segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

CONVERSAS INACABADAS

 É inevitável, os dias iniciais de Dezembro são sempre envolvidos nas memórias do meu Pai, um Homem bom. Hoje chegaria aos cem anos, uma idade bonita. Partiu também nos primeiros dias Dezembro, em 1975. Parecem muitos anos, mas não foi há muito tempo, a unidade de medida do afecto e da saudade não tem um padrão, é a de cada um.

Partiu demasiado cedo, mas não partiu sem me mostrar o que nunca viu, sem me ajudar a chegar aonde nunca foi.

Tanto que ficou por dizer e por viver.

Partiu numa altura em que acreditávamos que, finalmente, tudo seria melhor, tudo seria possível, e tudo seria melhor e possível para todos. Nos tempos de adolescência e juventude, quando nos sentíamos donos do mundo ou quando sabia que me envolvia em algo que naqueles tempos negros poderia ter algum risco, sempre me dizia, “Pensa por ti”. Não sei se pensei sempre bem, certamente não, mas acho que tenho pensado sempre por mim.

Teria gostado de nos ver a fazer pela vida, eu e o meu irmão. Havia de ter gostado de conhecer os netos e os bisnetos que certamente também gostariam de o ter conhecido e ouvido as histórias que ele nos contava, sempre inventadas. Ainda recupero essas histórias e os seus personagens, como o “Arranja Moinhos”, uma espécie de MacGyver antes do tempo, e é sempre um tempo divertido para o Tomás e para o Simão.

Era um homem tranquilo, nunca o ouvi gritar e nunca me bateu, não era habitual na época. Trazia livros da biblioteca do Arsenal do Alfeite onde era serralheiro e o jornal “A Bola” já lido pelos colegas. Ainda me lembro de assistir bem pequeno a peças de teatro no Clube Recreativo que ajudou a fundar e em que o meu pai também representava. Uma vez por ano, quase sempre no final do campeonato, íamos ao antigo Estádio da Luz, ver o nosso Benfica. Só não partilhava com ele a enorme paixão que tinha pela caça.

Continuaria a ser porto de abrigo dos sobressaltos que também fazem parte da vida da gente.

É verdade, tanto que ficou por dizer e viver.

Mas um dia destes, ainda vamos conversar todas as conversas que não iniciámos e todas as conversas que não acabámos.

domingo, 10 de dezembro de 2023

"NÃO CONSIGO FAZER NADA DELE". DA EDUCAÇÃO FAMILIAR

 No Público encontra-se uma peça que aborda um problema que parece estar em crescimento, a agressão ou maus tratos de filhos jovens aos pais. Parece algo de improvável, duro de conhecer, mas acontece.

Algumas notas em torno da educação familiar, o contexto em que podem nascer estes comportamentos.

Nos estilos de vida actuais, as famílias expressam uma enorme dificuldade em compatibilizar o que ainda entendem ser o seu papel educativo com a pressa e o pouco tempo que assumem ter para o realizar. Tenho conhecido dezenas de pais que se sentem culpados e fragilizados por entenderem que não têm para os filhos a disponibilidade de tempo e atitude que julgam necessária. Esta culpa e fragilidade é, com frequência, a base inconsciente que impede alguns pais de serem consistentes e firmes na definição de regras e limites imprescindíveis às crianças, pois “temem estragar” o pouco tempo que têm com elas devido a um eventual conflito.

Também sei que apesar da proliferação de materiais que parecem querer assumir este papel não existem, nem irão existir e ainda bem “manuais de instrução” para a educação familiar.

Também sabemos que as famílias vão assumindo novas configurações que colocam novos desafios à parentalidade.

E sabemos que existem muitas famílias que, transversalmente aos patamares sociais que sentem enormes dificuldades e inquietações no dia-a-dia com os filhos.

A estas famílias, a estes pais e a estas crianças e adolescentes, também nós que profissionalmente ou de outra qualquer forma nos relacionamos com este universo, precisamos de estar mais atentos, de ler, de perceber comportamentos, discursos ou omissões que sejam sinais de mal-estar para crianças e pais.

Acontece ainda que os contextos familiares são sempre específicos. Recordo a ideia de Tolstoi em “Anna Karenina”, “as famílias felizes parecem-se todas. As famílias infelizes, cada uma é-o à sua maneira”. Mais difícil, mas ainda mais importante se torna estarmos atentos.

Demasiadas vezes intervimos para responder, nem sempre conseguimos responder bem e intervimos para prevenir menos que o necessário. Não pudemos ou não soubemos perceber o que estava a acontecer ou para acontecer.

Considerando todo este universo e não acreditando na educação perfeita da criança perfeita acredito num princípio fundador da educação familiar, a promoção da autonomia e da auto-regulação desde bebé, sim desde bebé, até …  sempre.

Neste sentido e de há muito, sempre que penso ou falo de educação me lembro de um texto de Almada Negreiros em que se afirma "... queria que me ajudassem para que fosse eu o dono de mim, para que os que me vissem dissessem: Que bem que aquele soube cuidar de si". Este enunciado ilustra, do meu ponto de vista, a essência da educação, seja familiar ou escolar, em qualquer idade como, aliás, aqui reafirmei recentemente.

Um processo educativo terá com eixo estruturante a construção de gente que sabe tomar conta de si própria da forma adequada à idade e à função, actividade ou contexto em que se encontra. Este entendimento traduz-se num esforço contínuo de promover a autonomia das crianças e jovens para que "saibam tomar conta de si próprios", no fundo, a velha ideia de "ensinar a pescar, em vez de dar o peixe".

Parece-me fundamental que adoptemos comportamentos que favoreçam esta autonomia dos miúdos e dos jovens. No entanto, é minha convicção que por razões que se prendem com os estilos de vida, com os valores culturais e sociais actuais, com as alterações das sociedades, questões de segurança, por exemplo, estamos a educar os nossos miúdos de uma forma que não me parece, em termos genéricos, promotora da sua autonomia e auto-regulação.

Tenho também a convicção de que os pais são, de uma forma geral, intuitivamente competentes. Mais "asneira", menos "asneira", mais uma "festinha", menos um "ralhete" e o caminho cumpre-se sem grandes problemas. Um discurso social excessivo em torno da "psicologização" ou induzindo a ideia de que só indo a uma "escola de pais" e lendo vários "manuais de instruções" poderemos ser bons pais, pode ser mais fonte de inquietação que de ajuda.

Ainda relativamente ao comportamento de crianças e adolescentes, costumo dizer, independentemente das idades, é preciso tomar conta deles porque … eles não sabem (não querem) tomar conta de si. Isto levanta a questão central de, como na educação escolar e na educação familiar estamos a lidar com uma das “irredutíveis necessidades das crianças”, o estabelecimento de regras e limites. De facto, é minha convicção, estamos a lidar mal com o não, o que promove miúdos e adolescentes a funcionar com uma latitude excessiva face a regras e limites. No seu funcionamento diário temos assim muitas crianças e adolescentes que, conhecendo, naturalmente as regras e os limites do funcionamento, por exemplo em sala de aula, não são regulam, por si, o seu comportamento obrigando a que, permanentemente, os adultos, professores ou pais, tenham de proceder a essa regulação.

Temos, assim, que reajustar a nossa acção, com uma particular atenção à definição das regras e dos limites que, embora de forma flexível, são imprescindíveis ao bem-estar de crianças e jovens.

É frequente ouvir dizer que as crianças hoje em dia têm muitos mimos que as “estragam”, dito de outra maneira, têm “afecto” a mais ou ainda “gosta-se de mais” das crianças. Estes discursos, que alguns profissionais destas áreas também subscrevem, merecem-me alguma reserva pois assentam, do meu ponto de vista, num equívoco.

De uma forma geral, as crianças não terão afecto, mimos, a mais, poderão, isso sim, ser objecto de “mau afecto” ou se quiserem, de "maus mimos". É essa falta de qualidade que lhes poderá ser prejudicial. Não é mau por ser muito, é mau porque asfixia, é tóxico, não deixa que os miúdos cresçam, distorce a percepção da criança de si própria e do seu funcionamento, não permite o estabelecimento de uma relação saudável, protectora e promotora da autonomia das crianças, uma condição fundamental para o seu desenvolvimento positivo.

Insisto, as crianças não têm elogios ou mimos a mais. Na verdade, oque se passa mais frequentemente é que recebem “nãos” de menos. Na verdade, muitos adultos, pais, sendo quase sempre capazes de dar os mimos, mostram-se muitas vezes incapazes de dar os “nãos”, de estabelecer os limites e as regras que, como sempre digo, são tão necessárias às crianças como respirar e alimentar-se. Estes “nãos” e para utilizar a mesma terminologia, são outros mimos imprescindíveis na educação de crianças e adolescentes nos seus diferentes contextos de vida.

As regras e os limites são bens de primeira necessidade. Tal como com os afectos, nenhuma dieta educativa pode prescindir de regras e limites.

Ficando sem “nãos” muitas crianças, a coberto da ideia dos “mimos a mais”, transformam-se em pequenos ditadores que infernizam a vida de toda a gente, a começar pela sua própria vida. Não crescem saudavelmente.

Neste cenário complexo da educação familiar, continuo a afirmar a necessidade de que os pais falem entre si sobre as suas experiências, sem receio de que os julguem maus pais. Importa inda que na relação com os técnicos ligados à educação as conversas não incidam quase que exclusivamente sobre "se está bem ou mal na escola", mas que se abordem as questões educativas também no contexto familiar de forma aberta e serena. Os "manuais de instruções" não são a solução, são, alguns, apenas mais uma ajuda.

Pais atentos, pais confiantes, são pais que educam sem especiais problemas. Paradoxalmente, alguns "manuais" e alguns discursos "científicos" podem aumentar a insegurança e a ansiedade de alguns pais.

Desculpem o texto tão longo.

sábado, 9 de dezembro de 2023

DISCRETOS CAMPEÕES E CAMPEÃS DE MUITAS PROVAS

 A entrevista de Carla Oliveira aoDN e a sua história de vida, incluindo o “pormenor” de ser campeã da Europa de Boccia, merece um destaque que, provavelmente, não terá.

Nada de novo. A vida de muitas pessoas com deficiência é, na verdade, uma constante e infindável prova de obstáculos, muitas vezes intransponíveis, que ampliam de forma inaceitável a limitação na mobilidade e a funcionalidade em diferentes áreas que a sua condição, só por si, possa implicar. Existem muitas áreas de dificuldades colocadas às pessoas com deficiência, designadamente, acessibilidades, educação e emprego em que a vulnerabilidade e o risco de exclusão são enormes.

Reafirmo algo que recorrentemente subscrevo, os níveis de desenvolvimento das comunidades também se aferem pela forma como lidam com as minorias e as suas problemáticas.

Como disse, habitualmente o feito desportivo desta atleta não terá o relevo que merecia. As primeiras páginas, também no desporto, não são para estes indivíduos. Mesmo quando vencem, as pessoas com deficiência não têm "glamour", não enchem estádios e não fazem movimentar milhões, não são colunáveis, são apenas, simplesmente, campeões, a sério.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

A MÃE

 Uma história já antiga  e que de que por vezes me lembro.

Um dia destes estava à bica num café pequenino, daqueles de bairro, e ouvi, não pude deixar de o fazer, uma conversa entre duas mães que me pareceram mães, isto é, mulheres que adoptaram os filhos, porque há mulheres, poucas, que são mais prestadoras de serviços à infância, do que propriamente mães, ou seja e usando uma expressão de Laborinho Lúcio, nunca chegam a adoptar os filhos. Uma delas, mais faladora, mostrava-se um pouco mais preocupada e com algumas inquietações relativamente à educação de um gaiato, pelos oito anos, ao que percebi. Achei curioso o discurso e vou tentar recuperá-lo.

Pois é, muitas vezes, nem sei o que fazer, ele faz asneiras, vou para me zangar com ele e lembro-me que estou tão pouco tempo com ele que se me zangar, nem esse tempo me sabe bem. Eu acho que ele vem cansado da escola, está lá desde as 8, vai com o pai porque eu saio às 7 de casa, vou buscá-lo eu já perto das sete e meia, eu também venho cansada. Depois é a lida do jantar e do banho, estás a ver que tempo é que eu tenho para ele. Dizem que a gente devia brincar com os filhos, falar com eles, mas quando? Ao jantar, aproveitamos para ir vendo as notícias que é quando temos alguma hipótese. Por vezes ainda começo a falar com ele ao deitar, mas ele adormece logo e eu também vontade não me falta. Este ano não consegui ir às reuniões da escola, foram sempre a horas que eu não podia. Lá no trabalho se falto começam logo a fazer má cara, como as coisas estão, sabes como é. Não sei se aconteceu contigo, mas este ano pediram para comprar muitas coisas para a escola. Não foi nada fácil, está tudo muito caro, a gente tem que fazer alguns sacrifícios, mas fica difícil, lá comprámos o computador, ele ficou contente e não quer outra coisa. Às vezes já me explica algumas coisas, eu percebo pouco daquilo mas ele fica contente de me explicar, mas é um bocadinho ao fim-de-semana, sempre com falta de tempo. Mas é a vida assim, a gente é mãe, é para isto não é, a gente é que quisemos que eles nascessem e ainda bem. E quando vejo o ar dele a dormir, bem quieto, até parece que está rir-se para dentro, fico contente e acho que vale a pena a luta dos dias.

Sabes o que ele me disse no outro dia, já nem me lembro a que propósito, “mãe, se os miúdos pudessem escolher as mães, eu escolhia-te à mesma”.

Eu também.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

PISA (2). A AVALIAÇÃO ESCOLAR

 Merece leitura a entrevista com João Marôco no Expresso a propósito dos resultados dos alunos portugueses no PISA. .

Tal como afirma João Marôco, e como escrevi há pouco, os efeitos da pandemia não explicam o abaixamento verificado, o declínio tem vindo a verificar-se nos últimos anos e, sublinha como forte contrubuto para o abaixamento dos resultados, a substituição dos exames finais do 4º e do 6º ano pelas provas de aferição que, como tenho escrito, nem sequer me parecem de aferição.

Algumas notas a propósito de avaliação escolar.

Creio que é consensual o entendimento de que a qualidade em educação se promove sustentada na avaliação rigorosa e regular das aprendizagens.

Também me parece imprescindível a existência de dispositivos de avaliação externa com uma função reguladora e realizada em finais de ciclos, função que as provas de aferição não cumprem.

Por outro lado, a qualidade da educação solicita também a avaliação do trabalho dos professores, a definição de currículos e metodologias adequadas, a estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores eficazes e suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados de organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, sustentadores de uma visão estável para o funcionamento do sistema.

De forma mais específica, a avaliação escolar, através de diferentes dispositivos, cumpre três funções essenciais, a certificação, da aquisição de saberes ou de competências por exemplo, a ordenação, os resultados dos alunos dispersam-se por uma escala, 1 a 5, 0 a 20 ou 0 a 100, e a de regulação, recolher informação que permita identificar fragilidades nos processos de trabalho com vista à sua correcção.

Os exames nacionais, mas também os tão frequentes testes, procuram cumprir, sobretudo a primeira e segunda funções, a certificação e a ordenação, mas também em termos de sistema educativo, uma função de regulação.

Assim, apesar da imprescindibilidade da avaliação externa, os exames, só por si não me parecem os promotores centrais de qualidade. Dito de outra forma, uma avaliação basicamente centrada em produtos, os exames por exemplo, é insuficiente para introduzir mecanismos de correcção eficazes no trabalho de alunos e professores. Não é por medir muitas vezes a febre, mesmo com um termómetro de boa qualidade, que a febre baixa.

Nesta perspectiva é fundamental a solidez dos dispositivos de avaliação dirigida aos processos, ou seja, recorrer de forma consistente e aprofundada a dispositivos de avaliação formativa. No entanto, este movimento deve assentar numa sólida autonomia de professores e escolas de que ainda estamos longe.

Finalmente, parece-me de reafirmar que qualquer debate sobre avaliação escolar solicitará incontornavelmente o envolvimento de outras dimensões como currículos e programas, organização e funcionamento das escolas, designadamente recursos e apoios educativos.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

O CADERNO DE ENCARGOS

 

Na passagem de olhos pela imprensa nacional de hoje, três referências.

No DN, a directora da Comunidade Viva e Paz estima que a população sem-abrigo na área metropolitana de Lisboa aumentou 25%. Este aumento é ainda mais preocupante dado que o perfil das pessoas sem-abrigo também se alterou, encontrando-se agora muitas pessoas com emprego, mas sem capacidade económica para pagar uma casa para habitar.

O Expresso aborda a recente publicação da UNICEF, “Relatório dos Inocentes 18: pobreza infantil nos países ricos”. Apesar da evolução positiva, em 2021 Portugal tem uma taxa de pobreza infantil de 18%.

No Público, considerando o recém divulgado PISA 2023, refere-se que o estatuto socioeconómico dos alunos continua, sem surpresa, a constituir-se como um factor com peso determinante dos alunos portugueses, mas não só.  Em Matemática, a origem familiar foi responsável por 18,5% da variação dos resultados dos alunos.

Estes indicadores sustentam o pesado caderno de encargos que temos pela frente.

Estamos já em clima de pré-campanha eleitoral, é importante que se perceba com clareza o que esperar de quem se propõe ser responsável pelas políticas públicas nos próximos anos.

No entanto, lamentavelmente, tenho algum cepticismo relativamente ao que ficaremos a saber para além dos discursos “esperados” e vazios.

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

PISA 2022 (1)

 Aguardava-se com alguma expectativa a divulgação dos resultados do PISA (Programme for International Student Assessment) relativos a 2022.

Não me parece surpreendente que, à semelhança do que se verificou em muitos países, os resultados dos alunos portugueses baixaram significativamente a Matemática e Leitura e menos a Ciências. Em Portugal participaram 6793 alunos de 224 escolas.

O conjunto vasto de resultados merece reflexão mais alargada. Numa primeira apreciação, importa considerar que em muitos países também se verificou um abaixamento dos resultados, pelo que apesar da queda significativa em Matemática e Leitura, os resultados dos alunos portugueses estão dentro da média da OCDE.

Apesar de se poder atribuir este abaixamento a efeitos da pandemia, verifica-se que os resultados em muitos países já vinham em queda e em Portugal, tal como noutros países, os dados recolhidos com alunos e professores, referem dificuldades nos apoios, falta de qualificação adequada em alguns professores (verificada num quadro de falta de docentes).

Uma nota para sublinhar como estes dados parecem claramente contraditórios com os dados da avaliação interna, traduzida nos percursos de sucesso, tal como já se verificava e aqui tenho abordado, com os resultados dos exames nacionais e das provas de aferição.

Sendo certo que o dispositivo de avaliação do PISA não é igual à avaliação de conhecimentos nas escolas ou realizados pelo IAVE, importa considerar e volto a insistir que a qualidade promove-se, é certo e deve sublinhar-se, com a avaliação rigorosa e regular das aprendizagens e com regulação externa, sim, naturalmente, mas também com a avaliação justa e competente do trabalho dos professores e das escolas, com a definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores eficazes e suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados e reais de autonomia, organização e funcionamento desburocratizado das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, etc.

É o que não estamos a conseguir fazer acontecer de forma consistente, generalizada e sustentada em Portugal, apesar da imensidade de projectos, iniciativas, inovação, actividades que, demasiadas vezes chegam do exterior às escolas, podem ser interessantes … mas não são mágicos, por mais que num exercício de "wishful thinking" os queiramos entender e vender como tal.

Voltaremos ao PISA 2022.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

TEMPO DE NATAL, UMA SUGESTÃO DE PRENDA

 Estamos à beira do Natal, uma época, apesar dos dias pesados que vivemos, traz dentro de si uma inevitável questão, os presentes de Natal. O tempo de Natal é habitualmente um tempo de frio, a que as dificuldades de muita gente ainda retiram calor.

No entanto, Natal é Natal e boa parte de nós sente, deseja, precisa, de dar presentes pensando sobretudo nos miúdos que, em particular os mais pequenos, ainda mantêm uma relação quase mágica com este tempo. Sorte a deles.

A escolha dos presentes nem sempre é uma tarefa fácil e os constrangimentos económicos poderão limitar a disponibilidade e dificultar a escolha. Numa peça do JN afirma-se que, dados de um inquérito realizado, os portugueses pensam gastar cerca 215 euros no Natal em média, sobretudo em alimentação e prendas. Trata-se do valor mais baixo dos últimos três e menos 10% que em 2022.

Quando os destinatários dos presentes são os miúdos a coisa complica-se pois, para além dos eventuais custos, acontece com frequência pensarmos que as crianças já têm tudo o que nem sequer é ajustado, porque na verdade, muitas crianças a que nada parece faltar, sentem muitas precisões de que nem sempre nos damos conta.

Nos últimos anos parece notar-se nos discursos das pessoas alguma preocupação com a utilidade das prendas, minimizando a compra de coisas ou bens mais supérfluos e escolher o que possa ser de maior utilidade.

Neste contexto e conhecendo o que se vai passando no universo dos miúdos, gostava de sugerir, perdoem o atrevimento, um presente de Natal pensando neles, mas que me parece também interessante para muitos dos mais velhos. Aliás, faço esta sugestão com regularidade, oferecer tempo às pessoas que estão à nossa beira, sobretudo aos mais pequenos.

Trata-se de algo que parecendo não ser muito fácil de encontrar, também não é assim tão difícil, se quisermos encontramos.

É um bem que pode assumir diversos tamanhos, podemos oferecer a quantidade que acharmos por bem e não carece de manual de instruções, pois não é muito sofisticado o seu uso. Creio que é um presente que, para além de ser bonito, é bastante útil podendo ser usado das mais variadas formas, em diferentes ocasiões e sempre com agrado.

Apresenta também a vantagem de corresponder a uma enorme necessidade, raramente se encontra alguém que não se queixe da sua falta pelo que oferecendo este presente estamos, para além de expressar o afecto que sentimos pelas pessoas a quem oferecemos, a contribuir com algo de verdadeiramente necessário e, como já disse, útil.

Creio que os mais pequenos vão gostar mais deste presente do que de muitos dos jogos e brinquedos com que frequentemente são submersos, frequentemente a mascarar alguma falta de tempo que temos para lhes dar e que, às vezes, sem nos darmos conta compensamos com presentes.

Por outro lado, os mais crescidos que receberem tempo também se sentirão bem, todos nós gostamos de um "tempinho" para nós vindo que quem anda à nossa beira.

Na verdade, acho que poderia ser mesmo uma boa ideia oferecer tempo. É isso, este Natal podíamos poupar nos euros e oferecer tempo, tenho quase a certeza de que as pessoas vão gostar.

Bom Natal para todos. Com tempo.

domingo, 3 de dezembro de 2023

DIA INTERNACIONAL DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

 Passou mais um ano e a agenda das consciências determina que hoje se cumpra o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência. Como sempre, umas notas que de forma substantiva não se desactualizam, lamentavelmente.

Como tem sido hábito, poderão surgir algumas referências na comunicação social, ouvir-se-á alguma da retórica política aplicável à matéria em apreço com referência a iniciativas ou intenções, eventualmente teremos até alguns testemunhos, positivos e negativos, de pessoas com deficiência ou de entidades que "operam" nesta área. Aliás, a inclusão ou a promoção de um qualquer entendimento de inclusão constitui-se como um nicho de mercado promissor em diversas vertentes.

Poderão ter lugar alguns eventos realizados por instituições e movimentos que operam nesta área, referir-se-ão alguns avanços de natureza tecnológica, como se sabe as tecnologias mudam mais depressa que as pessoas e amanhã o mundo volta-se para outra questão que a agenda das consciências determine. Nos dias que correm será ainda mais rápido.

Em primeiro lugar deve dizer-se que, como acontece em outras áreas, a legislação portuguesa é globalmente positiva, embora a sua operacionalização mereça quase sempre um estudo de caso. Na sua definição é promotora dos direitos das pessoas, mas a sua falta de eficácia e operacionalização é bem evidenciada na tremenda dificuldade que milhares de pessoas experimentam no dia-a-dia.

Como exemplo, é notória a falha na fiscalização e cumprimento das disposições legais relativas às questões das acessibilidades e barreiras nos edifícios, mobiliário urbano e acessibilidade em geral. As normas de construção não são respeitadas, mantendo-se em edifícios novos a ausência de rampas ou a sua existência com desníveis superiores ao estabelecido, constituindo, assim, um obstáculo e um risco.

O resultado é a existência de muitos serviços públicos e outro tipo de equipamentos de prestação de serviços com barreiras arquitectónicas intransponíveis, a que os cidadãos com deficiência só podem aceder com ajuda de terceiros e, mesmo assim, com dificuldade.

Os transportes públicos de diferente natureza também colocam enormes problemas na acessibilidade por parte de pessoas com mobilidade reduzida.

Para além deste quadro, suficientemente complicado, ainda há que contar com a prestimosa colaboração de muitos de nós que estacionamos o belo carrinho em cima dos passeios, complicando ou proibindo, naturalmente, a circulação de cadeiras de rodas. Os passeios, nem sempre com as medidas determinadas por lei, são, por vezes ainda ocupados com esplanadas que, claro, são só mais uma dificuldade para muita gente.

A vida de muitas pessoas com deficiência é uma constante e infindável prova de obstáculos, muitas vezes intransponíveis, que ampliam de forma inaceitável a limitação na mobilidade que a sua condição, só por si, pode implicar. No entanto, muitos dos obstáculos não têm a ver com barreiras físicas, remetem para a falta de senso, incompetência ou negligência com que gente responsável(?) lida com estas questões.

Na verdade, boa parte dessas dificuldades decorre do que as comunidades e as suas lideranças, políticas por exemplo, entendem ser os direitos, o bem comum e o bem-estar das pessoas, de todas as pessoas.

Também para as crianças com necessidades especiais e respectivas famílias a vida é muito complicada face à qualidade e acessibilidade aos apoios educativos e especializados necessários apesar do empenho e profissionalismo da maioria dos profissionais que trabalham nestas áreas.

Como é evidente, existem muitas outras áreas de dificuldades colocadas às pessoas com deficiência, designadamente apoios sociais, qualificação profissional e emprego, em que a vulnerabilidade e os riscos de exclusão e pobreza são elevados traduzido em taxas de desemprego entre pessoas com deficiência muitíssimo superiores à verificada com a população sem deficiência.

Uma referência ainda ao que deve ser um princípio não negociável, a inclusão em todos os domínios da vida das comunidades.

É verdade que a questão da inclusão, em particular da inclusão em educação, é presença regular nos discursos actuais. É objecto de todas as apreciações, ilumina todas as perspectivas e acomoda todas as práticas, incluindo a “entregação” que manifestamente não promove inclusão, antes pelo contrário. Apesar do bom trabalho que existe e deve ser sublinhado, por vezes, demasiadas vezes, confunde-se colocação educativa, crianças com necessidades especiais na sala de aula regular, com inclusão. Aliás, até a exclusão de muitos alunos da sala de aula e das actividades comuns é frequentemente realizada … em nome da inclusão. E não acontece nada. A situação dura e já longa que atravessamos veio agudizar a situação.

O termo está tão desgastado que já nem sabemos bem o que significa. Não esqueço o que positivo se faz, mas também se conhecem tantas práticas e tantos discursos que alimentam exclusão e que são desenvolvidas e enunciados ... em nome da inclusão. Tantas vezes me lembro do Mestre Almada Negreiros que na "Cena do Ódio" falava da "Pátria onde Camões morreu de fome e onde todos enchem a barriga de Camões".

A inclusão assenta em cinco dimensões fundamentais, Ser (pessoa com direitos), Estar (na comunidade a que se pertence da mesma forma que estão todas as outras pessoas), Participar (envolver-se activamente da forma possível nas actividades comuns), Aprender (tendo sempre por referência os currículos gerais) e Pertencer (sentir-se e ser reconhecido como membro da comunidade). A estas cinco dimensões acrescem dois princípios inalienáveis, autodeterminação e autonomia e independência.

As pessoas com deficiência não precisam de tolerância, não precisam de privilégios, não precisam de caridade, precisam só de ver os seus direitos considerados. Os direitos não são de geometria variável cumprindo-se apenas quando é possível.

Este é o caderno de encargos que nos convoca a todos, todos os anos, todos os dias.

sábado, 2 de dezembro de 2023

UMA BOA NOTÍCIA

 Num tempo em que as dificuldades são enormes para muita gente e o futuro inquieta, sabe bem encontrar boas notícias.

Leio no Público que um grupo de estudantes universitários que tem vindo a alargar criou há já dez anos uma associação de solidariedade, a ExplicaMisto, com o objectivo de ajudar no estudo, de forma gratuita, alunos do secundário.

O apoio decorre online e o número de envolvidos, quer de “explicadores”, quer de alunos apoiados tem vindo a crescer.

As avaliações, dos jovens universitários, quer dos alunos envolvidos são muito positivas. O projecto dirige-se fundamentalmente a alunos de famílias mais carenciadas que mais dificilmente, conseguem aceder a “explicações” com custos comportáveis.

É bom saber deste tipo de iniciativas que justificam divulgação e mais apoios e incentivos.