Um dia destes estava à bica num café pequenino,
daqueles de bairro, e ouvi, não pude deixar de o fazer, uma conversa entre duas
mães que me pareceram mães, isto é, mulheres que adoptaram os filhos, porque há
mulheres, poucas felizmente, que são mais prestadoras de serviços à infância,
frequentemente em outsourcing, do que propriamente mães. Uma delas, mais
faladora, mostrava alguma preocupação e inquietações relativamente à educação
de um gaiato, pelo que percebi, de uns oito anos. Achei curioso o discurso e
vou tentar recuperá-lo.
Pois é, muitas vezes, nem sei o que fazer, ele
faz asneiras, vou para me zangar com ele e lembro-me que estou tão pouco tempo
com ele que se me zangar, nem esse tempo me sabe bem. Eu acho que ele vem
cansado da escola, está lá desde as 8, vai com o pai porque eu saio às 7 de
casa, vou buscá-lo eu já perto das sete e meia, eu também venho cansada. Depois
é a lida do jantar e do banho, estás a ver que tempo é que eu tenho para ele.
Dizem que a gente devia brincar com os filhos, falar com eles, mas quando? Ao jantar,
aproveitamos para ir vendo as notícias que é quando temos alguma hipótese. Por
vezes ainda começo a falar com ele ao deitar mas ele adormece logo e eu também
vontade não me falta. Este ano não consegui ir às reuniões da escola, foram
sempre a horas que eu não podia. Lá no trabalho se falto começam logo a fazer
má cara, como as coisas estão, sabes como é. Não sei se aconteceu contigo, mas
este ano pediram para comprar muitas coisas para a escola. Não foi nada fácil,
está tudo muito caro, a gente tem que fazer alguns sacrifícios mas fica
difícil, lá comprámos o computador, ele ficou contente e não quer outra coisa.
Às vezes já me explica algumas coisas, eu percebo pouco daquilo mas ele fica
contente de me explicar, mas é um bocadinho ao fim-de-semana, sempre com falta
de tempo. Mas é a vida assim, a gente é mãe, é para isto não é, a gente é que
quisemos que eles nascessem e ainda bem. E quando vejo o ar dele a dormir, bem
quieto, até parece que está rir-se para dentro, fico contente e acho que vale a
pena a luta dos dias.
Sabes o que ele me disse no outro dia já nem me
lembro a que propósito, “mãe, se os miúdos pudessem escolher as mães, eu
escolhia-te à mesma”.
Eu também.
Dois gaiatos, com mães em outsourcig, a falar da mãe: vou para me zangar com ela e lembro-me que estou tão pouco tempo com ela que se me zangar, nem esse tempo me sabe bem… por isso disse-lhe, está rir-me para dentro, “mãe, se os miúdos pudessem escolher as mães, eu escolhia-te à mesma”.
ResponderEliminarO seu texto deixou-me baralhado, por um lado, triste, por outro feliz. Triste pela condição desta Senhora Mãe, escrava da vida. Feliz pela felicidade, em outra dimensão, desta Mãe. Eu fui um felizardo na vida. Minha Mãe esteve sempre presente em minha vida. Quando era adolescente até pensava que às vezes estava presente demais. Em minha casa «só» o meu Pai trabalhava, minha Mãe era a escrava do trabalho doméstico e a gestora dos parco ordenado de meu Pai para que os 6 filhos pudessem estudar. O meu carácter foi formado especialmente por minha Mãe. Sem a sua presença contínua eu teria sido outra pessoa. Escrevo sempre Mãe e Pai com maiúscula - ensinamentos do meu Professor da Instrução Primária: "Mãe e Pai devem escrever-se sempre com maiúscula para demonstrarmos o quanto os amamos, respeitamos e pela gratidão que nos merecem". Apreciei muito o comentário de LL. Se for assim...
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