AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 2 de maio de 2013

OS EXAMES DO 4º ANO. A deslocalização dos miúdos e a desconfiança face aos professores

Nesta altura do ano é quase impossível não ir falando sobre a próxima época de exames, a poção mágica na qual radica a melhoria da qualidade do trabalho educativo de alunos e professores no entendimento de Nuno Crato.
O MEC estabeleceu que os alunos do 4º ano, que vão realizar pela primeira vez exames obrigatórios e nacionais, sejam concentrados tanto quanto possível nas sedes dos agrupamentos. Esclarece posteriormente que também os alunos dos estabelecimentos do ensino privado em que só existam professores do 1º ciclo terão que remeter os seus alunos para outras escolas. Como o MEC tem uma relação profundamente desconfiada com os professores, uma malandragem em quem não se pode confiar, os exames do 1º ciclo só podem ser vigiados por professores que não leccionem este ciclo e que, não vá algum ceder à fraqueza de ajudar as criancinhas, também não pertençam aos grupos de Português ou Matemática. Talvez isto seja exagero, mas esta decisão deveria envergonhar um Ministro, ainda por cima, da Educação.
A razão desta deslocalização será, obviamente, de natureza logística, fica bastante mais fácil e barato para além, como referi, de expressarem uma desconfiança abusiva e generalizada sobre a solidez ética e deontológica da classe. Se os exames e os procedimentos são justificados do ponto de vista dos miúdos e dos benefícios globais é uma outra questão, o que importa são os exames e a poupança.
Os representantes dos pais têm referido a existência de um risco de ansiedade acrescida por parte dos miúdos devido à mudança, a realização do exame numa escola diferente, para além dos impactos que para as famílias tem o facto de muitos alunos das escolas em que se realizam os exames não poderem frequentá-las nesse dia como vários directores têm vindo a alertar o MEC.
Do meu ponto de vista, esta questão da potencial ansiedade dos miúdos, sendo importante não é uma questão essencial embora mereça discussão, evidentemente, os miúdos estão habituados a realizar tarefas escolares de avaliação de conhecimentos. O que pode ser gerador de ansiedade em alguns miúdos é o discurso de muitos adultos, pais ou professores, e a pressão criada por esses discursos. As consequências de tudo a isto traduzem-se, por exemplo, numa corrida, dos que podem, obviamente, aos centros de explicações como a imprensa tem vindo a referir.
A questão central, peço desculpa pela insistência, no papel e função de exames nacionais obrigatórios e com peso no trajecto dos alunos, situação que não se verifica em boa parte dos países com bons resultados escolares.
Não estando, evidentemente, em discussão a importância, a vários níveis dos exames, escapa-me como o seu aumento produza, só por si, qualidade e mudança. Os discursos que oiço na defesa dos exames não explicitam os ganhos de que aí advirão em termos de qualidade. A anterior Secretária de Estado do Ensino Básico afirmou em profunda reflexão serem muito importantes para que os meninos se habituem a realizar provas de conhecimento. Sem dúvida, mas para isso são necessários exames nacionais?
A introdução dos exames como panaceia da qualidade promove, do meu ponto de vista, o risco do trabalho escolar se organizar centrado na preparação dos alunos para a multiplicidade de exames que realizam como muitos professores têm vindo a alertar e é reconhecido, por exemplo pela OCDE em relatório de há uns meses sobre a avaliação no sistema educativo português. Curiosamente e sem estranheza, as posições da OCDE são usadas ao sabor da agenda.
Como tantas vezes afirmo, a qualidade promove-se, é certo e deve sublinhar-se, com a avaliação rigorosa e regular das aprendizagens, naturalmente, mas também com a avaliação do trabalho dos professores, com a definição de currículos adequados e de vias diferenciadas de percurso educativo para os alunos sempre com a finalidade de promover qualificação profissional, com a estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores eficazes e suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados de organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, etc. O problema é que de há muitos anos a educação anda à deriva das agendas políticas.
A existência de exames nacionais, logo no 4º e 6º anos, obrigatórios e com peso na nota final, corre o risco de sustentar um discurso demagógico, as referências a exigência e a rigor vendem bem, que deixa de lado os aspectos mais essenciais, a necessidade de promover qualificação para todos, sublinho todos, os alunos e, insisto, a disponibilização de apoios a alunos e professores.
Nesta perspectiva, continuo pouco convencido da imprescindibilidade destes exames, assim estruturados, seja qual for a escola em que se realizem.

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