AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

ENSINO SUPERIOR. Financiamento a menos e escolas a mais

O Público de hoje retoma as dificuldades do sector do ensino superior público face aos cortes orçamentais para 2012. O Conselho de Reitores, tal como os presidentes dos Institutos Politécnicos, manifesta a sua enorme preocupação com os riscos de degradação quer do ensino, quer da investigação que o abaixamento do financiamento implicará. Por outro lado, sabe-se que em muitos estabelecimentos de ensino superior se verificam desperdício e subaproveitamento de recursos, como há dias referiram os reitores da Universidade do Porto e da Universidade de Coimbra dando o exemplo de professores com nível de envolvimento institucional e desempenho profissional abaixo do desejável. Também nos últimos dias se verificou um protesto dos alunos de direito da Universidade de Lisboa pela falta de professores, levando a que aulas que não deveriam ter mais de 30 ou 40 alunos funcionem com 100.
Do meu ponto de vista, e várias vozes se ouvem nesse sentido, para além da importante questão imediata dos cortes orçamentais para 2012, a questão estrutural remete para o sobredimensionamento da rede de ensino superior em Portugal.
O Professor António Nova, reitor da U. de Lisboa, tem vindo a afirmar a imperiosa necessidade de racionalizar a rede, "Portugal não deveria termais do que sete ou oito universidades públicas. E estou a ser benevolente" afirmou.
O ensino superior em Portugal é, como muitíssimas outras áreas, vítima de equívocos e de decisões políticas nem sempre claras. Uma das grandes dificuldades que enfrenta prende-se com a demissão durante muito tempo de uma função reguladora da tutela que, sem ferir a autonomia universitária, deveria minimizar o completo enviesamento da oferta, pública e privada, que se verifica, um país com a nossa dimensão são suporta tantos estabelecimentos de ensino superior, sobretudo, se atentarmos na qualidade. As regiões e autarquias reclamam ensino superior com a maior das ligeirezas. Durante algum tempo a pressão vinda da procura e a incapacidade de resposta do subsistema de ensino superior público associada à demissão da tutela da sua função reguladora, promoveu o crescimento exponencial do ensino superior com situações que, frequentemente, parecem incompreensíveis à luz de um mínimo de racionalidade e qualidade. Portugal contará com cerca de 160 instituições de ensino superior, como indicador relativo temos um rácio de 17,4 estabelecimentos por milhão de habitantes, enquanto a Espanha apresenta 7, um dado extraordinário.
Nesta matéria, a qualidade e o redimensionamento da rede, espera-se que o processo em curso de Avaliação e Acreditação se revele um forte incentivo. Temos uma oferta de ensino superior, universitário, politécnico e subsistema privado, completamente distorcida, cuja responsabilidade é, como disse, da tutela que se demitiu durante décadas da sua função reguladora escudando-se na autonomia universitária, designadamente no sistema público. Uma consulta à oferta de licenciaturas e mestrados por parte do ensino superior público e privado mostra com imperiosa se torna a racionalização dessa oferta.
Espera-se no entanto que o processo de avaliação e acreditação agora desencadeado, seja eficaz e não desenvolvido de uma forma cega. Existem cursos que apesar de alguma menor empregabilidade se inscrevem em áreas científicas de que não podemos prescindir com o fundamento exclusivo no mercado de emprego. Podemos dar como exemplo formações na área da filosofia ou nichos de investigação que são imprescindíveis num tecido universitário moderno. Será também importante que o processo permita desenvolver e incentive modelos de cooperação, universitário e politécnico, público e privado, que potencie sinergias, investimentos e massa crítica.
O enviesamento da oferta de que acima falava, alimenta a formação em áreas menos necessárias e não promove a formação em áreas carenciadas. Tal facto, conjugado com o baixo nível de desenvolvimento do país e com uma opinião publicada pouco cuidadosa na informação, leva a que se tenha instalado o equívoco dos licenciados a mais e destinados ao desemprego, quando continuamos a ser um dos países da UE com menos licenciados, já o disse aqui muitas vezes.

2 comentários:

  1. Inteiramente de acordo. Hoje parece claro que a proliferação desenfreada de instituições de ensino superior, não traz nem o benefício/desenvolvimento local nem nacional.
    Acho que uma forma de dar a volta a esta questão (e que poderia dar um impulso à economia) era transformar, reciclar várias universidades e pólos universitários em incubadoras de empresas para permitir mais spin-off's dos alunos. Estou a lembrar-me concretamente do "buzz" que o grupo 3B's (Polímeros- spin off da UMinho) está a criar na região Guimarães-Braga. Em Braga são inúmeras as spin-off's (da UM) com grande sucesso - especialmente na Informática.

    Porque não redireccionar a actividade docente para esta combinação ensino-trabalho-criação de projectos, no período próximo ou logo a seguir à graduação dos alunos.
    Isto na teoria já acontece. No entanto parece-me que ainda é feito de forma demasiado tímida...

    Todos lucravam: os professores que já recebem o seu salário, poderiam ver-se ainda mais úteis ao auxiliar com o seu know-how, "o salto" para o empreendedorismo dos alunos, os jovens graduados poderiam entrar mais facilmente no mercado de trabalho, os jovens alunos teriam mais lugares onde estagiar/aprender, uma vez que as parcerias spin-off/universidade se mantinham.

    Parece que toda a gente tem ideias, boas ou más para impulsionar isto... Menos quem foi eleito para as ter...

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  2. Caro Luís, como sempre, existem outros interesses, corporativismo científico, poder, competição e não cooperação, etc.
    Mesmo as experiências de sucesso da UM que refere, desenvolvem-se, basicamente, no interior da própria UM.
    Por outro lado, continuo a entender que temos uma rede de E. superior absolutamente incomportável para ter qualidade e escala, que, deve dizer-se existe, mas é localizada e dependente da qualidade de alguns dos investigadores. No entanto, a qualidade do ensino nem sempre corresponde à qualidade da investigação. Entendo que o Ministro Mariano Gago foi um bom ministro da investigação mas um mau ministro do ensino superior. Deixou que esta rede imensa se consolidasse. Vamos ver o que acontece com o Ministro Nuno Crato

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