Há números que pelo seu gigantismo
não nos deixam perceber a sua real dimensão, somos incapazes de os perceber.
Segundo o Relatório estudo "Ending Extreme Poverty: A Focus on
Children", da responsabilidade da UNICEF e do Banco Mundial hoje é
divulgado, vivem em pobreza extrema 385 milhões de crianças. A probabilidade de
pobreza extrema é duas vezes superior nas crianças face à população adulta.
Impressionante e difícil de compreender.
Só para citar mais alguns dados,
segundo a Cáritas Europa Portugal foi o país em que o risco de pobreza mais
subiu em 2014 sendo que cerca de 25% de crianças estão nesta situação.
Portugal teve nos últimos um dos
maiores aumentos das desigualdades de rendimento, igual ou superior a 5%. Este
valor confirma que o Governo anterior sempre negou, aumento das desigualdades
em consequência das políticas de austeridade.
Portugal é também dos países em
que as transferências sociais, subsídios, abonos, etc. menos minimizam a
desigualdade de distribuição de rendimentos.
Nada disto é novo, como é sabido
as situações de carência assumem sempre consequências mais graves nos grupos
mais vulneráveis, designadamente crianças e velhos. Vários outros trabalhos têm
mostrado indicadores no mesmo sentido.
Segundo dados do sistema de
monitorização da Direcção-Geral da Saúde constantes no relatório “Portugal –
Alimentação Saudável em Números 2015, uma em cada 14 famílias portuguesas salta
refeições por não ter comida suficiente.
O impacto das circunstâncias de
vida no bem-estar das crianças e de forma mais particular no rendimento escolar
e comportamento é por demais conhecido e essas circunstâncias constituem,
aliás, um dos mais potentes preditores de insucesso e abandono quando são
particularmente negativas, como é o caso de carências significativas ao nível
das necessidades básicas.
Recordo o estudo do CNE e da
Fundação Francisco Manuel dos Santos há pouco tempo divulgado mostrando com
clareza que a esmagadora maioria dos alunos com insucesso é oriunda de famílias
com estatuto económico e social muito baixos e vivem em situação de pobreza e
carência.
Um Relatório de 2013, "Food
for Thought", da organização Save the Children, afirmava que 25% das
crianças terão o seu desempenho escolar em risco devido à malnutrição com as
óbvias e pesadas consequências em termos de qualificação e qualidade de vida de
que a educação é uma ferramenta essencial.
Em qualquer parte do mundo,
miúdos com fome, com carências, não aprendem e vão continuar pobres. Manteremos
as estatísticas internacionais referentes a assimetrias e incapacidade de
proporcionar de forma mais efectiva mobilidade social através da educação. Não
estranhamos. Dói mas é “normal”, é o destino.
Esta realidade não pode deixar de
colocar um fortíssimo risco no que respeita ao desenvolvimento e ao sucesso
educativo destes miúdos e adolescentes e portanto, à construção de projectos de
vida bem-sucedidos.
Quando penso nestas matérias
sempre me lembro da história que aqui conto com frequência e foi umas das
maiores lições que já recebi, acontecida há uns anos em Inhambane, Moçambique.
Ao passar por uma escola para gaiatos pequenos o Velho Bata, um homem velho e
sem cursos, meu anjo da guarda durante a estadia por lá, disse-me que se
mandasse traria um camião de batata-doce para aquela escola. Perante a minha
estranheza, explicou que aqueles miúdos teriam de comer até se rir, “só aprende
quem se ri”, rematou o Velho Bata.
Pois é Velho, miúdos com fome não
aprendem e vão continuar pobres.
As palavras de Augusto Gil de
1909 estão tragicamente actualizadas.
(...)
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!
(...)
Vivemos realmente num mundo estranho e implacável. Hoje, em conversa com pessoa conhecida (não cultivo amigos destes) que é acérrimo defensor de não aceitar refugiados em lado nenhum, ás páginas tantas da conversa disse: Então, não os salvem, deixem-nos naufragar no meio do Mediterrâneo!
ResponderEliminarVIVA!