AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quarta-feira, 31 de julho de 2019

DA PROMOÇÃO DO SUCESSO EDUCATIVO


A propósito do anúncio da aprovação do programa municipal “Secundário para todos” no município de Lisboa que disponibiliza uma verba de cinco milhões de euros “para ajudar a combater e prevenir o insucesso e o abandono escolar precoce”, algumas notas.
Em primeiro lugar quero reafirmar sem qualquer margem para dúvida que está estudada e reconhecida de há muito a associação fortíssima entre o investimento em educação e investigação e o desenvolvimento das comunidades, seja por via directa, qualificação e produção de conhecimento, seja por via indirecta, condições económicas, qualidade de vida e condições de saúde, por exemplo. Assim, por princípio, os custos da educação não são despesa, são investimento, o que mais retorno e bem-estar traz ao país e o caminho mais sólido para construir o futuro.
Mas, os velhos têm sempre um mas, o modelo que está a ser seguido pode conter alguns riscos na cultura e praxis política que temos.
São múltiplos os programas municipais de promoção do sucesso, alguns que conheço dotados com orçamentos muito significativos no âmbito do Quadro Comunitátio  Portugal 2020 e apresentam um elenco interminável de iniciativas de múltipla natureza com o objectivo último de promoção do sucesso educativo. Aliás, tenho dado algumas colaborações de natureza pontual a alguns destes projectos.
A minha questão … é qual a capacidade transformadora e sustentada destes projectos, com frequência vindo de fora para as escolas com iniciativas e intervenções não integradas com as equipas e recursos escolares, aliás, conheço situações em que as escolas ou agrupamentos nem sequer aderem. Não estará em causa o empenho ou a competência dos técnicos envolvidos mas, sobretudo, o modelo de funcionamento.
O investimento em educação terá de ter sempre como eixo central a escola/agrupamento no âmbito de uma reconhecida autonomia com projectos com horizonte temporal passível de criar, de facto, transformação e mudança.
Iniciativas de natureza avulsa, recursos disponibilizados sem garantia de continuidade, intervenção sistemática de agentes exteriores à escola agenciados pelas iniciativas municipais terão, provavelmente, um potencial de mudança mais baixo de … sucesso duradouro e estrutural.
É verdade e registo com muito agrado, o empenho e competência do trabalho desenvolvido por muitos agrupamentos/escolas e professores no âmbito destes projectos.
Importa sublinhar que a autonomia das escolas e agrupamentos é, reconhecidamente, uma ferramenta de desenvolvimento da sua qualidade, pois permite que os seus recursos, modelos de organização e funcionamento se ajustem às especificidades de contexto e, assim, melhor possam responder à população que servem, a toda a população, evidentemente, de acordo com as suas necessidades.
As autarquias têm, evidentemente, um papel crítico nas diferentes dimensões da vida das comunidades que servem. No entanto, a “tutela”  e liderança do trabalho educativo, pedagógico, de promoção do sucesso escolar deverão ser sediados na escola sendo, obviamente, o trabalho desenvolvido em colaboração com todos os múltiplos actores no processos de desenvolvimento mesmo que de forma mais indirecta.
Por outro lado, estes múltiplos projectos carecem de uma regulação eficaz que permita perceber mesmo se estamos a construir sucesso ou a “fabricar” sucesso.

terça-feira, 30 de julho de 2019

É PARA DEVOLVER A CRIANÇA. NÃO É BEM O QUE ESTÁVAMOS À ESPERA


Peço desculpa de neste período de férias e de relaxamento insistir em algumas matérias que são perturbadoras e inquietastes. No DN encontra-se uma peça sobre uma questão que, normalmente apenas é referida na comunicação social na altura em que é divulgado o Relatório CASA, a situação de crianças que passam pela interrupção do seu período de pré-adopção familiar, uma forma mais “simpática" de afirmar que são devolvidas pelas famílias adoptantes às instituições que as acolhem.
Embora ainda sem dos dados de 2018 que o DN informa serem 14, nos últimos três anos foram devolvidas 53 crianças.
Estas crianças, com idades diversas, passam por situações verdadeiramente devastadoras como a peça bem evidencia.
Os motivos para esta “devolução” passam por situações que assim podem aconselhar, maus tratos da família adoptante por exemplo, mas também por justificações como “não correspondem às expectativas”, “'venderam-me gato por lebre” ou que atrapalham as rotinas com os animais de estimação da família.
Também há algum tempo num trabalho sobre o mesmo tema, o DN citava um caso em que uma criança foi devolvida e trocada por outra porque não se adaptava ao cão da família. Outros casos de devolução envolvem dificuldades de adaptação a outros elementos da família ou a questões económicas.
Vejamos com mais atenção. Uma criança que por qualquer razão não tem uma família, está numa instituição, envolve-se num processo de adoção, entra numa família que entende passar a ser a SUA família, deve sentir-se num caminho bonito. Passado algum tempo é devolvida, provavelmente, sem perceber porquê e vive uma, certamente mais uma, devastadora experiência de abandono e rejeição com efeitos que não podem deixar de ser significativos. O trabalho do DN refere algumas situações perturbadoras.
Como é evidente, admito que em circunstâncias excepcionais o processo possa ser interrompido mas, insisto, só mesmo numa situação limite depois de esgotados os dispositivos de apoio às famílias adoptantes.
A lei permite o período de transição e um período de pré-adopção, uma espécie de contrato à experiência. Há uns anos em conversa sobre esta questão com o então presidente da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco, Juiz Armando Leandro, este reconhecia que a devolução não tem de ser baseada em "critérios necessariamente válidos".
Como também é referido os serviços competentes têm-se esforçado para que estas situações se minimizem quer através da adequação das famílias candidatas, quer nas orientações e apoios para a optimização dos processos de adopção mas, algumas situações continuarão certamente a acontecer.
Voltando ao tão apregoado "superior interesse a criança", é difícil imaginar o que se passará na cabeça de um miúdo que passa anos a construir uma ideia de família, a certa altura entra numa família a que chama sua e de repente dizem-lhe que volta a estar só, na instituição, porque ... não se dá bem com o cão ou não corresponde às expectativas. Que sentirá a criança?
Porquê? Não presta? Não a querem? ...
Mas as crianças, Senhores?
Deixem-me ainda recordar uma expressão que ouvi em tempos a Laborinho Lúcio num dos encontros que tenho tido o privilégio de manter com ele.
Dizia Laborinho Lúcio que "só as crianças adoptadas são felizes, felizmente a maioria das crianças são adoptadas pelos seus pais”.
Na verdade, muitas crianças não chegam a ser adoptadas pelos seus pais, crescem sós e abandonadas. No entanto, é melhor criar uma oportunidade para que as crianças "desabrigadas" possa ser adoptadas, possam ser felizes.

segunda-feira, 29 de julho de 2019

PAIS E FILHOS AOS GRITOS


Achei interessante a peça com a entrevista a Hedvig Montgomery no Observador centrada no infindável e complexo mundo a parentalidade nos tempos actuais. O discurso tem, do meu ponto de vista, uma densidade que nem sempre se encontra na enorme oferta que que tem proliferado nos últimos anos em que tanta gente parece quere escrever um impossível “Manual de instrução para educar crianças”. Como sabem, a educação entre nós não é matéria objecto de “saber”, de conhecimento”, é, basicamente, matéria de “opinião”, de “achismos”. Em qualquer cidadão que já se tenha cruzado com crianças ou, sobretudo, que tenha filhos e algum “jeito” para escrita nasce um livro que nos dá a receita para bem educar as crianças. O problema é que a generalidade das crianças não cabe num livro de receitas.
A título de exemplo parece-me de registar, “Estamos sempre a impor limites para manter a criança segura. Aonde ir (e não ir), quando ir para a cama, quando ir para a escola, etc. As crianças precisam disto, e precisam que os pais encontrem os limites apropriados para elas e para as suas idades — do princípio até ao fim.”
A este propósito, aproveitando a época de férias no qual, em princípio, haverá mais temo de contacto nas famílias acrescento umas partindo de uma história que já aqui deixei.
Há algum tempo, também num período de férias escolares, estava a almoçar com um gaiato da família num daqueles espaços de restauração que sempre têm gente nova, adivinharam, isso mesmo, um McDonald's. Numas mesas perto de nós estavam dois casais, gente ainda nova, que tinha à volta três ou quatro crianças, talvez entre os cinco e os sete, oito anos.
Bom, nem vos conto, aquelas alminhas pequenas já teriam almoçado pelo que, enquanto os papás continuavam na "tranquilidade" do repasto, saltitando entre a conversa, curta, e os telemóveis, os pequerruchos entretinham-se a gritar, a correr de um lado para o outro, tropeçando nas mesas, entornando papéis e lixo, enfim, animando o almoço dos presentes.
Os papás, de vez em quando, soltavam um distraído e ineficaz, "estejam quietos", "portem-se bem" e continuavam "tranquilamente" na conversa que, dado o barulho, não me parecia sequer fácil de manter, daí, o menos exigente apego ao telemóvel.
Às tantas, tinha uma gaiata com uns cinco anos a gritar-me aos ouvidos. Olhei para a mocinha com um olhar que tenho guardado para quando é preciso, um olhar que aprendi com o meu pai quando me dizia o que deveria ser feito, e ela recuou indo gritar para o pé de outro comensal bafejado com a sorte de tal experiência.
Fiquei a pensar como gritam estes miúdos, muitos miúdos, a estes acho que nem os ouvi usar um tom de voz normal, seja lá isso o que for, apenas gritos.
Há quem diga que é por causa da educação que levam, ou da falta dela, que os meninos passam o tempo gritar. Talvez não seja um problema de educação, ou, melhor, da falta dela.
Eu creio que os miúdos gritam muito porque, de uma forma geral, os adultos estão mais surdos. Quando os miúdos falam mais baixo os adultos não os ouvem e, por isso, os putos desatam a gritar a ver se alguém lhes liga. O problema é que, muitas vezes, nem assim. Ou então, os adultos senrem que têm de gritar mais alto ... porque são adultos e acosa também não funciona.
Esta história não tem rigorosamente a ver com superpais, tem apenas a ver com atenção, bom senso e regulação que pressupõe relação (não é estar ao lado), afecto, regras, limites e autonomia. Será este o caminho do desenvolvimento saudável.

domingo, 28 de julho de 2019

DUAS FÉRIAS


Neste começo de férias uma história com férias, duas férias.
No último dia de aulas, a Ana foi à biblioteca da escola entregar um livro. Quando estava para sair, o Professor Velho, o que está na biblioteca e fala com os livros, disse-lhe adeus e desejou-lhe boas férias. A Ana riu-se.
Vão ser boas, Velho, vou ter duas férias.
Duas férias, Ana? Como é isso?
Primeiro, vou de férias com a minha mãe, com o amigo dela, o João, e com o Manel que é filho do João. Depois, vou de férias com o meu pai, a amiga dele, a Sara, e com o Tito que é o filho da Sara.
Estás contente?
Claro. Eles são todos fixes e a gente farta-se de brincar. Brinco mais do que brincava quando vivia com o pai e a mãe. Eles estavam sempre um bocado chateados e a gente não brincava muito. Já viste Velho, tinha uma família chata e agora tenho duas famílias mesmo fixes.
Sorte a tua, Ana, boas férias.
O Professor Velho tem razão, as crianças são bem capazes de lidar com duas famílias se os adultos ajudarem. Tantas vezes afirmo que é preferível uma boa separação a uma má família com pais casados por fora e descasados por dentro. Esta situação não passa despercebida às crianças e não têm como lidar com ela.
Boas férias.

sábado, 27 de julho de 2019

MAIS ALUNOS NO SUPERIOR


Está a decorrer a primeira fase do concurso de acesso ao ensino superior. Considerando igual período do ano passado verifica-se um aumento de cerca de 5% nas candidaturas já realizadas.
Depois do decréscimo do ano anterior que contrariou três anos de subida, a confirmar-se esta subida  no final de todo o processo de candidatura, trata-se, de facto, de uma boa notícia.
O aumento de número de estudantes que se candidatam ao ensino superior dever-se-á segundo alguns especialistas a maior sucesso no ensino secundário, a melhoria na condição económica de algumas famílias e ao aumento de confiança na formação superior.
Espero que estas razões continuem a sustentar a busca de formação de nível superior.
É importante recordar que, contrariamente ao muitas vezes se entende, as famílias portuguesas enfrentam um dos mais caros sistemas de ensino superior da UE e da OCDE.
Por outro lado, de há uns anos para cá tem vindo a instalar-se a perigosa e falsa ideia de que "somos um país de doutores" e de que não compensa estudar. É fundamental insistir que não temos licenciados mais, temos desenvolvimento a menos e daí alguma dificuldade na absorção de mão-de-obra qualificada. Importa também repensar rede e a oferta, corrigindo assimetrias e ajustando a oferta não só em função da empregabilidade mas não esquecendo o papel do ensino superior e da investigação na promoção do desenvolvimento em todas as áreas do conhecimento.
Na verdade, apesar da recuperação ao nível do abandono, temos uma das mais baixas taxas de pessoas com formação superior entre os países da OCDE. Aliás, não cumpriremos certamente o objectivo de formação superior estabelecido na UE para 2020.
Neste quadro, saber que está a aumentar o número de estudantes, sem a exclusão dos mais vuneráveis, que pretende frequentar o ensino superior é mesmo uma boa notícia.

QUE FAZER? TALVEZ ..., DIZ O ALIANÇA


A “silly season” traz sempre algo de estimulante.
O partido do Menino Guerreiro, o Aliança, inova nas mensagens programáticas. O Menino Guerreiro cresceu e, naturalmente, constrói um novo olhar sobre Portugal e a forma como os problemas devem ser resolvidos e o bem-estar dos portugueses pode ser atingido.
Este seu processo de maturidade no entendimento do mundo traduz-se evidentemente no programa que o Aliança propõe aos portugueses. No Instagram, onde mais poderia ser, vislumbra-se como pode ser mais rica e mais estimulante a nossa vida. É certo que tudo deve ser sempre, mas sempre, fruto do amor. É lindo e ilumina o futuro.
Obrigado Santana Lopes, o país não será nunca capaz de lhe agradecer o tanto que tem feito por nós e o tanto que ainda se propõe fazer por nós.
Somos uma terra de ingratos.


sexta-feira, 26 de julho de 2019

A MAGIA DA AVOZICE


Quase sempre passa discretamente mas de acordo com o calendário das consciências´determina para hoje o Dia Mundial dos Avós.
A avozice é um mundo mágico no qual entrei há algum tempo com a abençoada chegada do Simão há seis anos e do Tomás há três e acho que ainda não consegui acomodar os sentimentos e a magia de acompanhar de perto, tão de perto quanto possível sem o excesso da intrusão inibidora de autonomia, o crescimento destes gaiatos que têm uma geração pelo meio.
Tem sido um divertimento, uma descoberta permanente e a percepção de um outro sentido para uma vida que já vai comprida e também, desculpem a confissão, cumprida.
Neste entendimento e como tem acontecido aqui no Atenta Inquietude a cada 26 de Julho, retomo a minha proposta no sentido de ser legislado o direito aos avós. Isto quer dizer, simplesmente, que todos os miúdos deveriam, obrigatoriamente, ter avós e que todos os velhos deveriam ter netos.
Num tempo em que milhares de miúdos passam muito tempo sós, mesmo quando, por estranho que pareça, têm pessoas à beira, e muitos velhos vão morrendo devagar de sozinhismo, a doença que ataca os que vivem sós, isolados, qualquer partido verdadeiramente interessado nas pessoas, sentir-se ia obrigado a inscrever tal medida no seu programa ou, porque não, inscrevê-la nos direitos fundamentais.
Com tantas crianças abandonadas dentro de casa, institucionalizadas, mergulhadas na escola tempos infindos ou escondidas em ecrãs, ao mesmo tempo que os velhos estão emprateleirados em lares ou também abandonados em casa, isolados de tal forma que morrem sem que ninguém se dê conta, trata-se apenas de os juntar, seria um “dois em um”. Creio que os benefícios para miúdos e velhos seriam extraordinários.
Um avô ou uma avó, de preferência os dois, são bens de primeira necessidade para qualquer miúdo.
Já agora deixo uma história com avô dentro. Como sabem contar histórias é mesmo coisa de avós e às vezes repetem-nas, é o caso desta, já aqui a contei.
De há uns tempos para cá apareceu uma moda naquela terra que “impede” as pessoas de falarem em brincar nas escolas da terra, é proibido brincar nas escolas.
A moda foi fabricada por uma gente ignorante de miúdos, obcecada com trabalho e produtividade, mesmo infantil, uns infelizes escravos convencidos de que são livres e que também querem escravizar os outros.
Mas ainda existem uns professores, muitos, naquela terra que não se deixam enganar, sabem ler os miúdos e percebem que eles aprendem porque também brincam e brincam porque também aprendem. Aliás, brincar e aprender são as coisas mais sérias que os miúdos fazem, sorte a deles, a de alguns, felizmente muitos.
Um dia, um desses professores lembrou-se, que sacrilégio, de dizer aos seus alunos para trazerem para a escola o seu brinquedo preferido. A Maria trouxe uma boneca. O João apareceu com a consola nova. A Sara vinha vaidosa com umas bonecas que o pai tinha trazido do estrangeiro. A Irina trazia o Noddy. O Carlos vinha com uns olhos quase tão grandes como a bola de futebol que trazia debaixo do braço. O David, sempre pronto para as lutas, trazia uns bonecos lutadores de wrestling. A Joana não ligava a ninguém com o seu mp3 cheio das músicas de que gosta. Enfim, por um dia, toda gente veio para a escola com um brinquedo, o seu preferido.
O último a chegar foi o Manel.
Feliz e sorridente entrou na sala de aula com o avô pela mão.

quinta-feira, 25 de julho de 2019

DAS ALTERAÇÕES AO DL 54/2018

Foram promulgadas as primeiras alterações ao DL 54/2018, um ano depois da sua entrada em vigor.
Sublinho que promover alterações disposições legais quando necessário é, por princípio, uma atitude ajustada que nem sempre se verifica em políticas públicas. No entanto, algumas notas a propósito das alterações ao DL 54/2018 ao fim de um ano de entrada em vigor.
É verdade que todos os processos de mudança estão sujeitos a dúvidas e sobressaltos pelo que a gestão das políticas públicas deve ter isso em consideração. Apesar da reafirmada inovação conceptual, da mudança de paradigma, da revolução desencadeada que instalava definitivamente a "inclusão", a forma como foi colocado em campo só podia criar dificuldades, constrangimentos e dúvidas. 
Como já escrevi, uma das mais significativas maiores alterações apontadas ao 54/2018 seria, criar um novo paradigma, e acabar com a “categorização”. Não teríamos mais referências a “CEIs”, os “NEEs” ou os “redutores”. No entanto, ouvir e ler regularmente que alguém trabalha com 5 “adicionais” e dois “selectivas” ou com 6 “universais” ou ainda “Olá, alguém tem adaptações curriculares não significativas da Disciplina A e Disciplina B do x° ano?” ilustra o novo paradigma que eliminou a categorização.
A burocratização “grelhadora” ou “matrizadora”e os múltiplos e extensos relatórios continuam e relatórios imensos continuam que desgasta sem que o benefício pareça compensar o custo. São excessivamente frequentes os pedidos de “alguém tem um relatório sobre ...”, “alguém tem um programa de …”, “alguém tem uma ficha para ...”
Os testemunhos conhecidos em vários espaços e de diferentes formas sobre o que vai acontecendo pelas escolas nesta matéria ilustram com muita clareza a enorme sombra de dúvidas sobre o processo que mostram todos os intervenientes, professores do ensino regular, docentes de educação especial, técnicos e pais que estão genuinamente empenhados em que todo corra o melhor possível.
Às dúvidas, muitas, surgem respostas que com frequência começam por “eu acho …”, “nós decidimos …”, “na minha escola”, “no meu grupo …”, etc.
Sim, também sei, há gente e escolas a realizar trabalhos notáveis como sempre aconteceu. Merecem divulgação e reconhecimento.
A questão é que, lamentavelmente, não se verificam apenas pontuais incidentes próprios dos processos de mudança e as alterações agora promulgadas ainda que, por exemplo no que respeita ao envolvimento dos pais, possam ser positivas não mexem substantivamente, do meu ponto de vista, com o cenário que descrevi.
Continuo a entender que o processo de mudança ganharia se durante algum tempo, antes da publicação, o normativo estivesse em discussão e trabalho nas escolas, identificando e antecipando os processos decorrentes da mudança, as dificuldades e as necessidades em matéria de ajustamento de recursos, organização e procedimentos. Teria estimulado uma apropriação envolvida e permitiria construir alguma coerência e maior tranquilidade no trabalho a desenvolver pelas equipas das escolas quando, de facto, entrasse em vigor.
Teria sido possível a construção nas escolas de uma massa crítica sólida e fundamentada que, então sim, sustentasse o ajustamento do quadro legislativo, importante e necessário, mas não realizado de forma mais avulsa e reactiva.

quarta-feira, 24 de julho de 2019

OS MIÚDOS SÁBIOS

Era uma vez, estavam dois miúdos num parque, um desses sítios que algumas terras ainda têm para os mais pequenos brincarem, quando podem e os deixam, é claro. Não havia muita gente. Os miúdos, às tantas, rebolavam no chão um bocado engalfinhados.
Passou um médico e pensou que eles talvez se magoassem porque aquelas brincadeiras podem ser perigosas.
Passou um antropólogo e pensou como ainda provavelmente se realizam lutas simbólicas por territórios, apesar das mudanças culturais.
Passou um pai e pensou como era possível que as crianças estivessem ali sozinhas nos dias que correm.
Passou um professor e pensou como seria mais útil que estivessem a ler algo de interessante em vez de se comportarem assim.
Passou um sociólogo e pensou como desde cedo se procura hierarquizar as relações sociais.
Passou um psicólogo e pensou como começa a ser tão frequente o bullying.
Passou um padre e pensou como os padrões morais que regem os comportamentos se alteram e a violência se instala.
Passou outro miúdo e perguntou “Estão a brincar a quê?”. Responderam os outros, “Às lutas, também queres brincar?”, “Quero” disse o que chegou.
E ficaram três miúdos a rebolar-se no chão um bocado engalfinhados. E felizes.

terça-feira, 23 de julho de 2019

IDEOLOGIA DE GÉNERO? NÃO, É MESMO UMA QUESTÃO DE DIREITOS


De forma que considero discreta para o significado que contém, foi noticiado que 85 deputados PSD e do CDS requereram ao Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva das normas que enquadram a educação para a identidade e expressão de género no ensino público e privado.
Ao abrigo de algo indefinido e abrigo para preconceito e intolerância a que chamam “ideologia de género” contestam que se defina que o Estado possa “garantir a adoção de medidas no sistema educativo, em todos os níveis de ensino e ciclos de estudo, que promovam o exercício do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e do direito à proteção das características sexuais das pessoas”.
Como me parece claro, os senhores deputados não conhecem o mundo real que existe para lá do ecrã que interpõem entre os seus valores, preconceitos e crenças e a realidade e o sofrimento de muita gente.
A este propósito, chamava a atenção dos senhores deputados subscritores da enormidade de defender a diversidade e proteger direitos, para uma matéria em que certamente nunca ouviram falar, o bullying homofóbico em contexto escolar.
Um trabalho recente do CIS-IUL - Centro de Investigação e de Intervenção Social do Instituto Universitário de Lisboa mostrou que as vítimas de bullying  relacionado com a orientação sexual, real ou percebida, têm menos hipóteses de ter ajuda por parte dos colegas que outras vítimas de bullying. Estando presente a questão óbvia do preconceito os colegas receiam efeitos de contágio, ou seja, serem também considerados homossexuais. A questão da ajuda é importante pois a generalidade dos estudos aponta para que em mais de 80% das situações de bullying existam assistentes que podem ter um papel importante na contenção das agressões. Aliás, é hoje aceite que uma parte significativa da intervenção e prevenção do bullying deve envolver os assistentes.
Um trabalho divulgado em 2018 pela Associação ILGA Portugal — Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo divulgou o “Estudo Nacional Sobre o Ambiente Escolar — Jovens LGBTI+ 2016/2017” realizado pelo ISCTE e pela U. do Porto envolvendo perto de 700 jovens com idades compreendidas entre os 14 e os 20 anos também evidenciou dados pertinentes.
Mais de 62% dos inquiridos reporta comentários negativos feitos de pessoal docente e não docente de natureza ocasional e 28.5% refere regularidade nesses comentários.
Os comentários negativos são sobretudo produzidos por colegas, 75.1%.
Sendo a maioria das agressões de natureza verbal também se relatam agressões físicas, 7.7%.
De registar ainda que 73,6% refere ter sentido alguma forma de exclusão intencional por parte dos colegas e quase 65% foi alvo de rumores ou mentiras sobre si na escola.
É ainda relevante que apenas um em cada dez inquiridos denunciou regularmente a situação de vitimização e constata-se que em escolas onde se desenvolve trabalho sobre estas questões a situação é mais positiva.
Todos estes dados estão em linha com a realidade, são frequentes os discursos ou comportamentos discriminatórios face à orientação sexual ou identidade de género em contexto escolar.
Em 2017 a Agência para os Direitos Fundamentais da União Europeia referia que 94% dos jovens LGBT ouvem ou testemunham comentários e comportamentos negativos em contexto escolar em Portugal". Já se referia também que a apresentação de queixa por parte das vítimas é rara.
Com demasiada frequência os problemas das minorias são eles próprios percebidos como problemas minoritários, menores ou mesmo como não problemas.
Em 2014 foi divulgado um estudo referindo as dificuldades das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em lidar com crianças e jovens com orientações sexuais diferentes, um problema que raramente é abordado mas que é fonte de sofrimento para muitas crianças, adolescentes famílias.
Um Relatório da Rede Ex-Aequo referia que no ano de 2012 se registaram 37 denúncias de homofobia e transfobia, sendo que 42 % da juventude lésbica, gay ou homossexual afirmou ter sido vítima de bullying homofóbico, 67% dos jovens declarou tê-lo presenciado e 85% afirmou já ter ouvido comentários homofóbicos na escola que frequenta. Em muitas situações desta natureza emergem quadros “baixa auto-estima, isolamento, depressões e ideação e tentativas de suicídio”, contribuindo ainda para o insucesso e para o abandono escolar de muitos jovens. O mesmo relatório referia ainda episódios recorrentes de bullying homofóbico em contextos de praxes académicas, situação que já aqui também comentei.
Recordo que em Novembro de 2011, dados da UNESCO referiam que cerca de 70 % de alunos homossexuais afirma ser vítima de bullying.
De facto, parece evidente o risco de sofrimento por parte destes adolescentes e jovens.
Sabemos também que tanto como intervir na remediação e apoio é fundamental entender que o público mais jovem terá de ser sempre ser um alvo privilegiado, é de "pequenino que se torce o pepino".
Esperamos que face à dimensão dos incidentes de bullying dirigidos a um alvo em particular bem como outros comportamentos da mesma natureza, sejam uma preocupação não ideológica mas de direitos e de natureza civilizacional no contexto das políticas e processos educativos.
Senhores deputados, face a este cenário ainda vos é difícil perceber a importância da “adoção de medidas no sistema educativo, em todos os níveis de ensino e ciclos de estudo, que promovam o exercício do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e do direito à proteção das características sexuais das pessoas”?
O problema não está na “ideologia de género”, seja lá isso o que for, está na cegueira ideológica que não deixa entender a realidade e as pessoas, sobretudo as pessoas que sofrem.

segunda-feira, 22 de julho de 2019

COM UMAS PALMADAS A COISA RESOLVE-SE. SERÁ?

Ainda não há muito tempo deixei aqui umas notas a propósito da presença da violência no quotidiano familiar de muitas crianças, o número significativo de crianças que assistem a episódios de violência doméstica. Hoje retomo a questão a propósito do texto de Eva Delgado-Martins no Público, “Educar sem violência” que merece reflexão e divulgação.
Na verdade, a questão do recurso aos castigos físicos ou às agressões verbais e humilhação como forma de educar é recorrente e está sempre presente na agenda de qualquer encontro ou conversa entre e com pais sendo, aliás, frequentes os discursos de legitimação destas “estratégias educativas”. Umas notas.
Se estivermos atentos reparamos que quando na imprensa generalista se abordam questões relativas a comportamentos menos positivos de crianças ou adolescentes são inúmeros os comentários e discursos sobre a alegada falência das famílias na definição de regras e limites nos comportamentos de crianças e adolescentes. Muitos destes discursos e comentários são normalmente acompanhados de referências ao facto de não se recorrer a umas “palmadas”, à “pedagogia do chinelo” ou outras variações no mesmo tom, com uns “tabefes” a coisa resolvia-se.
As alusões às dificuldades das famílias ou da escola na regulação dos comportamentos de crianças e adolescentes podem ser justificáveis, mas a ideia de lidar com estas dificuldades através do bater parece-me na verdade preocupante para além da sua potencial ineficácia. Ninguém pode garantir que foram ou que são as “tareias” que constroem pessoas de bem.
Começo por recordar que em 2018 divulgou a Academia Americana de Pediatria produziu novas orientações sobre a parentalidade afirmando veementemente que bater nas crianças, insultá-las, humilhá-las ou envergonhá-las são comportamentos a banir. Os efeitos positivos são nulos e os negativos estão bem demonstrados.
Para além das questões de natureza legal que Eva Delgado-Marins também recorda, recupero a referência a um trabalho desenvolvido pela Universidade de Pittsburgh nos EUA divulgado na Child Development em 2017 que considerando diferentes variáveis seguiu 1482 alunos durante nove anos e evidenciou uma relação sólida entre o que foi considerado “parentalidade severa” (recorrer com regularidade ao gritar, bater ou outro tipo de comportamento coercivo, além de ameaças físicas e verbais como forma de punição) e baixo rendimento escolar e problemas de comportamento nas crianças envolvidas nesse “modelo” de educação familiar.
Sabemos e não esquecemos que os “castigos corporais” podem ir da mais ligeira palmada à mais pesada tareia e também sabemos que bater é um tipo de comportamento inscrito na prática de muitas famílias na sua relação educativa com os filhos.
Na verdade, os castigos corporais ainda são uma "ferramenta" educativa em muitas famílias e, é conhecido, também em instituições que acolhem crianças sendo que mesmo que no âmbito da justiça a questão é complexa como algumas decisões judiciais ilustram.
A ver se nos entendemos, bater em crianças não é uma actividade educativa, o comportamento gera comportamento, aliás, também se sabe que crianças que foram batidas são frequentemente pais que batem.
No entanto e dito tudo isto, também entendo que comportamentos inadequados ou incompetentes não significam necessariamente que estejamos perante pessoas, pais, más ou incompetentes.
Todos nós, alguma vez, agimos de uma forma menos ajustada ou adequada com os nossos filhos e isso não nos transforma em pessoas más, significa que somos apenas pessoas, que somos imperfeitos.
Assim sendo, creio que devemos ser cautelosos, quer na defesa da "estalada educadora" ou “palmada pedagógica”, quer na diabolização definitiva de pais que numa situação eventualmente esporádica e de tensão assumem um comportamento de que podem ser os primeiros a arrepender-se.
Esta nota, não branqueadora ou desculpabilizante de nada, pode não ser particularmente simpática mas estou cansado, tanto de discursos de legitimação do efeito "educativo" da violência dirigida a crianças, como de discursos demagógicos e, por vezes hipócritas, que clamam pelo "crucificação" cega de uma pessoa, o outro que bate, mas são produzidos por gente desatenta ou mesmo autora ou apoiante doutros comportamentos dirigidos a miúdos tão indignos quanto a "estalada" ainda que menos visíveis.
Finalizando, embora saiba que a legislação mesmo quando é imperativa é entendida como indicativa e, portanto, desrespeitada como temos tantos exemplos em várias matérias, é bom não esquecer que estamos a falar de direitos, não de opiniões.

domingo, 21 de julho de 2019

HISTÓRIA DE DOMINGO


Trata-se de um diálogo entre um Rapaz de cinco anos e a sua Mãe, uns aninhos mais velha.
- Mãe, hoje lá na escola, o meu amigo Manel contou uma história que lhe tinha acontecido. Foi com o Pai à praia para lançar a voar um papagaio de papel muito grande que o tio lhe tinha dado. Como estava muito vento foram a voar agarrados ao papagaio. Disse que é bonito ver as casas lá de cima, ficam muito pequeninas. Andaram a voar muito tempo e só desceram quando o vento parou. É mesmo giro, o Manel e o Pai a voarem agarrados a um papagaio.
- Ó Rapaz, és mesmo parvo. Então tu acreditas em histórias dessas?
- Acredito e gosto de acreditar.
- Está bem, tu é que sabes. Olha, agora ficas a brincar sozinho que eu vou ver a novela da televisão. É tão bonita, parece mesmo verdadeira, às vezes até me faz chorar.

sábado, 20 de julho de 2019

A ESCOLHA DO CURSO


Como sempre tenho feito nesta altura, umas notas sobre a candidatura ao ensino superior. Este processo que está em curso envolve uma primeira decisão que me parece de sublinhar, aceder a formação de nível superior, é uma decisão importante e positiva. Contrariamente ao que tantas vezes se ouve, não somos “um país de doutores”, antes pelo contrário, temos ainda um nível baixo de cidadãos com formação superior.
Coloca-se então a decisão, muitos já a terão tomado, sobre a escolha do curso e as eventuais dúvidas que daqui resultam.
No que respeita à escolha do curso, a questão mais colocada pode ser assim enunciada, os jovens deverão seguir a sua motivação e interesses ou a escolha deve obedecer ao conhecimento do mercado de trabalho, isto é, nível de empregabilidade, estatuto salarial e saídas profissionais tão abordadas pela imprensa nesta altura?
Para muitos de nós, provavelmente, a resposta será fácil, seja num sentido ou no outro. Alguns dirão que cada jovem deve, obviamente, seguir o seu desejo, o seu gosto, só assim se realizará. Ideia romântica e sem noção da realidade que corre o sério risco de desembocar no desemprego, dirão outros, para os quais a escolha deve ser racional, pragmática, realista, o jovem deve procurar uma formação que lhe garanta, tanto quanto possível, saída profissional e para isso deve "estudar" o mercado e assim proceder à escolha. Os primeiros acharão que este entendimento pode levar a um risco de frustração e desencanto que podem instalar-se em quem "faz o que não gosta".
Na verdade, não será fácil a escolha para muitos jovens a que acresce, frequentemente, a pressão familiar ou de outras pessoas para a "escolha acertada".
Dito isto, sou dos que entendem que cada um de nós deve poder escrever, tanto quanto as circunstâncias o permitirem, a sua narrativa, cumprir o seu sonho. Por outro lado, a vida também nos ensina que é preciso estar atento aos contextos e às condições que os influenciam, sabendo ainda a volatilidade e rapidez com que hoje em dia a vida acontece e rápida variabilidade dos mercados de trabalho.
Nesta perspectiva, parece-me importante que um jovem, sabendo o que a sua escolha representa, ou pode representar, nas actuais, sublinho actuais, condições do mercado de trabalho, faça a sua escolha assente na motivação ou no projecto de vida que gostava de construir e, então, informar-se sobre as opções, sobre as escolas e respectivos níveis de qualidade a que pode aceder para se qualificar. A plataforma Infocursos pode, entre várias outras fontes, pode ser uma ajuda.
Finalmente, do meu ponto de vista, boa parte da questão da empregabilidade, mesmo em situações de maior constrangimento, relativiza-se à competência, este é o ponto fulcral.
Na verdade, o que frequentemente me inquieta é a ligeireza com que algumas pessoas parecem encarar a sua formação superior, assumindo logo aqui uma atitude pouco "profissional", cumprem-se os serviços mínimos e depois logo se vê. A formação académica é mais do que um título que se cola ao nome, é um imprescindível conjunto de saberes e competências que sustentam um projecto de vida pessoal e profissional com melhores perspectivas de sucesso.
Mesmo em áreas de mais baixa empregabilidade, ou assim entendida, continuo a acreditar que, apesar dos maus exemplos que todos conhecemos, a competência e a qualidade da formação e preparação para o desempenho profissional, são a melhor ferramenta para entrar nesse "longínquo" mercado de trabalho.
Dito de outra maneira, maus profissionais terão sempre mais dificuldades, esteja o mercado mais aberto ou mais fechado.
Boa sorte e boa viagem para todos os que vão iniciar agora esta fase fundamental nas suas vidas.

sexta-feira, 19 de julho de 2019

TEMPO PARA OS FILHOS


A propósito da divulgação de um recente trabalho da Pordata, “Retrato de Portugal", centrado em questões no âmbito da demografia, Vanessa Cunha, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e coordenadora do Observatório das Famílias e das Políticas para as Famílias, afirma em entrevista ao DN, “Somos dos países onde se passa menos horas com os filhos diariamente”.
De facto, o tempo que de uma forma geral as famílias têm disponível para os filhos parece não ser o desejável quer na perpectiva dos próprios pais, quer considerando a necessidade de contextos de parentalidade mais positivos. Muitas vezes aqui tenho abordado esta questão, tal como é recorrentemente objecto de reflexão em múltiplas conversas que estabeleço com grupos de pais.
Quando converso sobre esta questão, invariavelmente solicito aos pais presentes que quem entenda que “dá” os filhos o tempo que gostaria de dar levante o braço e raramente alguém o faz. Esta sensação de “falta” terão várias implicações na relação entre pais e filhos. A menor disponibilidade e segurança no estabelecimento de regras e limites par as crianças poderá ser uma destas implicações para alguns pais.
Alguns trabalhos têm sugerido que os pais atribuem fundamentalmente as dificuldades de tempo às condicionantes de natureza profissional e aos horários escolares.
Os problemas de tempo dos pais decorrentes dos constrangimentos profissionais criam dificuldades aos pais na guarda das crianças fora do horário escolar e a solução tem sido a prolongar a estadia dos filhos na escola, já é Escola Tempo Inteiro. Para além desta estadia na escola que pode chegar às 11 horas diária verifica-se também, para quem pode, o recurso às actividades extracurriculares que com uma oferta altamente diversificada são também uma forma de “ocupar” as crianças.
Esta situação não é uma fatalidade, é necessário encontrar outras soluções, aliás já conhecidas, e promover ajustamentos na organização do trabalho, diversificação de horários, "teletrabalho", etc., de modo a criar outras disponibilidades nas famílias.
No entanto, este cenário não determina que o pouco tempo disponível seja usado para colocar as crianças em frente de um qualquer ecrã ou para as “arrastar” pelos centros comerciais. Nesta matéria seria desejável que com os pais considerassem outras hipóteses que não são mais onerosas nem mais trabalhosas, mas que alargariam o leque de actividades.
Finalmente, acharia interessante que se ouvissem os miúdos relativamente ao seu entendimento sobre as brincadeiras que realizam com os pais, as que gostariam de realizar, o que tempo em que o fazem e o tempo em que gostariam de fazer.
Talvez as respostas nos ajudassem a perceber o que pode ser mudado. Podemos e devemos fazer melhor.
Defendo há muito a pertinência de, em sede de Concertação Social, avançar com propostas de alteração legislativa, sobretudo, na organização horária do trabalho que poderia, essa sim, ter impacto na disponibilidade dos pais. Não me parece impossível que em muitas profissões os tempos de trabalho pudessem ter outra distribuição permitindo mais tempo com os filhos e menos tempo destes na escola.
Ainda a propósito da dificuldade de conciliar trabalho e vida pessoal deixo uma estória que já aqui deixei.
Bom dia, venho apresentar uma queixa.
Com certeza, contra quem?
Contra muita gente.
Será, portanto, contra incertos. E apresenta queixa porquê?
Por roubo, roubaram-me tempo.
Muito bem, então roubaram-lhe tempo. Por favor, pode explicar um pouco melhor para eu poder registar a situação.
Eu já não tinha muito tempo porque nunca fui uma pessoa muito rica de tempo, mas o pouco que tinha roubaram-me. Fiquei sem tempo para estar com os meus filhos e brincar com eles. Este tempo faz-me muita falta, os miúdos andam tristes porque desde que me roubaram o tempo não consigo mesmo. Já não tenho tempo para descansar ou ler qualquer coisa como gostava de fazer. Não tenho tempo descansado para a minha mulher que também precisava do tempo que eu tinha e que partilhava com ela. No meu trabalho não tenho tempo para parar um minuto sem que alguém venho logo chamar a atenção. Fiquei sem o tempo que tinha para beber um copo com os meus amigos e trocar umas lérias que serviam para aliviar das coisas da vida.
Eu percebo o seu problema, mas como deve calcular não tenho tempo para queixas como as que apresenta.
Não tem tempo? Não me diga que também lhe roubaram o tempo. Até às autoridades, é demais.

quinta-feira, 18 de julho de 2019

OS FARDOS QUE OS MIÚDOS CARREGAM

Leio no Público que o ME colocou na plataforma de atribuição dos manuais um conjunto de recomendações sobre o excesso de peso que muitos crianças e adolescentes carregam nas mochilas. A campanha iniciada tem como designação “Mochila Leve”.
As orientações recuperam os conteúdos da recomendação aprovada em 2017 por unanimidade no Parlamento na sequência de uma petição subscrita por mais de 50000 cidadãos. “Só” passaram 2 anos pelo que folgo com a preocupação agora assumida pelo ME com o fardo que os miúdos põem diariamente às costas.
São contempladas medidas como o estabelecimento de dispositivo de homologação das mochilas e das condições ergonómicas mais adequadas, a definição de salas fixas para cada turma, para evitar que as crianças tenham de carregar as mochilas durante os intervalos, a instalação de cacifos, a possibilidade dos materiais escritos, manuais, por exemplo, livros serem produzidos com um papel com uma gramagem mais leve ou a utilização gradual dos recursos digitais incluíam-se na recomendação aprovada em 2017.
Eu sei que nem toda gente concorda que a vida de muitos miúdos se traduz num fardo bem pesado mas a verdade é que diferentes estudos sugerem que cerca de sete em cada dez crianças transportam às costas um peso superior ao aconselhado pela OMS, 10% do seu peso corporal.
Como já escrevi a propósito de outras matérias, existem muitas matérias que não deveriam ser objecto de legislação, o bom senso deveria bastar mas assim não é, aguardemos que as campanhas e recomendações contribuam para minimizar a situação que para algumas crianças é mesmo pesada.
Como é óbvio, pelas suas implicações e riscos, imediatos e a prazo, para a saúde dos miúdos, esta questão deve merecer a atenção de pais e educadores no sentido de a minimizar, embora, por outro lado, o seu transporte configure um exercício físico que disfarça a ausência de espaços e equipamentos adequados em muitas das nossas escolas e combata uma infância sedentarizada, a troco, é certo, de uma coluna castigada. Nada é perfeito, dir-se-á com algum cinismo.
No entanto, aproveitando o espaço e o tempo de reflexão agora criados talvez também fosse útil olhar de uma forma mais alargada para o peso excessivo que muitas crianças carregam nas suas costas.
As mochilas escolares serão apenas um dos carregos, por assim dizer, mas existem outros que temo ficarem fora deste conjunto de recomendações e nos quais insisto.
Estou a pensar no peso da pressão para que sejam excelentes.
Estou a pensar no peso da pressão para que sejam o que não são e da pressão para que não sejam o que são.
Estou a pensar no peso da pressão de viver demasiado só.
Estou a pensar no peso da pressão que leva a que, por vezes, só gritando e agitando-se se façam ouvir.
Estou a pensar no peso da pressão de não conhecer o caminho e sentir-se perdido.
Estou a pensar no peso da pressão de actividades sem fim e, às vezes, sem sentido.
Estou a pensar no peso da pressão do depressa e bem.
Estou a pensar no peso da pressão para sejam diferentes e na pressão para que sejam iguais.
Estou a pensar na pressão da exclusão e do insucesso.
Estou a pensar na pressão dos que são vitimizados por outros que também sendo vítimas se escondem na agressão.
Estou a pensar no peso da pressão causada por famílias demasiado distantes ou por famílias demasiado próximas ou ainda por famílias ausentes.
Na verdade, há miúdos que carregam o mundo às costas. Entende-se as preocupações dos professores, pediatras, psicólogos, ortopedistas, outros especialistas e de muitos de nós com a coluna dos miúdos.
Não, não é uma visão romântica ou eduquesa, trata-se do bem-estar de crianças e adolescentes.

quarta-feira, 17 de julho de 2019

EXAUSTÃO E ENVELHECIMENTO, A TEMPESTADE PERFEITA


No âmbito da trágica morte de alguns docentes, ao que parece em contexto de desempenho profissional, reentra na agenda o mal-estar que aflige a classe profissional e desejo muito que a questão seja tratada da forma séria e com a dignidade que exige mas temo que assim não seja.
Como é reconhecido em qualquer país, a profissão docente é altamente permeável a situações de burnout, estado de esgotamento físico e mental provocado pela vida profissional, associado a baixos níveis de satisfação profissional. Um estudo recente da OCDE  Reviews of School Resources: Portugal 2018” já referia estes riscos.
Os dados de um estudo realizado pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova em parceria com a Fenprof sobre as condições pessoais dos professores considerando dimensões relativas ao “desgaste emocional, “burnout” incluído”, e sobre as condições em que estes trabalham - se há cansaço, desânimo, desmotivação ou, pelo contrário, alegria” em que responderam perto de 16000 docentes também mostraram dados inquietantes e em linha com outros trabalhos. Quase metade dos docentes que responderam revela sinais preocupantes de “exaustão emocional”, (20,6% mostram sinais “preocupantes”, 15,6% apresentam “sinais críticos” e 11,6% têm já “sinais extremos” de esgotamento) e mais de 40% não se sentem profissionalmente realizado.
Acresce que, de acordo com a Fenprof existirão perto 12000 docentes em situação de baixa médica sendo que em Março de 2018, dados da ADSE, estavam mais de seis mil professores com baixa médica há mais de sessenta dias a aguardar pela realização de junta médica. O ME não divulga o total de docentes em situação de baixa médica, mas os directores escolares e a as estruturas sindicais afirmam que tem aumentado.
Foram identificados alguns factores explicativos dos resultados, a idade dos docentes, as questões relativas à carreira, organização (burocracia na escola e gestão hierarquizada das escolas) e o comportamento indisciplinado dos alunos.
Se consideramos uma das razões apontadas, a idade dos docentes, os indicadores do relatório “Perfil do Docente”, produzido pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência relativo ao ano 2016/2017 e base da informação da OCDE.
No universo da educação pré-escolar apenas 13 profissionais da rede pública têm menos de 30 anos, 0.1%, enquanto 6034 educadores de infância, 74% têm 50 ou mais anos. No 1º ciclo no sistema público, entre 24 435 docentes apenas 16 têm menos de 30 anos, 0.1% do total. Do outro lado, 38%, 9298 têm 50 ou mais anos. No 2º ciclo, temos 19 398 docentes dos quais 872 têm menos de 30 anos, 4.5% e 10271 com 50 anos ou mais, 53%.
No 3º ciclo e secundário, em 63473 professores temos 290 com menos de 30 anos, 0.5%, e 30242 com 50 anos ou mais, 48%.
Um outro indicador, a idade média, mostra que na educação pré-escolar é de 52 anos, no 1º ciclo 47 anos, no 2º ciclo 50 anos e no 3º ciclo e secundário 49 anos.
Se considerarmos o grupo de professores com 40 anos ou mais, temos 96% na educação pré-escolar, 78% no 1º ciclo, 87% no 2º ciclo e 86% no 3º ciclo e secundário.
Estes dados, mal-estar, cansaço, exaustão e envelhecimento configuram a tempestade perfeita e só podem surpreender quem não conhece o universo das escolas, como acontece com boa parte dos opinadores que pululam pela comunicação social perorando sobre educação e sobre os professores. 
Alguns lembrar-se-ão que em Março de 2018 se realizou em Lisboa um encontro internacional organizado pelo ME, OCDE e pela organização Internacional da Educação. O tema central da cimeira foi o bem-estar dos professores pois “Não se deve perder a oportunidade de colocar o bem-estar dos professores no centro das políticas de todos os países que participam nesta cimeira”, afirmou a propósito o secretário-geral da IE, David Edwards e o bem-estar dos professores terá de ser percebido pelos Governos como “um tema político de primordial importância”. Sabe-se que se os docentes “se sentem bem com eles próprios podem fazer uma diferença positiva no ensino dos seus alunos” lê-se na nota de imprensa.
Na verdade, ser professor é uma das funções mais bonitas do mundo, ver e ajudar os miúdos a ser gente, mas é seguramente uma das mais difíceis e que mais respeito e apoio deveria merecer. Do seu trabalho depende o nosso futuro, tudo passa pela educação e pela escola.
E a verdade é que conforme os estudos internacionais de natureza comparativa mostram o trabalho de professores e alunos, tem revelado progressos importantes nos últimos anos desencadeando, aliás, uma curiosa luta pela paternidade desses sucessos que, obviamente, pertence a professores e alunos.
Repetindo-me, os sistemas educativos com melhores resultados são, justamente, os sistemas em que os professores são mais valorizados, apoiados e reconhecidos.

terça-feira, 16 de julho de 2019

DO "MEETNAPING" AO "PRESENTISMO"


Numa passagem de olhos pela imprensa tropecei com uma peça sobre uma questão que todos nós conhecemos e de que nos queixamos, as inúmeras reuniões intermináveis e inúteis para que somos regularmente convocados. Confesso que desconhecia a designação dada a este “fenómeno”, “meetnaping”, claro que teria de ser em inglês.
Como, aliás também seria previsível, uma aplicação, há sempre mais uma aplicação, criada pela “Harvard Business Review” permite quantificar o custo de cada reunião para as organizações, são milhares de euros por ano dependendo da escala.
No entanto e sem que seja um conhecedor da área da gestão, se acrescentarmos ao “meetnaping” a cultura de “presentismo” que muitas organizações também desenvolvem a coisa fica ainda mais cara e … chata, por assim dizer. Dito de outra maneira, o trabalhador está presente no local de trabalho em situações de horário prolongado, mesmo que não esteja a fazer nada de relevante, não seja necessário ou não esteja em condições. O importante é estar presente, estar à vista. Creio que boa parte de nós já passou por situações desta natureza.
Estas situação também têm paralelo no mundo da educação como bem sabemos.

A REUTILIZAÇÃO DOS MANUAIS DO 1º CICLO


Muitas vezes aqui tenho abordado a questão dos manuais escolares. Nestas reflexões creio que posso identificar três pontos essenciais que sintetizo sem hierarquia de importância.
Em primeiro lugar sublinho a ideia da gratuitidade dos manuais durante a escolaridade obrigatória que é constitucionalmente gratuita.
Em segundo lugar defendo o princípio genérico da reutilização por razões de sustentabilidade e custos.
Em terceiro lugar tenho considerado que o nosso modelo de trabalho, apesar das excepções e das mudanças, ainda se pode considera excessivamente “manualizado” ou seja, assenta talvez demais a práticas pedagógicas pouco diferenciadas muito decorrentes de conteúdos curriculares demasiado extensos, prescritivos e normalizadores. Seria desejável atenuar a fórmula predominante, o professor ensina com base no manual o que o aluno aprende através do manual que o pai acha muito importante porque tem tudo o que professor ensina. Não esqueço no entanto, que variáveis como a natureza e conteúdos curriculares, o número de alunos por turma ou ainda a cultura pedagógica de décadas influenciam este cenário.
Estou convicto de que sem aligeirar o peso do manual no trabalho em sala de aula os níveis de diferenciação necessários como forma mais robusta à diversidade dos alunos ficam comprometidos.
No entanto e apesar de continuar a assumir estes princípios julgo que a particularidade do 1º ciclo merece uma reflexão designadamente no caso da reutilização.
Nos últimos tempos tivemos referências na imprensa a expedientes usados pelos pais para “apagar” o rasto que os seus filhos deixaram nos manuais, a decisão da direcção do agrupamento de S. Julião da Barra de não pedir a devolução dos manuais aos alunos do 1º ciclo e o ME a “obrigar” à sua recolha, o Tribunal de Contas a entender que a não reutilização compromete as contas, sempre as contas da educação que insistem em não dar certo, etc.
A entrada na escola, no 1º ciclo, será dos poucos processos que quando correm mal já não é possível voltar atrás e recomeçar com a esperança de que a coisa vá correr melhor.
Torna-se, pois, essencial que este processo de entrada na escola seja pensado e orientado, que crie as rotinas, a adaptação e a confiança em miúdos e em pais, indispensáveis à aprendizagem bem-sucedida.
É fundamental não esquecer que os miúdos à entrada na escola não estão todos nas mesmas condições pelas mais variadas razões, ambiente e experiências familiares, percurso anterior, características individuais, etc. o que exige desde o início uma atenção diferenciada que combata a cultura de que devem ser todos tratados da mesma maneira que alguma opinião publicada e ignorante defende.
Antes de, com voluntarismo e empenho, se tentar ensinar aos miúdos as coisas da escola é preciso, como sempre afirmo, dar tempo, oportunidade e espaço para que aprendam a escola. Depois de aprenderem a escola estarão mais disponíveis para então aprender as coisas da escola.
É neste contexto que julgo que os manuais deveriam ficar com os alunos, não seriam devolvidos, podendo continuando a sua produção a permitir que sejam usados como suporte do seu trabalho sem que este entendimento, comprometa o que disse acima sobre o excesso de peso pedagógico atribuído ao manual. Acresce ainda que apesar de alguma “disciplinarização” dos conteúdos curriculares, incluindo o recurso a manuais para cada conteúdo, e a lógica de ciclo contida na LBSE, a continuidade da relação dos alunos em diferentes patamares de aprendizagem e desempenho ao longo do ciclo com o trabalho desenvolvido também aconselharão a que se mantenham os manuais que vão utilizando.
Esta manutenção terá ainda um valor de natureza menos tangível, diria afectivo, pois seriam um registo, um diário de bordo da sua aprendizagem e um instrumento de relação com o trabalho escolar.
Como é óbvio este entendimento não belisca a necessidade dor recursos a actividades e materiais diversificados num já referido modelo de diferenciação pedagógica.
Definitivamente, aos 6, 7 ou 8 anos a relação com os manuais é de natureza diferente da que estabelece em fases posteriores da escolaridade obrigatória em que a reutilização é bem mais “tranquila”, por assim dizer.

segunda-feira, 15 de julho de 2019

INDECÊNCIA E IRRESPONSABILIDADE


Quando pensamos que já dificilmente seremos surpreendidos, para o melhor e para o pior, a realidade desmente-nos.
No Expresso deste fim-de-semana, no espaço Passatempos, as Palavras Cruzadas, da responsabilidade de Marcos Cruz, incluíam a questão “Ensinam quando não estão em greve” cuja resposta em 11 letras é … professores.
Não, não se explica pela “silly season”, explica-se pela indecência e irresponsabilidade que, obviamente, não decorrem de … um momento infeliz. Não pode ser considerado um não-problema, é mesmo mais uma face visível de algo preocupante.
Já aqui tenho referido que os ataques, intencionais ou não, à imagem dos professores, incluindo parte do discurso de gente dentro do universo da educação que tem, evidentemente, responsabilidades acrescidas e também o discurso que muitos opinadores profissionais, mais ou menos ignorantes ou com agendas implícitas, produzem sobre os professores e a escola, contribuíram para alterações significativas da percepção social de autoridade dos professores, fragilizando-a seriamente aos olhos da comunidade educativa, sobretudo, alunos e pais. Os últimos tempos têm sido, aliás, elucidativos.
Esta fragilização tem, do meu ponto de vista, graves e óbvias consequências, na relação dos professores com alunos e pais e restante comunidade.
O Expresso tem, evidentemente, responsabilidade nesta situação. Aliás e em matéria de responsabilidade, recordo o texto de Miguel Poiares Maduro no Público na sequência da polémica criada pelo abjecto artigo de Maria de Fátima Bonifácio.
Definitivamente, a valorização social e profissional dos professores, em diferentes dimensões é uma ferramenta imprescindível a um sistema educativo com mais qualidade sendo esta valorização uma das dimensões identificadas nos sistemas educativos melhor considerados.


domingo, 14 de julho de 2019

CRIANÇAS E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA


Uma proposta do BE no sentido de atribuir o estatuto de vítimas a crianças que presenciem violência doméstica foi chumbada em comissão parlamentar na semana que passou pelos votos de PS, PCP e CDS, tendo o PSD votado com o BE.
O BE vai retomar a proposta para votação em plenário.
Parece-me que qualquer iniciativa que amplie a protecção a crianças em situação vulnerável merce consideração conforme, aliás, parecer do Instituto de Apoio à Criança e da Ordem dos Advogados o que, neste caso, pode significar que o quadro legal existente não é suficientemente protector. Aliás, o voto contra do PS terá decorrido do entendimento de que lei actual já acautela a questão.
De facto, parece importante a necessidade de protecção nestas casos considerando o número de situações e os efeitos destas vivências na vida das crianças e adolescentes.
Como indicador recordo que segundo o Relatório relativo a 2017 produzido pela Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Protecção das Crianças, é de 12,5% a percentagem de casos sinalizados devido a exposição à violência doméstica.
Para além de sublinhar os danos potenciais que esta exposição pode provocar nas crianças gostava de chamar a atenção para um outro potencial efeito nas crianças que assistem a episódios, por vezes violentos, de violência doméstica, os modelos de relação pessoal que são interiorizados. Aliás, nos últimos anos tem-se verificado que a maioria das queixas de violência doméstica é apresentada por mulheres jovens o que permite pensar em crianças pequenas que assistirão a estes episódios.
Numa avaliação por defeito aos casos participados de violência doméstica estima-se que cerca de metade serão testemunhados por crianças. Se considerarmos que existem muitíssimas situações não reportadas, pode concluir-se que estas testemunhas, por vezes também vítimas, serão em número bem mais elevado.
Este quadro lembra o velho adágio "Filho és, pai serás", ou seja, num processo de modelagem social muitas crianças tenderão a replicar ao longo da sua vida, em adultos também, os comportamentos a que assistiram e que, tal como podem produzir efeitos traumáticos, poderão adquirir aos seus olhos, infelizmente, um estatuto de normalidade.
Não é certamente por acaso que estudos recentes em Portugal evidenciaram números elevadíssimos de violência em casais de jovens namorados universitários, uma população já com níveis de qualificação significativos.
Neste contexto e com o objectivo de contrariar uma espécie de fatalidade em círculo vicioso, os miúdos assistem à violência doméstica, replicam a violência, a sociedade é violenta, quando crescem são violentos em casa, e assim sucessivamente, importa que os processos educativos e de qualificação sublinhem a dimensão, a formação cívica e o quadro de valores.
Não é nada de novo, a afirmação desta necessidade.
A questão é que o próprio discurso social e político sobre a escola e sobre os professores não me parece contribuir para que se possa encarar a escola com a confiança necessária a que possa cumprir o seu papel e contribuir para quebrar o círculo vicioso do processo de modelagem social envolvido.
Acresce que a intervenção junto das famílias e a tentativa de contrariar dinâmicas disfuncionais, violência doméstica por exemplo, não dispõe dos meios e recursos suficientes.

sábado, 13 de julho de 2019

DE PEQUENINO É QUE ...


Segundo dados da Inspecção-Geral da Educação e Ciência em 14/15 e em 15/16 dos 114 jardins-de-infância pertencentes a IPSS avaliados, 73% não possuía autorização de funcionamento do ME. Esta autorização funciona como reguladora de um conjunto de normas, sobretudo na área da segurança. A sua inexistência compromete obviamente a sua monitorização.
É ainda relevante que 78% das instituições inspeccionadas não tinha a direcção pedagógica reconhecida pela tutela e quase metade estavam a cobrar de forma indevida veras aos pais.
A questão da qualidade da resposta educativa em educação de infância é uma matéria crítica tal como os custos e a sua acessibilidade à generalidade das famílias que a ela tenham de recorrer, seja a creche, a ama ou o jardim-de-infância.
Ainda sobre a questão da qualidade recordo que a Associação de Creches e Pequenos Estabelecimentos de Ensino Particular recebeu cinquenta denúncias de creches ilegais ao longo de 2018.
No primeiro semestre desse ano a Segurança Social determinou o encerramento de oito estabelecimentos. Em 2017 encerraram 12 e em 2016 foram encerradas sete creches ilegais. É por demais conhecida a existência destes depósitos de crianças. Sabe-se também de situações em que após o encerramento os mesmos responsáveis reabrem rapidamente outros espaços para o exercício da sua actividade.
Portugal tem um dos mais elevados custos de equipamentos e serviços para crianças o que é, naturalmente, um forte constrangimento para projectos de vida que envolvam filhos. Sobretudo nas grandes áreas metropolitanas, existe uma falta significativa de respostas e recursos a preços acessíveis para o acolhimento a crianças dos 0 aos 3 anos e também ainda em idade de pré-escolar apesar do aumento da oferta e do programa de promoção da garantia de acesso universal em curso de forma gradual. A alteração dos estilos de vida, a mobilidade e a litoralização do país, levam à dispersão da família alargada de modo a que os jovens casais dependem quase exclusivamente de respostas institucionais que, ou não existem, ou são demasiado caras.
Sabemos todos como o desenvolvimento e crescimento equilibrado e positivo em todas as suas dimensões é fortemente influenciado pela qualidade das experiências educativas nos primeiros anos de vida, de pequenino é que ...
Assim, a eficiência da fiscalização e regulação das condições de funcionamento das instituições e o combate eficaz à oferta clandestina, o aumento significativo da resposta de qualidade ao nível da creche e do a custo acessível é, seguramente, uma aposta no futuro e, por isso, é imprescindível para que se minimizem os riscos de termos depósitos de crianças em vez de contextos educativos..

sexta-feira, 12 de julho de 2019

DOS RESULTADOS DOS EXAMES DO SECUNDÁRIO


Foram divulgados os resultados da primeira fase dos exames nacionais do secundário. À excepção de Física e Química, Biologia e Geologia, a média subiu em todas as disciplinas. Também a média foi positiva em todas as disciplinas embora tenhamos um 9.8 a Filosofia.
Antes de se desencadearem os testes de paternidade relativamente à responsabilidade pelos resultados importa considerar que neste âmbito a única ilação possível é que o trabalho de alunos e professores foi melhor sucedido. No entanto, também não esqueço que é reconhecida a forma como os exames tendem a ser também politicamente usados como forma de validação das políticas públicas, melhores resultados validarão as decisões políticas e a dificuldade dos exames é, obviamente, fruto de uma decisão. Veja-se a recorrente opinião diversa de grupos profissionais de “famílias políticas” diferentes na apreciação da dificuldade dos mesmos exames.
De qualquer forma registe-se a melhoria de resultados. Algumas notas breves sobre os exames em torno de três questões, existência, modelo e função.
Creio que no contexto actual a existência de exames nacionais no ensino secundário parece-me justificada como forma de regulação advinda de uma avaliação externa associada à avaliação interna que como se sabe é contaminada pela reconhecida “simpatia de algumas escolas, sobretudo privadas.
No que respeita ao seu modelo creio que seria de reflectir no sentido de caminhar para modelos de exame mais integrados em matéria curricular e menos centrados em mobilização instrumental de conhecimentos e mais diversificados nos dispositivos e suportes. Talvez conseguíssemos minimizar a existência de um ensino fundamentalmente centrado na preparação para o exame.
A terceira questão, a função, parece também carecer de reflexão e mudança como muitas vezes tenho referido.
Contrariamente ao que se passa em muitos países, os resultados dos exames têm um peso muito significativo no acesso ao ensino superior o que contamina e enviesa aquela que me parecer a sua função central. Os exames nacionais destinam-se, conjugados com a avaliação realizada nas escolas, a avaliar e certificar o trabalho escolar produzido pelos alunos do ensino secundário. Não deveria ser mais do que isto.
Dado o que muitas vezes vejo escrito, defender que esta questão seja repensada não implica defender que o desempenho no ensino secundário não deve ser valorizado no processo de candidatura ao ensino superior, claro que tem de ser considerado e os exames fazem sentido.
No entanto, e é “apenas” disso que se trata, também me parece que nesse processo devem entrar outros critérios, públicos e claros, e, naturalmente, sujeitos a monitorização rigorosa. Parece-me mais justo.
Esta mudança, em linha com o que se passa noutros sistemas educativos, minimizaria muitos dos problemas conhecidos decorrentes do facto da média de conclusão do ensino secundário ser o único critério utilizado para ordenar os alunos no acesso e eliminaria o “peso” das notas inflacionadas em diversas circunstâncias por escolas “simpáticas, fenómeno repetidamente referenciado. Não é também dispiciendo referir o mercado das explicações deste processo decorre e alimenta desigualdade de oportunidades.
Minimizaria também a forma como é percebida pelos alunos a importância de todas as disciplinas do secundário que, recordemos, representa o cumprimento da escolaridade obrigatória, o acesso a um conjunto alargado de conhecimentos e competências. O ensino secundário não deve ser o ensino pré-superior.
Será que se chegará a algum consenso sobre algumas destas questões sem pressa e devidamente estudadas?

quinta-feira, 11 de julho de 2019

DA DIFERENCIAÇÃO PEDAGÓGICA, "UM MERGULHO NO MAR"


Como tem acontecido regularmente estive hoje com um significativo número de docentes, desta vez no Agrupamento de Escolas Passos Manuel, a conversar sobre diferenciação e sala de aula. Foi curioso, desde logo, voltar à escola onde realizei o meu exame de 1º ciclo do liceu como na altura se designava, lá para meados dos anos 60.
A temática da diferenciação pedagógica não é nova, longe disso, mas ganhou visibilidade por ter sido definida no DL 54 como uma das medidas universais de apoio à aprendizagem a par, por exemplo, das acomodações curriculares o que, do meu ponto de vista, enviesa o entendimento as acomodações curriculares integram o trabalho pedagógico diferenciado e não estão a par num elenco de medidas, ainda que universais.
Também me parece que esta questão da forma como tantas vezes é abordada corre o risco de perder significado e entra como é mais habitual entre nós em modo “cada cabeça, sua sentença” ou, de outra forma, “cá para mim, diferenciação é…”
Não tenho a pretensão do discurso definitivo, do manual, não creio que exista, encaro estes encontros como espaço de reflexão que, lamentavelmente e do meu ponto de vista são insuficientes nas escolas em parte devido à carga burocrática e também a questões e modelos de organização e funcionamento. Assim e recuperando outros textos, umas notas.
Como todos reconhecemos, a característica mais evidente de qualquer sala de aula ou escola é a diversidade. Esta é a questão central, com grupos diversos e escolas diversas a resposta deve, tem que ser, diferenciada sob pena de não acomodar as diferenças entre os alunos comprometendo a qualidade, o sucesso e a inclusão.
Todo o sistema educativo e as políticas educativas devem servir de suporte a esta visão e às suas múltiplas implicações.
Indo um pouco mais longe nas práticas pedagógicas e como nestas se traduz um princípio de diferenciação umas notas breves sublinhando que alterar alguns aspectos não tem a ver com “inovação” ou com “novos paradigmas”, terminologia cuja utilização frequente me irrita um bocado. A questão central pode ser alterar e não inovar, são de há muito conhecidas boas práticas que diariamente são mobilizadas em muitas escolas quase sempre com pouca divulgação, até mesmo interna.
Uma primeira nota sobre o equívoco habitual de que diferenciação é sinónimo de trabalho individual. Considerando as dificuldades (e o desajustamento) de fazer assentar o trabalho educativo no trabalho individual, encontra-se assim um suposto “impedimento” à diferenciação. De facto, diferenciar não é igual a trabalho individualizado, pelo contrário, implica muito fortemente a aprendizagem cooperada e a cooperação entre professores. Aliás, verificando-se desejavelmente a aprendizagem individual por parte de cada aluno a sua construção é social pelo que mesmo que fosse possível o recorrer exclusivamente ao trabalho individual, (o que nem com turmas mais pequenas aconteceria) não seria a melhor forma de trabalhar.
Assim, só o desenvolvimento de formas diferenciadas de organizar os processos educativos, de gerir a sala de aula, de avaliar, de gerir a estrutura curricular ela própria com uma concepção e conteúdos que sejam amigáveis desta diferenciação, de comunicar, de cooperar com pais e encarregados de educação, etc., poderá permitir responder tão bem quanto possível à diversidade dos alunos e contextos.
Nesta perspectiva, a organização e funcionamento de uma sala de aula da forma mais ajustada a recursos e necessidades contemplar alguma foram de diferenciação em dimensões como: Planeamento educativo/gestão curricular (aqui entra a “flexibilidade curricular” mas com conteúdos e organização dos currículos adequados, a flexibilidade curricular é mais do que as escolas, felizmente poderem desenhar conteúdos curriculares, é que a flexibilidade se desenhe dentro da sala de aula); Organização do trabalho dos alunos – as múltiplas formas de organizar o trabalho dos alunos relativamente às situações de aprendizagem; Clima de aprendizagem – a qualidade e nível de interacção e relacionamento social entre alunos e entre professor e alunos; Avaliação – os processos relativos à avaliação e regulação do processo de ensino e aprendizagem; Actividades / Tarefas de aprendizagem – a escolha das diferentes tarefas ou situações de aprendizagem a propor aos alunos e Materiais e Recursos – a definição, utilização e gestão dos materiais e recursos que funcionarão como suporte ao processo de ensino/aprendizagem.
Mas para que isto seja consistente e não localizado também sabemos que o sucesso se constrói identificando e prevenindo dificuldades de forma precoce, com a definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio eficazes, competentes e suficientes a alunos e professores, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados e reais de autonomia, organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, com a valorização do trabalho dos professores, com práticas de diferenciação e expectativas positivas face ao trabalho e face aos alunos, com melhores níveis de trabalho cooperativo e tutorial, quer para professores quer para alunos, etc.
Sabemos tudo isto. Nada é novo.
A conversa foi estimulante e até pelo dia quente que se vive em Lisboa foi bonito o “Mergulho no Mar”, uma iniciativa que envolveu alunos do pré-escolar, 1º e 2º ciclo do Agrupamento Passos de que vos deixo uma pequeníssima amostra. A diferenciação também passa por aqui.



quarta-feira, 10 de julho de 2019

DA ATRIBUIÇÃO CAUSAL EXTERNA


Uma das áreas de investigação robusta e já longa em psicologia tem sido o que se designa por atribuição causal. De forma simples, como forma de protecção da nossa percepção de nós próprios tendemos, designadamente em contextos de realização, a atribuir o sucesso, o bom desempenho, ao nosso esforço e competência e, naturalmente, tendemos a atribuir as causas do que corre menos bem a causas ou factores que nos são externos pelo que não nos sentimos responsáveis. Este funcionamento tem sido também muito estudado no universo da educação.
Serve esta introdução para referir que já cansam os discursos mais ou menos explícitos que atribuem fundamentalmente a factores externos às decisões em matéria de política educativa o que reconhecidamente não está a correr bem nas escolas em vários aspectos.
E há muitas coisas que não estão correr bem. A carga de burocracia que aflige as escolas é só um exemplo. A burocracia que é sentida em diferentes niveis e áreas de funcionamento das escolas, com especial ênfase no funcionamento pedagógico, não é, evidentemente, da exclusiva responsabilidade de professores e escolas como o não são outras dificuldades.
Este padrão de atribuição causal externa não facilita, antes pelo contrário, a promoção de ajustamentos necessários. Alguma humildade também ajuda.

terça-feira, 9 de julho de 2019

OS MIÚDOS ATRAPALHAM


Enquanto os joelhos e a idade me permitiram fui um furioso praticante de futebol, amador é claro, que os dotes não davam para mais, embora a motivação fosse muita.
Nesses tempos quando nos queríamos referir a alguém que jogava à bola mas era "pé de chumbo", usávamos uma expressão que de vez em quando recordo. Era qualquer coisa como "o tipo até nem é mau jogador, a bola é que o atrapalha um bocado".
Quase sempre recordo esta expressão quando oiço alguns pais, raros, e alguns professores, ainda mais raros, a falar dos miúdos, filhos ou alunos. De facto, às vezes, fico a pensar para com os meus botões, "até nem são mau educadores ou professores, os miúdos é que atrapalham um bocado".
E na verdade os miúdos atrapalham um bocado esta tarefa de lidar com eles.
Continuam a ser fornecidos sem manual de instruções e muitas vezes sem serem desejados, pelos pais, ou objecto de investimento, por professores. Os miúdos nestas circunstâncias transformam, quer em casa quer na escola, a educação numa coisa a que chamo aturação, deixam de ser educados para passarem à condição de aturados ou suportados.
Os miúdos têm a mania de ser diferentes uns dos outros o que, obviamente, só atrapalha. Uns aprendem mais depressa, outros mais devagar, uns são mais inteligentes, outros são menos dotados, uns são mais simpáticos, outros são menos simpáticos, uns têm uma cor, outros têm outra, até há alguns a quem chamam mesmo os diferentes, esses é que atrapalham mesmo. E mais diferenças podíamos enunciar porque não existe alguém igual a outro alguém.
Além disso e para complicar a atrapalhação, os miúdos precisam que lhes dêem tempo, lhes dêem atenção e disponibilidade, bens que, como sabem, não são fáceis de providenciar.
Bom, bom seria, se eles aprendessem todos a mesma maneira e sem grandes ajuda, que eles crescessem por si e sem incomodarem muito, ficava tudo bastante mais fácil. Lamentavelmente, a coisa não funciona assim e para algumas pessoas, muito poucas, mesmo muito poucas, os miúdos atrapalham mesmo.
E os miúdos sabem quando atrapalham, uns gritam e agitam-se para dentro, outros gritam e agitam-se para fora.