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terça-feira, 8 de dezembro de 2020

O DESEMPENHO EM MATEMÁTICA E CIÊNCIAS, RESULTADOS DO TIMSS

 Foram divulgados os resultados do TIMSS (Trends in International Mathematics and Science Study) de 2019 coordenado pela  International Association for the Evaluation of Educational Achievement (IEA) que avalia Matemática e Ciências no 4.º e 8.º ano do ensino básico.

Do extenso conjunto de dados relava o abaixamento significativo em matemática no 4.º ano de 541 pontos em 2015 para 525 em 2019 e um abaixamento, mas pouco significativo em ciências, de 508 para 504, sendo 500 o valor médio da escala. Este abaixamento inverteu a trajectória de subida nas últimas edições.

Quanto ao 8.º que agora foi considerado em comparação com 1995 ano em que Portugal participou neste estudo e só retomando a participação em 2019, os resultados mostram uma subida em matemática, 451 para 500 pontos, e em ciências, de 463 para 519.

No relatório é referido sem surpresa, o peso que assumem neste desempenho variáveis como o estatuto  socioeconómico familiar dos alunos e o contexto sócio demográfico das escolas ou a frequência de educação pré-escolar.

A este propósito recordo um relatório da Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência com dados de 2019 divulgado em Março segundo o qual em 2018/2019 apenas 21% dos alunos abrangidos pela Acção Social Escolar cumpriram o 9º ano sem retenções, entre os alunos com meios familiares mais favorecidos a percentagem de trajectos sem retenção foi 56%.

Os números ilustram uma situação que, lamentavelmente, não tem nada de novo, os resultados em Matemática continuam mais baixos e também associados a variáveis sociodemográficas, condições económicas e nível de escolarização familiar.

Para além destas questões que são críticas a explicação para os resultados a Matemática é complexa e nem sempre consensual e surge habitualmente a questão dos currículos. Aliás, o Secretário de Estado em reacção a estes dados anunciou um novo programa de matemática produzido pelo Grupo de Trabalho criado para o efeito e entrar em discussão brevemente. Não sou especialista em questões curriculares, mas curiosamente duas Associações, Sociedade Portuguesa de Matemática e a Associação dos Professores de Matemática representativas deste universo quase sempre têm entendimentos diferentes. No entanto, julgo que estruturas curriculares demasiado extensas, normativas e prescritivas são pouco amigáveis para o bom desempenho da generalidade dos alunos sendo ainda que os conteúdos curriculares carecem de ajustamento como todas as áreas.

Por outro lado, e como aqui tenho escrito o desempenho a matemática pode ainda ser influenciado, não numa relação de causa-efeito, por múltiplas variáveis como número de alunos por turma, tipologia das turmas e das escolas, dispositivos de apoio às dificuldades de alunos e professores ou questões de natureza didáctica e pedagógica.

Acresce a esta complexidade um conjunto de outras variáveis menos consideradas por vezes mas que a experiência e a evidência mostram ter também algum impacto.

São variáveis de natureza mais psicológica como a percepção que os alunos têm de si próprios como capazes de ter sucesso associada a contextos familiares de natureza diversa, por exemplo.

É também conhecido que os pais com mais qualificação e de mais elevado estatuto económico têm expectativas mais elevadas sobre o desempenho escolar dos filhos o que se repercute na acção educativa e nos resultados escolares e, naturalmente, mais facilmente mobilizam formas de ajuda para eventuais dificuldades, seja nos TPC, seja através de ajuda externa.

Finalmente uma outra variável neste âmbito, a representação sobre a própria Matemática. Creio que ainda hoje existe uma percepção passada nos discursos de muita gente com diferentes níveis de qualificação de que a Matemática é uma “coisa difícil” e ainda de que só os mais “inteligentes” têm “jeito” para a Matemática. Esta ideia é tão presente que não é raro ouvir figuras públicas afirmar sem qualquer sobressalto e até com bonomia que “nunca tiveram jeito para a Matemática, para os números”. É claro que ninguém se atreve a confessar uma eventual “falta de jeito” para a Língua Portuguesa e às vezes bem que “parece”. A mudança deste cenário é uma tarefa para todos nós e não apenas para os professores e seria importante que acontecesse.

De facto, este tipo de discursos não pode deixar de contaminar os alunos logo desde o 1º ciclo convencendo-se alguns que a Matemática vai ser difícil, não vão conseguir ser “bons” e a desmotivar-se.

Não fica fácil a tarefa dos professores, mas no limite e como sempre será a escola o braço operacional da comunidade que quer fazer a diferença a fazer a diferença. Aliás, Dirk Hastedt, director-executivo da International Association for the Evaluation of Educational Achievement, em entrevista no Público sublinha justamente a necessidade da valorização dos professores com forma de também valorizar a educação e melhorar a sua qualidade.

Parece ainda claro e é uma questão central claro que para promover mais sucesso e não empurrar os alunos para os anos seguintes sem nenhuma melhoria nas suas competências ou saberes é essencial criar e tornar acessíveis a alunos, professores e famílias apoios e recursos adequados e competentes de forma a evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo.

Sabemos também que a escola pode e deve fazer a diferença, em muitas escolas isso acontece. Mas para que isto seja consistente e não localizado também sabemos que o sucesso se constrói identificando e prevenindo dificuldades de forma precoce, com a definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio eficazes, competentes e suficientes a alunos e professores, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados e reais de autonomia, organização e funcionamento desburocratizado das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, com a valorização do trabalho dos professores, com práticas de diferenciação que não sejam "grelhodependentes", com expectativas positivas face ao trabalho e face aos alunos, com melhores níveis de trabalho cooperativo e tutorial, quer para professores quer para alunos, etc.

Uma nota final para a importância da avaliação externa como forma imprescindível de regulação. No entanto, não entendo que só por existirem e serem muitos, os exames finais, só por si, insisto, só por si, melhorem a qualidade. É como se só por medir muitas vezes a febre se espere que ela baixe. A qualidade é promovida considerando o que escrevi em cima e regulada em termos globais pela avaliação externa que permite análises necessárias, nacionais ou internacionais como, por exemplo, o próprio TIMSS.

Não tenho nenhuma convicção que a multiplicação de projectos que emergem fora das escolas, por vezes com formas robustas de financiamento fora do sistema educativo, que alimentam agendas e corporações de interesses possam ser o caminho apesar de surgirem sempre alguns resultados ou avaliações que os pretendem legitimar. É com a escola, por dentro da escola e integrado em sólidos projectos de autonomia e responsabilidade e com recursos adequados que o caminho se constrói.

Sabemos tudo isto. Nada é novo.

Só falta um pequeno passo.

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