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quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

DIA DE SÃO VALENTIM, O LADO B

 Retomo a referência ao Dia de São Valentim que, para além de tudo o que se desenvolve em torno do romantismo do namoro e da menos romântica dimensão de negócio, tem um inquietante lado B das relações de namoro, a violência nas suas diferentes formas.

Em 2023 a PSP e a GNR receberam, em média oito queixas diárias relativas a violência em situações de namoro. Foram recebidas 2860 queixas, 1497 à GNR e 1363 à PSP.

Importa ainda sublinhar que boa parte dos episódios não são objecto de denúncia pelo que os números serão a ponta do icebergue. Ambas forças desencadearão, mais uma vez, acções de sensibilização junto da população mais jovem.

No estudo Estudo Nacional sobre Violência no Namoro 2024 hoje apresentado e realizado UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta e financiado pela Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género envolvendo 6152 jovens entre o 7.º e o 12.º considerando duas dimensões tem duas dimensões, legitimação e prevalência dos indicadores de violência apresenta dados inquietantes e em linha com os do ano anterior.

É significativo que 68,1%inda assim, nota-se um ligeiro aumento na percentagem de jovens que legitimam pelo menos um tipo de violência, sendo que controlo (54,6%) e violência psicológica (33,5%) são os mais referidos sendo ainda que 27,9% dos jovens consideram normal ser insultado numa discussão.

No que respeita a tipos de violência a que foram sujeitos 63% dos jovens referem a que já estiveram numa relação em que passaram pelo menos por um tipo de violência.

onde experienciaram pelo menos um tipo de violência.

Assim, 43% refere a proibição de estar ou falar com alguma pessoa, 39,9% viveram pelo menos uma forma de violência psicológica, 20,4% de perseguição, e 18,4% de alguma forma de violência sexual, nomeadamente serem obrigados a beijar, e 11% sofreram violência física.

São indicadores suficientes para que nos sintamos apreensivos, são jovens que nos dizem isto.

O que torna a situação ainda mais complexa é a manutenção sem grandes alterações destes indicadores ao longo dos anos, incluindo trabalhos com estudantes do ensino superior, o que talvez ajude a perceber como a violência doméstica parece indomesticável.

Os dados convergem no indiciar do que está por fazer em matéria de valores e comportamentos sociais. Acresce qu,e como referi, boa parte das situações de abuso não são objecto de queixa.

Este conjunto de dados é preocupante, gostar não é compatível com maltratar, mas creio que não é surpreendente, lamentavelmente. Os dados sobre violência doméstica em adultos que permanece indomesticável deixam perceber a existência de um trajecto pessoal anterior que suporta os dados muitos trabalhos sobre violência no namoro e que se mantêm inquietantes. Aliás, nos últimos anos a maioria das queixas de violência doméstica registadas pela APAV foram de mulheres jovens embora seja um drama presente em todas as idades.

Os sistemas de valores pessoais alteram-se a um ritmo bem mais lento do que desejamos e estão, também e obviamente, ligados aos valores sociais presentes em cada época. De facto, e reportando-nos apenas aos dados mais gerais, é criticamente relevante a percentagem de jovens, incluindo estudantes universitários, que afirmam um entendimento de normalidade face a diferentes comportamentos que evidentemente significam relações de abuso e maus-tratos.

Como todos os comportamentos fortemente ligados à camada mais funda do nosso sistema de valores, crenças e convicções, os nossos padrões sobre o que devem ser as relações interpessoais, mesmo as de natureza mais íntima, são de mudança demorada. Esta circunstância, torna ainda mais necessária a existência de dispositivos ao nível da formação e educação de crianças e jovens; de uma abordagem séria persistente nos meios de comunicação social; de um enquadramento jurídico dos comportamentos e limites numa perspectiva preventiva e punitiva e, finalmente, de dispositivos eficazes de protecção e apoio a eventuais vítimas.

Só uma aposta muito forte na educação, escolar e familiar, pode promover mudanças sustentadas nesta matéria. É uma aposta que urge e tão importante e sublinha a necessidade óbvia de matérias desta natureza serem objecto de abordagem na educação escolar sendo que não terão de o ser de uma forma “disciplinarizada”. Não me parece que haja outro caminho.

Entretanto e enquanto não muda, "só faço isto, porque gosto de ti, acreditas não acreditas?". Não, não se pode acreditar.

Retomo como iniciei. Apesar da natureza e gravidade fora do comum dos dias que vivemos e para os quais não estávamos preparados, talvez seja de não esquecer questões como estas que devastam o quotidiano de muita gente.

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