AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

terça-feira, 27 de maio de 2014

A PROTECÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS

"Carolina, 15 anos, voltou a ser vítima de abusos. Os alarmes soaram, mas ninguém fez nada"
O I de hoje apresenta um trabalho tão impressionante quanto acusador sobre o caso de uma adolescente da Margem Sul vítima de episódios sucessivos de agressão sexual e física por parte de colegas de escola sem que os diversos intervenientes e conhecedores do processo tenham conseguido proteger a criança e os pais destes episódios. Para além dos acontecimentos e como também acontece com frequência, em termos processuais, a adolescente foi obrigada a relatar, recordar, vezes sem conta as experiências de que foi vítima e aniquilaram a sua vida. Uma situação verdadeiramente dramática e que nos interroga, onde é que estamos a falhar?
De há muito e a propósito de várias questões, que afirmo que em Portugal, apesar de existirem vários dispositivos de apoio e protecção às crianças e jovens e de existir legislação no mesmo sentido, sempre assente no incontornável “supremo interesse da criança", não existe o que me parece mais importante, uma cultura sólida de protecção das crianças e jovens de que temos exemplos com regularidade. Poderíamos citar a insuficiência e falta de formação de juízes que se verifica nos tribunais de Família com enorme morosidade na resolução de situações de regulação para além de surgirem com alguma regularidade decisões incompreensíveis em casos de regulação do poder parental ou o silêncio face a situações conhecidas, a forma negligente como são muitas vezes referidos fenómenos de bullying, etc.
Por outro lado, as condições de funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho eficaz estão longe de ser as mais eficazes e operam em circunstâncias difíceis. Na sua grande maioria as Comissões têm responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial. Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as integram.
Este cenário permite que ocorram situações, frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que, sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio e os procedimentos necessários. Ainda acontece que depois de alguns episódios mais graves se oiça uma expressão que me deixa particularmente incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver ou minimizar os problemas das crianças referenciadas ou sinalizadas.
Por isso, sendo importante registar uma aparente menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será fundamental que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas.
A Carolina não nos vai perdoar termos permitido o seu continuado sofrimento que ainda não terminou e que certamente deixará marcas profundas.

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