AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sexta-feira, 10 de maio de 2013

O DIA DA ESPIGA

Como dizia Camões o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades. De manhã, logo cedo, entre a notícias sobre crise, dificuldades, dívidas, cortes em pensões e reformas e outras assim interessantes ouvi uma breve referência ao facto de hoje ser o Dia da Espiga e aí fiquei, no Dia da Espiga, como nós dizíamos quando era pequeno, a Quinta-feira da Espiga. Acho que já muito pouca gente repara no Dia da Espiga, como já nenhuns miúdos aparecem a pedir Pão por Deus no 1º de Novembro, o Dia de Todos os Santos. Na verdade, surpreendi-me porque no último ano bateu-me à porta um grupo e não era à conta do Halloween, importação recente que se tornou moda, era mesmo a pedir Pão por Deus. Fiquei contente.
Voltando ao Dia da Espiga e a umas dezenas de anos atrás, na minha casa íamos sempre buscar a sorte prometida no ramo da Espiga. Com o meu pai, pegávamos nas bicicletas, na altura o meio de transporte familiar e íamos à quinta onde vivia a Avó Leonor apanhar o ramo da Espiga, papoilas, flores silvestres, sobretudo malmequeres amarelos e brancos, o que se encontrasse de espigas de cereais e o ramo de oliveira. Fazia-se o ramo atado com ráfia, arranjávamos sempre mais do que um para oferecer aos vizinhos e colocava-se pendurado lá em casa por cima da mesa do jantar como chamariz da sorte. Saía apenas quando era substituído pelo novo ramo da Espiga. Nunca me lembro de termos conseguido associar a presença do ramo ao que de bom nos ia acontecendo, mas o ramo lá estava e a tradição era sempre cumprida.
Nas novas qualidades que o mundo vem tomando, não parece que possam caber minudências como andar no campo, se houver campo, à cata de flores, espigas e um raminho de oliveira. Não sei se é bom, ou se é mau, mas eu gostava de ir à Espiga, mesmo se não confiava muito na sorte.

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