AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sexta-feira, 10 de junho de 2011

MEU CARO PORTUGAL

Neste 10 de Junho, dia em que te comemoras, resolvi escrever-te, de novo. Como sabes, conhecemo-nos há umas décadas. Quando te conheci eras um tipo tristonho, cinzento, com a tua gente calada e com medo de quem em ti mandava. A partir de certa altura, entraste em guerra e a nossa relação complicou-se, assim como a situação de toda a gente. Nesses tempos, o resto do mundo vivia longe e todos nós, que te habitávamos, nos sentíamos distantes de tudo e tudo era difícil de conseguir.
Um dia, tu mudaste. De repente, ficaste a cores, o longe ficou perto, a tristeza ficou alegre, o impossível parecia possível. Foram os tempos da brasa, dizíamos. Tudo era depressa, tudo era ontem, até a guerra. Foi um tempo para descobrir, transgredir, aprender e progredir. Para a democracia, finalmente. Lembras-te? Fizemos as pazes.
Meu caro Portugal, a poeira entretanto começou a assentar e entrámos na chamada normalidade democrática, campanhas, eleições, mudanças de governo, desenvolvimento, etc. Apesar de alguns solavancos fomos mantendo uma relação tranquila. Então, juntaste-te a outros mais desenvolvidos, a União Europeia, e perdeste um bocado a voz que gostávamos de ouvir, por nós. Para um tipo pequeno como tu, pode ter sido boa ideia.
E aqui estamos meu caro, mais velhos e com uma relação como a que os velhos amigos têm. Zangamo-nos, fazemos as pazes, zangamo-nos de novo e, de novo nos entendemos. Quando me afasto de ti sinto saudades, quando estou contigo aborreces-me e vamos andando nisto.
Ultimamente, tenho-te sentido diferente. Pareces-me mais desalentado e com pouca esperança. É certo que a situação à tua volta também não ajuda e contigo as coisas não vão bem, mas é importante que te sintas com futuro. Isso para nós é fundamental, para nos sentirmos bem contigo.
Se bem te lembras na carta que te enviei o ano passado já te dizia que não te sentia bem, achava-te em baixo, como diz o teu povo, hoje, acho mesmo que não estás nada bem. Neste ano que passou continuou instalada por todo o mundo uma complicada situação a que tu também não tens conseguido fugir. Muita gente sem trabalho e sem esperança em dias melhores. As lideranças que acolhes também não parecem capazes de promover a esperança. Agora vamos mudar, veremos como corre. Devo confessar-te que não estou particularmente optimista.
Entretêm-se nos jogos da política pequenina, provavelmente por falta de competência para a política grande. Como se não bastasse a crise instalada ainda aparece uma rapaziada a gerir estruturas e empresas públicas que acumulam tantos prejuízos como a rapaziada acumula prémios que, em decisões difíceis de entender, terão de ser pagos com o dinheiro e sacrifícios do cidadão, prejuízos e prémios. Os casos de corrupção e manhosices dos pequenos e grandes poderes não têm fim e ninguém parece substantivamente empenhado em contribuir para o seu fim.
Pois é meu caro e velho Portugal, estás a atravessar um período nada fácil. Imagina que ouvi há horas o teu Presidente da República afirmar esperar que os teus cidadãos se queiram curar, estarão todos doentes? Que está a acontecer meu velho? Os adultos de “baixa” ou desempregados, os jovens perdidos e ao que dizem “à rasca” e os velhos a lutar pela sobrevivência. Não pode ser, temos que dar a volta a isto. Apesar de pequeno tens que protestar, não podemos aceitar não ter futuro meu caro, temos que nos organizar para um projecto de futuro.
Espero que para o próximo ano te possa encontrar em melhor estado. Até lá recebe um abraço de confiança.

10 de Junho de 2011

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