Era uma vez uma Menina dos Olhos Doces, mas não se chamava Amélia como a que morava na canção de Carlos Mendes, lembram-se? Até podia chamar-se Amélia que no som parece nome feito para olhos doces, mas na verdade já quase ninguém sabia o nome da Menina dos Olhos Doces.
Conheciam-lhe o ar triste de onde
apenas saía um sorriso quando o Professor Velho, aquele que está na biblioteca
e fala com os livros, a encontrava num canto do páteo lá da escola e lhe
contava histórias malucas que a faziam sorrir, ainda que com medo que alguém
não gostasse de a ver rir. Sabem que há pessoas que não gostam de ver os outros
a rir, são, quase sempre, pessoas infelizes que não suportam a alegria dos
outros.
A Menina dos Olhos Doces,
carregava um fardo grande demais para a sua idade, carregava o cuidado que
tinha de assegurar ao irmão pequeno que tinha de levar à creche antes de vir
para a escola porque a mãe saía muito cedo de casa. Quando voltava à tarde,
depois de apanhar o irmão, era ela que preparava com o que havia, se havia, a
janta do pai que lhe cobrava no corpo o desagrado com o serviço, e sempre
estava desagradado, ele não é mau, mas bebe, dizia a Menina dos Olhos Doces ao
Professor Velho.
Na escola tinham combinado que
ela ficava mais tempo para poder fazer os trabalhos de casa antes de ir para
casa. É curioso que a Menina dos Olhos Doces, a que mais trabalhava em casa,
era a única que não levava trabalhos de casa. A Menina dos Olhos Doces também
era a única que nunca tinha brincado com uma Playstation, quer dizer uma
Playstation sua, e dizia de forma desprendida aos colegas que não gostava de
Playstations e também não tinha telemóvel, é verdade, ainda há adolescentes que
não têm telemóvel.
Da última vez, antes das férias,
que conversou com o Professor Velho disse que não sabia se voltava para a
escola, a mãe diz que ela precisa de começar a trabalhar. Já vai sendo tempo.
Ela não sabe dessas coisas da escolaridade obrigatória.
Como é de perceber esta
Menina dos Olhos Doces não existe, felizmente, a Amélia dos Olhos Doces morava
na canção de Carlos Mendes, esta mora nestas linhas.
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