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sexta-feira, 17 de setembro de 2021

SERÁ DESTA?

Foi formalmente anunciada a constituição de 31 equipas para apoio a crianças e jovens vítimas de violência doméstica. Estas equipas integram as Respostas de Apoio Psicológico para crianças e jovens atendidos ou acolhidos na Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica.

Esta iniciativa tinha sido anunciada em Janeiro e nela estão envolvidas a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género e a Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) através de um protocolo de colaboração na resposta.

Recordo que em Julho foi finalmente aprovado o estatuto de vítima para as crianças e jovens em contexto de violência doméstica algo reclamado de há muito pelo Instituto de Apoio à Criança e pela a Ordem dos Advogados existindo ainda uma petição com o mesmo objectivo e que reuniu perto de 50 000 assinaturas.

Neste contexto é de sublinhar que o relatório Anual da Comissão Nacional Promoção dos Direitos e Protecção das Crianças e Jovens relativo a 2020 se refere que, à excepção da exposição de crianças e jovens a situações de violência doméstica ou mesmo o seu envolvimento foi a situação que mais se agravou face a 2019, 7,7%. Também se registou um ligeiro aumento nos casos de maus tratos psicológicos, de 284 em 2019 para 288 crianças em 2020.  Todos os outros indicadores desceram.

Para além de sublinhar os danos potenciais que esta exposição pode provocar nas crianças gostava de chamar a atenção para um outro potencial efeito nas crianças que assistem a episódios, por vezes violentos, de violência doméstica, os modelos de relação pessoal que são interiorizados. Aliás, nos últimos anos tem-se verificado que a maioria das queixas de violência doméstica é apresentada por mulheres jovens o que permite pensar em crianças pequenas que assistirão a estes episódios e nas potenciais consequências. Nesse sentido, operacionalização das equipas de apoio é uma boa notícia.

Numa avaliação por defeito aos casos participados de violência doméstica estima-se que cerca de metade serão testemunhados por crianças. Se considerarmos que existem muitíssimas situações não reportadas, pode concluir-se que estas testemunhas, por vezes também vítimas, serão em número bem mais elevado.

Este quadro lembra o velho adágio "Filho és, pai serás", ou seja, num processo de modelagem social muitas crianças tenderão a replicar ao longo da sua vida, em adultos também, os comportamentos a que assistiram e que, tal como podem produzir efeitos traumáticos, poderão adquirir aos seus olhos, infelizmente, um estatuto de normalidade.

Não é certamente por acaso que estudos recentes em Portugal evidenciaram números elevadíssimos de violência em casais de jovens namorados universitários, uma população já com níveis de qualificação significativos.

Neste contexto e com o objectivo de contrariar uma espécie de fatalidade em círculo vicioso, os miúdos assistem à violência doméstica, replicam a violência, a sociedade é violenta, quando crescem são violentos em casa, e assim sucessivamente, importa que os processos educativos e de qualificação sublinhem a dimensão, a formação cívica e o quadro de valores.

Não é nada de novo, a afirmação desta necessidade.

A questão é que a intervenção junto das famílias e a tentativa de contrariar dinâmicas disfuncionais, violência doméstica por exemplo, não dispõe dos meios e recursos suficientes e os riscos para crianças e jovens são significativos.

Como afirma, Benedict Wells em “O fim da solidão”, “Uma infância difícil é como um inimigo invisível. Nunca se sabe quando nos vai atingir”.

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