AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

terça-feira, 5 de junho de 2012

A REALIDADE É QUE ATRAPALHA. Se não fosse a realidade estava tudo bem

Nos últimos dias a liderança política desdobrou-se em discursos sobre o bom andamento do país, comprovado pela avaliação positiva da troika. O Primeiro-ministro informou que se vislumbram sinais de mudança e que "os portugueses já não estão à beira do abismo". Ao que parece, este optimismo não é partilhado pelas gentes pois, sondagem do JN, a maioria dos inquiridos mostra-se pessimista para os próximos tempos, independentemente de quem possa ser governo. Aliás, os diferentes indicadores disponíveis sobre a qualidade de vida da generalidade dos portugueses estão longe de ser compatíveis com a "avaliação muito positiva" da realidade do país, embora eu saiba que se trata de uma questão de perspectiva, a agenda da troika e de boa parte das políticas em curso visam os mercados e não as pessoas.
As declarações sobre os "bons resultados" são no mínimo estranhas quando as previsões do próprio Governo para o maior flagelo das dificuldades, o desemprego, ainda são de aumento para o próximo ano.
É evidente que se espera das lideranças um discurso mobilizador e que promova confiança, mas esse discurso tem que se manter dentro dos níveis de realismo que lhe dá consistência e credibilidade.
Em diferentes ocasiões tenho referido no Atenta Inquietude a importância do que tenho designado exactamente por uma dimensão psicológica da crise, a confiança, ou, mais claramente, a falta de confiança. Esta importância verifica-se em termos individuais, quando nos sentimos confiantes, sentimo-nos mais capazes, verifica-se em termos de grupo, a título de exemplo, uma equipa de futebol confiante será seguramente mais eficaz, verifica-se de forma genérica em qualquer instituição e, finalmente, poderemos também dizer que sociedades mais confiantes sentir-se-ão mais capazes de enfrentar dificuldades.
Assim sendo, parece importante que as lideranças, entre todas as suas competências e acções, sejam capazes e competentes no sentido de transmitir confiança. Acontece que as nossas lideranças, em matéria tão importante, subordinam, como sempre, as suas acções aos interesses imediatos, sobretudo partidários, ou seja, basicamente, quem governa faz discursos excessivamente optimistas, que muitas vezes parecem negar a realidade, pintando-a de rosa e quem está na oposição produz discursos e visões catastrofistas. Como é óbvio, os cidadãos têm cabeça, qualquer dos discursos são um péssimo contributo à confiança realista e informada que precisamos de sentir face a dificuldades e a desafios complexos.
Nos últimos tempos, em que se têm acentuado as consequências dramáticas da crise a nível do emprego e da diminuição dos apoios sociais por exemplo, seria ainda mais necessário um discurso que contribuísse para identificar um rumo e promovesse e envolvesse os cidadãos na convicção e confiança de que seremos certamente capazes de ultrapassar, ainda que com momentos dolorosos, os tempos que vivemos.
O problema é que muita desta gente e dos seus discursos e comportamentos são parte do problema, dificilmente serão parte da solução como temos vindo a constatar.
Depois de vários anos de desemprego, dezenas de entrevistas e currículos enviados, uma idade "proibida" no mercado de trabalho, a dignidade de rastos, uma família afectada, parece difícil manter o optimismo e a confiança e entender como a situação do país merece uma "avaliação positiva" de uns burocratas sem alma nem ética.

1 comentário:

  1. "Como é óbvio, os cidadãos têm cabeça", só se for para pentear cabelos. Vamos a ver o resultado das próximas eleições.

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