Não há volta a dar, 8 de Março, o calendário das consciências manda reparar nas mulheres, no seu universo, nos seus problemas. Para além das iniciativas, discursos e referências na imprensa que fazem parte da liturgia comemorativa, reparemos então.
Reparemos como se mantêm em níveis dramáticos e inaceitáveis
os episódios de violência doméstica incluindo homicídios. Acresce que ainda
existem muitíssimas situações que não são do conhecimento público e, portanto,
boa parte dos episódios não são sequer objecto de procedimento.
Reparemos como se mantém a diferença de oportunidades e a
desigualdade salarial apesar das mudanças legislativas. Segundo alguns dados
serão precisas décadas para atingir equidade no estatuto salarial.
Reparemos na dificuldade que muitas mulheres em Portugal têm
em conciliar maternidade com carreira, adiando ou inibindo uma ou outra, sendo
cada mais preterida a maternidade. A intenção expressa de ter filhos é um
obstáculo no acesso ao emprego.
Reparemos em como as mulheres portuguesas são das que na
Europa mais horas trabalham fora de casa e também das que mais trabalham em
casa.
Reparemos na necessidade de imposição legal de quotas para
garantia de equidade.
Reparemos na desigualdade no que respeita à ocupação de
postos de chefia.
Reparemos nos números do tráfico e abuso de mulheres que
também passa por Portugal.
Reparemos na criminosa mutilação genital feminina, também
realizada em Portugal.
Reparemos como a igreja continua a discriminar as mulheres.
Reparemos na quantidade de mulheres idosas que vivem sós,
sobrevivem isoladas e acabam por morrer de sozinhismo sem que ninguém, quase,
se dê conta.
Reparemos, finalmente, no que ainda está por fazer.
Na verdade, a metade do céu que as mulheres representam
carrega um fardo pesado.
Provavelmente ainda assim será no próximo ano como tem sido
nos anos anteriores.
Provavelmente voltarei com este texto no próximo ano.
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