AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

domingo, 26 de dezembro de 2021

ALDEIA DE UM HOMEM SÓ

 Tem estado um dia cabaneiro, entre o nevoeiro e a chuva miúda, que nos mantém mais por casa do que gostamos aqui no Monte. Precisava de plantar dois pessegueiros e duas amendoeiras, mas a terra está demasiado carregada da chuva e ainda bem que assim é. A meteorologia prevê menos água para os próximos e ainda dará para as plantar, estão de raízes aconchegadas, aguentam-se bem.

Na vista de olhos pela imprensa tropecei com um trabalho muito interessante no DN sobre a vida do Sr. José, o único habitante de uma aldeia da Serra do Barroso, Casas da Serra.

Vive sozinho na aldeia desde 2007, a luz chegou em 2009 e a água ainda é da fonte.

Sim, estamos em 2021 a virar para 2022. Como se sabe o tempo tem muitas velocidades e o Sr. José está bem habituado às velocidades do tempo, agora já ouve rádio, uma oferta de 2020.

Creio que olhamos para estas vidas com um sentimento entre a admiração pela coragem e resistência, admiração pelas assimetrias que ainda existem, e também com tristeza. Teria de ser assim, tão assim?

As oscilações da demografia não explicam tudo. Décadas de políticas públicas que desertificaram o interior, que mantiveram a pobreza e o desinvestimento no desenvolvimento do interior que empurram as pessoas para o estrangeiro ou para o litoral deixando poucos que envelhecem e partem. O Sr. José, também afirmou “Ainda pensei sair, mas fiquei. Estou arrependido, se tivesse saído a vida teria sido muito melhor... é nisso que penso muitas vezes."

O encerramento de escolas e outros serviços públicos, muitas vezes com critérios apenas administrativos têm dado um forte contributo. Reconheço a necessidade de ajustamentos que o tempo torna necessário, para dar um exemplo, não podemos ter uma escola onde existe uma criança, nem sequer cumpriria a sua função, mas não podemos promover abandono contribuir, neste caso, para deixar o Sr. José sozinho em Casas da Serra.

Por falar em políticas públicas, registei que na entrevista o Sr.  José afirmou que vota sempre, “é uma obrigação escolher".

É daquelas histórias de vida que nos deixam pequeninos.

Bom Ano Sr. José.

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