Um estudo, “Mobilidade Social em Portugal”, realizado por Teresa Bago D'Uva e Marli
Fernandes e divulgado pela Fundação Francisco Manuel dos
Santos, vem de novo evidenciar a dificuldade de promovermos mobilidade social,
ou seja, em Portugal a escolaridade e profissão dos pais têm um impacto
fortíssimo no trajecto de qualificação dos filhos, superior ao que se verifica
no espaço europeu.
Recordo que um trabalho divulgado
em 2016 pela Direcção-Geral de Estatísticas de Educação, “Desigualdades Socioeconómicas e Resultados Escolares – 2.º ciclo do
ensino público geral”, mostrava com clareza esta realidade. Sublinhava mais uma
vez a forte relação entre variáveis de natureza social e económica, nível de
escolaridade das mães por exemplo, e os resultados escolares dos filhos.
A percentagem de sucesso no 2º
ciclo de alunos com mães com licenciatura ou bacharelato é de 80%, entre os
alunos com mães com o equivalente ao 4ºano é de 26%. Se extremarmos as
habilitações, sem habilitações face a mestrado a doutoramento, temos um
intervalo de 85 para 83%.
Estes resultados não são
propriamente surpreendentes tal como no estudo anterior que considerava o
3ºciclo. A capacidade preditora da variável escolaridade dos pais, em
particular a das mães no nosso caso, relativamente ao percurso escolar dos
filhos é ainda muito significativa e comprovada em múltiplos estudos em
diferentes paragens. A análise dos resultados escolares em exames nacionais
cruzando com a habilitação escolar dos pais mostra isso mesmo.
Recordo também uma análise da
OCDE, cruzando os resultados escolares dos alunos de diferentes países no
Estudo comparativo PISA relativos a 2012 com as profissões dos pais, mostra que
em Portugal, mais do que noutros países, os filhos de pais mais qualificados
têm melhores resultados.
Na verdade, desde sempre que os
estudos, designadamente no âmbito da sociologia da educação, associam a
carreira escolar e o estatuto profissional dos filhos ao nível de escolaridade
e estatuto económico dos pais.
Também sabemos que isto é tanto
mais evidente quanto maiores são os níveis de desigualdade. Em Portugal
verifica-se ainda um dos maiores fossos entre ricos e pobres da União Europeia
pelo que a relação entre os níveis escolar e salarial dos pais e os dos filhos
é ainda mais forte. O trabalho agora apresentado vem, mais uma vez, confirmar a
realidade que conhecemos, a enorme dificuldade da escola de promover mobilidade
social, ou seja, o nível de escolaridade dos pais marca de forma excessiva o
nível atingido pelos filhos. A situação sempre assim foi, ainda me lembro de
quando era pequeno, haver quem se admirasse do meu pai, um serralheiro, ter
decidido que eu continuaria a estudar.
Acresce que as circunstâncias
conjunturais e estruturais das políticas educativas, apesar de alguma
recuperação não garantem equidade nas oportunidades, dificilmente sustentam que
a educação e a qualificação promovam a desejada mobilidade social ascendente.
Deste quadro, resulta uma
complexa situação que poderemos de forma simplista colocar nestes termos, a
escola ao acabar por reproduzir a desigualdade social à entrada, compromete o
papel fundamental que lhe cabe na promoção da mobilidade social, ou seja, a
escola que deveria ser parte da solução, na prática, corre o risco de continuar
a ser parte do problema. No entanto e apesar disto, creio que muito poderá e
deverá ser feito no sentido da promoção efectiva da chamada e distante equidade
e igualdade de oportunidades. Aliás, tal como no Estudo se demonstra,
felizmente, temos muito boas experiências que mostram que a escola pode, deve,
de facto, fazer a diferença.
Do meu ponto de vista, tantas
vezes aqui afirmado, a questão central será a qualidade na escola pública. Esta
qualidade deverá assentar em três eixos fundamentais, a qualidade considerando
resultados, processos, autonomia e gestão optimizada de recursos, segundo eixo,
qualidade para todos, a melhor forma de combater os mecanismos de exclusão e a
desigualdade de entrada e, terceiro eixo, diferenciação de metodologias,
diferenciação progressiva e não prematura dos percursos de educação e formação.
Esta diferenciação de percursos deve passar, temos registado progressos nesta
área, por uma oferta bastante mais variada ao nível do secundário
possibilitando a muitas jovens completar este nível de ensino com competências
profissionais, isto é que é fundamental. Também ao nível do ensino superior,
com o trabalho no âmbito do ensino politécnico se criam condições para
processos de qualificação mais curtos e mais diversificados.
No actual cenário, quando se
entende e espera que a educação e qualificação possam ter um papel decisivo na
minimização de assimetrias, as políticas, os custos e a dificuldade de acesso
podem, pelo contrário, alimentar essas assimetrias e manter a narrativa,
"tal pai, tal filho", pai (mãe) letrado, filho letrado e pai (mãe)
pouco letrado, filho pouco letrado.
Assim sendo, urge a definição de
uma política educativa para o médio prazo, estabelecida com base no interesse
de todos, com definição clara de metas, recursos, processos e avaliação. A
continuar na deriva a que nas última décadas nos entregamos, daqui a algum
tempo um novo estudo de dentro ou de fora virá dizer exactamente o mesmo.
Será o meio tão determinante? Poderá a educação fazer a diferença de forma não residual?
ResponderEliminarhttps://www.youtube.com/watch?v=ofKAw2hIJIA&feature=share
O meio, e a escolaridade e estatuto económico dos pais não são "determinantes" são preditores fortes, ou seja, têm influência e a escola pode de facto fazer a diferença de forma "não residual"
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