Não sei se já vos contei a história do Pé Leve. Foi um companheiro de escola de há muitos anos, no tempo em que a escola se chamava primária e que só era obrigatório andar por lá quatro anos. O Pé Leve ganhou esse nome, que me fez esquecer o verdadeiro, por uma particularidade, não parava um minuto. Era o miúdo mais agitado que conhecíamos, sempre em movimento e com uma energia que parecia não ter fim.
Dava ideia, por vezes, que partia
antes de chegar. Mudava de actividade, brincadeira ou conversa, sem cessar
exasperando-nos. No entanto, não nos conseguíamos aborrecer com o Pé Leve, era
pequeno, quase sempre a rir, parecia impossível que alguém se zangasse com ele.
Mas havia. A nossa professora, a
D. Conceição, senhora à beira da reforma e com a paciência também já a pedir
descanso, não aguentava o andamento, por assim dizer, do Pé Leve.
Perguntava-lhe centenas de vezes porque não assentava ele, a seguir zangava-se,
ralhava mesmo a sério e, aqui para nós, às vezes puxava mesmo pela régua e as
mãos do Pé Leve ganhavam uma cor diferente. Os olhos ficavam com água, mas na
boca continuava um sorriso. Nada fazia alterar o comportamento do Pé Leve. Não
se esqueçam que ainda não tinham inventado a hiperactividade.
Como a escola naquele tempo era
curta e poucos de nós continuávamos a estudar, eu e alguns outros perdemos o
rasto ao Pé Leve.
Passados uns anos, já adultos, estávamos
dois ou três do velho grupo à conversa e alguém informou que tinha sabido que o
Pé Leve tinha terminado a sua viagem.
Ninguém disse nada por algum
tempo, mas acho que todos pensámos que só assim o Pé Leve poderia assentar.
É a vida dos Pé Leves, de alguns.
Sem comentários:
Enviar um comentário