AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

E DEPOIS DOS 18 ANOS


As declarações públicas de amor e apreço aos professores por parte de figuras de topo no universo político, sobretudo em épocas de alguma perturbação, deixam-me sempre como o menino do quadro à venda nas feiras, com uma lágrima no canto do olho. Por outro lado, sinto uma inquietação a crescer nos dentes com a situação ilustrada num peça do DN, o que acontece aos alunos com necessidades educativas especiais, sim, como necessidades educativas especiais que aos 18 anos terminam a escolaridade obrigatória e têm … nada à sua frente.
De acordo com a Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência no ano lectivo 2016/2017 havia 87.039 alunos com necessidades especiais inscritos nas escolas portuguesas. Muitos destes alunos têm passado por alunos passam por experiências de sucesso independentemente do seu perfil de competências, felizmente que assim é.
No entanto, para muitos o período que se segue é um enorme túnel no qual poucas vezes se vislumbra uma luz, sobretudo em situações com problemáticas mais severas como ilustra a peça do DN.
Começando pela continuidade no trajecto escolar, no ano lectivo 2017/2018 frequentaram o ensino superior 1644 alunos com necessidades especiais, 0,5% do total dos matriculados no ensino superior o que evidencia o que está por fazer em matéria de equidade e inclusão. Considerando as vagas do contingente especial para estes estudantes apenas 14% foram ocupadas.
Se a estes dados acrescentarmos que a taxa de desemprego na população com deficiência é estimada em 70-75% e que o risco de pobreza é 25% superior à população sem deficiência e que Portugal se orgulha de ter perto de 98% dos alunos com NEE a frequentar as escolas de ensino regular no período de escolaridade obrigatória, temos um cenário que nos deve merecer a maior atenção.
Como tantas vezes tenho dito, aqui e nos espaços de contextos da lida profissional, a questão da presença dos alunos começa no que é feito no ensino básico e secundário, e existe muita matéria para reflectir e sobre as mudanças necessárias. Também neste aspecto a peça do DN ajuda a perceber as dificuldades percebidas e sentidas pelas famílias.
Por outro lado, é fundamental que com clareza, sem ambiguidades ou equívocos se entenda e após a escolaridade obrigatória os jovens, TODOS os jovens, têm três vias disponíveis formação profissional, formação escolar (ensino superior) ou mercado de trabalho (trabalho na comunidade que pode ter uma dimensão ocupacional).
A realidade mostra que os jovens com necessidades especiais estão significativamente arredados destas vias e, voltamos ao mesmo, em muitas circunstâncias ao abrigo de práticas e modelos de resposta sob a capa da … inclusão. Muitos deles ficam entregados (não integrados) às famílias ou encaminham-se para instituições onde, apesar de algumas experiências muito positivas interessantes, se recicla a exclusão.
Desculpem a enésima repetição mas um processo de inclusão assenta em cinco dimensões fundamentais, Ser (pessoa com direitos), Estar (na comunidade a que se pertence da mesma forma que estão todas as outras pessoas), Participar (envolver-se activamente da forma possível nas actividades comuns), Aprender (tendo sempre por referência os currículos gerais) e Pertencer (sentir-se e ser reconhecido como membro da comunidade). A estas cinco dimensões acrescem dois princípios inalienáveis, autodeterminação e autonomia e independência.
As pessoas com NEE de diferente natureza depois dos 18 anos devem ser, estar, participar e pertencer até aos contextos que todas as outras pessoas com mais de 18 anos estão. As instituições ou voltar para a família serão sempre um recurso e nunca uma via.
É também claro que no âmbito do ensino superior importa que se proceda a ajustamentos de natureza diversa, atitudes, representações e expectativas, oferta formativa, custos, acessibilidades e apoios ou, aspecto fundamental, promover melhor articulação com o ensino secundário
As questões mais complexas decorrem, os estudos e a experiência sugerem-no, das barreiras psicológicas e das atitudes, pessoais e institucionais, seja de professores, direcções de escola, da restante comunidade, incluindo, naturalmente, professores do ensino básico e secundário e de "educação especial", técnicos, os alunos com necessidades especiais e famílias.
Também é minha convicção de que as preocupações com a frequência do ensino superior por parte de alunos com necessidades especiais é fundamentalmente dirigida aos alunos que manterão as capacidades suficientes para aceder com sucesso à oferta formativa tal como ela existe. Estou a referir-me, evidentemente, aos alunos que não têm “diagnóstico” de problemas de natureza cognitiva.
No entanto, como tantas vezes digo, esta preocupação deveria ser mais alargada, estamos a falar de inclusão e agora, se quiserem, da minha utopia.
Porque não podem frequentar estabelecimentos de ensino superior? Sim, frequentar o ensino superior onde estão jovens da sua idade e em que a oferta formativa se for repensada e a experiência de vida proporcionada podem ser importantes.
Não, não é nenhuma utopia. Muitas experiências noutras paragens mas também por cá mostram que não é utopia.
O primeiro passo é o mais difícil, tantas vezes o tenho afirmado. É acreditar que eles são capazes e entender que é assim que deve ser.
Eu já disse e escrevi isto várias vezes. Peço desculpa mas continuarei a fazê-lo.

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