AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

O MEC NÃO GOSTA DOS POBRES

"Ministério da Educação volta a não pagar bolsas de mérito a alunos carenciados"

Tal como aconteceu o ano passado, os alunos do ensino profissional apoiados pela acção social não estão a receber a bolsa de mérito por desempenho escolar.
No ano anterior o MEC, ainda com uma ponta de pudor, voltou atrás e com uma esfarrapada desculpa "interpretação errada dos serviços" acabou por pagar.
Para este ano, o pudor é zero.
O MEC afirma, lê-se no Expresso, que nada mudou na política de atribuição de bolsas e que "todos os processos instruídos e terminados já foram pagos". No entanto, segundo o jornal as escolas garantem ter recebido apenas os montantes que respeitam aos alunos dos cursos científico-humanísticos. É ainda referida a existência de documentação do comissário, perdão, d delegado regional de Educação do Norte em que afirma expressamente que os "cursos profissionais cofinanciados pelo POPH [Programa Operacional Potencial Humano] não poderão ser considerados nesta modalidade, nesta fase". 
Ainda a propósito de apoios aos alunos carenciados, o MEC também cortou as comparticipações para visitas de estudo aos alunos com apoio da acção social escolar. Na mesma linha das bolsas de mérito, o ano passado ainda recuou mas este ano não paga mesmo. No seu peculiar entendimento de autonomia diz que a responsabilidade é das escolas através das receitas próprias que como se sabe são muito significativas.
Definitivamente o pudor desapareceu da 5 de Outubro. O MEC não gosta dos pobres e dos alunos do cursos profissionais, por isso os exclui das bolsas de mérito e dos apoios para a realização de visitas de estudo.
Não haverá ninguém por perto que possa explicar a Nuno Crato o que significa equidade e igualdade de oportunidades?
Sim, eu sei que ele sabe o que significam mas isso choca com a visão que tem de educação e de escola.
Estamos no fundo.

O DONO DISTO TUDO NÃO É O CULPADO DISTO TUDO?

Existirá certamente algo que desconheço mas confesso alguma dificuldade em compreender muitos dos discursos das pessoas lesadas no chamado caso do "papel comercial" do BES.
Em primeiro lugar parece-me razoavelmente claro que muitos dos que foram lesados terão sido vítimas de discursos ardilosos ou publicidade enganosa, no mínimo, para serem induzidos a a permitir que as suas poupanças fossem canalizadas para fundos com capital não garantido. Algumas destas pessoas perderam as suas poupanças e sentem-se desesperadas, roubadas, sem nada , sem expectativas de futuro e daí a sua revolta, que se compreende e a solidariedade e apoio que merecem.
Algumas outras terão sido vítimas do seu próprio interesse em aproveitar a onda especulativa de investimentos e aceder a rendimentos que os depósitos a prazo não garantiam.
Dito isto acho estranho que todos os discursos que oiço se voltem de forma exacerbada contra o Banco de Portugal, em particular contra o Governador Carlos Costa. Ainda ontem ouvia o treinador de futebol Carlos Queiroz a vociferar indignado contra Carlos Costa pela perda dos seus  700 000 euros no BES do Dubai.
Na verdade, não é de agora, lembremo-nos de Vítor Constância e da sua sonolenta regulação que permitiu o BPN e outros negócios, que a regulação do Banco de Portugal parece ser pouco eficaz e interveniente. Também é verdade que algumas intervenções de Cavaco Silva e Passos Coelho vieram transmitir confiança num tempo em que tal já não seria possível pelo que se sabia ou intuía.
No entanto, continuo a pensar a grande responsabilidade desta situação é da administração e dos responsáveis do grupo BES, na pessoa do Dr. Ricardo Salgado que através de um conjunto de habilidades, cumplicidades e fraudes montou uma situação que resultou neste descalabro. Veja-se a notícia de hoje no Público que envolve os negócios com o BES do amigo generoso de Ricardo Salgado, o tal José Guilherme, que lhe ofereceu uma prenda, uma "liberalidade", de 14 milhões de euros e que agora anda a tentar reestruturar a sua dívida para com o BES.
De facto, o Dono Disto Tudo é, evidentemente, o Culpado Disto Tudo.
Como já tem sido referido, estranhamente, as pessoas roubadas e revoltadoas em vez de protestar e se indignar contra o ladrão protestam contra o polícia que, apesar de poder ter feito melhor o seu trabalho, não é o criminoso.
Fico com a sensação que o Dono Disto Tudo continua a ser ... o Dono Disto Tudo pois parece que as pessoas ainda têm medo de dizer que "o rei vai nu", ou seja, que foram roubadas por Ricardo Salgado e pela rede que liderava.
Aliás, tenho para mim, que num país com menos brandos "costumes legais" Ricardo Salgado não estaria a responder numa Comissão Parlamentar mas sim nos Tribunais.
Querem advinhar como Isto Tudo vai acabar?
Eu acho que PIT - Pagamos nós Isto Tudo.

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E DELINQUÊNCIA JUVENIL REVISTAS EM ALTA

De facto, a violência doméstica parece continuar indomesticável e apenas nos podemos referir a casos reportados que como é reconhecido, representam a ponta do iceberg.
Como muitas vezes afirmo, para além da gravidade e frequência com que continuam a acontecer episódios gravíssimos de violência doméstica é ainda inquietante o facto de que alguns realizados em Portugal evidenciam um elevado índice de violência presente nas relações amorosas entre gente mais nova mesmo quando mais qualificada. Muitos dos intervenientes remetem para um perturbador entendimento de normalidade o recurso a comportamentos que claramente configuram agressividade e abuso ou mesmo violência.
Assim sendo, torna-se muito importante que a comunidade assume uma atitude mais proactiva e atenta aos casos conhecidos, muitas vezes sabemos que existem na porta ao lado e ignoramos, que combata a sensação de impunidade do agressor com uma justiça eficaz e célere e que promova estruturas de acolhimento, apoio e protecção e apoio, bem como intervenções de natureza educativa junto de adolescentes e jovens que previnam a emergência futura destes episódios.
No que respeita à delinquência juvenil os dados  merecem preocupação embora, estranhamente, sejam desvalorizados pela Secretária Geral do Sistema de Segurança Interna, "Considero que é um aumento, não me parece que seja um aumento preocupante."
Lamento discordar da Senhora Secretária-geral mas acho preocupante. Considerando a questão da delinquência envolvendo jovens talvez seja de considerar que 35% de desemprego jovem, perto de 300 000 jovens, a geração "nem, nem", nem estuda nem trabalha" e os Centros Educativos com lotação esgotada levando a que muitos jovens cumpram penas de internamento em prisões para adultos com as consequências evidentes são, por assim dizer, "contas do mesmo rosário".
Por outro lado, segundo dados ainda da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, 24% dos jovens de alto risco de envolvimento em comportamentos de delinquência e a quem foram aplicadas medidas tutelares incluindo o internamento em Centros Educativos reincidiram nos primeiros 12 meses e ao fim de 26 meses a taxa de reincidência sobe para 48.6%.
Sempre que estas matérias são discutidas, os especialistas acentuam a importância da prevenção e da integração comunitária como eixos centrais na resposta a este problema sério das sociedades actuais pelo que a resposta recentemente criada mas não posta em prática, “casas se autonomização” poderia constituir-se como um contributo se dotada de recursos adequados. Sabemos que prevenção e programas comunitários e de integração têm custos, no entanto, importa ponderar entre o que custa prevenir e cuidar e os custos posteriores do mal-estar e da pré-delinquência ou da delinquência continuada e da insegurança.
Parece ser cada vez mais consensual que mobilizar quase que exclusivamente dispositivos de punição, designadamente a prisão, parece insuficiente para travar este problema e, sobretudo, inflectir as trajectórias de marginalização de muitos dos envolvidos mais novos em episódios de delinquência. É também reconhecido que as equipas técnicas e recursos disponíveis nos Centros Educativos são insuficientes e inibem a resposta ajustada na construção de programas de educação e formação profissional.
No entanto a discussão sobre estas matérias é inquinada por discursos e posições frequentemente de natureza demagógica e populista alimentados por narrativas sobre a insegurança e delinquência percebida, alimentadora de teses securitárias.
Apesar de, repito, a punição e a detenção constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade instalada, é minha forte convicção de que só punir e prender não basta.

DEFICIÊNCIA, TECNOLOGIA E MUDANÇA

"O Inesc Tec - Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores - Tecnologia e Ciência (Inesc Tec) do Porto, juntamente com a Universidade do Texas e a Acapo — Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal, está a desenvolver uma plataforma digital móvel para garantir uma maior autonomia dos invisuais nas suas actividades diárias."

Mais um passo no sentido de aproveitar o conhecimento tecnológico para minimizar os obstáculos sem fim que se atravesssam na vida das pessoas com deficiência. Para quem, como eu, começou a lidar com estas questões há décadas os avanços tecnológicos conseguidos são absolutamente extraordinários. Veja o trabalho do Observador.

"Como é viver com os olhos na ponta dos dedos?"

No entanto, é ainda necessária investigação aprofundada que permita criar um dispositivo tecnológico com capacidade para alterar "atitudes e comportamentos", "preconceitos", "intolerância e discriminação", etc.
Dito de outra maneira, será que a tecnologia e a ciência mudarão as cabeças?

DA INCLUSÃO - EPPUR SI MUOVE

"JOVEM COM TRISSOMIA 21 DESFILA NA PASSARELLE DO PORTUGAl FASHION"


Apesar da lentidão.
Apesar dos obstáculos.
Apesar da pressão para a "normalização".
Apesar da discriminação ainda presente.
Apesar da retórica de boa parte dos discursos, da legislação e das políticas.
Apesar de ...
A inclusão, através do seu verdadeiro critério, a participação, vai fazendo o seu difícil caminho.
Eppur si muove.

Nota - Intencionalmente não produzo qualquer juízo sobre este universo, os desfiles de moda, o mercado, a imagem, etc.
São outras questões.

O BOM DESEMPENHO DE UNIVERSIDADES PORTUGUESAS

"Há seis universidades portuguesas entre as melhores do mundo"


Aqui está uma notícia positiva no universo da educação, o bom desempenho de seis universidades poruguesas em comparações internacionais. No entanto, o desinvestimento no ensino superior, o processo devastador de avaliação da investigação científica que liquidou boa parte das estruturas de investigação em Portugal sugerem que este caminho de desenvolvimento e afirmação poderá estar ameaçado.
Por outro lado, o abandono da frequência dos cursos  de ensino superior por parte de muitos alunos e a desmotivação para continuação de estudos para além do secundário também não são boas notícias.
Mas, apesar do MEC, este bom resultado das universidades portuguesas é de saudar.

VACINAR OU NÃO VACINAR?

Como é sabido existe um Plano Nacional de Vacinação e Portugal tem, felizmente, uma taxa bastante elevada de vacinação nas crianças. Noutros países parece estar a assistir-se à emergência de um movimento que leva a que muitos pais recusem vacinar os filhos e por cá ouvem-se algumas opiniões nesse sentido.
Recordo que há algum tempo se verificou um surto de sarampo nos Estados Unidos com resultados preocupantes pois atingiu estados em que os pais podem recusar as vacinas.
Não sendo especialista, sei que as vacinas contêm alguns riscos que basicamente estarão controlados e sei também que existem interesses brutais em jogo, designadamente por parte das farmacêuticas e laboratórios. No entanto, parece-me que a vacinação representa um ganho civilizacional que poupa a morte a muitos milhares de crianças pelo mundo inteiro e quando reparamos na taxa de mortalidade infantil verificada em países que não conseguem assegurar campanhas de vacinação generalizadas percebemos isso com clareza.
Assim sendo, é sempre com alguma preocupação que em nome de valores, certamente legítimos mas que necessitam de ponderação, se possa decidir por comportamentos que manifestamente são causadores de riscos para as crianças.
Ainda no mesmo âmbito recordo também um movimento emergente que defende a realização de partos em casa que, evidentemente, tem merecido a condenação de enfermeiros e médicos devido aos elevados riscos envolvidos para bebés e mães. Também nesta matéria sabemos dos interesses económicos em jogo traduzidos, por exemplo, numa altíssima taxa de cesarianas que parece agora com tendência para baixar.
O povo costuma dizer que "com a saúde não se brinca". Não estamos a falar, obviamente, de brincadeiras mas estamos a falar de decisões que são de uma enorme responsabilidade e que podem levar como aconteceu recentemente em França, a peça do DN refere-o, que o tribunal obrigue uma família a vacinar os filhos em nome do seu superior interesse.

domingo, 29 de março de 2015

SOMOS PARCEIROS. Tu assumes riscos, encargos e prejuízos e eu ... os lucros

Na verdade, a generosidade do Estado assumida por sucessivos Governos é extraordinária. Numa espécie de variante do Estado Social em modo “Só p’ra amigos”, o estabelecimento de parcerias entre instituições públicas e entidades privadas, as PPPs, tem sido uma excelente forma de distribuir riqueza. Por poucos, é certo.
É uma área de investimento diversificado, para além dos mais conhecidos sectores das obras públicas, estruturas rodoviárias e da saúde, chegou também ao universo da gestão das águas em diversos municípios. Do que se conhece, resulta quase invariavelmente um péssimo negócio para o estado, para os contribuintes, e um muito bom negócio para os concessionários.
De facto, as PPPs em modo português são, de uma forma geral, uma estranha e assimétrica parceria, um parceiro, o Público, assume os encargos, os riscos e os prejuízos e o outro parceiro, o Privado,  recebe os lucros.
O que parece mais embaraçoso é que esta assimetria inaceitável entre quem se assume como “parceiro” tem vindo a ser sucessivamente denunciada mesmo de dentro do estado. Apesar disso, sucessivos governos têm apostado de forma despudorada, irresponsável e delinquente do ponto de vista ético, para ser simpático, no estabelecimento e fortalecimento ou manutenção destas Parcerias assentes em contratos jurídicos estabelecidos basicamente à medida dos interesses privados de empresas e grupos “amigos”, constituindo-se, assim,  como verdadeiros brindes à custa do erário público e dando um enorme contributo para a situação financeira que actualmente vivemos.
Mais grave, é continuar-se a assistir à defesa destes comportamentos, à impunidade dos responsáveis e ao aumento dos custos que esta ruinosa e irresponsável política envolve.
E não acontece nada de significativo.
É o Portugal dos Pequeninos.

NOVO PROGRAMA DE PORTUGUÊS, PARTE DO PROBLEMA OU PARTE DA SOLUÇÃO?

"Para os professores de Português, novo programa vai potenciar chumbos"

Está em discussão pública o Programa de Português para o Ensino Básico. A Associação dos Professores de Português vem exprimir sérias reservas face ao que agora se conhece.
Sem estranheza e ao contrário que parecia ser razoável, o novo Programa é definido de forma a subordinar-se às metas curriculares que foram definidas em 2012.
Assim, considerando as metas curriculares e o papel determinante atribuído pelo MEC aos exames e também sem considerar o parecer do CNE sobre a relação entre a retenção escolar e os conteúdos curriculares surge um “um currículo balizado por programas excessivamente extensos e por correspondentes metas curriculares anuais”, que “tem como objectivo a avaliação externa" e “impede a flexibilização do currículo e dos programas, bem como a criação de momentos de consolidação das aprendizagens e recuperação das áreas menos conseguidas”.
Ainda segundo a Associação dos Professores de Português, “Desta forma, impede que se responda à situação dos alunos que, cumprindo o plano de estudos regular, evidenciam dificuldades no seu acompanhamento”, lê-se no Público.
Talvez seja de recordar que, no caso do Português e da Matemática para o 1º ciclo as metas curriculares estabelecidas definem um total de 177 objectivos e 703 descritores. Por anos, temos: no 1º ano 33 objectivos e 143 descritores; no 2º, 47 objectivos e 168 descritores; no 3º, 51 objectivos e 202 descritores e no 4º, 46 objectivos e 190 descritores. É obra, uff.
Este entendimento faz correr o sério risco de que o ensino se transforme na gestão de uma espécie de "check list" das metas estabelecidas implicando a impossibilidade de acomodar as diferenças, óbvias, entre os alunos, os seus ritmos de aprendizagem o que culminará, antecipa-se, com a realização de exames todos os anos. Aliás, neste contexto é preocupante a afirmação dos autores das metas curriculares, de que estas estabelecem o que os alunos deverão imprescindivelmente revelar, “exigindo da parte do professor o ensino formal de cada um dos desempenhos referidos nos descritores”.
Como exemplos de descritores podemos mostrar “Apropriar-se de novos vocábulos: reconhecer o significado de um mínimo de 150 novas palavras, relativas a temas do quotidiano, áreas de interesse dos alunos e conhecimento do mundo (exemplos de áreas vocabulares: casa, família, escola, vestuário, profissões, festas, animais, jardim, cidade, campo)” ou “Ler pelo menos 45 de 60 pseudo-palavras (sequências de letras que não têm significado mas que poderiam ser palavras em português) monossilábicas, dissilábicas e trissilábicas (em 4 sessões de 15 pseudo-palavras cada” ouler um texto com articulação e entoação razoavelmente correctas e uma velocidade de leitura de, no mínimo, 90 palavras por minuto”.
Aplicar este modelo de trabalho em sala de aula para um grupo com mais de 20 alunos é uma tarefa que eu diria impossível.
Em síntese e como afirma a Associação de Professores de Português, um modelo curricular de natureza “fortemente prescritivo, que vai empobrecer a educação e promover a retenção escolar dos alunos”.
Parece-me importante recordar que alguns trabalhos de investigação que têm vindo a ser desenvolvidos, cito o da Professora Dulce Gonçalves da Universidade de Lisboa, evidenciam a desadequação e os problemas criados pelas metas curriculares.
Não será difícil antecipar que este novo Programa de Português para o ensino básico assente nas metas curriculares, tal como estão definidas, corre o sério risco de vir a ser parte do problema, o sucesso dos alunos, e não parte da solução.
É evidente que esta opção é coerente com a visão de educação, educação e ensino públicos que a equipa do MEC assume. 

sábado, 28 de março de 2015

DA MANHOSICE E DO DESPUDOR

"Ministra manipulou dados sobre pedofilia



Taxa de reincidência em Portugal é de 18%, e não de 80, como diz Paula Teixeira da Cruz para justificar lista de abusadores. Números dos serviços prisionais desmentem ministra."
A Ministra da Justiça está a oferecer um patético exemplo de manhocie política, manipulando dados de forma despudorada para justificar a controversa proposta de criar com acesso público uma lista de condenados por pedofilia, ainda que com restrições, coisa impossível de assegurar em Portugal como é sabido.
Cada nova intervenção justificativa da Ministra Paula Teixeira da Cruz obedece ao tão conhecido modelo "cada cavadela, cada minhoca", varia entre a ignorância, demagogia, populismo e a habilidade política manhosa.
Podia apresentar a proposta, tentar defendê-la da melhor forma possível, seria razoável. Torcer os números para que digam o que lhe convém, apesar de estarmos habituados, não é sério.

A AVOZICE

Existe uma moda aqui no Alentejo que começa assim, "Quando um homem está sozinho no seu monte".
Esta nota também assim começa. 
Quando um homem está sozinho no seu monte põe-se a pensar e a olhar.
Lembrei-me do meu neto e da magia da avozice.
E a magia da avozice fez-me recordar uma fala de um Velho cabo verdiano, amigo do meu amigo Amílcar, que dizia a propósito do quanto gozava a sua condição de avô, "Se soubesse que ter netos era assim, tinha tido os netos antes dos filhos".
Acho curiosíssima e elucidativa deste mundo mágico, ser avô.
No entanto, a ordem das coisas é a ordem das coisas, cresceu o filho até ser Gente, vai crescer o neto até ser Gente.
E eu por perto, espero.

A INTERMINÁVEL PROVA DE OBSTÁCULOS DA VIDA DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

"Cegos não conseguem abrir contas em bancos, denuncia a Acapo"

Este episódio é apenas mais um exemplo da infinita e dura corrida de obstáculos em que a vida das pessoas com deficiência se transforma.
Acontece que boa parte desses obstáculos relevam da atitude da gente "normal", da negação dos direitos, de políticas “normalizadoras”, da intolerância, da caridade que disfarça discriminação, etc.
O que ainda está por fazer apesar do muito que foi feito!

CONTINUAMOS LIXO

"Nova desilusão nos ratings: Fitch mantém Portugal no nível “lixo”"

Estes abutres sem alma gerem um deus chamado mercado, transformam em lixo o que e quem muito bem entendem à luz dos seus objectivos de saque imoral e escandaloso, criando milhões de pobres, esses sim assumindo a condição de lixo.
Estas agências são cabeças de um polvo que as alimenta e que delas se alimenta, transformam países em lixo, empresas em lixo, bancos em lixo com critérios que, frequentemente, nem os especialistas entendem mas que a alguém certamente servem.
Talvez seja de recordar que a Standard and Poor's notou com o máximo, AAA, o Lehman Brothers dias antes do seu colapso em 2008 com as consequências que bem conhecemos. Naturalmente que à agência que promoveu tão rigorosa avaliação não aconteceu nada.
Para essa gente, nós, portugueses, também somos lixo, os nossos bancos são lixo, as nossas empresas são lixo, enfim, vamos esperando pela reciclagem de que os abutres ditam as regras e com as quais continuarão a sacar.
Como diz o povo, só à vassourada, mas não é só no lixo, é nos abutres que nos transformam e tratam como lixo.

"UMA PALMADA A HORAS FAZ MUITO BEM". FARÁ?

"Há uns dias foi notícia que o Conselho da Europa está pressionar a França para adoptar legislação que expressamente proíba o recurso a castigos corporais a crianças.
A Secretária de Estado da Família do Governo Francês afirmou em entrevista à AFP e ao Le Monde que não pretende proceder a alterações pois uma parte da população é favorável aos castigos corporais e, cito do Público, não quer "dividir o país em dois campos: os que são pela palmada e os que são contra.
A Senhora Secretária entende ainda que "persiste uma tolerância baseada no costume, a do direito de correcção, que é aceite desde que seja ligeira e tenha um fim educativo"
Parece-me interessante esta questão e considerando que em muitas conversas com pais a utilização dos castigos corporais é uma questão frequente, algumas notas.
Na verdade, creio que apesar da legislação o proibir os castigos corporais ainda são uma "ferramenta" educativa em muitas famílias e, é conhecido, também em instituições que acolhem crianças.
O argumento da governante francesa é notável. Em primeiro lugar, bater nos miúdos é um costume, uma tradição, pelo que se deve tolerar e não alterar. Pela mesma ordem de razões, o costume, teremos que aceitar a violência doméstica ou tolerar a excisão genital feminina pois fazem parte de uma ancestral tradição.
Por outro lado, afirma que não quer "dividir os campos", os que defendem a pancada nos miúdos e os que são contra. Lamento, mas esta não é uma questão "fracturante" como agora se diz. Não pode existir uma legislação num país europeu do Sec. XXI que não condene expressamente um comportamento de agressão dirigido a uma criança.
Como é também frequente em muitos discursos a Senhora Secretária refere o valor "educativo" da palmada e acha que a intensidade deve ser ligeira embora reconheça a dificuldade de "objectivar" a "ligeireza".
Não faz sentido, bater nas crianças não é uma actividade educativa, o comportamento gera comportamento, e a intensidade não é definível, ou seja, a Senhora Secretária admite a existência de um grau de dor infligida que é aceitável mas ninguém conseguirá, evidentemente, que ela explique qual é esse limite como, aliás, reconhece.
A este propósito recordo que o Papa Francisco declarou há pouco tempo numa intervenção pública que entende que quando um pai bate num filho e não lhe bate na cara está a bater com dignidade, respeita a criança. Confesso que sinto alguma dificuldade em compreender como um comportamento de violência dirigido a uma criança possa ser algo de digno.
No entanto e dito tudo isto, também entendo que comportamentos inadequados ou incompetentes não significam necessariamente que estejamos perante pessoas, pais, más ou incompetentes.
Todos nós, alguma vez, agimos de uma forma menos ajustada ou adequada com os nossos filhos e isso não nos transforma em pessoas más, significa que somos apenas pessoas, que somos imperfeitos, por assim dizer e para utilizar uma expressão actual.
Assim sendo, creio que devemos ser cautelosos, quer na defesa da "estalada educadora", quer na diabolização definitiva de pais que numa situação eventualmente esporádica e de tensão assume um comportamento de que pode ser o primeiro a arrepender-se.
Esta nota, não branqueadora ou desculpabilizante de nada,  pode não ser particularmente simpática mas estou cansado, tanto de discursos de legitimação do efeito "educativo" da violência dirigida a crianças, como de discursos demagógicos e, por vezes hipócritas, que clamam pelo "crucificação" cega de uma pessoa, o outro que bate, mas são produzidos por gente desatenta ou mesmo autora ou apoiante doutros comportamentos dirigidos a miúdos tão indignos quanto a "estalada" ainda que menos visíveis.
Finalizando, embora saiba que a legislação mesmo quando é imperativa é entendida como indicativa e, portanto, desrespeitada como temos tantos exemplos entre nós, parece-me inaceitável que o direito das crianças a não serem fisicamente agredidas não esteja clara e expressamente protegido por lei."

sexta-feira, 27 de março de 2015

FAZES FALTA NO DEBATE, PAULO GUINOTE

"Paulo Guinote põe fim a um dos blogues mais lidos da educação"

Vais fazer falta no debate sobre a educação, Paulo. 
Justamente para que não se transforme na "coreografia do fingimento" que te levou a suspender "A Educação do Meu Umbigo".
Ficamos à espera.

DISCUTIR O EFEITO DO "CHUMBO ESCOLAR" NÃO É DEFENDER "PASSEM SEM SABER". DE UMA VEZ POR TODAS

Confesso que fico bastante surpreendido quando ao discutir-se os efeitos da retenção, cerca de 150 000 alunos por ano, algumas vozes, mesmo dentro do universo da educação", clamam que se está a promover o "facilitismo", o "então passam sem saber".
Como me parece evidente não é dada disto. Só como exemplo, a Noruega tem uma taxa de retenção próxima do 0% e não consta que os alunos noruegueses passem sem saber, são, aliás, dos alunos com melhores resultados nos estudos comparativos internacionais.
A questão é saber se o chumbo transforma o insucesso em sucesso. Não transforma, repetir só por repetir não produz sucesso, aliás gera mais insucesso conforme os estudos mostram.
Do meu ponto de vista, o essencial é promover e tornar acessíveis a alunos, professores e famílias apoios e recursos adequados e competentes de forma a evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo. É necessário também diversificar percursos de formação com diferentes cargas académicas e finalizando sempre com formação profissional mas não nas idades que o MEC defende, criando percursos de "segunda" para os "sem jeito para a escola" e "preguiçosos".
Como é evidente este tipo de discurso não tem rigorosamente a ver com "facilitismo" e, muito menos, com melhoria "administrativa" das estatísticas da educação uma tentação a que nem sempre se resiste.
Não tenho nenhum princípio fundamentalista contra os exames, embora no 1º ciclo me pareçam dispensáveis, as provas aferidas cumpriam o papel de regulador do sistema,. No entanto, entender que os exames, quanto mais melhor, só por existirem são fonte de qualidade, parece decorrer da estranha convicção de que se medir muitas vezes a febre, esta irá baixar o que é, no mínimo, ingénuo.
A qualidade promove-se, é certo e deve sublinhar-se, com a avaliação rigorosa e regular das aprendizagens, sim, naturalmente, mas também com a avaliação do trabalho dos professores, com a definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores eficazes e suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados de autonomia, organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, etc.
É o que acontece, genericamente, nos países com mais baixas taxas de retenção escolar.
É o que não acontece em Portugal.
É o que o Ministro Nuno Crato parece entender que não deve existir em Portugal.
Ponto.

PAÍS À VENDA

"Passos convida empresários japoneses para as privatizações nos transportes"

Vende-se
For sale
銷售本身
verkauft sich
se vende solo
se vend
自分自身を販売している
продает себя

Oportunidade única.
País em liquidação total com artigos de grande interesse.
Excelente investimento, clima excepcional, gastronomia impecável, lindas vistas.
Indígenas simpáticos, acolhedores, trabalhadores, tranquilos e com salários baixos.

Vendedores a contactar:

Passos Coelho
Pires de Lima
Paulo Portas

NO MELHOR IAVE CAI A NÓDOA

"O Instituto de Avaliação Educativa (Iave) confirmou aquilo a que prefere chamar “omissão” e a atribuição de tempo extra para a reformulação da resposta com base em novos dados. Mas não anulará a prova: “Na classificação, será garantido que nenhum professor será prejudicado”, assegurou."


Como é evidente e tantas vezes afirmamos, errar é humano. Nesta perspectiva, o erro da responsabilidade do Instituto de Avaliação Educativa na prova específica de Português de nível 1 integrada na sinistra PACC e, ao se refere, também na de Filosofia poderia ser encarado com alguma serenidade apesar do ruído e inconvenientes introduzidos. 
Acontece que a arrogância e postura do IAVE, na pessoa do seu Presidente e do Ministro Nuno Crato, designadamente nos discursos dirigidos ao profissionalismo e competência dos professores, retiram qualquer tolerância face a erros desta natureza, "omissão" como lhe chamou.
Como o povo costuma dizer com grande sabedoria, "no melhor IAVE cai a nódoa" ou, noutra versão, "pela boca morre o peixe".

quinta-feira, 26 de março de 2015

O PROJECTO-PILOTO DA MUNICIPALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

Mais uma vez ouvimos a retórica da “descentralização” e do “reforço da autonomia das escolas”.
De novo algumas notas. Em primeiro lugar expressar alguma reserva face ao entendimento que o MEC tem de “projectos-piloto”. Se consideramos, por exemplo a generalização dos cursos vocacionais sem que as “experiências piloto” fossem avaliadas creio que este caminho, a municipalização nestes moldes, está traçado e corresponde, evidentemente, à visão do Ministro.
Mais uma vez e enquanto for possível, insisto na necessidade de se considerarem com atenção os resultados de experiências de "municipalização" realizadas noutros países nos termos em que Nuno Crato se vai referindo a este movimento, e cujos resultados estão longe de ser convincentes. A Suécia, por exemplo, está assistir-se justamente a um movimento de "recentralização" considerando os resultados, maus, obtidos com a experiência de municipalização.
Por outro lado, o que se vai passando no sistema educativo português no que respeita ao envolvimento das autarquias nas escolas e agrupamentos, designadamente em matérias como as direcções escolares, os Conselhos gerais ou a colocação de funcionários e docentes (nas AECs, por exemplo) dá para ilustrar variadíssimos exemplos de caciquismo, tentativas de controlo político, amiguismo face a interesses locais, etc. O controlo das escolas é uma enorme tentação. Podemos ainda recordar as práticas de muitas autarquias na contratação de pessoal, valorizando as fidelidades ajustadas e a gestão dos interesses do poder.
Assim sendo, talvez seja mesmo recomendável alguma prudência embora, confesse, não acredite pois não se trata de imprudência, trata-se de uma visão, de uma agenda.
Ainda nesta matéria e dados os recursos económicos disponíveis, poderemos correr o risco de se aumentar o "outsourcing" e a promoção de PPPs que já existem nas escolas, muitas vezes com resultados pouco positivos, caso de apoios educativos e do recurso a empresas de prestação de serviços, (de novo o exemplo das AECs).
Finalmente, uma referência ao equívoco habitual entre autonomia das escolas e municipalização. De acordo com o modelo proposto e conforme alguns directores têm referido a autonomia da escola não sai reforçada, antes pelo contrário, passa para as autarquias. O imprescindível reforço da autonomia das escolas e agrupamentos não depende da municipalização como muitas vezes se pretende fazer crer.
Confundir autonomia das escolas com municipalização é criar um equívoco perigoso e frequentemente não passa de uma cortina de fumo para mascarar os caminhos dos negócios da educação.

DA COMPENSAÇÃO AOS PROFESSORES CORRECTORES

Não o serão em termos económicos, como eram até 2010, mas através do horário, reduzindo a componente lectiva ou a componente não lectiva, a posição do MEC, estando a questão ainda em aberto.
Uma pequena dúvida.
É sabido que as escolas estão, de uma forma geral, a trabalhar nos limites, ou para além deles, no que respeita aos recursos humanos em matéria de docentes, mas não só. Esta situaçao decorreu da saída forçada de muitos milhares de professores como consequência da política contabilística em que boa parte das políticas educativas se transformaram.
Neste cenário e tal como os directores se interrogam, não parece muito fácil que as escolas consigam acomodar a falta do número de horas com que os professores correctores venham a ser compensados. Por uma lado, porque as aulas que estão a dar são necessárias e o MEC não quererá gastar dinheiro em substituições, por outro lado, no âmbito da componente lectiva os professores desempenham funções necessárias e não uma espécie de ocupação de tempos livres, que, evidentemente não existem.
Estou em crer, gostava de me enganar, que com os directores entalados isto vai sobrar ... para os alunos e reflectir-se, por exemplo, em mais carência de apoios.

TRISTE SINA


Sem surpresa, todos os estudos confirmam, verificamos que os grupos mais vulneráveis, idosos e crianças, são os mais expostos à violência, bem como aos riscos e efeitos das situações de crise implicando a emergência da pobreza e da dificuldade ou impossibilidade de aceder à satisfação das necessidades básicas.
Triste sina.
Mostra também o (quase) tudo que está por fazer.

quarta-feira, 25 de março de 2015

NOTÍCIAS DO PET - "M'espanto às vezes, outras m'avergonho"

"Ministério recua e torna facultativos testes de Inglês que antes eram obrigatórios"

Pois é, volta e meia lembro-me de Sá de Miranda, "M'espanto às vezes, outras m'avergonho".
O MEC acordou com a FNE que os exames que os professores de Inglês deveriam fazer com a Universidade de Cambridge para certificar que sabem Inglês que chegue para classificar o Preliminary English Test dos alunos portugueses deixam de ser obrigatórios e passam a ser facultativos.
Mas que raio quer dizer isto?
É sério?

PROFESSORES, OS CDT - Culpados Disto Tudo

A Fenprof manifesta a sua preocupação com os custos da sinistra PACC que durante esta semana conhece uma nova etapa, a parte específica do exame. Não considero que seja particularmente relevante o custo, em euros, deste pulverizado dispositivo de avaliação dos professores, aliás, um pouco mais e teríamos uma escola, uma prova, um examinador,  uma vítima. Não é por acaso, evidentemente.
Estou bastante mais preocupado com os custos não tangíveis desta encenação de mau gosto da responsabilidade de Nuno Crato ainda que a ideia da sinistra PACC não tenha sido sua. Ao que parece, os autores estarão arrependidos e quando chegarem ao Governo prometem mudanças. Bem podem estar,  a coisa é mesmo má.
Na verdade, o impacto no clima das escolas, o impacto na vida de muita gente que já exerce a profissão de professor com avaliação bem sucedida, o impacto na imagem dos professores, a humilhação desnecessária e insustentável, entre outros aspectos, têm custos dificilmente calculáveis, mas certamente mais significativos que os euros gastos nesta fantochada.
No entanto, como jogada política, no seu nível mais enviesado não é mal lembrado.
Os professores, sempre esse bando de contestatários e incompetentes, aparecem com resistentes à avaliação, incompetentes que nem escrever sabem, inimigos do rigor e da excelência que só os exames promovem, ou seja, são os inimigos da educação.
De fininho, como diz o meu amigo Cajó, talvez se note menos a catastrófica situação do arranque do ano lectivo, o despedimento brutal de professores não porque não sejam necessários mas porque é preciso cortar.
Também se notará menos, achará Nuno Crato e o seu inner circle, a falta de funcionários, o número de alunos por turmas que em algumas escolas dificultará o sucesso do trabalho de alunos e professores, a falta de dispositivos de apoio às dificuldades, a instituição de uma examocracia que transforma o ensino na preparação para exames assente num modelo burocratizado, excessivo e inoperacional de metas curriculares.
Também se notará menos a amargura porque passam os alunos com necessidades educativas especiais, as suas famílias, técnicos e professores.
Também se notará menos o desinvestimento brutal na educação e escola pública, a ameaça à já insuficiente autonomia das escolas.
Também se notará menos o caminho de municipalização e o envolvimento dos interesses privados.
Também se notará menos o desânimo em que boa parte da classe docente parece viver.
Também se notará menos o número de alunos que está a ser empurrados para vias alternativas, impostas precocemente com oferta diminuta e desajustada mas que tornam as estatísticas do sucesso mais simpáticas.
Também se notará menos o brutal ataque à investigação científica e o desinvestimento no ensino superior.
Também se notará menos ...
Os CDT, os Culpados Disto Tudo são ... claro, os professores.
Não Senhor Ministro, a história não o absolverá, por mais que Guilherme Valente, Ramiro Marques, José Manuel Fernandes, entre outros, o beatifiquem.

O MEU AMIGO ZÉ TANGAS

Creio que ainda não vos falei do meu amigo Zé Tangas. Tenho para mim que todos nós tivemos um amigo Zé Tangas. Pois o meu, era um dos companheiros da adolescência.
Era um cromo o Zé Tangas. Não havia problema que ele não afirmasse resolver, alguém que ele não afirmasse conhecer ou algo que lhe fosse impossível realizar, só queria ser útil, a forma que sentia como caminho para estar com a gente.
É claro que nós aproveitávamos as fragilidades do infeliz Zé Tangas para o pôr a realizar as tarefas chatas do grupo. Naturalmente que o Zé Tangas na ânsia de comprar o afecto do grupo se dispunha e propunha a fazer de tudo para estar nas boas graças do pessoal.
Ainda hoje existem muitos putos assim que, perdidos, sós, procuram desesperadamente comprar o afecto de um grupo que os acolha e proteja. Para isso, por vezes, até se dispõem a trabalho sujo, com base na ideia de que os fins justificam os meios. O grupo, os mais importantes do grupo, safam-se sempre das histórias e o Zé Tangas, os Zé Tangas, acabam sempre entalados e a apanhar com as consequências.
Por isso, dão tanto jeito aos grupos.

CONHECIMENTO, VALORES, REPRESENTAÇÕES E PRECONCEITOS

Estes indicadores poderão ser inesperados mas, do meu ponto de vista, não o são.
Em primeiro lugar importa recordar que só em 1972 a Associação Americana de Psiquiatria retirou a homossexualidade da lista de doenças mentais que serve de referência mundial e que, ultimamente tem sido particularmente contestada. Também só nos anos 80 a Organização Mundial de Saúde deixou de considerar a homossexualidade uma doença.
Neste contexto e como também está estudado, em muitas matérias que envolvem a vida das pessoas, quando o conhecimento disponível entra em conflito com valores, representações ou preconceitos é comum que estes se sobreponham resolvendo, assim, a dissonância instalada. A questão da adopção de crianças por parte de casais homossexuais é também um exemplo elucidativo.
Assim, valores, representações ou preconceitos são "transformados" e passados como conhecimento.
Se considerarmos que este fenómeno se passa com pessoal dos serviços de saúde, a situação pode ter efeitos sérios nas pessoas atendidas pois, valores, representações e preconceitos poderão passar a ser "ciência" uma vez que são defendidas, por exemplo, por médicos e, caso mais complicado, médicos especialistas na saúde mental que, frequentemente, lidam com pessoas em situação de vulnerabilidade.
Este cenário, complexo deve dizer-se, mostra o que está por fazer em matéria de educação em termos gerais e de formação específica na área da saúde.

terça-feira, 24 de março de 2015

DA INCLUSÃO

A participação nas actividades da comunidade é um critério essencial de inclusão. Um exemplo interessante.

Consigo - RTP2, 21 de Março 2015 from ISPA - Instituto Universitário on Vimeo.

A SÉRIO?! AINDA OS CURSOS VOCACIONAIS

Em reacção a uma afirmação de António Costa sobre os cursos vocacionais o MEC vem afirmar:
A sério?!
Esta afirmação é elucidativa da relação ambígua que o MEC, Nuno Crato, tem com a seriedade.
Como é do conhecimento público, o Expresso referia- no último fim de semana, em dois anos e sem qualquer avaliação concluída e divulgada os cursos vocacionais passaram a ser frequentados por quase 25 000 alunos, eram 300, a grande maioria oriunda do ensino básico, cerca de 22 000.
Como é possível afirmar o que o MEC afirma se não existe avaliação conhecida que suporte tais conclusões. Não é sério, não é rigoroso, não é admissível, é manha política para vender uma agenda, uma visão de educação e ensino público.
Como referi há dias, é de recordar que  Relatórios da OCDE e da UNESCO têm sustentado que a colocação dos alunos com piores resultados escolares em ensino de carácter técnico e vocacional, muito cedo, em vez da aposta nas aquisições escolares fundamentais, aumenta a desigualdade social.
A diferenciação dos percursos, necessária e imprescindível reafirmo, deve surgir mais tarde, como se verifica na maioria dos sistemas educativos que se preocupam com os miúdos, com todos os miúdos.
Quanto ao conjunto de ideias expressas por António Costa sobre educação ... é melhor esperar para perceber melhor.

A GORDURA QUE JÁ NÃO É FORMOSURA

Estes resultados vão no mesmo sentido de indicadores recolhidos noutros estudos que contribuem para perceber a dimensão deste problema.
De acordo com um estudo do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, aos 4 anos mais de 90% das crianças ultrapassa já “os valores toleráveis de sal” para a sua idade. Tal situação é preocupante e requer urgente atenção.
Neste universo, o bem estar dos miúdos e os seus hábitos alimentares, recordo que segundo um estudo publicado na Lancet, creio que de 2013, em Portugal  28,7% dos rapazes, 27,1% das raparigas, 63,8% dos homens e 54,6% das mulheres evidenciam excesso de peso, enquanto a obesidade afecta 8,9% dos rapazes, 10,6% das raparigas, 20,9% dos homens e 23,4% das mulheres. Estes indicadores vão na linha dos que a OMS divulgou há algum tempo, sobretudo no que respeita à população mais nova.
Na Europa, mais de 27% das crianças com 13 anos e 33% com 11 têm excesso de peso. Portugal é um dos países com indicadores mais inquietantes, 32% das crianças com 11 anos têm peso a mais.
Nada de novo, recordo um estudo, “EPACI Portugal 2012 – Estudo do Padrão Alimentar e de Crescimento na Infância”, segundo o qual, 31.4% das crianças portuguesas entre os 12 e os 36 meses apresentam excesso de peso e 6.5% situações de obesidade. Os dados são preocupantes mas não surpreendem indo no mesmo sentido de dados envolvendo outras idades.
A Direcção-Geral de Saúde tem vindo a recomendar às escolas que alimentos hipercalóricos, como doces ou bolos, não sejam expostos, devendo ficar visíveis aos olhos dos alunos os alimentos considerados mais saudáveis em como estão em curso medidas no sentido de baixar a publicidade a alimentos e bebidas com maior carga calórica.
Recordo ainda um estudo divulgado há meses da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, encontrou 17% de rapazes e 26% de raparigas de quatro anos, sublinho, quatro anos, com excesso de peso e obesidade e níveis de colesterol elevados, um cenário verdadeiramente preocupante e de graves consequências futuras.
Creio ainda de sublinhar que estudos realizados em Portugal mostram que a obesidade infantil é já um problema de saúde pública, implicando, por exemplo, o disparar de casos de diabete tipo II em crianças.
Apesar de parecer uma birra ou teimosia acho sempre importante sublinhar a importância que deve merecer a questão dos hábitos alimentares e o combate ao sedentarismo , sobretudo nos mais novos.
As consequências potenciais deste quadro em termos de saúde e qualidade de vida são muito significativas, quer em termos individuais, quer em termos sociais. Assim, e como já tenho referido, um problema de saúde pública desta dimensão e impacto justifica a definição de programas de prevenção, educação e remediação que o combatam. Provavelmente, teremos algumas reacções contra o chamado “fundamentalismo nos hábitos individuais” mas creio que são também de ponderar as implicações colectivas e sociais do problema. 
No entanto, como sabemos, o excesso de peso e os riscos associados não serão, para a esmagadora maioria das miúdos e graúdos nessa situação, uma escolha individual, é algo de que não gostam e sofrem, de diferentes formas, com isso.

DOS JOBS FOR THE BOYS

"Ou seja, na prática, as pessoas foram escolhidas por confiança política e não pelas regras de transparência que este Governo quis introduzir ao criar a CRESAP."
"Nova diretora-geral da Autoridade Tributária não teve, por duas vezes, mérito para o cargo"

Como é reconhecido, a questão do desemprego é de uma enorme gravidade e complexidade. São urgentes medidas eficazes e diversas de promoção de emprego. Porque não começar pelos amigos? 
Fazem parte de uma lista VIP, por assim dizer.
Há que começar por algum lado e os amigos são para as ocasiões.
Aliás, o povo costuma dizer, "quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é tolo ou não tem arte".
Cambada de artistas, nem as moscas, às vezes, variam.

PARTIU HERBERTO HELDER

"Morreu Herberto Helder, o poeta dos poetas"

Partiu Herberto Helder.
Uma inspiração que ilumina este espaço. 
"... E o mundo ..., sou eu que o contemplo, é ele que me contempla, ou trocamo-nos? ...", Herberto Helder, no cabeçalho do Atenta Inquietude desde o primeiro minuto.
Continuaremos a trocarmo-nos.

A NEGRURA CRÁTICA SOBRE A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA EM PORTUGAL

A coisa resume-se facilmente. A Fundação para a Ciência e Tecnologia contratou uma moribunda European Science Foundation para um trabalho extraordinário, liquidar parte significativa das estruturas de investigação existentes em Portugal.
Definiu à partida que metade das entidades deveriam ser eliminadas logo na primeira fase e a ESF  que fizesse o trabalho. Para dar suporte às decisões recorreu-se de forma absolutamente delirante à tirania dos índices bibliométricos através da Elsevier e constituíram-se equipas de avaliadores que sem dar a cara se dispuseram a fazer o trabalho sujo, eliminar 50% dos centros e laboratórios da passagem à fase seguinte da avaliação, objectivo constante do contrato estabelecido como veio a saber-se posteriormente.
O resultado deste tenebroso processo é conhecido, pode aceder-se a muitos exemplos no blogue Rerum Natura e na imprensa onde têm sido reportados sucessivos exemplos de avaliações e tomadas de posição de investigadores e estruturas, quer em Portugal, quer no estrangeiro.
Nas avaliações realizadas verificou-se de tudo, critérios ambíguos e falta de transparência, avaliação de áreas científicas por avaliadores fora dessa área e sem peso científico, avaliações completamente contraditórias, mal fundamentas, sobre o mesmo trabalho, ignorância sobre algumas temáticas em avaliação, desconhecimento das variáveis contextuais, etc.
O resultado pretendido pela FCT foi atingido, boa parte do tecido de investigação em Portugal foi, vai ser, destruído. Muitos Laboratórios e Centros de investigação com resultados importantes e reconhecidos têm fortemente comprometido, quando não impossibilitado, o seu trabalho. É uma irresponsabilidade ética e politicamente delinquente.
Nada disto quer dizer, evidentemente, que a investigação não deva ser avaliada e escrutinados os apoios financeiros. A questão é que esta avaliação deve ser séria e competente, com critérios claros e por avaliadores reconhecidos e competentes  nas áreas  que avaliam.
Também sem surpresa e na linha das apreciações do Ministro Nuno Crato, o Presidente da FCT, Miguel Seabra, afirmou que o processo foi competente e adequado, promove a excelência, o rigor ... blá, blá, blá. Trata-se do estranho entendimento de normalidade que faz escola no MEC. 
O resultado é cada vez mais claro, boa parte das estruturas de investigação portuguesas, nomeadamente nas proscritas ciências sociais estão condenadas a desaparecer, a curto e médio prazo.

segunda-feira, 23 de março de 2015

JÁ NÃO AGUENTO

Não vou referir-me aos casos abordados na peça, passam-se noutras paragens, mas algumas notas sobre o nosso universo.
Vale a pena analisar os dados do último estudo A Saúde dos Adolescentes Portugueses, o de 2014, que integra o estudo internacional Health Behaviour in School-aged Children, da responsabilidade da OMS, realizado de quatro em quatro anos e coordenado em Portugal pela excelente equipa da Professora Margarida Gaspar de Matos e de leitura obrigatória para compreensão do universo dos adolescentes e jovens portugueses.
Segundo o estudo, um em cada cinco alunos entre o 8º e o 10º ano já se magoou a si próprio, de propósito, nos últimos 12 meses, sobretudo cortando-se nos braços, nas pernas, na barriga... Referiram que se sentiam “tristes”, “fartos”, “desiludidos” quando o fizeram.
Este indicador, preocupante como é evidente, é-o tanto mais quando representa um aumento de quase cinco pontos percentuais do grupo dos que fazem mal a si próprios considerando o Relatório de há quatro anos.
É importante sublinhar que foram envolvidos no estudo 6026 alunos do 6.º, 8.º e 10.º anos, de Portugal continental, com idades entre os 10 e os 20 anos (a média de idades é 14 anos).
Na verdade, os comportamentos de automutilação em adolescentes são mais frequentes e graves do que muitas vezes pensamos. Alguns estudos internacionais apontam para cerca de 10% da população em idade escolar com este tipo de comportamento pelo que os dados encontrados em Portugal são, de facto, preocupantes.
Este quadro é um indicador do mal-estar que muitos adolescentes e jovens sentem. Em muitas situações não conseguimos estar suficientemente atentos. Acontecem com alguma frequência situações de sofrimento com as mais diversas origens, relações entre colegas, bullying por exemplo nas suas diferentes formas, ou relações degradadas em família que facilitam a instalação de sentimentos de rejeição, ausência de suporte social, facilitadoras de comportamentos autodestrutivos. Começa também a emergir como causa deste mal estar a dificuldade que algumas crianças e adolescentes sentem em lidar com situações de insucesso escolar. Estas dificuldades são frequentemente potenciadas pela pressão das famílias e pelo nível de competição que por vezes se instala.
O sofrimento e mal-estar induzem uma espiral de comportamentos em que os adolescentes causam a si próprios sofrimento que promove mais sofrimento num ciclo insuportável e com níveis de perplexidade, impotência e sofrimento para as famílias também extraordinariamente significativos.
Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes evidenciam no seu dia-a-dia sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos atenção, seja em casa, ou na escola espaço onde passam boa pare do seu tempo boa parte do seu tempo, De facto em muitos casos, designadamente, em comportamentos de automutilação, pode ser possível perceber sinais e comportamentos indiciadores de mal-estar. Estes sinais não podem, não devem, ser ignorados ou desvalorizados. É também importante que pais e professores atentos não hesitem nos pedidos de ajuda ou apoio para lidar com este tipo de situações.
Muitos pais, diz-me a experiência, sentem-se de tal forma assustados que inibem um pedido de ajuda por se sentirem impotentes e perplexos.
O resultado pode ser trágico e obriga-nos a nós a uma atenção redobrada aos discursos e comportamentos dos adolescentes.

OS (DIS)MIÚDOS

No universo complexo e fascinante da vida e da educação dos mais novos gostava de partilhar algo que de há uns tempos para cá tem vindo a verificar-se e que me deixa com alguma inquietação, o número muito significativo de crianças e adolescentes que têm "ganho" uma espécie de prefixo na sua condição, o "dis".
Reparemos na diversidade de situações. Ao correr da lembrança e sem esgotar as possibilidades, temos os meninos que são disléxicos com uma tipologia bem variada, disgráficos, discalcúlicos, disortográficos ou até distraídos, só para citar alguns exemplos.
Temos também as crianças e adolescentes que têm (dis)túrbios. Estes (dis)túrbios também são das mais diferenciadas naturezas, distúrbios do comportamento, distúrbios da atenção e concentração, distúrbios da memória, distúrbios da cognição, distúrbios emocionais, distúrbios da personalidade, distúrbios da actividade, distúrbios da comunicação, distúrbios da audição e da visão, distúrbios da aprendizagem ou distúrbios alimentares.
O caso particular das crianças consideradas "hiperactivas" e ou "com défice de atenção" é um exemplo do que se pode designar como "sobrediagnóstico" e que, frequentemente, implica o recurso a medicação, situação com evidentes riscos para os quais alguns especialistas mais prudentes e atentos, como o Professores Mário Cordeiro ou Gomes Pedro, têm alertado. Acontece, por outro lado, que algumas crianças que exprimem de facto dificuldades são também mal avaliadas e, portanto, não acedem a uma intervenção que seria necessária.
Como é evidente existem ainda os que só fazem (dis)parates e aqueles cujo ambiente de vida é completamente (dis)funcional.
Pois é, há sempre um "dis" à espera de qualquer criança e se não, inventa-se, "ela tem que ter qualquer coisa".
Agora um pouco mais a sério, sabemos todos que existe um conjunto de problemas que pode afectar crianças e adolescentes mas, felizmente, não serão tantas as situações  como por vezes parece e a quantidade de referências e casos "diagnosticados" sugerem.
Inquieta-me muito a facilidade com que frequentemente são produzidos "diagnósticos" e rótulos que se colam aos miúdos, dos quais eles dificilmente se libertarão. Temo que a banalização da sua utilização possa contribuir para instalar, sem nos darmos, conta uma perigosa indiferença sobre o que observa nos miúdos.
É ainda preocupante a ligeireza com que muitos miúdos aparecem medicados, chamo-lhes "ritalinizados", sem que os respectivas avaliações ou diagnósticos pareçam suportar seguramente o recurso à medicação.
Esta matéria, avaliar e explicar o que passa com os miúdos e adolescentes, exige um elevadíssimo padrão ético e deontológico além da óbvia competência técnica e científica. Só assim poderemos ajudar, de facto, as crianças e adolescentes que na verdade, podem apresentar quadros específicos de dificuldades.
Não se pode aligeirar, é "dis"masiado grave.

CRIANÇAS E JOVENS EM RISCO

Peço desculpa da insistência.
Numa altura em que está na agenda a complexa discussão do acesso aberto a listas de pedófilos (na prática aberto apesar das restrições propostas), vale pena perceber e não esquecer que a maior parte dos abusos e maus tratos a crianças ocorre entre dentro de casa, envolvendo família, amigos ou conhecidos.
Por outro lado, o volume de casos faz questionar a qualidade e a celeridade das respostas.
Em Dezembro de 2014, os técnicos a intervir na área da protecção de crianças e jovens em risco manifestavam a sua preocupação com o aumento de casos e o impacto nos recursos humanos disponíveis da redução de técnicos da Segurança Social que integram as Comissões. Foi na altura divulgado que existem Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em Risco em que um técnico é responsável pelo acompanhamento de 100 crianças, ou seja, 100 famílias, tarefa manifestamente impossível de ser realizada de forma eficiente e efectivamente protectora das crianças e jovens.
Recordo que o Relatório da Actividade das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em Risco relativo a 2013 mostrava o aumento do número de casos, foram acompanhadas 71.567 crianças, mais 2560 do que em 2012.
A exposição a situações de violência doméstica, a negligência e casos relativos ao direito à educação (abandono, absentismo ou insucesso escolar) são as situações com maior incidência. É ainda relevante que os casos de crianças abandonadas ou entregues a si próprias quase duplicaram.
Verificou-se ainda o aumento do número de situações de consumos, álcool e droga, bem como de indisciplina severa. Merece registo positivo a diminuição de casos envolvendo negligência, abuso sexual, maus-tratos psicológicos, abandono, mendicidade e trabalho infantil.
Importa ainda considerar que nem todos os casos chegam às Comissões de Protecção.
Embora não possa ser estabelecida de forma ligeira nenhuma relação de causa as dificuldades severas que muitas famílias atravessam e a insuficiência de apoios sociais não serão alheias a muitas das situações de risco em que crianças e jovens estão envolvidos pois os estudos mostram que crianças e velhos constituem justamente os grupos mais vulneráveis.
De há muito e a propósito de várias questões, que afirmo que em Portugal, apesar de existirem vários dispositivos de apoio e protecção às crianças e jovens e de existir legislação no mesmo sentido, sempre assente no incontornável “supremo interesse da criança", não existe o que me parece mais importante, uma cultura sólida de protecção das crianças e jovens de que temos exemplos com regularidade. Poderíamos citar a insuficiência e falta de formação de juízes que se verifica nos tribunais de Família com enorme morosidade na resolução de situações de regulação para além de surgirem com alguma regularidade decisões incompreensíveis em casos de regulação do poder parental ou o silêncio face a situações conhecidas, etc.
Por outro lado, as condições de funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens ou dos Núcleos de Infância e Juventude do Centro Distritais de Segurança Social que procuram fazer um trabalho eficaz estão longe de ser as mais eficazes e operam em circunstâncias difíceis como o trabalho hoje divulgado com vários exemplos mostra claramente.
 Na sua grande maioria as Comissões têm responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial e foram conhecidos recente mente casos de técnicos da Segurança Social que integravam Comissões e foram dispensadas para "requalificação", ou seja, despedimento. Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as integram.
Este cenário permite que ocorram situações, frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que, sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio e os procedimentos necessários. Sublinho que neste universo intervêm diferentes entidades. Ainda acontece que depois de alguns episódios mais graves se oiça uma expressão que me deixa particularmente incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver os problemas das crianças referenciadas ou sinalizadas.
Por isso, sendo importante registar uma aparente menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos e ao seu mal-estar, também será fundamental que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas.

domingo, 22 de março de 2015

OS CURSOS VOCACIONAIS GENERALIZADOS ANTES DE AVALIADOS. Crato não erra e raramente tem dúvidas

O Expresso de ontem apresenta um trabalho interessante sobre o universo dos cursos vocacionais. Em dois anos e sem qualquer avaliação concluída os cursos vocacionais passaram a ser frequentados por quase 25 000 alunos, eram 300, a grande maioria oriunda do ensino básico.
O Expresso questiona em título se de facto este modelo será uma verdadeira resposta ao insucesso ou uma forma, mais uma diria eu, de "mascarar" estatísticas pois chumbam em Portugal cerca de 150 000 alunos por ano  e para estes cursos são "empurrados" todos os alunos que a partir dos 13 anos já tenham mais de um "chumbo".
Na maioria das situações descritas no Expresso surgem referências à tipologia dos alunos, à inadequação da oferta, à falta de recursos e meios técnicos e humanos, etc. Acontece que todos os alunos deverão cumprir uma escolaridade de 12 anos, a idade de entrada no mercado de trabalho é aos 16 e o modelo parece francamente desajustado. Nada de novo, como já aqui tenho referido considerando que este modelo contém alguns equívocos.
É curioso que sem terminar a avaliação de uma "experiência-piloto", Nuno Crato  Crato tenha decido aumentar exponencialmente, 3000%, o número de turmas destes cursos o que é interessante como metodologia, generaliza-se independentemente da avaliação a que o período experimental estava sujeito. É certo que Ramiro Marques, um dos cráticos gurus, bem se esforçou por bem vender o "produto" e ele aí está. Como se sabe, também Nuno Crato nunca se engana e raramente tem dúvidas.
Como se infere da interrogação do Expresso e das inquietações de alguns directores ouvidos, a decisão do MEC por esta opção também não é estranha pois corresponde a uma linha importante das opções políticas, um persistente e determinado caminho de ir aliviando o "ensino regular" dos alunos "preguiçosos" e "burros" que só atrapalham e não deixam que os resultados escolares, quer dizer, os exames, o mantra de Nuno Crato, sejam excelentes. Na verdade, é mais interessante criar turmas de "descamisados", uma espécie de "alunão", um recipiente para onde se enviam a partir dos 13 anos os alunos que não prestam e devem ser reciclados, do que estruturar apoios e recursos que os mantenham, tanto quanto possível, no ensino "regular". Esta ideia é vendida sob o princípio ajustado e que deve ser considerado de diferenciar e diversificar os percursos educativos mas contém o pecado original de se destinar privilegiadamente e "obrigatoriamente" aos chumbados como todos sabemos que na prática acontecerá.
No entanto, gostava de recordar que  Relatórios da OCDE e da UNESCO têm sustentado que a colocação dos alunos com piores resultados escolares em ensino de carácter técnico e vocacional, muito cedo, em vez da aposta nas aquisições escolares fundamentais, aumenta a desigualdade social.
Quero deixar claro, tenho-o escrito e afirmado, que é importante diversificar a oferta formativa, a diferenciação de percursos, de forma a conseguir um objectivo absolutamente central e imprescindível, todos os alunos devem atingir alguma forma de qualificação, única forma de combater a exclusão e responder mais eficazmente à principal craracterística de qualquer sala de aula actual, a heterogeneidade dos alunos. Aliás, a oferta formativa de natureza profissional a alunos mais velhos, no âmbito do ensino secundário que também está a acontecer, pode ser um passo nesse sentido desde que não canalizado para os "que não servem" para a escola.
A questão que considero fortemente discutível num plano técnico e ético é a introdução desta diferenciação tão cedo e “obrigatória” para os que chumbam. Poucos sistemas educativos assumem este entendimento e o facto de o ensino alemão, a inspiração de Crato e colaboradores, o admitir não é nenhuma chancela de correcção do modelo como atestam as apreciações internacionais.
Os alunos com insucesso, estamos a falar, presumo, de gente com capacidades "normais" irão “obrigatoriamente para” o ensino vocacional. Sabe-se que o insucesso escolar é mais prevalente em famílias mais desfavorecidas embora também conheçamos as excepções, muitas. Assim, mantemos a velha ordem, os mais pobres "destinados" preferencialmente para o trabalho manual, os mais favorecidos preferencialmente para o trabalho intelectual como a UNESCO reconhece.
A diferenciação dos percursos, necessária e imprescindível reafirmo, deve surgir mais tarde, como se verifica na maioria dos sistemas educativos que se preocupam com os miúdos, com todos os miúdos.