AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

segunda-feira, 28 de julho de 2014

EDUCAÇÃO E AUTONOMIA

"Licenciatura, mestrado ou emprego? Ano sabático pode ser opção"

Ainda de forma incipiente, quer por razões culturais, quer por questões económicas, começam a surgir em Portugal as primeiras experiências de “gap year”, um ano sabático, sem estudar ou trabalhar, no final do secundário ou entre a licenciatura e o mestrado. Neste período os jovens viajam, desenvolvem acções de voluntariado ou outras iniciativas.Estas experiências são razoavelmente comuns noutros países, Inglaterra, por exemplo.
Os defensores da iniciativa vêem este ano sabático como algo de muito vantajoso no percurso dos jovens no sentido de estimular a sua autonomia e conhecimento da vida antes de ingressar no ensino superior. As potenciais vantagens são superiores aos eventuais efeitos negativos da "perda" de um ano sem estudar. Alguns especialistas apesar de algumas vantagens, manifestam algumas reservas face às diferenças culturais, aos modelos sociais e às questões de natureza económica envolvidas.
Sobre esta questão algumas notas telegráficas.
De há muito e sempre que penso ou falo de educação me lembro de um texto de Almada Negreiros em que se afirma "... queria que me ajudassem para que fosse eu o dono de mim, para que os que me vissem dissessem: Que bem que aquele soube cuidar de si". Este enunciado ilustra, do meu ponto de vista, a essência da educação, seja familiar ou escolar e em qualquer idade. Na verdade, o que se pretende num processo educativo será a construção de gente que sabe tomar conta de si própria da forma adequada à idade e à função que em cada momento se desempenha. Este entendimento traduz-se num esforço contínuo de promover a autonomia das crianças e jovens para que "saibam tomar conta de si próprios", no fundo, a velha ideia de, "ensinar a pescar, em vez de dar o peixe".
Dito isto, sou por princípio favorável a iniciativas que favoreçam esta autonomia dos miúdos e dos jovens. No entanto, é minha convicção que por razões que se prendem com os estilos de vida, com os valores culturais e sociais actuais, com as alterações das sociedades, questões de segurança. por exemplo, estamos a educar os nossos miúdos de uma forma que não me parece, em termos genéricos, promotora da sua autonomia. Os miúdos são permanentemente bombardeados com saberes e actividades que serão obviamente importantes para o seu desenvolvimento e para o seu futuro mas, ao mesmo tempo, são miúdos, pouco autónomos, pouco envolvidos nas decisões que lhes dizem respeito cumprindo agendas que lhes não dão margem de decisão sobre o quê e o porquê do que fazemos ou não fazemos. Um exemplo, para clarificar. Um adolescente não habituado a tomar decisões, a fazer escolhas, mais dificilmente dirá não a uma oferta de um qualquer produto ou um a convite de um colega para um comportamento menos desejável. É mais difícil dizer não do que dizer sim aos companheiros da mesma idade. Num sala de aula é bem mais provável que um adolescente tenha um comportamento adequado porque "decida" que é assim que deve ser, do que por "medo" das consequências.
Só miúdos autónomos, auto-determinados,  serão mais capazes de dizer não ao que se espera que digam não e escolher de forma ajustada o que fazer ou pensar, o que sublinha a importância de em todo processo de educação, logo de muito pequeno, em casa e na escola, se estimular a  autonomia dos miúdos.

Este entendimento, que creio pouco presente em muito do que fazemos em matéria de educação familiar ou escolar e para todos os miúdos, parece-me bem mais necessário que uma experiência realizada só por alguns, numa fase determinada da sua vida por mais interessante que possa ser e por mais efeitos positivos que possa produzir nos jovens envolvidos, quando corre bem, evidentemente.

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