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terça-feira, 30 de maio de 2023

OS SOBRESSALTOS DAS CHAMADAS PROVAS DE AFERIÇÃO

 Como há pouco aqui escrevi, as chamadas provas de aferição parecem estar enredadas numa aproximação à chamada lei de Murphy, “tudo o que pode correr mal, corre mesmo mal”. Retomo algumas dessas notas.

Dado que ainda não foi alterada, a Lei de Bases do Sistema Educativo define que o ensino básico se organiza numa lógica de ciclos e não de disciplinas como o secundário. Assim, parece claro que uma avaliação externa de aferição deveria ser realizada no ano final de cada ciclo e não nos anos intermédios, 2º, 5º e 8º ano, quando os alunos estão a meio do seu caminho de um ciclo. Acresce que no 4º e no 6º não existem exames finais pelo que não temos a imprescindível avaliação externa.

A argumentação para a sua realização nestes anos, assenta na ideia de que a identificação de dificuldades e a devolução de resultados permitiriam a correcção de trajectórias futuras dos alunos. Certo, assim sendo e neste caso a avaliação não é de aferição, mas de diagnóstico. No entanto, espera-se que diariamente nas salas de aula os professores realizem, mais formal ou mais informalmente, avaliações desta natureza, mais formativa, pois é a mais sólida ferramenta que possuem de regulação do trabalho dos alunos e do seu próprio trabalho.

Numa decisão apressada e talvez com objectivos paralelos, a transição digital como lhe chamam é inevitável, as provas são realizadas de forma digital. No entanto existem algumas questões certamente irrelevantes.

Conheciam-se com demasiada frequência queixas relativas ao acesso a equipamentos por parte dos alunos, à qualidade dos equipamentos, que, de acordo com os directores de escolas e agrupamentos, a insuficiência dos recursos necessários à adequada utilização dos equipamentos, nas escolas, mas em particular nas salas de aulas, infra-estruturas eléctricas e rede de net eficientes, por exemplo. Acontece ainda que existe uma enorme diversidade na literacia digital dos alunos. Deste cenário podem decorrer situações sérias de desigualdade entre escolas e entre alunos e todos conhecemos múltiplas situações que evidenciam a enorme disparidade de recursos e da sua utilização.

Por outro lado, e para além da disparidade de recursos e competências e pensando sobretudo nos alunos do 2º ano, mas não esquecendo todos os outros, a aprendizagem da escrita é realizada, e bem, com o recurso predominante à escrita manual. Existem razões advindas da evidência, como agora se diz, que sustentam este caminho. Assim sendo, a proficiência da escrita em formato digital será na esmagadora maioria dos alunos de natureza e nível diferente o que pode contaminar os resultados ainda que, de acordo como o IAVE na amostra estudada as diferenças não sejam significativas.

Acresce que materiais de apoio e instruções relativos às aplicações para a realização das provas chegaram às escolas nas vésperas das provas.

A Associação Nacional de Professores de Informática avisou há algum tempo que as dificuldades seriam muitas e o Presidente do IAVE também afirmou que não estavam reunidas as “condições ideais”,

A tutela, que parece entender que a realidade é a projecção dos seus desejos, insistiu na digitalização, na base do “vai correr bem” habitual e, por deslumbramento ou por intenção menos clara, manteve o processo.

A Associação Nacional de Professores de Informática veio agora divulgar que, com base no inquérito mais de 200 professores, a maioria dos alunos não terminou a prova de aferição no tempo estipulado por problemas técnicos de diversa ordem, em 49% dos casos foi necessário recorrer a "todo o período da manhã ou da tarde". Nada de novo e inesperado.

 Finalmente, emerge outra questão a realização de provas em datas coincidentes com feriados municipais que, sobretudo, em concelhos mais densos levantam algumas dificuldades logísticas e, naturalmente de natureza profissional.

De facto, o processo de realização das provas tem decorrido em modo, ia escrever “cada tiro, cada melro”, mas como não sou dado às coisas da cinegética e para prevenir alguma reacção, escrevo, “cada cavadela, cada minhoca” (não estou a referir-me aos conteúdos de uma das provas).

Como já aqui escrevi, este processo não podia correr assim ou então … será mesmo para ser assim, no fundo, no fundo, as provas não são assim tão relevantes e reparamos menos noutras questões.

É mau, muito mau.

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