Retomando o Despacho Normativo
13/2014 do MEC, hoje publicado em DR, algumas notas sobre a constituição de "grupos
de homogeneidade relativa" de alunos. A designação seria uma pérola em
"eduquês" mas Nuno crato não é, evidentemente, homem para certas
liberdades discursivas, é um homem de rigor como todos os aspectos da politica educativa
demonstram.
É definido que as escolas poderão
constituir turmas de alunos com dificuldades e de alunos com "elevadas
capacidades".
Como já tenho referido, em
algumas situações, bem avaliadas todas as variáveis envolvidas, posso entender
a constituição por um período de tempo bem delimitado de grupos de alunos para a
realização de um trabalho de apoio específico. No entanto, a a constituição,
assim enunciada, de grupos de alunos com dificuldades e de grupos de alunos com
"elevada capacidade" abre a porta a situações que me parecem
profundamente discutíveis.
Esta medida já existiu em tempos
com as turmas de nível e quem conhece a realidade sabe que os resultados dos
alunos "maus" continuaram genericamente maus, o povo diz junta-te aos
bons e serás como eles, junta-te aos maus e serás pior do que eles.
Quem lida com miúdos reconhece
que, na verdade, não existem grupos homogéneos e não vislumbro o que seja a
"homogeneidade relativa", quem tanto combateu o "eduquês"
talvez agora pense e fale em "cratês", terei que estudar mais para
perceber.
A constituição de grupos
nivelados, "homogéneos", com base no rendimento escolar, no
comportamento ou na origem social e familiar, não é rara nas nossas escolas, é
do conhecimento da tutela que tolera o procedimento, as escolas já têm
autonomia nesta matéria. Sabemos todos de turmas maioritariamente constituídas
por repetentes ou oriundos de alguns bairros, bem como, pelo contrário, turmas
maioritariamente constituídas por bons alunos, filhos de docentes ou de
funcionários ou de alguém com “capacidade” para influenciar a definição da
turma para o seu filho ou, como agora se define de alunos com "elevada
capacidade". Até sabemos de escola públicas que recusam alunos com base no
"currículo que carregam. Nada de novo, portanto.
A questão central coloca-se em
dois patamares, a eficácia e o impacto nos alunos. Vamos por partes. A
experiência e os estudos realizados sobre estas questões mostram que sem
recorrer a apoios eficazes e adequados, separando apenas por competência, os “bons”
continuam bons os “maus” também continuam maus, apenas deixam, crê-se, de
atrapalhar o trabalho dos bons. O trabalho dos maus, sendo nivelado por baixo
introduz um tecto nas aprendizagens que inibe um percurso do mesmo tipo e
qualidade que o dos bons mesmo que sejam bem sucedidos, o que só acontece pelo
trabalho de apoio adequado e não por estarem junto de outros maus.
Nós aprendemos mais e melhor com
quem sabe mais que nós.
Quanto ao impacto, parece óbvio
que a diversidade é sempre preferível a uma falsa homogeneidade. As atitudes de
discriminação negativa não apresentam nenhuma espécie de vantagem pessoal ou
social, guetizam, estigmatizam e promovem quer nos bons, quer nos maus, uma
relação desconfiada e tensa facilitadora de problemas.
As dificuldades escolares
gerem-se com apoios e recursos que terão certamente de ser diferenciados mas
não podem, não devem, implicar a criação de reservas para os “maus” ou de
"condomínios" para os "bons".
Finalmente, creio que esta
medida, grupos de nível, se inscreve num processo de selecção neodarwinista que
o MEC tem vindo de mansinho a instalar. O caminho é este, dos fracos não reza a
história.
O problema é que se não for a
escola, a educação, a promover equidade de oportunidades e a combater a
exclusão não restará nada nem ninguém que o faça. O Ministro da Educação e Ciência
deveria saber isto.
Pelo que ouço e leio aqui a ali, grande parte dos pais concorda. Não estão preocupados se a escola promove ou não a equidade de oportunidades ou se combate a exclusão. Estão preocupados em que os seus filhos "sejam excelentes, porque ser mediano já não chega" e os maus só atrapalham.
ResponderEliminarCristina
Olá Cristina, eu percebo o ponto de vista dos pais, têm um pensamento centrado no que na sua perpectiva é melhor para os SEUS filhos, acho natural, concorde ou não. Muitas vezes tenho conversado com grupos de pais sobre isto.
ResponderEliminarO que me preocupa é ser a política educativa, alguns discursos de profisionais, a alimentar este tipo de ideias e procedimentos.
Bom não fica, mas pior tambem não...
ResponderEliminarOh minha senhora !
ResponderEliminarSe o menino tiver jeito para a politica, inscreva-o na JSD, sempre vai à Universiade de Verão e logo arranja um emprego muito jeitoso.
E deixe-lá, que bons, bons, nem todos podem ser...
Sou professora numa escola em que foi criada, esta ano, uma turma de repetentes no 6º ano. São alunos com várias retenções e um comportamento indisciplinado indescritível. Juntaram todo o "lixo" para aquela turma e assim "limparem" as outras turmas de 6º ano. Pergunto: isso é legal???
ResponderEliminarSer professor de alunos sem dificuldades é fácil, difícil é apresentar resultados com alunos que revelam dificuldades a vários níveis...Embora ache que as turmas deveriam ser heterogéneas, a palavra "lixo" choca-me! Acho que é de todo impossível que essa turma tenha apenas indisciplinados e outros adjetivos que nem me atrevo a repetir...Comece por lhes mostrar que gosta deles e os quer realmente ajudar.
ResponderEliminar*Para além de serem todos muito, muito fraquinhos à minha disciplina (Matemática), o problema dessa turma exclusivamente de repetentes é o comportamento! Dos vinte e tal alunos, há uns 8 ou 10 (com 15 anos e sem qualquer interesse pela aprendizagem) que infernizam as aulas! É fácil falar em ensino individualizado, centrado no aluno, mas quando uma escola forma turmas como esta - de repetentes problemáticos - a ideia é mesma essa: retirar os "maus" alunos das "boas" turmas para não perturbarem...
ResponderEliminarE são as professoras mais novas, contratadas, como eu que apanham com estes "presentes envenenados". Já comecei as aulas há 2 semanas e ainda não avancei nada! Sinto-me amargurada...
Compreendo perfeitamente o seu sentir.
ResponderEliminarA questão destes alunos não é "sua", é de um sistema que deve ter condições para dar respostas ajustadas aos problemas que enfrenta, menos alunos por turma se e quando necessário, apoios a professores se e quando necessário, apoio aos miúdos se e quando necessário, gestão adequada dos professores, políticas educativas que se direccionem para a qualidade do trabalho de professores e alunos, programas adequados e não uma checklist de metas de aprendizagem, etc, etc, etc. Em termos mais reais temos ... o que descreve
Agradeço as suas palavras, Morgado, e a compreensão que demonstra.
ResponderEliminarVou ter de carregar esta "cruz" todo o ano letivo. Sei que, no final, a taxa de sucesso será muito reduzida, o que me preocupa, já que quando se proceder à "análise fria dos números" ninguém vai tratar de saber que "tipo de turma" me entregaram.
No fim do ano, todos vão associar o meu nome (e a minha "qualidade" profissional) aos resultados obtidos, não se importando de saber que a turma é composta exclusivamente por repetentes, indisciplinados, e totalmente desinteressados pelos conteúdos escolares. Para as "estatísticas" os meus colegas, com "boas" turmas, vão obter bons resultados, enquanto eu... serei a "incompetente".
Sinto-me injustiçada! Vou "sofrer" todo o ano e, no fim, ainda serei prejudicada na avaliação dos meus pares/escola. Sinto-me triste. Só continuo porque preciso do meu salário e porque tenho uma filha ainda bebé para criar.
Como já disse, compreendo a situação. Não serve para nada mas estou cada vez mais convencido que os professores mais do que o que sabem, ensinam o que são. A prova, como escrevi no texto sobre o dia do Professor, é que os professores de que nos lembramos com saudade é. sobretudo, por aquilo que eram e não tanto pelo que nos ensinaram. Talvez os seus alunos a venham a recordar. Um abraço
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