O Público de hoje aborda de novo a questão da
adopção infantil em Portugal com um trabalho que merece algumas notas.
Em 2012 existiam 8537 crianças institucionalizadas
das quais 1087 em situação de passível de adopção. Também no mesmo ano existiam
em lista de espera 390 candidaturas. É de registar a diminuição que se tem
verificado nos últimos anos das candidaturas à adopção. O Ministro da Segurança
Social determinou a constituição de dois grupos de trabalho que para estudar
todo o processo de adopção e, eventualmente, promover ajustamentos que o possam
optimizar. Técnicos deste universo referem morosidade nas decisões e no próprio
processo.
Apesar da evolução verificada ainda continuamos
com uma elevada quantidade de crianças institucionalizadas, muitas das quais
sem projectos de vida viáveis pese o empenho dos técnicos. Seria desejável que
se conseguisse até ao limite promover a sua desinstitucionalização das crianças
por múltiplas e bem diversificadas razões. Como exemplo, um estudo recente da
Universidade do Minho aponta no sentido de que as crianças institucionalizadas
revelam, sem surpresa, mais dificuldade em estabelecer laços afectivos sólidos
com os seus cuidadores nas instituições. Esta dificuldade pode implicar alguns
riscos no desenvolvimento dos miúdos e no seu comportamento.
A conclusão não questiona, evidentemente, a
competência dos técnicos cuidadores das instituições, mas as próprias condições
de vida institucional e aponta no sentido da adopção ou outros dispositivos
como forma de minimizar estes riscos e facilitar os importantes processos de
vinculação afectiva dos miúdos.
Acontece ainda que se verifica uma enorme dificuldade
de algumas crianças em ser adoptadas devido a situações como doença,
deficiência, existência de irmãos ou uma idade já elevada. Assim, muitas
crianças estarão mesmo condenadas a não ter uma família. Curiosamente, existem
famílias interessadas na adopção de bebés que esperam até cinco anos porque
entre os mais pequeninos passíveis de adopção, o número é menor, situação que
se mantém, os candidatos à adopção preferem as crianças abaixo dos 3 anos.
Como é óbvio, um processo de adopção é algo cuja
qualidade não pode em momento algum ser hipotecada e o Plano Nacional de
Adopção zela por isso no sentido de evitar, por exemplo, processos de
"devolução" de crianças em processo de adopção, situação altamente
penalizadora para todos os envolvidos. No entanto, parece claro que o processo
carece de agilização de modo a que os candidatos à adopção não desistam
assustados com a morosidade.
Como repararão os mais atentos, sempre que aqui
me refiro a este tipo de questões, julgo justificado umas notas sobre os
contextos familiares das crianças.
Por estranho que possa parecer, existe uma outra
realidade, menos perceptível em termos globais, mas conhecida por aqueles que
lidam de mais perto com as crianças e que remete para a quantidade enorme de
situações de crianças abandonadas e rejeitadas dentro das famílias, algumas
destas famílias até com um funcionamento aparentemente normal.
Pode parecer surpreendente esta abordagem, mas
muitas crianças vivem em famílias, diferentes tipos de família, que, por
variadíssimas razões, as não desejam, as não amam, apenas as toleram, cuidam,
pior ou melhor, sobretudo nos aspectos "logísticos". Em alguns casos,
são mesmo crianças a que "não falta nada", dizem-nos. Na verdade
falta-lhes o essencial, o abrigo de uma família.
Quando penso nestas situações lembro-me sempre de
uma expressão que ouvi já há algum tempo a Laborinho Lúcio num dos encontros
que tenho tido o privilégio de manter com ele.
Dizia Laborinho Lúcio que "só as crianças
adoptadas são felizes, felizmente a maioria das crianças são adoptadas pelos
seus pais”. Na verdade, muitas crianças não chegam a ser adoptadas pelos seus
pais, crescem sós e abandonadas.
Existem mais crianças a viver narrativas desta
natureza, abandonadas e ou rejeitadas dentro da família, do que se pode
imaginar.
É verdade, mas a resposta a dar ao problema não está, como alguma esquerda mais radical vem sugerindo, na possibilidade dos casais homossexuais poderem vir a adoptar...
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