AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

terça-feira, 2 de outubro de 2012

OS TRABALHOS DOS MIÚDOS

Um trabalho realizado na Escola Superior de Educação do Porto chama a atenção para algo que recorrentemente abordo neste espaço e em outras iniciativas da lida profissional, o tempo dedicado pelos miúdos às actividades de natureza escolar.
Com o arranque do ano escolar as crianças e adolescentes retomam as suas rotinas, os trabalhos, um grupo mais pequeno, os do 1º ano, estão a iniciá-las. Com as alterações nos estilos de vida muitas famílias sentem um problema importante, a guarda das crianças nos períodos laborais, o sistema educativo tem procurado resolvê-lo da pior da maneira, prolongando inaceitavelmente a estadia das crianças na escola, através das Actividades de Enriquecimento Curricular.
Creio que nem toda a gente tem consciência de que, de acordo com a lei, uma criança, por exemplo do 5º ano, pode passar 11 horas por dia na escola, ou seja, 55 horas por semana. Muitas crianças do 1º e º ciclo passam efectivamente muitas horas, demasiadas horas, na escola.
Esta overdose de estadia institucional na escola, com o tempo muitas vezes preenchido com actividades de duvidosa qualidade, não pode deixar de ter consequências na relação que os miúdos estabelecem com a escola e com as actividades da escola.
Para além do recurso muitíssimo frequente aos trabalhos de casa, que quase sempre são tarefas escolares repetitivas e discutíveis, muitos pais recorrem ainda ao envolvimento dos filhos em múltiplas actividades transformando-as numa espécie de crianças-agenda pois os pais, para além dos problemas logísticos da guarda dos miúdos em horários laborais sentem-se também pressionados para esperar e exigir níveis de excelência aos miúdos Todas estas actividades, a oferta é variadíssima, são percebidas como imprescindíveis à excelência, os miúdos devem ser educados para ser excelentes. Promovem níveis fantásticos de desenvolvimento intelectual e da linguagem, desenvolvimento motor, maturidade emocional, criatividade, interacção social, autonomia e certamente de mais alguns aspectos que agora não recordo. Assim, as crianças e adolescentes estão sempre envolvidos em qualquer actividade, a quase todas as horas.
Os pais, alguns pais, seduzidos pela sofisticação desta oferta, pressionados pelos estilos de vida que não conseguem ou podem ajustar e com a culpa que carregam pela falta de tempo para os filhos, aceitam sem vislumbrar alternativas que os trabalhos dos miúdos se desenvolvam para além do que seria desejável, eu diria saudável.
Vamos ter que repensar os trabalhos dos miúdos, de muitos miúdos. O consumo excessivo, mesmo de actividades fantásticas ou de actividades escolares, tem riscos. Um deles, mais uma ideia romântica, é a falta de tempo para brincar, a coisa mais séria que os miúdos fazem. E precisam.

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