AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

terça-feira, 31 de agosto de 2010

QUERIDA FAMÍLIA E AMIGOS

A peça de hoje do Público a propósito do caso Casa Pia leva-me a retomar a questão dos abusos sobre as crianças, sobretudo os de natureza sexual.
Esperando-se a leitura da sentença para dia 3 de Setembro, ninguém acredita que o caso por aqui termine. Aliás, este caso parece ser um paradigma dos crimes em que só existem vítimas, não existirão agressores à excepção provável do desprotegido Carlos Silvino.
O trabalho do Público acentua algo que não pode deixar de ser referido. A emergência deste caso colocou uma luz mais forte sobre este universo negro, os abusos sexuais sobre crianças, pelo que a comunidade parece ter ficado mais atenta. A prova desta maior atenção pode encontrar-se no facto de desde o início do processo em 2002 até 2009, ter triplicado o volume de denúncias. No entanto, as pessoas que conhecem este tipo de problemáticas sabem que o volume de denúncias é apenas uma parte das situações de abuso.
Esta circunstância decorre de um aspecto que apesar de abordado, me parece de sublinhar. A maioria dos abusos sexuais sobre crianças ocorre nos contextos familiares e envolve família e amigos, não em instituições que, provavelmente na sequência do caso Casa Pia, até se terão tornado mais atentas e eficazes na prevenção de abusos.
Apesar das mudanças verificadas em termos legais e processuais, a fragilidade ainda verificada, na criação de uma verdadeira cultura de protecção dos miúdos leva a que muitos estejam expostos a sistemas de valores familiares que toleram e mascaram abusos com base num sentimento de posse e usufruto quase medieval. Muitas crianças em situação de abuso no universo familiar ainda sentem a culpa da denúncia das pessoas da família ou amigos, a dificuldade em gerir o facto de que pessoas que cuidam delas lhes façam mal e a falta de credibilidade eventual das suas queixas.
Neste quadro continua a ser absolutamente necessário que as pessoas que lidam com crianças, designadamente na área da saúde e da educação, sejam capazes de “ler” os miúdos e os sinais que emitem de que algo se passa com eles.
Esta atitude de permanente, informada e intencional atenção aos comportamentos e discursos dos miúdos é, do meu ponto de vista, uma peça chave para minimizar a tragédia dos abusos.

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