Deixem-me insistir em duas ou três notas que me parecem relativamente claras e simples que retomo de reflexões anteriores.
Os estilos de vida, as exigências de qualificação têm
tornado gradualmente a escola mais presente e durante mais tempo na vida de
crianças e adolescentes e, consequentemente, com reflexos na educação em
contexto familiar.
Creio que já dificilmente se entende que a “família educa e
a escola instrói”.
Creio que já dificilmente se entende que a escola forma
“técnicos” e não cidadãos, pessoas, com qualificações ao nível dos
conhecimentos em múltiplas áreas. Aliás, se bem repararem falamos de
sistemas de educação e não de sistemas de ensino e ainda bem que assim é.
Creio que já dificilmente se entende que o conhecimento é
asséptico. O conhecimento, a sua produção e a sua divulgação, tem, deve ter,
sempre um enquadramento ético e não é imune a valores.
Creio que os tempos mais recentes são elucidativos de como a
abordagem de matérias como Direitos Humanos; Igualdade de Género;
Interculturalidade; Desenvolvimento Sustentável; Educação Ambiental; Saúde;
Sexualidade; Media; Instituições e Participação Democrática; Literacia
Financeira e Educação para o Consumo; Segurança Rodoviária; Risco,
Empreendedorismo; Mundo do Trabalho, Segurança defesa e paz, Bem-estar animal e
Voluntariado são fundamentais ao longo do processo de formação de crianças,
jovens e adultos.
Nas sociedades contemporâneas um sistema público de educação
com qualidade, desde há muito de frequência obrigatória e progressivamente mais
extenso, é uma ferramenta fundamental para a promoção de igualdade de
oportunidades, de equidade e de inclusão. É através de uma educação global de
qualidade que se minimiza o impacto de condições sociais, económicas e
familiares mais vulneráveis.
Já agora, uns indicadores que, do meu ponto de vista,
justificam com clareza a ideia de que “Educação e Cidadania para todos, porque
sim”.
De acordo com o Relatório Anual de Segurança Interna
relativo a 2021 alguns indicadores no que respeita aos comportamentos de
adolescentes e jovens. Os crimes que envolvem grupos de indivíduos entre os 15
e os 25 subiu 7,7% e a criminalidade juvenil, entre os 12 e os 16 anos,
aumentou 7,3%, o segundo maior aumento da última década.
Considerando as ocorrências registadas em meio escolar em
20/21, regista-se uma diminuição de 6,8%, tendo-se evidenciado um abaixamento do
número de registos em todos os tipos de ilícito à excepção das ofensas sexuais.
Mais alguns dados relativos a 2019 considerando a violência nas
relações de namoro. Um de trabalho de
2020 da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) que envolveu 4598
jovens, do 7.º ao 12.º com idade média de 15 anos, mostrou que para 67% é
normal algum tipo de violência e 58% já terá sofrido pelo menos um
comportamento de agressão.
Relativamente ao bullying, os estudos em Portugal sugerem
uma prevalência entre 10 e 25% e a OMS indica que 1 em cada 3 crianças ou
adolescentes será vítima de bullying. No caso mais particular do bullying
homofóbico, um trabalho da Associação ILGA Portugal (2018) envolvendo 700
jovens dos 14 e aos 20 anos, refere que 73,6% já sentiu alguma forma de
exclusão intencional por parte dos colegas.
Consumo de drogas, dados de 2019. Entre os 13 e os 18 anos
aumentou o consumo de drogas não canábis e no grupo de 18 anos aumentou o
consumo de canábis. O número de overdoses aumenta há três anos.
O consumo de álcool por jovens está a aumentar desde 2017 e
a delinquência juvenil, entre os 12 e os 16 anos, em 2019 aumentou 5,6% e a
criminalidade grupal (gangues) aumentou 15,9%.
Assim, por estas razões simples entendo que "Educação
para a Cidadania" deve obrigatoriamente integrar o trabalho desenvolvido
na educação em contexto escolar.
Precisamos e devemos discutir como fazer sempre considerando
a autonomia das escolas, não acredito na disciplinarização destas matérias,
julgo mais interessantes iniciativas integradas, simplificadas e
desburocratizadas em matéria de organização e operacionalização.
PS – Retomei este texto a propósito de uma elucidativa entrevista
ao pai dos meninos de Famalicão, episódio que se mantém activo com contornos e
aspectos lamentáveis e que está a servir de gatilho e alavanca para agendas
outras. Os pais não são donos dos filhos e não vale tudo.
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