AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 2 de julho de 2015

"NO TEMPO DA ESCOLA DAS NOSSAS AVÓS"

Merece registo e divulgação a iniciativa, os seus conteúdos e o seu resultado num tempo em que a escola está permanentemente sob escrutínio.
A este propósito e dada a minha avozice deixem que vos dê também um testemunho com notas que já por aqui têm passado sobre a minha escola, a escola daquele tempo.
A escola que havia lá para trás no tempo não era grande, nem pequena, era triste. A maioria das pessoas que por lá andava era, naturalmente, triste. Devo, no entanto dizer, que também nos divertimos, alguns achavam até que nos divertíamos demais.
As pessoas que mandavam na escola estabeleciam o que toda a gente tinha de aprender, fazer, dizer e pensar. Quem pensasse, dissesse ou fizesse diferente podia até sofrer algum castigo, mesmo os professores, não eram só os alunos. Não se podia inventar histórias, as pessoas contavam só histórias já inventadas. Às vezes, os miúdos e os professores, às escondidas, inventavam histórias novas.
Eu andei nesta escola lá para trás no tempo.
E na escola do meu tempo nem todos lá entravam e muitos dos que o conseguiam saíam ao fim de pouco tempo, ficando com a segunda ou terceira classe, como então se chamava. Chegava.
E na escola do meu tempo os rapazes estavam separados das raparigas.
E na escola do meu tempo havia um só livro e toda a gente aprendia apenas o que aquele livro trazia.
E na escola do meu tempo levavam-se muitas reguadas, basicamente por dois motivos, por tudo e por nada.
E na escola do meu tempo ensinavam-nos a ser pequeninos, acríticos e a não discutir, o que quer que fosse.
E na escola do meu tempo eu era “obrigado” a ter catequese, religiosa e política.
E na escola do meu tempo aprendia-se que os homens trabalham fora de casa e as mulheres cuidam do lar e dos filhos.
E na escola do meu tempo não aprender não era um problema, quem não “tinha jeito para a escola, ia para o campo”. Aliás, muitas crianças não cabiam na escola, eram diferentes, tão diferentes que nem precisavam de escola, diziam.
E na escola do meu tempo não se falava do lado de fora de Portugal. Do lado de dentro só se falava do Portugal cinzento e pequenino. Na escola do meu tempo eu era avisado em casa para não falar de certas coisas na escola, era perigoso.
Quem mandava no país achava que muita escola não fazia bem às pessoas, só a algumas. Ao meu pai perguntaram porque me tinha posto a estudar depois da quarta classe, não era frequente naquele meio, para ser serralheiro como ele não precisava de estudar mais.
Sim, eu sei, não precisam de me dizer que a escola deste tempo tem muitas coisas, cada vez mais embora com outras vestes e discursos, que nos recordam a escola do meu tempo.  Mas o caminho é melhorar a escola deste tempo não é, não pode ser, querer a escola do meu tempo.
Eu andei naquela escola lá para trás no tempo.
Por isso, quando falam da escola hoje, penso, nunca mais voltarei a andar naquela escola. E não quero que o meu neto e os outros miúdos andem numa escola como aquela, a minha escola, lá para trás no tempo.

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