AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

JÁ NÃO AGUENTO, ACABOU-SE. Tudo

No meio da crise, do despudorado mundo das mordomias de ex-políticos, do regresso do Inverno, passou relativamente despercebida uma tragédia, o suicídio de uma criança com 10 anos em Lisboa. A criança, ao que parece, com uma vivência familiar problemática, com um quadro de problemas pessoais a solicitar apoio e ainda a viver reconhecidamente uma situação de bullying escolar, resolveu partir para longe dos seus problemas. Lembram-se do Leandro, o menino de Mirandela?
Como refere Daniel Sampaio no DN, é preciso uma enorme cautela no sentido de não estabelecer apressadamente nexos de causalidade, nenhum dos factores enunciados e presentes na vida do miúdo levará, só por si e incontornavelmente ao suicídio, mas as circunstâncias podem conjugar-se no sentido de se realizar.
Exige-se pois, uma enorme atenção aos miúdos e ao seu funcionamento. Os comportamentos autodestrutivos em adolescentes são mais frequentes do que muitas vezes pensamos. Alguns estudos realizados também em Portugal referem com alguma surpresa que 15.6 % dos adolescentes inquiridos, com catorze anos de idade média, afirmaram ter-se magoado de propósito mais do que uma vez nos últimos doze meses à data do estudo. Alguns estudos internacionais apontam para cerca de 10% da população em idade escolar com comportamentos de auto-mutilação pelo que os dados encontrados em Portugal são, de facto, preocupantes.
Este quadro é um indicador do mal-estar que muitos adolescentes e jovens sentem. Em muitas situações não conseguimos estar suficientemente atentos. "Há um ano que nos apercebemos de que as crianças gozavam com as orelhas do Rafael, mas pensávamos que era uma situação resolvida. É de lamentar, sinceramente. Ele era um menino querido", palavras de uma professora da escola do menino citadas na imprensa.
Acontecem com alguma frequência situações de sofrimento com as mais diversas origens, relações entre colegas, bullying por exemplo, ou relações degradadas em família que facilitam a instalação de sentimentos de rejeição, ausência de suporte social, facilitadoras de comportamentos autodestrutivos. Começa também a emergir como causa deste mal estar a dificuldade que algumas crianças e adolescentes sentem em lida com situações de insucesso escolar. Esta dificuldades são frequentemente potenciadas pela pressão das famílias e pelo nível de competição que por vezes se instala.
Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes evidenciam no seu dia a dia sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos atenção, seja em casa, ou na escola, espaço onde passam um tempo enorme. Estes sinais não podem, não devem, ser ignorados ou desvalorizados.
O resultado pode ser trágico.

3 comentários:

  1. A mim impressionou-me ainda mais (se é possível dizer isto) porque foi na minha escola preparatória, onde andei cinco anos.

    O papel do psicólogo na escola tem de ser repensado profundamente, não pode servir apenas para fazer orientação vocacional.

    Sem apoio psicológico regular aos alunos dentro ou fora da escola não vamos a lado nenhum.

    Tenho a felicidade de trabalhar numa escola pública como psicólogo (apesar de o fazer quase de graça) e fico espantado com o número de casos onde se podia fazer a diferença com uma intervenção terapeutica.

    A esperança daquele rapaz acabou a minha ainda não.

    Abraço
    António Caroço

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  2. Pois é António, mas como sabe essa coisa de psicólogos para os miúdos é coisa de ricos.

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  3. Anónimo, concordo inteiramente consigo, mas sabe também quem se poderia aliar ao psicólogo? O professor.
    Porque o professor é uma figura mitológica que aparece na sala, e no intervalo refugia-se numa mística "sala dos professores" onde estão a salvo das crianças, dos seus problemas e das suas vivências.

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