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quarta-feira, 27 de julho de 2022

DEFICIÊNCIA E DIREITOS

 Alguma imprensa divulgou ontem o “Relatório anual 2021 sobre as práticas de actos discriminatórios em razão da deficiência e do risco de saúde agravado”, produzido anualmente pelo Instituto Nacional de Reabilitação sobre as práticas de actos discriminatórios em razão da deficiência e do risco de saúde agravado.

Verifica-se um aumento de queixas relativo a 2020, de 1013 para 1195, uma média diária de três casos e foram reportadas a diferentes entidades, maioritariamente à provedoria de Justiça.

Lamentavelmente nada de novo, sabendo ainda que as queixas são sempre em número bem menor face ao volume de situações em que os cidadãos com deficiência sentem os seus direitos desprotegidos. Algumas notas.

Em Fevereiro de 2020 foi divulgado um relatório sobre acessibilidades em edifícios públicos elaborado pela Comissão para a Promoção das Acessibilidades e os dados mostraram como, apesar da legislação, são múltiplas as dificuldades no acesso de pessoas com mobilidade reduzida aos edifícios em que funcionam serviços públicos.

Como exemplo, em 45% dos edifícios públicos com mais do que um andar não há elevadores ou plataformas elevatórias, 42% destes edifícios não têm lugar reservado para pessoas com deficiência e apenas 64% têm balcões de atendimento adaptados do ponto de vista da altura.

Em primeiro lugar deve dizer-se que, como acontece em outras áreas, a legislação portuguesa é positiva e promotora dos direitos das pessoas com deficiência, mas a sua falta de eficácia e operacionalização é bem evidenciada na tremenda dificuldade que milhares de pessoas experimentam no dia-a-dia que decorre, frequentemente, da falta de fiscalização relativa às questões das acessibilidades e barreiras nos edifícios. O relatório citado confirma-o.

Os problemas das minorias são, evidentemente, problemas minoritários.

Para além dos edifícios a questão da mobilidade e das acessibilidades que afecta muitos cidadãos com deficiência envolve áreas como vias, transportes, espaços, mobiliário urbano e, sublinhe-se, a atitude e comportamento de muitos de nós.

Boa parte dos nossos espaços urbanos não são amigáveis para os cidadãos com necessidades especiais mesmo em áreas com requalificação recente. Estando atentos identificam-se inúmeros obstáculos.

Quantas passadeiras para peões têm os lancis dos passeios rampeados ou rebaixados ajustados à circulação de pessoas com mobilidade reduzida que recorrem a cadeira de rodas?

Quantas passadeiras possuem sinalização amigável para pessoas com deficiência visual?

Quantos obstáculos criados por mobiliário urbano desadequado?

Quantas dificuldades no acesso às estações e meios de transporte público?

Quantas caixas Multibanco são acessíveis a pessoas com cadeira de rodas?

Quantos passeios estão ocupados pelos nossos carrinhos, com mobiliário urbano erradamente colocado, degradados, criando dificuldades enormes a toda a gente e em particular a pessoas com mobilidade reduzida e inúmeros obstáculos?

Quantos programas televisivos ou serviços públicos disponibilizam Língua Gestual Portuguesa tornando-os acessíveis à população surda?

Quantos Centros de Saúde ou outros espaços da Administração central ou local criam problemas de acessibilidade?

Quantos espaços de lazer ou de cultura mantêm barreiras arquitectónicas?

Quantos …?

Na verdade, apesar do muito que já caminhámos, as crianças, jovens e adultos com necessidades especiais, bem como as suas famílias e técnicos sabem, sentem, que a sua vida é uma árdua e espinhosa prova de obstáculos em múltiplas áreas, acessibilidades, educação, trabalho, saúde (este ano subiram significativamente as queixas nesta área) segurança social, habitação, etc., muitos deles inultrapassáveis.

Lamentavelmente, boa parte dessas dificuldades decorre do que as comunidades e as suas lideranças, políticas ou económicas, por exemplo, entendem ser a geometria variável dos direitos, do bem comum e do bem-estar das pessoas, de todas as pessoas.

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