AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sábado, 23 de janeiro de 2021

O DIA DA REFLEXÃO

 Manda a liturgia e o quadro legal dos processos eleitorais que o dia anterior à votação se dedique à reflexão. Como em outras ocasiões tenho afirmado não estou muito de acordo com este cenário. Do meu ponto de vista, ainda que pareça estranho, a haver um dia de reflexão deveria ser o dia seguinte.

É verdade que este processo eleitoral ocorre em circunstâncias excepcionais e essas sim, justificam reflexão aprofundada. A decisão em matéria de voto não exige um dia de reflexão.

Em primeiro lugar não julgo necessário o dia de reflexão antes do acto eleitoral porque não entendo que essa reflexão influencie significativamente os resultados eleitorais pois, se por um lado a abstenção continua a crescer, deixando cada vez mais o voto no eleitorado fidelizado, por outro lado, o eleitorado flutuante não decide na véspera, decide, creio, face a contextos e circunstâncias. No caso das presidenciais e por outras razões também o dia de reflexão parece algo de desnecessário.

Em segundo lugar, porque na verdade, em termos de futuro parece ser mais significativo reflectir nos resultados eleitorais que se verificarem. Estas eleições são um claro exemplo disso mesmo, por exemplo a partir da votação que receberá a extrema-direita.

No entanto e desde já, aproveito o dia de reflexão para deixar um apelo muito sentido.

Apelo vivamente aos senhores integrantes da classe política, em particular a uma figura notável, o Ministro Eduardo Cabrita,  que a propósito das eleições de amanhã se inibam de elaborar comentários como “queria felicitar o povo português pela forma tranquila como está a decorrer, ou decorreu, o acto eleitoral”, “quero registar a normalidade que o povo português evidencia no cumprimento do seu dever cívico”, “os cidadãos mais uma vez mostram a sua maturidade democrática” ou ainda “o acto eleitoral está a decorrer, ou decorreu, com toda a normalidade em todo o território”. Considero afirmações desta natureza um insulto à esmagadora maioria dos cidadãos eleitores em Portugal. Que diabo pensam de nós, para se surpreenderem com a “normalidade” do nosso comportamento?

Então não é de esperar que participar num acto eleitoral, das diferentes formas possíveis, seja algo de normal e tranquilo?

Lembro-me daqueles pais e professores que ao falarem de miúdos acrescentam de imediato “e até se portam bem”, como se o comportamento adequado seja uma surpresa e a excepção. Como se dizia no PREC, “repudio veementemente tais afirmações”.

Já agora, nós, os cidadãos que votamos, ou não, com normalidade democrática, gostávamos de poder comentar as campanhas dos políticos dizendo que tudo decorreu com a elevação, sentido ético e de esclarecimento normais. Mas não, existem sempre os insultos, a demagogia, a trafulhice nas ideias e nas promessas, a falta de esclarecimento e debate sério, etc.

A campanha que ontem terminou constituiu um autêntico manual. Aliás, achei até curioso que ouvindo ou lendo muitas das intervenções dos candidatos, mas parecia que são candidatos a chefe de governo e não á presidência da República num quadro de distribuição de poderes como o nosso.

A actividade política das lideranças é que não decorre com normalidade e tranquilidade democráticas. Não tratem os cidadãos como gente incapaz e de quem sempre se espera o pior.

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