AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

BRINCAR E ANDAR NA RUA

O pediatra Luís Januário, em comunicação proferida num Congresso da especialidade a acontecer no Porto, chamou a atenção para a importância do brincar e do brincar em espaços abertos que permitam à criança aprender a conhecer riscos e a lidar com eles, o que é um excelente contributo para o seu desenvolvimento e autonomia. O Dr. Luís Januário referiu-se ao que designou por “cultura de segurança fóbica” e a “organização estereotipada dos espaços” destinados a crianças.
Fiquei satisfeito com a divulgação desta perspectiva pois abordo frequentemente esta questão com pais, técnicos e também aqui no Atenta Inquietude.
Sendo certo que temos de estar atentos aos riscos, continuamos a ser um país com elevado número de acidentes com crianças, como também neste Congresso foi referido,  bem como considerar mudanças nos estilos de vida das famílias, nos valores e nos equipamentos, brinquedos e actividades dos miúdos, a verdade e que o brincar na rua começa a ser raro.
Embora consciente, repito, das questões como risco, segurança e estilos de vida das famílias, creio que seria possível “devolver” os miúdos ao circular e brincar na rua, talvez com a colaboração de velhos que estão sozinhos as comunidades e as famílias conseguissem alguns tempos e formas de ter as crianças por algum tempo fora das paredes de uma casa, escola, centro comercial, automóvel, ecrã ou dos “espaços estereotipados” de que fala Luís Januário.
No imperdível “O MUNDO, o mundo é a rua da tua infância”, Juan José Millás recorda-nos como a rua, a nossa rua foi o princípio do nosso mundo e nos marca. Quantas histórias e experiências muitos de nós carregam vindas do brincar e andar na rua e que contribuíram de formas diferentes para aquilo que somos e de que gostamos.
Como muitas vezes tenho escrito e afirmado, o eixo central da acção educativa, escolar ou familiar, é a autonomia, a capacidade e a competência para “tomar conta de si” como fala Almada Negreiros. A rua, a abertura, o espaço, o risco (controlado obviamente, os desafios, os limites, as experiências, são ferramentas fortíssimas de desenvolvimento e promoção dessa autonomia.
Curiosamente, se olharmos às nossas condições climatéricas, Portugal é um dos países com valores mais baixos no tempo dedicado a actividades de ar livre, situação com implicações menos positivas na qualidade de vida, nas suas várias dimensões, de miúdos e crescidos.
Talvez, devagarinho e com os riscos controlados, valesse a pena trazer os miúdos para a rua, mesmo que por pouco tempo e não todos os dias.
Eles iriam gostar e far-lhes-ia bem.

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