Para que não nos esqueçamos o calendário das consciências
determina para hoje o Dia Mundial do Combate ao Bullying.
Nos tempos que atravessamos e apesar das circunstâncias
excepcionais o fenómeno do bullying e em particular do cyberbullying, continua a ser fonte de sofrimento para
muitas crianças e jovens e, naturalmente, uma fonte de preocupação para famílias,
professores e técnicos.
Mesmo durante o período do de confinamento a variante
cyberbullyingaconstituiu uma fonte de enorme inquietação como emergiu no
estudo “Cyberbullying em Portugal durante a pandemia da covid-19” do Centro de
Investigação e Intervenção Social do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa,
que aqui referi, e nos dados agora revelados pela Associação Portuguesa Contra a Obesidade Infantil, uma em cada cinco crianças com obesidade foi pela
primeira vez vítima de cyberbullying durante os meses de confinamento e ensino
à distância.
Algumas notas repescadas direccionadas sobretudo para os
alunos que ainda frequentam a escolaridade obrigatória.
Desde logo parece-me de chamar a atenção que também por
questões desta natureza se percebe a necessidade de uma área disciplinar
trabalhada na escola, que chegue a todos os alunos e que promova a qualidade
das relações interpessoais, a empatia, solidariedade e inteligência emocional,
etc.
O cyberbullying parece ser actualmente a variante de
bullying mais preocupante. Contrariamente ao bullying presencial o
cyberbullying não tem “intervalos”, normalmente os fins-de-semana pois ocorrem
predominantemente nos espaços escolares. Não sendo presencial o(s) agressor(es)
não tem, ou não têm, uma percepção clara do nível de sofrimento infringido o
que em algumas circunstâncias pode funcionar como “travão” e inibir o
comportamento agressivo. Esta situação é potenciada quando se junta a um menor
nível de empatia pelo outro o que ficou muito claro no primeiro trabalho citado
acima e que merece leitura.
Também por estas razões é fundamental uma atitude ajustada
face a este tipo de comportamentos.
Em termos globais, sabe-se também que a ocorrência de
situações de bullying é bem superior ao número de casos que são relatados. Uma
das características do fenómeno, nas suas diferentes formas, incluindo o cyberbullying,
é justamente o medo e a ameaça de represálias a vítimas e assistentes que,
evidentemente, inibem a queixa pelo que ainda mais se justifica a atenção
proactiva e preventiva de adultos, pais, professores, técnicos ou funcionários.
Este cenário determinaria, só por si, um empenhado
investimento em recursos e dispositivos que procurassem minimizar o volume de
incidências, algumas das quais de gravidade severa.
Neste contexto e dada a gravidade e frequência com que
ocorrem estes episódios, é imprescindível que lhes dediquemos atenção ajustada a sinais dados por crianças e adolescentes,
nem sobrevalorizando, nem tudo é bullying, o que promove insegurança e
ansiedade, nem desvalorizando, o que pode negligenciar riscos e sofrimento.
Neste universo e mais uma vez importa considerar dois eixos
fundamentais de intervenção por demais conhecidos, a prevenção e a intervenção
depois dos problemas ocorrerem. Esta intervenção pode, por sua vez e de forma
simplista, assumir uma componente mais de apoio e correcção ou repressão e
punição, sendo que podem coexistir. Com alguma demagogia e ligeireza a
propósito do bullying, as vozes a clamar por castigo têm do meu ponto de vista
falado mais alto que as vozes que reclamam por dispositivos de prevenção,
intervenção e apoio para além da óbvia punição, quando for caso disso.
Esta utilização mostra a necessidade de dispositivos de
apoio e orientação absolutamente fundamentais para que pais, professores e
alunos possam obter informação e apoio. Entretanto estão criados vários portais
e disponíveis alguns canais de denúncia e procura de orientação e suporte
dirigido a pais, professores, técnicos e, naturalmente, alunos.
Lamentavelmente, parte importante das entidades e iniciativas
de apoio e suporte é exterior às escolas e ilustra a falta de resposta
estruturada e global do sistema educativo, para além das insuficiências de
recursos e na formação de técnicos e de professores sobre esta complexa
questão, desde logo para o seu reconhecimento e identificação.
A existência de dispositivos de apoio sediados nas escolas,
com recursos qualificados e suficientes, designadamente no que respeita aos
assistentes operacionais com funções de supervisão dos espaços escolares, é uma
tarefa urgente.
Do meu ponto de vista, o argumento custos não é aceitável
porque as consequências de não mudar ou não fazer são incomparavelmente mais
caras. Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil dizer qualquer coisa,
mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes evidenciam no seu dia-a-dia
sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos ou não conseguimos dar atenção,
seja em casa, ou na escola.
Estes sinais não devem ser ignorados ou desvalorizados. O
resultado pode ser trágico.
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