AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sábado, 11 de maio de 2013

UM PROGRAMA NOVO QUE DE NOVO ... BASICAMENTE TRAZ PROBLEMAS

Há umas semanas quando foi colocado em discussão um novo Programa de Matemática, o Ministro Nuno Crato sustentou a iniciativa com a “grande liberdade metodológica aos professores”, para ensinarem de acordo com “a sua experiência, as suas técnicas e a sua sala de aula” face a um programa moderno e com "objectivos mais facilmente perceptíveis". O Ministro insistiu que "a ideia foi sempre dar esta liberdade metodológica”, para que cada docente fique livre de definir o seu próprio método de ensino dos diversos conceitos. Muito bem. Confesso que me pareceu, escrevi na altura, um pouco estranha a afirmação, como se as opções didácticas e pedagógicas de profissionais cientificamente preparados fossem determinadas pelo Ministério, algo que até no plano ético e deontológico é discutível. Ainda assim e à cautela, fica bem agradecer ao MEC a "liberdade" concedida aos professores.
Voltando às metodologias, no Documento em discussão, no seu ponto 6 lê-se "Tendo em consideração, tal como para os níveis de desempenho, as circunstâncias de ensino (de modo muito particular, as características das turmas e dos alunos), as escolas e os professores devem decidir quais as metodologias e os recursos mais adequados para auxiliar os seus alunos a alcançar os desempenhos definidos nas Metas Curriculares.
A experiência acumulada dos professores e das escolas é um elemento fundamental no sucesso de qualquer projeto educativo, não se pretendendo, por isso, espartilhar e diminuir a sua liberdade pedagógica nem condicionar a sua prática letiva. Pelo contrário, o presente Programa reconhece e valoriza a autonomia dos professores e das escolas, não impondo portanto metodologias específicas.
Sem constituir ingerência no trabalho das escolas e dos professores, nota-se que a aprendizagem matemática é estruturada em patamares de crescente complexidade, pelo que na prática letiva deverá ter-se em atenção a progressão dos alunos, sendo muito importante proceder-se a revisões frequentes de passos anteriores com vista à sua consolidação." Segue-se a orientação para que não se use a calculadora.
Registe-se de novo a enorme preocupação com a liberdade metodológica dos professores e um texto que ... não diz nada, ou seja, um bom exemplo do que o Ministro Crato designava por eduquês.
O que continuo com uma enorme dificuldade em entender é como é que esta retórica sobre "liberdade metodológica", "características das turmas e dos alunos", "autonomia dos professores e das escolas, "revisões frequentes", etc., se torna compatível com um definição de metas curriculares que para Português e Matemática no 1º ciclo correspondem a 177 objectivos e 703 descritores que estabelecem o que os alunos deverão imprescindivelmente revelar, “exigindo da parte do professor o ensino formal de cada um dos desempenhos referidos nos descritores”. Acontece ainda que, de uma forma geral e decorrente da agregação de escolas os professores trabalharão com turmas lotadas, 24 alunos.
O ensino tenderá a transformar-se na gestão de uma espécie de "check list" das metas estabelecidas implicando a impossibilidade de acomodar as diferenças, óbvias, entre os alunos, os seus ritmos de aprendizagem o que culminará, antecipa-se, com a realização de exames todos os anos. Por outro lado, como também já escrevi, a lógica de elaboração das metas curriculares remete para uma lógica de ano de escolaridade e não de ciclo como prevê a Lei de Bases, ou seja, os objectivos são definidos para o ciclo e não para o ano, aliás, os exames, tão caros ao MEC, acontecem exactamente no final de ciclo.
Apesar do MEC acenar com a referência aos modelos anglo-saxónicos como selo de qualidade, o que está longe de acontecer, devo confessar que estou apreensivo tal como os autores do Programa de Matemática que estava em vigor, a Sociedade Portuguesa de Investigação em Educação Matemática e a Associação Nacional dos Professores de Matemática que hoje volta a manifestar a sua fortíssima crítica ao novo programa de Matemática, alertando para o risco de retrocesso nos resultados positivos que os últimos dados dos estudos comparativos internacionais demonstraram utilizando um programa que estava agora a terminar a sua fase de generalização e era de 2007.
Também a Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), afirmou que só se justificaria a revogação do programa de Matemática se "nesta altura, se tiver sido detectada alguma impossibilidade legal de aplicar as metas curriculares no próximo ano lectivo”, o que não parece verificar-se produzindo-se assim uma desnecessária turbulência.
Mas como é habitual a infalibilidade e a arrogante genialidade do MEC que escondem a ignorância e uma agenda ideológica, embrulhadas em palavras como rigor, exigência continuam a sua trajectória, vão correndo com os professores e irão correndo com os alunos para as fábricas logo de bem cedo. Restará o pequeno grupo que constituirá a elite e assim se cumprirá a visão de escola desta gente.

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